Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0857/10
Data do Acordão:02/09/2011
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANTÓNIO CALHAU
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE
PRESCRIÇÃO
OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA
Sumário:I - A questão da prescrição é de conhecimento oficioso mesmo em sede de impugnação judicial tendo em vista a eventual inutilidade superveniente da lide.
II - Para determinar se o prazo de prescrição aplicável é o do CPT ou o da LGT apenas há que atentar no que estabelece o artigo 297.º, n.º 1 do CC, de acordo com o qual a regra é a aplicação do novo prazo, a não ser que da aplicação do mesmo, ainda que mais curto, resulte um termo mais tardio do que o que resultaria da lei antiga.
III - Assim, se de acordo com o mecanismo do artigo 279.º, n.º 1 do CC a lei nova for a elegível há que aplicá-la sem mais, sendo certo que o novo prazo se conta apenas a partir da entrada em vigor dessa lei.
IV - Por força do disposto no n.º 2 do artigo 49.º da LGT, na redacção anterior à Lei 53-A/2006, de 29/12, a impugnação judicial interrompe o prazo de prescrição, cessando, porém, esse efeito se este processo estiver parado por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo, somando-se neste caso o tempo que decorrer após esse período ao que decorreu até à data da autuação do processo.
V - Embora tal norma esteja hoje revogada, a mesma continua a ser aplicável aos factos interruptivos pretéritos cujo período de paragem se completou antes da entrada em vigor da Lei n.º 53-A/2006, de 29/12.
Nº Convencional:JSTA00066812
Nº do Documento:SA2201102090857
Data de Entrada:11/03/2010
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAF MIRANDELA PER SALTUM.
Decisão:EXTINÇÃO INST.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART175.
L 53-A/2006 DE 2006/12/29 ART91.
DL 398/98 DE 1998/12/17 ART6.
LGT98 ART48 N1 ART49 N1 N2 N3.
CPTRIB91 ART130 ART282.
CCIV66 ART12 ART297 N1.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC659/08 DE 2009/03/11.
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA CPPT ANOTADO E COMENTADO 5ED PAG205. JORGE DE SOUSA SOBRE A PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA NOTAS PRATICAS 2ED PAG52 PAG53.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
I – A…, Lda., com sede em Valpaços, não se conformando com a decisão do Mmo. Juiz do TAF de Mirandela que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra a liquidação de IRC, referente ao ano de 1997, dela vem interpor recurso para este Tribunal, formulando as seguintes conclusões:
1. Os factos em causa dizem respeito ao ano de 1997, pelo que ocorreu a prescrição, nos termos do artigo 48.º da LGT.
2. E nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 49.º da LGT (em vigor à data dos factos) e que se aplica por ser mais favorável ao recorrente, a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar os efeitos do n.º 1 do citado artigo 49.º da LGT, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação.
3. Já decorreu um total de 12 anos e cinco meses.
4. Uma vez que a paragem do processo não é da responsabilidade da recorrente, apenas se conta, para efeitos da suspensão o prazo de um ano, pelo que, mesmo assim, decorreram onze anos e cinco meses, ocorrendo, consequentemente, a prescrição.
5. Neste sentido, Acórdãos do STA de 2008/01/16, Proc. 0416/08 e de 03/12/2008, Proc. 0475/08.
6. A prescrição é do conhecimento oficioso do Tribunal.
7. A douta sentença ancorou a decisão na seguinte matéria factual:
As correcções efectuadas à matéria colectável do ano de 1997 reconduzem-se, em síntese, às seguintes circunstâncias:
a) Correcção relativa a 20% da amortização praticada relativamente ao veículo Opel Frontera Sport, nos termos do n.º 4 do artigo 41.º do CIRC, no montante de Esc. 166.667$00 (€ 831,33);
b) Custos e perdas extraordinárias, relativos a impostos de solidariedade – 7.042.386$00 (€ 35.127,27) e IRS dos trabalhadores pago na Alemanha – 48.569.784$00 (€ 242.264,88), no total de 55.612.134$00 (€ 277.392,15);
c) Acréscimo à matéria colectável, resultante da dupla tributação internacional nos termos do artigo 58.º, n.º 1, b) do CIRC.
