Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0700/13.5BEPNF
Data do Acordão:03/29/2023
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:NUNO BASTOS
Descritores:IRS
BOLSA DE FORMAÇÃO
MÉDICO
Sumário:I - Apesar da designação que o legislador lhe atribuiu, o propósito da bolsa adicional paga aos médicos internos em regime de vaga preferencial é o de incentivar a fidelização do médico interno no serviço ou hospital onde se verificou uma carência de profissionais, compensando-os pela obrigação de permanência naquele serviço após a conclusão do internato médico.
II - Em consequência, a quantia atribuída mensalmente ao sujeito passivo a título de bolsa de formação, constitui rendimento do trabalho dependente, enquanto remuneração acessória da remuneração principal e portanto fora da incidência objectiva da norma de exclusão da tributação (art. 2º n.ºs 3 al. b) e 8 al. c) CIRS em vigor à data dos factos).
Nº Convencional:JSTA000P30788
Nº do Documento:SA2202303290700/13
Data de Entrada:02/10/2022
Recorrente:AA
Recorrido 1:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. AA, contribuinte fiscal n.º ..., com domicílio indicado na Travessa ..., ... ..., recorreu para o Tribunal Central Administrativo Norte da douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que julgou totalmente improcedente a impugnação judicial da liquidação de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (“IRS”) do período de 2012 (liquidação n.º 2013 5004195217) a que corresponde nota de cobrança em que foi determinado o valor a pagar de € 2.857,94.

O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e com efeito devolutivo.

Notificada da sua admissão, apresentou alegações e formulou as seguintes conclusões: «(…)

A) A sentença recorrida viola o disposto nos artigos 1º e 2º do CIRS e o artigo 8º e 11º da LGT.

B) As bolsas de formação recebidas pela Recorrente durante o ano de 2012 e liquidadas pelo Centro Hospitalar ... A... EPE não se reconduzem a rendimentos de trabalho dependente, sujeitos a IRS nos termos do artigo 2º CIRS.

C) As bolsas de formação não constituem remuneração pela prestação de trabalho, nem tão pouco constituem remuneração acessória daquela, nos termos do artigo 2º nº 3 al. b) do CIRS.

D) Não sendo subsumíveis à previsão do artigo 2º CIRS nem se alegando qualquer outra norma que preveja a sua sujeição a imposto, as bolsas de formação não devem ser sujeitas a IRS, pelo que a sua consideração para apuramento da matéria colectável em sede de IRS é ilegal

E) As bolsas de formação encontram-se previstas no artigo 12ºA do Decreto-Lei nº 203/2004, de 18 de Agosto (Define o regime jurídico da formação médica, após a licenciatura em Medicina, com vista à especialização, e estabelece os princípios gerais a que deve obedecer o respectivo processo), aditado pelo Decreto-Lei nº 45/2009.

F) Neste diploma prevê-se a atribuição de uma bolsa de formação aos médicos internos que preencham uma vaga preferencial, bem como a obrigatoriedade daqueles, após o internato, ficarem a realizar trabalho para o estabelecimento ou serviço onde se verificou a necessidade que deu lugar à vaga preferencial, por um período não inferior ao do respectivo programa de formação médica especializada, incluindo repetições. Em caso de incumprimento desta obrigação, o interno terá de devolver a totalidade ou parte do montante da bolsa recebida.

G) De acordo com o regime estabelecido no referido artigo 12º A, as vagas preferenciais são destinadas a suprir as necessidades de serviços e estabelecimentos de saúde carenciados de médicos em determinadas especialidades.

H) O médico interno tanto poderá receber formação no serviço ou estabelecimento de saúde onde será colocado em vaga preferencial como em outro serviço ou estabelecimento de saúde, que tenha capacidade formativa.

I) Nesta última situação, a mais comum e a que se verifica nos autos, o médico interno recebe formação e presta trabalho num determinado serviço ou estabelecimento de saúde com capacidade formativa. Este serviço ou estabelecimento de saúde suporta a remuneração devida pelo trabalho prestado.

J) Após a conclusão com sucesso do internato, o médico será colocado no serviço ou estabelecimento com vaga preferencial, onde passará a prestar trabalho durante um período equivalente ao internato.

