Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:055/22.7BEALM
Data do Acordão:11/24/2022
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
PROVIDÊNCIA CAUTELAR
SUSPENSÃO DE EFICÁCIA
FUMUS BONI JURIS
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Não se justifica admitir a revista em providência cautelar se o acórdão recorrido decidiu de forma plausível e fundamentada as diversas questões que lhe eram suscitadas, sem evidência de erro manifesto ou preterição de princípios processuais fundamentais, e se não se colocam questões de relevância social e jurídica fundamental.
Nº Convencional:JSTA000P30252
Nº do Documento:SA120221124055/22
Data de Entrada:11/14/2022
Recorrente:A........ E OUTROS
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE SETÚBAL
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A………….. e B…………., invocando o disposto no art. 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA], peticionam a admissão do recurso de revista por si interposto do acórdão de 22.09.2022 do Tribunal Central Administrativo Sul [doravante TCA/S] [cfr. fls. 589/629 - paginação «SITAF» tal como as ulteriores referências à mesma, salvo expressa indicação em contrário], que negou provimento ao recurso que havia interposto na providência cautelar deduzida contra o MUNICÍPIO DE SETÚBAL e que manteve a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada [doravante TAF/ALM] que tinha decidido indeferir «as providências cautelares requeridas» [suspensão de eficácia da deliberação n.º 74/2022 da Câmara Municipal de Setúbal tomada na reunião n.º 1/2022, de 05.01.2022, que decidiu desfavoravelmente o pedido de informação prévia (PIP) que apresentaram e a emissão de decisão judicial antecipatória que o aprove].

2. Motivam a admissão do recurso de revista [cfr. fls. 641/679] na relevância jurídica das questões objeto de dissídio e, bem assim, na necessidade de «uma melhor aplicação do direito», fundada na errada interpretação e aplicação, nomeadamente dos arts. 01.º, 95.º, 140.º, n.º 3, e 144.º, n.º 4, do CPTA, 03.º e 635.º, n.º 4, do CPC/2013, 01.º, 114.º, n.º 2, al. a), 153.º, n.º 1, do CPA/2015, 111.º e 268.º, n.º 3, da CRP, bem como do princípio da separação de poderes.

3. O aqui recorrido produziu contra-alegações em sede de recurso de revista [cfr. fls. 690/709] nas quais pugna, desde logo, pela sua não admissão.
Apreciando:

4. Dispõe-se no n.º 1 do art. 150.º do CPTA que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

5. Do referido preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s no uso dos poderes conferidos pelo art. 149.º do CPTA, conhecendo em segundo grau de jurisdição, não são, em regra, suscetíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar quando: i) esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, revista de importância fundamental; ou, ii) o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

6. O TAF/ALM desatendeu totalmente a tutela cautelar peticionada pelas aqui recorrentes, tendo considerado que in casu não se mostrava preenchido o «critério da aparência do bom direito» [cfr. fls. 478/539].

7. O TCA/S no acórdão sob impugnação manteve o julgado firmado pelo TAF/ALM, tendo julgado improcedente o recurso de apelação.

8. As requerentes cautelares, aqui ora recorrentes, fundam a necessidade de admissão da presente revista não só na relevância jurídica, mas, também, para uma melhor aplicação do direito, acometendo-o de incurso em erro de julgamento visto estarem verificados no seu entendimento os requisitos conducentes ao deferimento total da pretensão cautelar sub specie.

9. O caráter excecional deste recurso tem sido reiteradamente sublinhado pela jurisprudência desta Formação de Admissão Preliminar, com especial destaque para os processos cautelares em que se tem afirmado a exigência de um rigor acrescido, constituindo sua orientação jurisprudencial a de que em sede cautelar não se justifica admitir revista de decisões de segunda instância, salvo quando se discutam aspetos do regime jurídico específicos ou que exclusivamente digam respeito ou se confinem à tutela cautelar, ou quando a decisão contenda com situações de relevância comunitária particularmente intensa ou de inobservância de princípios processuais fundamentais.

10. As instâncias quanto ao segmento da pretensão cautelar em crise convergiram no sentido do não preenchimento do requisito do fumus boni juris inserto do n.º 1 do art. 120.º do CPTA, entendendo que, presentes os fundamentos de ilegalidade invocados, não se vislumbrava como provável a procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal.

11. Entrando na análise do preenchimento dos pressupostos da revista sub specie previstos no art. 150.º do CPTA impõe-se referir, desde logo, que não nos deparamos ante uma situação em que a admissão do recurso se imponha pela existência de questão que, pela sua relevância jurídica, revista de importância fundamental ou que seja clara a sua necessidade para efeitos de melhor aplicação do direito.

12. Com efeito, ante a pronúncia do acórdão recorrido e aquilo que nesta sede relevará como crítica importa referir que no presente recurso de revista não se vislumbra face aos concretos termos como se mostram colocadas as questões elencadas que estas, gozando de alguma transversalidade, ainda assim estejam ou sejam dotadas de relevância jurídica fundamental, já que não se descortina complexidade jurídica, nem se surpreende nas mesmas a existência de dificuldades superiores ao comum nas operações exegéticas a realizar, ou que estejamos em presença de um enquadramento normativo especialmente intrincado, complexo ou confuso, não ressaltando, mormente pelas especificidades do caso, que a solução possa corresponder a um padrão de apreciação futura para outros casos similares.

13. Para além disso, temos que a alegação expendida pelas recorrentes nas críticas que acometem ao julgado não se mostra persuasiva, tudo apontando, presentes o quadro normativo em crise e os contornos do caso sub specie, no sentido de que as instâncias, mormente o acórdão sob recurso, decidiram com acerto, não aparentando padecer de erros lógicos ou jurídicos manifestos.

14. Nessa medida, mostrando-se a questão/pretensão apreciada em sede cautelar em dois graus de jurisdição e que ulteriormente há-de iniciar-se e seguir-se um novo ciclo de decisões sobre elas no quadro do processo principal, e que nenhuma razão se vislumbra, à luz do n.º 1 do art. 150.º do CPTA, para que este Supremo Tribunal seja chamado a emitir pronúncia na providência cautelar com o caráter provisório que é próprio das decisões em tal sede, temos que a presente revista revela-se ser inviável, não se justificando submetê-la à análise deste Supremo por razões de relevância jurídica e para uma melhor aplicação do direito.

DECISÃO
Nestes termos e de harmonia com o disposto no art. 150.º do CPTA, acordam os juízes da formação de apreciação preliminar da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal em não admitir a revista.
Custas a cargo das recorrentes.
D.N..

Lisboa, 24 de novembro de 2022. – Carlos Carvalho (relator) – Teresa de Sousa – José Veloso.