8. A douta sentença, que é colocada em crise pelo presente recurso, considera que os impostos pagos pela impugnante na Alemanha – Imposto de Solidariedade e o IRS dos trabalhadores – não deveriam ser imputados a custos de exploração, uma vez que, nos termos do disposto no artigo 41.º do CIRC, os mesmos não seriam dedutíveis para efeito de determinação do lucro tributável.
9. A douta sentença admite que o Imposto de Solidariedade, no valor de 7.042.386$00 (€ 35.127,27) seria “objecto de dedução no âmbito da eliminação da dupla tributação, mas nunca seria dedutível ao lucro tributável”.
10. Ora, cabendo ao Estado Português proceder à sua eliminação, e não o tendo feito, a responsabilidade por tal omissão é da Administração Fiscal, não podendo ser imputada à impugnante.
11. Nos termos do Ac. do TCA - Sul de 27/01/2004 “1. No conflito entre a Lei Interna do Estado Português e a Lei emergente de Tratado Internacional ratificado por Portugal, prevalece a solução consagrada no Tratado, sob pena de violação do artigo 8.º da Lei Fundamental. 2. Estando provado que um cidadão português residiu mais de 183 dias na Alemanha, não pode o mesmo ser tributado por Portugal, pelos rendimentos auferidos na Alemanha, sob pena de violação do artigo 15.º, n.º 2 da Convenção entre a República Portuguesa e a República Federal da Alemanha aprovada pela Lei n.º 12/82, de 3 de Junho. 3. O artigo 24.º daquela Convenção só seria aplicável se os rendimentos em questão pudessem ser tributados pelo Estado Português, caso em que lhe cumpria proceder à eliminação da dupla tributação.
12. A douta sentença, na interpretação, errónea, que faz da Convenção celebrada entre o Estado Português e a República Federal da Alemanha, viola o artigo 8.º da Lei Fundamental.
13. E os normativos invocados, os artigos 73.º e 58.º do CIRC violam, igualmente, na interpretação da douta sentença, o artigo 8.º da Lei Fundamental.
14. A Administração Fiscal portuguesa deveria ter procedido à eliminação da dupla tributação e só depois poderia efectuar o cálculo do imposto.
15. A própria sentença colocada em crise admite que tal valor poderia e deveria ser objecto de dedução no âmbito da dupla tributação, facto este relevante para a determinação da matéria colectável, ao que acresce o facto de os rendimentos terem sido obtidos, pela impugnante, na Alemanha e ter pago os impostos naquele País.
16. A Administração Fiscal não curou de saber quais os rendimentos obtidos em Portugal pela impugnante e quais os rendimentos obtidos na Alemanha.
17. Assim, e por tudo isto, a douta sentença deveria ter dado provimento, quanto a esta parte à impugnante, retirando do lucro tributável o imposto de solidariedade pago na Alemanha no valor de 7.042.386$00 (€ 35.127,27), ou seja, tal valor nunca poderia ser acrescido ao lucro apurado em sede de IRC em Portugal.
18. Vejamos agora a outra questão respeitante ao IRS dos trabalhadores da impugnante, que exerceram funções na Alemanha e que o Estado Alemão liquidou à impugnante e que a Administração Fiscal portuguesa não aceitou como sendo matéria dedutível em sede de IRC.
19. A douta sentença dá como provado que os Serviços Fiscais alemães exigiram à impugnante, nos termos da ordem interna alemã, o pagamento do IRS dos trabalhadores que, ao serviço da impugnante, exerceram funções na Alemanha, porquanto trabalharam naquele País mais de 183 dias.
20. Torna-se, por demais evidente, que esse rendimento auferido pelos trabalhadores que levou o Estado Alemão a tributar a impugnante em sede de IRS determinou que fosse a impugnante a pagar esses valores, fruto das receitas obtidas naquele Estado.
21. A Administração Fiscal portuguesa nunca poderia fixar o valor do rendimento tributável da impugnante com base nos rendimentos ali obtidos e a considerá-los deveria imputar o IRS pago pela impugnante como custos do exercício.
Por todos, os acórdãos do TCA de 6/5/2003 e de 14/11/2000, proferidos nos recursos n.ºs 7509/02 e 3991/00, respectivamente.
22. O Estado Alemão, por causa da existência do estaleiro, entendeu como consta dos elementos existentes nos autos de inspecção que a reclamante tinha instalação fixa ou melhor local de direcção, pelo que tributou a empresa e os trabalhadores em IRC e IRS.