K) Durante o período de formação, mas não após a conclusão do internato, o serviço ou estabelecimento de saúde com a vaga preferencial suportará o pagamento da bolsa de formação.

L) Como resulta dos factos provados, a Recorrente, na sua qualidade de médica interna, recebeu do ... B... EPE a remuneração por trabalho aí prestado, no montante de €25.150,43, e do CHBA o montante de €9.000 a título de bolsa de formação, sem que tenha prestado qualquer trabalho neste último.

M) Assim, na economia do artigo 12º A, a bolsa de formação pode caracterizar-se do seguinte modo:

i. Corresponde a um incentivo (como o apelida o diploma) para que os médicos internos concorram a vagas em estabelecimentos ou serviços carenciados de determinadas especialidades;

ii. Tal incentivo tem como contraprestação a obrigação de permanência acima referida, e a pressuposta conclusão do internato.

iii. O sinalagma estabelece-se entre a prestação pecuniária (a bolsa de formação) e a permanência num determinado estabelecimento ou serviço de saúde por um certo período de tempo.

iv. A bolsa de formação, como o seu nome indica, é percebida durante o período de formação profissional obrigatória, a que corresponde o internato médico.

v. A bolsa de formação não tem correlação com a prestação de trabalho.

vi. O pagamento da bolsa de formação durante o internato e não após a conclusão deste compreende-se na lógica de incentivo, motivando e vinculando os médicos internos a um benefício presente, sem que se instale a dúvida sobre a manutenção desse mesmo incentivo no futuro.

N) Deve assim ser prevenida qualquer confusão entre a prestação de trabalho e a bolsa de formação.

O) O interno, ao prestar trabalho, é remunerado pela entidade ou entidades para a qual presta trabalho e nos termos do contrato que tenha para o efeito celebrado.

P) Já a bolsa de formação é paga, durante o internato, pela entidade onde o interno irá ocupar a vaga preferencial após a conclusão com aproveitamento do internato.

Q) É entendimento da Recorrente que a bolsa de formação não é sujeita a imposto, atenta a sua natureza compensatória pela obrigação de permanência, não tendo natureza remuneratória.

R) Esta dicotomia tem extrema importância em sede de IRS, porquanto o IRS incide sobre a retribuição do trabalho e não sobre quantias que se destinem a compensar o trabalhador por encargos ou sacríficos específicos, independentes da prestação do trabalho.

S) Na verdade, a possibilidade de ter de ser devolvida posteriormente interrompe a relação sinalagmática entre a prestação do trabalho e a prestação pecuniária, afastando a bolsa de formação de um puro conceito de remuneração.

T) Trata-se pois de uma compensação da restrição do exercício da liberdade de trabalho.

U) Este traço particular do regime desta prestação pecuniária destaca-a e separa-a do conceito de remuneração, o qual, atento o disposto no artigo 11º da Lei Geral Tributária, se deve reconduzir ao sentido de contraprestação pela prestação de trabalho.

V) Não deve ser pois sujeito a imposto a bolsa de formação, nem, em consequência, ser retida qualquer quantia aquando do seu pagamento.

W) Pelo que a liquidação efectuada pela AT é ilegal, nos termos do artigo 99º alínea c) CPPT.

X) O Tribunal recorrido desconsiderou por completo a especificidade do regime da bolsa de formação, considerando-a, numa interpretação que não corresponde sequer à letra e espírito do artigo 2º CIRS, uma remuneração acessória.

Y) A remuneração dita principal e a ora qualificada remuneração acessória são processadas por entidades diversas (uma sediada no ... outra em ...), sendo certo que a Recorrente apenas prestou trabalho ao ... B... EPE.

Z) Verifica-se assim uma total e inequívoca autonomia (i.e., inexiste qualquer conexão) entre a remuneração devida pela prestação do trabalho no ... B... EPE, e a bolsa de formação processada pelo CHBA.

AA) Na verdade, tal bolsa de formação seria sempre devida mesmo que o médico interno não prestasse trabalho, já que a mesma se destina a compensar a obrigatoriedade de permanência em vaga preferencial após a conclusão do internato.

