Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 0336/18.4BELLE |
Data do Acordão: | 10/27/2021 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | ANÍBAL FERRAZ |
Descritores: | CONTRA-ORDENAÇÃO PAGAMENTO POR CONTA |
Sumário: | O STA, há longa data e pela intervenção de várias gerações de Conselheiros, entende que não havendo imposto devido a final do exercício a que respeita o pagamento por conta omitido (mesmo que seja o segundo), fica excluída a ilicitude da conduta - artigo 114.º, n.ºs 1, 2, e 5, alínea f) do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT). |
Nº Convencional: | JSTA000P28401 |
Nº do Documento: | SA2202110270336/18 |
Data de Entrada: | 10/11/2021 |
Recorrente: | AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA |
Recorrido 1: | MINISTÉRIO PÚBLICO E OUTROS |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa;
# I.
A representação da Fazenda Pública (rFP) recorre de despacho decisório/sentença, proferido no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Loulé, em 8 de janeiro de 2021, que, neste processo de recurso (judicial) de decisão de aplicação de coima (contraordenação), julgou procedente a impugnação dirigida contra decisão aplicadora de coima, no valor de € 6.508,69 e custas processuais.
* O Ministério Público, na condição de recorrido, formalizou alegação, onde conclui: «
I. O presente recurso vem interposto da douta sentença proferida em 08/01/2021 que julgou procedente o Recurso e absolveu a Arguida da contra-ordenação que lhe tinha sido imputada no processo de Contra-Ordenação nº 1082018060000017428; II. Entende a Recorrente que incorreu em erro de julgamento e violou o disposto no art. 104º nº 1 al. a) CIRC. III. O fundamento determinante para a absolvição da arguida foi o de que da falta do pagamento por conta do período 2017/09 “não resultou prejuízo para o Estado, pois em 2017 a Recorrente apurou imposto a reembolsar, não havendo por esse motivo, nesse ano, qualquer montante a pagar de imposto ao Estado”. IV. Em termos substantivos os pagamentos por conta a efectuar ao longo do exercício são-no por conta do imposto final do exercício a que respeitam – traduzem adiantamentos - conforme decorre do disposto no art. 104º nº 1 al. a) CIRC, calculados a final, com vista a antecipar o pagamento do mesmo para o período em que se vai formando o facto tributário; V. E o art. 114º nº 1, 2 e 5 al. f) RGIT apenas prevê a punição, como contra-ordenação, pela falta de pagamento por conta do imposto devido a final, o que significa que o facto típico é a não entrega, total ou parcial, da prestação tributária devida a título de pagamento por conta do imposto devido a final no prazo de 90 dias; VI. Quando a final não for devido imposto não se verifica a prática de contra-ordenação por não estar preenchido o tipo incriminatório, seja porque não existe qualquer colecta ou porque o seu valor já se mostra pago antecipadamente. VII. Aquilo que está em causa, salvo melhor opinião, não é a conjugação com a interpretação do art. 107º nº 1 do CIRC mas do princípio da legalidade do direito penal (in casu contra-ordenacional) previsto no art. 1º do C Penal segundo o qual “Só pode ser punido criminalmente o facto descrito e declarado passível de pena por lei anterior ao momento da sua prática”, consagrado no art. 29º nº 1 CRP e aqui aplicável por força do disposto no art. 32º RGCO; VIII. Na sua vertente de nullum crimen sine lege stricta este princípio proíbe a aplicação analógica da lei penal, a interpretação extensiva da incriminação em detrimento do arguido, bem como da interpretação restritiva de uma causa de justificação. IX. Não se mostrando preenchidos os elementos constitutivos da infracção prevista no art. 114º nº 1, 2 e 5 al. f) RGIT impunha-se a absolvição da arguida (cfr. ac. STA 02/12/2020, P. 02482/17.2BEBRG e ac. TCA Sul 14/01/2021, P.326/18.7BELLE). * O Exmo. Procurador-geral-adjunto emitiu parecer, defendendo, a final, que “deve ser negado provimento ao recurso interposto, mantendo-se, na íntegra, a douta sentença recorrida”. * Cumpridas as formalidades legais, compete-nos decidir. ******* # II.
Na decisão recorrida, em sede de julgamento factual, consta: «
B) Em 17-02-2018, com base no auto de notícia identificado em B) supra, foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Loulé 1, o processo de Contra-ordenação n.º 10822018060000017428, contra a Recorrente (cfr. fls. 2 do Documento n.º 004453062 dos autos, idem); C) A Recorrente exerceu o seu direito de defesa no processo de Contra-ordenação identificado em B) supra, o qual foi considerado extemporâneo (cfr. fls. 51 a 54 do Documento n.º 004453062 dos autos, ibidem); D) Em 13-03-2018, foi proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Loulé 1, decisão de fixação da coima no âmbito do processo de Contra-ordenação referido em C) supra, no montante de € 6.508,69, acrescida de € 76,50 de custas processuais, pela prática de infracção prevista no artigo art.º 104.º, n.º 1, a) do CIRC – “falta de entrega de pagamento por conta” e punida pelo art.º 114.º, n.º 2 e 5, f) e art.º 26.º, n.º 4 do RGIT – “falta de entrega de prestação tributária”, nos seguintes termos: “(…) [ (…) ] (cfr. fls. 8 a 9 do Documento n.º 004453062 dos autos, ibidem); E) Em 19-06-2018, a Recorrente apresentou a declaração modelo 22 de IRC, referente ao exercício de 2017, identificada sob o n.º 1082-C0596-13, na qual indicou € 54.091,99, como valor da matéria colectável, € 10.759,32 de colecta e, € 21.270,25 de pagamentos por conta (cfr. fls. 1 a 10 do Documento n.º 004456740 dos autos, ibidem); F) Com base na declaração identificada em E) supra, foi apurado imposto a reembolsar à Recorrente no exercício de 2017, no montante de € 9.654,70 (cfr. fls. 1 do Documento n.º 004553254 dos autos, idem); *** Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito e que, por conseguinte, importe registar como não provados.»*** O STA, há longa data e pela intervenção de várias gerações de Conselheiros, versando todo o tipo de argumentação, entende que não havendo imposto devido a final do exercício a que respeita o pagamento por conta omitido (mesmo que seja o segundo), fica excluída a ilicitude da conduta - artigo 114.º, n.ºs 1, 2, e 5, alínea f) do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT). Tendo a decisão recorrida ido nesta, firme, linha jurisprudencial, nenhuma censura merecia (e merece). ******* # III. Pelo exposto, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, acordamos negar provimento a este recurso jurisdicional. * Sem tributação. * Cumpra-se, além do mais, o disposto no art. 70.º n.º 4 do Regime Geral do Ilícito de Mera Ordenação Social (RGIMOS).***** [texto redigido em meio informático e revisto] Lisboa, 27 de outubro de 2021. - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz (relator) - Pedro Nuno Pinto Vergueiro - Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia. |