23. A impugnante viu-se na obrigação de pagar tais impostos.
24. Os impostos - IRS e IRC - já foram pagos na Alemanha, configurando tal situação a figura de dupla tributação, para a qual se solicitou, em devido tempo, a intervenção, nos termos constantes da Convenção, do Sr. Ministro das Finanças que, por inépcia ou incompetência nada fez.
25. Se o Estado Português não resolveu, pelas vias competentes, esta situação, recebendo aquilo a que tinha direito, tal é da exclusiva responsabilidade do Estado.
26. Havendo dupla tributação, nos termos da Convenção, compete ao Estado Português solicitar a devolução das verbas retidas, facto este que é admitido na douta sentença, mas do qual a mesma não extrai as devidas consequências.
27. A tributação em Portugal, à impugnante, de impostos já pagos em outro país comunitário, viola frontalmente os artigos 8.º, 13.º, 14.º, 29.º, n.º 5, todos da CRP, isto é, a interpretação que a douta sentença faz dos artigos 41.º, 58.º e 73.º do CIRC viola os referidos preceitos constitucionais.
28. A impugnante pagou os seus impostos, nada mais devendo ao Fisco.
29. De resto, a douta sentença, na confusão em que se enreda para justificar a posição da Administração Fiscal, admite que existem “elementos fácticos que conduzem à conclusão que a impugnante tinha na Alemanha uma instalação, para efeito de imputação de rendimento aí produzido”.
30. E vai mais longe “… face à eventual dupla tributação internacional cumpre dizer que o imposto pago na Alemanha é dedutível, total ou parcialmente, ao imposto liquidado em Portugal”, invocando o artigo 24.º da Convenção.
31. E, depois, numa viragem, inexplicável, invoca-se o artigo 73.º do CIRC, o qual, na interpretação que a douta sentença faz do mesmo, é manifestamente inconstitucional por violação do artigo 8.º da Lei Fundamental para fundamentar a decisão, sem dar como provado se a impugnante declarou os rendimentos obtidos na Alemanha em sede de IRC em Portugal.
32. A douta sentença, submetida à sábia apreciação de Vexas Venerandos Conselheiros, peca por ser uma amálgama de conceitos de direito fiscal internacional, sem ancoragem na factualidade, e desprezando as mais elementares normas da Convenção e do direito do contribuinte.
Não foram apresentadas contra-alegações.
O Exmo. Magistrado do MP junto deste Tribunal não emitiu qualquer parecer.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
II - Mostram-se provados os seguintes factos:
1. A ora impugnante, “A…, Lda.”, NIF …, é uma empresa portuguesa do ramo da Construção Civil e Obras Públicas com sede na Praça …, Edifício …, Bloco Norte, …, em Valpaços;
2. Com referência ao ano de 1997, a Administração Tributária (DGCI) efectuou a liquidação adicional n.º 8310001999, no montante de Esc. 40.369.568$00 (€ 201.362,55), a qual é objecto da presente impugnação judicial;
3. A referida liquidação adicional teve origem em acção de fiscalização levada a efeito à escrita/contabilidade daquela empresa (ora impugnante), por funcionário afecto aos Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Vila Real, da qual resultou o relatório cuja cópia se encontra junta aos autos e se dá por reproduzido;
4. As correcções efectuadas à matéria colectável daquele ano de 1997 da empresa (ora impugnante), que originaram a liquidação que nos presentes autos se pretende colocar em crise, reconduzem-se, em síntese, às seguintes circunstâncias:
a) Correcção relativa a 20% da amortização praticada relativamente ao veículo Opel Frontera Sport, nos termos do n.º 4 do artigo 41.º do CIRC, no montante de Esc. 166.667$00 - cfr. ponto 3.2 do relatório;
b) Custos e perdas extraordinárias, relativos a impostos de solidariedade - 7.042.386$00 e IRS dos trabalhadores pago na Alemanha - 48.569.784$00, no total de 55.612.134$00 - cfr. ponto 3.1 do relatório;
c) Acréscimo à matéria colectável, resultante da dupla tributação internacional nos termos do artigo 58.º, n.º 1, b) do CIRC - cfr. ponto 2.3.2.1 do relatório.