BB) Também não autoriza a conclusão vazada na sentença recorrida uma correcta interpretação do artigo 2º nº 2 e nº 3 al. b) do CIRS, invocados na sentença.

CC) Ao contrário do que parece resultar da fundamentação da decisão recorrida, o artigo 2º do CIRS não representa qualquer desvio ao princípio da legalidade tributária, consignado nos artigos 8º e 11º nº 4 da LGT.

DD) Não se aceita que se afirme que o artigo 2º abarca todos os rendimentos que não estejam excluídos, quando tal afirmação representa uma completa subversão desse princípio, que se encontra constitucionalmente garantido.

EE) 0 artigo 2º do CIRS deve ser interpretado à luz do artigo 11º LGT e dos demais princípios estruturantes do direito fiscal, sendo permitido tributar apenas o que couber numa interpretação condizente com tais regras.

FF) Desde logo importa descartar os nº 1 e 2 do artigo 2º, porquanto tal nºs pressupõem uma remuneração auferida pela prestação de trabalho, o que, conforme alegado supra, não sucede com a bolsa de formação, a qual é liquidada sem que tenha como contrapartida a prestação de trabalho.

GG) Tal resulta claro das alíneas do nº 1, sendo o nº 2 complementar do nº 1, esclarecendo que a tributação opera independentemente da forma e natureza do pagamento. Apenas é essencial o sinalagma que se estabelece entre a remuneração e a prestação de trabalho, o que permite distinguir este rendimento das restantes categorias constantes do CIRS.

HH) No nº 3, o CIRS procede a um alargamento do conceito de remuneração de trabalho dependente constante do nº 1, o que desde logo impede a sua invocação conjunta, como resulta da sentença recorrida.

II) Olvidou o Tribunal recorrido de interpretar o nº 3 al. b), indicando os seus requisitos e subsumindo os factos.

JJ) Prevê o a alínea b) do nº 2 que se consideram rendimentos de trabalho dependente As remunerações acessórias, nelas se compreendendo todos os direitos, benefícios ou regalias não incluídos na remuneração principal que sejam auferidos devido à prestação de trabalho ou em conexão com esta e constituam para o respectivo beneficiário uma vantagem económica, elencando de seguida um rol não taxativo de situações.

Surgem desta norma dois requisitos distintos: 1) relação ou conexão com a remuneração principal e 2) natureza de vantagem económica.

KK) Analisando o primeiro requisito e conforme supra expendido, a bolsa de formação não é auferida devido à prestação trabalho, nem tem conexão com esta.

LL) Confrontando os factos constantes dos autos com o disposto na alínea b) do nº 3 e com o disposto no artigo 12º A do Decreto-Lei nº 203/2004, logo se conclui que a bolsa de formação é auferida com total autonomia da remuneração devida pela prestação do trabalho e não pressupõe sequer a existência de qualquer prestação principal.

MM) Tanto é assim que a remuneração principal e a bolsa de formação são devidas e liquidadas por entidades diversas e sem que a entidade que processa a bolsa de formação exija ou pressuponha a existência de uma remuneração principal.

NN) Nesta sede, o que se encontra disposto no nº 8 do artigo 12-A é irrelevante, já que se limita a afirmar a autonomia entre a bolsa de formação e a remuneração auferida pelo médico interno pela prestação de trabalho.

OO) Desde que cumpra as obrigações consignadas no nº 10 do mesmo artigo, o médico interno tem direito a auferir a bolsa de formação, sem qualquer dependência da prestação de trabalho.

PP) Assim, não se pode considerar preenchido o primeiro requisito da alínea b) do nº 3 do artigo 2º CIRS.

QQ) Não obstante tal apuramento ser desnecessário, em face do não preenchimento do primeiro requisito, também o segundo requisito não se encontra preenchido.

RR) Conforme analisado supra, a bolsa de formação não se destina a conferir ao médico interno uma vantagem económica, que acresça à sua remuneração, mas sim uma compensação pela obrigação de permanência, o que constitui uma limitação à liberdade de trabalho do médico interno.

SS) Nessa perceptiva, a bolsas de formação não se distinguem de outras compensações não sujeitas a imposto.