5. Basta atentar no quadro resumo constante do ponto 5.1 do relatório da inspecção tributária constante dos autos para se verificar que a Administração Tributária não efectuou qualquer correcção quantitativa nos custos com o pessoal (isto é, nos custos que dizem respeito às remunerações e às ajudas de custo), verba essa contabilizada pela empresa com um total de 203.662.523$00 e mantida com esse mesmo total de 203.662.523$00 no apuramento efectuado pela Administração Tributária.
III - Vem a recorrente nas conclusões da sua alegação de recurso suscitar a questão da prescrição da obrigação tributária relativa ao IRC de 1997 impugnado nos presentes autos, matéria esta que não foi enfrentada na sentença recorrida, a qual se limitou a conhecer dos fundamentos impugnatórios que tinham sido alegados.
Todavia, o certo é que a questão da prescrição é de conhecimento oficioso mesmo em sede de impugnação judicial tendo em vista a eventual inutilidade superveniente da lide, no pressuposto que os autos forneçam os dados necessários para o efeito e ainda não tenha transitado em julgado decisão final sobre o objecto da causa, o que acontece no caso “sub judicio”- cfr. artigo 175.º do CPPT; Jorge Lopes de Sousa, in CPPT, anotado e comentado, 5.ª edição, a fls. 205, anotação 4 ao mesmo artigo e acórdão de 11/03/09, no recurso n.º 659/08.
Sendo assim, vejamos se acaso se encontra prescrita a obrigação tributária relativa a IRC de 1997, em causa nos autos.
O prazo de prescrição aplicável ao tempo era o de 10 anos, contado do início do ano seguinte àquele em que ocorreu o facto tributário, nos termos do art. 34.º, n.º 1, do Código de Processo Tributário.
Sucede que, com a entrada em vigor da LGT (1/1/99 - artigo 6.º do DL n.º 398/98, de 17 de Dezembro), esse prazo foi reduzido para 8 anos, contado, nos impostos periódicos, como é o caso, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário - artigo 48.º n.º 1.
Como assim, em face da sucessão de diferentes prazos prescricionais, importará começar por apurar qual o prazo aplicável na situação em apreço.
Para tanto, cumpre convocar a regra estabelecida no artigo 297.º, n.º 1 do CC, de acordo com a qual deverá aplicar-se o prazo mais curto, que se conta a partir da entrada em vigor da lei nova, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar.
A contagem do prazo de 10 anos previsto no n.º 1 do artigo 34.º do CPT teve o seu início em 1/1/98, sendo que, à data de entrada em vigor da LGT, faltavam ainda 9 anos para se completar o prazo de prescrição, ou seja, um prazo maior do que o previsto nesta lei, pelo que se impõe concluir, assim, que será de atender ao novo prazo de 8 anos previsto na lei nova (artigo 48.º, n.º 1 da LGT), contado a partir da respectiva entrada em vigor (1/1/99).
Há que considerar, contudo, a ocorrência de factos interruptivos e/ou suspensivos da prescrição, susceptíveis de influir no decurso do prazo, sendo aplicáveis ao caso dos autos os previstos na lei vigente à data que ocorreram, ex vi do n.º 2 do artigo 12.º do Código Civil
A impugnação foi instaurada em 13/5/1999 tendo como efeito a interrupção da prescrição, nos termos do n.º 1 do artigo 49.º da LGT.
Todavia, o efeito interruptivo resultante da instauração da impugnação, ocorrida a 13/5/1999, degenerou em suspensivo, por força da respectiva paragem por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo, de 8/07/99 a 29/09/00 (v. fls. 30 a 35 dos autos), somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação (n.º 2 do artigo 49.º da LGT, na redacção anterior à Lei n.º 53-A/2006, de 29/12).
Ora, somando o tempo decorrido de 1/1/99 com o que já decorreu a partir de 8/7/00, é evidente que já se completou o prazo de oito anos de prescrição previsto no n.º 1 do artigo 48.º da LGT.
Por outro lado, como se extrai do processo executivo apenso, instaurado em 4/8/99, a impugnante foi nele citada em 19/8/99, sendo que este facto também interrompe a prescrição, nos termos do n.º 1 do artigo 49.º da LGT.
É certo que o actual n.º 3 do artigo 49.º da LGT dispõe que a interrupção da prescrição tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar, mas esta norma, porque apenas entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2007, apenas será aplicável se ocorrerem novos factos interruptivos já depois da sua entrada em vigor, não prejudicando os que antes dessa data, tiverem ocorrido.
Ora, quer a citação, quer a impugnação são anteriores a 1 de Janeiro de 2007, pelo que haverá dois factos interruptivos a considerar, sendo ambos relevantes para efeitos do cômputo do prazo.
Importa, igualmente, considerar que, embora o então n.º 2 do artigo 49.º da LGT - nos termos do qual a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação - esteja hoje revogado, e o legislador tenha determinado que essa revogação se aplica aos prazos de prescrição em curso, objecto de interrupção, ainda que não tenha decorrido o período superior a um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo (artigo 91.º da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro), tal norma continua a ser aplicável aos factos interruptivos pretéritos cujo período de paragem se completou antes da entrada em vigor daquela lei (1 de Janeiro de 2007).
Ora, aplicando o exposto ao caso dos autos, temos que a primeira interrupção da prescrição se deu em 13/5/99 (data da autuação da impugnação), tendo o processo estado parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, pois que entre a remessa dos autos à DDF de Vila Real, para apreciação nos termos do artigo 130.º do CPT, em 8/7/99, e o respectivo despacho do DDF, proferido apenas em 29/9/00, não há notícia de qualquer andamento do processo.
Aliás, o mesmo voltaria a estar parado entre 20/9/01 (conclusão ao juiz) e 10/12/02 (despacho do juiz) - v. fls. 58 e verso dos autos.
Assim, o período de paragem por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, quer numa quer noutra situação, completou-se em data anterior à da revogação do então n.º 2 do artigo 49.º da LGT, o que ex vi deste preceito legal, assim aplicável ao caso dos autos.
Também do processo executivo apenso e instaurado em 4/8/99 apenas se extrai que a executada, aqui impugnante, foi nele citada em 19/8/99 e após um despacho do chefe de RF, proferido em 21/10/99, a ordenar que se dê cumprimento ao artigo 282.º do CPT e de seguida se suspenda a execução, nenhum outro acto nele foi praticado, a não ser uma junção de documentos de veículos da executada, com data de 31/8/99 (?).
Não há, no caso dos autos, que considerar, assim, para cômputo do prazo de prescrição a suspensão do prazo em virtude da dedução de impugnação judicial, ex vi do então vigente n.º 3 do artigo 49.º da LGT, pois que esta não foi acompanhada da prestação de garantia para suspender a execução fiscal, nem consta que tenha havido dispensa da prestação de garantia para esse efeito ou que a entrega dos documentos de veículos referida fosse suficiente para pagamento da dívida exequenda e acrescido.
É que, como diz JORGE LOPES DE SOUSA (Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária: Notas Práticas, 2.ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2010, pp. 52/53), nos termos do art. 49.º n.º 3, da LGT, na redacção introduzida pela Lei n.º 100/99, de 26 de Julho, estabeleceu-se que «o prazo de prescrição legal suspende-se por motivo de paragem do processo de execução fiscal em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou de reclamação, impugnação ou recurso». A paragem do processo de execução fiscal por motivo de reclamação graciosa, impugnação judicial ou recurso judicial ocorre nos casos em que o uso desses meios impugnatórios é acompanhado de prestação de garantia (à prestação de garantia será de considerar equivalente a sua dispensa, nos termos dos arts. 52.º n.º 4, da LGT e 170.º do CPPT) ou penhora de bens suficientes para pagamento da dívida exequenda e do acrescido (art. 169.º n.º 1, do CPPT).
No caso dos autos, em que houve impugnação judicial mas esta não determinou a paragem do processo de execução, já que não se mostra prestada garantia para o efeito, não há, pois, que considerar esta suspensão do prazo de prescrição.
Razão por que, mostrando-se, assim, já prescrita a dívida impugnada, fica prejudicado o conhecimento das restantes questões suscitadas no recurso.
IV - Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do STA em, por se verificar prescrita a dívida impugnada, julgar extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide.
Sem custas.
Lisboa, 9 de Fevereiro de 2011. – António Calhau (relator) – Casimiro GonçalvesPimenta do Vale.