TT) Em conclusão, a liquidação impugnada é ilegal, por não se encontrar a tributação a imposto prevista na lei, violando a sentença recorrida o disposto nos artigos 1º e 2º CIRS.».

Pediu fosse dado provimento ao presente recurso e fosse revogada a sentença recorrida.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Tribunal Central Administrativo Norte julgou-se incompetente em razão da hierarquia para conhecer do recurso e declarou competente o Supremo Tribunal Administrativo.

Remetidos os autos a este tribunal, foram os mesmos com vista o M.º P.º.

O Ex.mo Senhor Procurador-Geral Adjunto lavrou douto parecer que, dado o seu manifesto interesse para a exposição do caso, aqui se transcreve parcialmente:

«Num primeiro momento formou-se uma corrente jurisprudencial no TCA Sul, de que é exemplo o acórdão de 12/01/2017, proferido no processo nº 09966/16, no qual se decidiu pela natureza não remuneratória de tal prestação pecuniária, com a seguinte fundamentação:

«…por constituir uma prestação paga em virtude da formação profissional dos médicos internos, tudo nos termos do artº.2, nº.8, al.c), do C.I.R.S., supra identificado, na redacção em vigor em 2011 (norma entretanto revogada pela Lei 82-E/2014, de 31/12 - Lei da Reforma do I.R.S.). Em conclusão, a bolsa de formação em causa não constitui uma remuneração acessória derivada de uma prestação de trabalho dependente, mas antes, um incentivo pecuniário atribuído, a título compensatório, no âmbito de um processo de formação profissional, ao médico interno que ocupe uma vaga preferencial, em contrapartida da obrigação por ele assumida de, findo o internato, permanecer ao serviço do estabelecimento onde se verificou a necessidade que deu lugar àquela vaga preferencial, por um período igual ao do respectivo programa de formação médica especializada».

Todavia a jurisprudência do STA adotou outro entendimento sobre a natureza daquela prestação pecuniária, considerando-se que «Apesar da designação que o legislador lhe atribuiu, a bolsa adicional paga aos médicos internos em regime de vaga preferencial, deve ser considerada como uma prestação relacionada exclusivamente com acções de formação profissional dos trabalhadores já que o seu propósito é o de incentivar a fidelização do médico interno no serviço ou hospital onde se verificou uma carência de profissionais, compensando-os pela obrigação de permanência naquele serviço após a conclusão do internato médico. Em consequência, a quantia atribuída mensalmente ao sujeito passivo a título de bolsa de formação, constitui rendimento do trabalho dependente, enquanto remuneração acessória da remuneração principal e portanto fora da incidência objectiva da norma de exclusão da tributação (art. 2º n.ºs 3 al. b) e 8 al. c) CIRS em vigor à data dos factos)» - sumário do acórdão de 25/09/2019, proc. 401/15.0BEAVR.

Este entendimento foi adotado e reiterado em diversos outros acórdãos proferidos pela secção de contencioso tributário2, pelo que se pode considerar entendimento pacífico neste tribunal3.

Ora, tal entendimento afigura-se-nos o mais consentâneo com as razões subjacentes à atribuição da referida prestação pecuniária, ou seja, por no essencial assumir um incentivo pecuniário associado ao exercício de funções num determinado lugar após o internato (estabelecimento ou serviço onde se verificou a necessidade que deu lugar à vaga preferencial) e não propriamente uma compensação por despesas acrescidas com a formação ou essencialmente em razão dessa formação, razões subjacentes à exclusão da tributação prevista na alínea c) do nº8 do artigo 2º do CIRS, na redação à data aplicável, como se infere da acentuação da “exclusividade” da conexão da prestação com ações de formação.

Entendemos, assim, que se impõe a reiteração de tal jurisprudência e a confirmação da sentença recorrida, ainda que com outra fundamentação, julgando-se improcedente o recurso».

Com dispensa dos vistos legais, cumpre decidir.


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2. Ao abrigo do disposto no artigo 663.º, n.º 6 do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 679.º do mesmo Código, dão-se aqui por reproduzidos os factos dados como provados em primeira instância.

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3. O presente recurso vem interposto de sentença que, tendo concluído que os rendimentos auferidos pela Impugnante «a título de bolsa de formação» a coberto do artigo 12.º-A, n.º 8, do Decreto-Lei n.º 203/2004, de 18 de agosto (na redação que lhe foi introduzida pelo Decreto-Lei n.º 45/2009, de 13 de fevereiro) constituem «remuneração acessória» do médico interno, considerou-os sujeitos a IRS a coberto do artigo 2.º, n.ºs 2 e 3, alínea b), do Código respetivo.

A Recorrente não se conforma com o assim decidido por entender, em geral, que a bolsa de formação não se encontra sujeita a imposto [conclusões “Q)” a “W)”] e, em particular, que não constitui nenhuma remuneração acessória [conclusões “X)” a “SS)”].

A questão fundamental a decidir no presente recurso é, por isso, a de saber se as quantias auferidas pelos médicos a coberto do n.º 8 do referido artigo 12.º-A do Decreto-Lei n.º 203/2004, antes da sua revogação pelo Decreto-Lei n.º 86/2015, de 21 de maio, constituem remuneração para os efeitos do artigo 2.º do Código de IRS e estão, como tal sujeitas a imposto.

Ora, o Supremo Tribunal Administrativo já respondeu a esta questão. Relevando o facto de o propósito confesso da bolsa adicional paga aos médicos ser o de os compensar pela obrigação de permanência no serviço após a conclusão do internato médico (acórdão de 31 de janeiro de 2018 tirado n.º recurso n.º 01331/16), concluiu que «a quantia atribuída mensalmente ao sujeito passivo a título de bolsa de formação, assumindo a natureza de incentivo pecuniário associado ao exercício da actividade profissional do médico interno provido em vaga preferencial, constitui rendimento do trabalho dependente, enquanto remuneração acessória da remuneração principal, consequentemente fora da incidência objectiva da norma de exclusão da tributação (art. 2º n.ºs 3 al. b) e 8 al. c) CIRS em vigor à data dos factos)» (acórdão de 8 de maio de 2019, tirado no processo n.º 02553/14.7BELRS).

Trata-se de um entendimento que merece a nossa adesão e que, de qualquer modo, foi reafirmado nos acórdãos de 22 de maio de 2019, de 29 de maio de 2019, de 25 de Setembro de 2019, de 17 de fevereiro de 2021, de 13 de julho de 2021 e de 8 de Setembro de 2021 (tirados respetivamente nos processos n.ºs 01744/13.2BELRS, 017/15.0BEPDL, 0401/15.0BEAVR, 0577/13.0BEAVR, 01044/15.3BESNT e 0439/14.4BECBR), derivando desta jurisprudência uma resposta uniforme à questão suscitada nos autos.

Assim sendo, considerando também o disposto no artigo 8.º, n.º 3 do Código Civil (que determina que nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito), assumimos como nossa a fundamentação do acórdão cujo segmento reproduzimos (acórdão de 8 de maio de 2019, processo n.º 02553/14.7BELRS), sendo dispensada a sua reprodução por estar disponível em redação integral no seguinte endereço electrónico: http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/4e0ebda5744f203f802568720050bb79?CreateDocument.

Pelo que o recurso não merece provimento.


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4. Preparando a decisão, alinham-se as seguintes conclusões, adaptadas a partir do sumário de um dos acórdãos acima citados:

I. Apesar da designação que o legislador lhe atribuiu, o propósito da bolsa adicional paga aos médicos internos em regime de vaga preferencial é o de incentivar a fidelização do médico interno no serviço ou hospital onde se verificou uma carência de profissionais, compensando-os pela obrigação de permanência naquele serviço após a conclusão do internato médico.

II. Em consequência, a quantia atribuída mensalmente ao sujeito passivo a título de bolsa de formação, constitui rendimento do trabalho dependente, enquanto remuneração acessória da remuneração principal e portanto fora da incidência objectiva da norma de exclusão da tributação (art. 2º n.ºs 3 al. b) e 8 al. c) CIRS em vigor à data dos factos).


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5. Decisão

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.

Custas pelo Recorrente.

Lisboa, 29 de março de 2023. – Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos (relator) – Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes.