Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0367/14
Data do Acordão:04/09/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA
INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
SUSPENSÃO DA PRESCRIÇÃO
APLICAÇÃO DA LEI FISCAL NO TEMPO
Sumário:I – As causas de interrupção ou suspensão da prescrição atendíveis para o cômputo em concreto do prazo de prescrição são as previstas na lei vigente à data da respectiva ocorrência, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 12.º do Código Civil.
II – Assim as causas de interrupção da prescrição que ocorreram antes da alteração ao nº 3 do art. 49º da LGT, introduzida pela Lei 53-A/2006, ou seja, antes de 01.01.2007, produzem os efeitos que a lei vigente no momento em que elas ocorreram associava à sua ocorrência: eliminam o período de tempo anterior à sua ocorrência e obstam ao decurso do prazo de prescrição, enquanto o respectivo processo estiver pendente ou não estiver parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte.
III – Ocorrendo sucessivas causas de interrupção da prescrição, antes da entrada em vigor da referida redacção do nº 3 do art. 49º da LGT, devem todas elas ser consideradas autonomamente, para efeitos de contagem do respectivo prazo, desde que susceptíveis de influir no seu decurso.
Nº Convencional:JSTA00068658
Nº do Documento:SA2201404090367
Data de Entrada:03/24/2014
Recorrente:A............, LDA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF AVEIRO
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL - PRESCRIÇÃO
Legislação Nacional:CPTRIB91 ART34 N1 N2 N3.
LGT98 ART48 N1 ART49 N2 N3.
CCIV66 ART297 N1 ART12 N2 ART327.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0629/09 DE 2011/01/19; AC STA PROC01476/13 DE 2013/10/16; AC STA PROC0903/13 DE 2013/06/05; AC STA PROC0208/13 DE 2013/03/06; AC STA PROC0177/11 DE 2011/03/17
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA - SOBRE A PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA NOTAS PRÁTICAS 2ED PAG73.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – A sociedade A…………, Ldª, com os demais sinais dos autos, recorreu para Tribunal Central Administrativo Norte da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que julgou improcedente a reclamação por ela deduzida contra a decisão do órgão de execução fiscal que não reconheceu por prescrita a dívida de IRC do período de 1996.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
«1) É inquestionável que no caso dos autos, o Regime geral da prescrição da obrigação tributária é o que consta do artigo 34°, nºs 1, 2 e 3 do Código de Processo Tributário, uma vez que está em causa uma dívida de IRC referente ao ano de 1996, no valor de 1.746.812$00 (8.713,06 €).
2) Pelo que, assim sendo, a questão que se impõe neste Recurso é a de fundamentar a inaplicabilidade da Lei Geral Tributária ao caso subjacente, uma vez que esta só em 01-01-1999 entrou em vigor e não é aplicável a factos ocorridos antes da sua entrada em vigor, como preceitua o artigo 6° do Decreto-Lei preambular N° 398/98, de 17 de Dezembro, que aprovou a Lei Geral Tributária.
3) Por isso, apenas havia e há que apreciar que o Regime da prescrição da dívida e obrigação tributária era, ao tempo, o regulado pelo artigo 34°, nº 1, 2 e 3 do Código de Processo Tributário.
4) É que, “completada a prescrição tem o beneficiário dela a faculdade de recusar o cumprimento da prestação e de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito” (artigo 304°, nº 1, do Código Civil).
5) O decurso do prazo de prescrição extingue, por conseguinte, o direito do Estado à cobrança de uma dívida liquidada, no caso dos autos, uma dívida de IRC do Ano de 1996.
6) O efeito interruptivo, decretado no nº 3 do artigo 34° do Código de Processo Tributário opera, com independência e sem colisão, em relação ao disposto no nº 2 do mesmo artigo 34°, quanto ao modo de contagem do prazo de prescrição.
7) Esta interrupção da contagem do prazo de prescrição só cessa pela cessação do efeito interruptivo previsto no nº 3 do artigo 34° do Código de Processo Tributário (um ano após a paragem do processo).
8) E, como o processo de Impugnação Judicial foi o primeiro facto interruptivo, é este que releva para efeitos do artigo 34° do Código de Processo Tributário, irrelevando qualquer outro que ocorresse posteriormente, como seja a instauração do processo de execução fiscal em causa em 03-01-2001.
9) Acresce que, no âmbito da aplicação do Código de Processo Tributário, a prestação da garantia pelo executado ou a realização da penhora na execução fiscal, não constitui causa interruptiva ou suspensiva da contagem do prazo de prescrição, por não caber na previsão normativa do artigo 34° do C.P.T. (Nesse sentido, Acórdão do T.C.A. Sul de 30/05/2006 — Rec. 1111/06 e Acórdão do S.T.A., de 31/05/06- Rec. 156/06).
10) Assim, no caso dos autos, para efeitos da dívida de IRC, ano de 1996, o inicio do prazo de prescrição conta-se a partir de 01/01/1997, que com a dedução da Impugnação em 30/10/2000 ficou interrompido, mas com a paragem do processo por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, o ano de paragem teve o seu início em 19 de Março de 2002, pelo que, o reinício da contagem do prazo de prescrição teve o seu reinício em 19/03/2003.
11) Nesta conformidade, com a contagem do prazo da prescrição a partir de 19/03/2003 e somando-lhe o período de tempo decorrido até à data da autuação, ou seja, o período decorrido de 01/01/1997 até 30/10/2000, verifica-se que desde há muito decorreu o prazo de prescrição de 10 anos (cerca de 15 anos).
12) Verifica-se, deste modo, a prescrição da dívida de IRC 1996, na importância total de 1.746.812$00 (8.713,06 €).
13) E tendo, nos termos expostos, sido ultrapassado o prazo de prescrição de 10 anos, estamos face a uma situação em que a liquidação de IRC, ano de 1996, acaba por ser atingida por via da obrigação tributária estar prescrita na sua totalidade face ao disposto no artigo 34°, nºs 1, 2 e 3 do Código de Processo Tributário.
14) Na Douta Sentença ao entender em sentido contrário, apreciou-se e decidiu-se mal, em clara violação do artigo 34°, nº 1, 2 e 3 do Código de Processo Tributário, ao tempo em vigor e aplicável ao caso sub judice.
15) Mais, tendo ocorrido a prescrição, é inadmissível a manutenção da penhora ou garantia efectuada nos bens da recorrente, pois causam prejuízo irreparável no exercício da actividade da sociedade aqui recorrente (artigo 278°, nº 3, alínea a) do C.P.P.T.»
2 – A Fazenda Pública não contra alegou.

3 – O recurso foi interposto no TCA Norte, o qual por acórdão exarado a fls. 323 e segs. dos autos, veio declarar-se incompetente em razão da hierarquia, para conhecer do mesmo, considerando que tem por fundamento, exclusivamente matéria de direito, e declarou competente para esse efeito, a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.

4 – Notificadas as partes do douto acórdão, veio a recorrente concordar com a remessa do processo para a secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.

5 – O Exmº Procurador Geral Adjunto emitiu douto parecer, com a fundamentação que, na parte mais relevante, se transcreve:
«A nosso ver o recurso não merece provimento. (…..) Em termos de factualidade apurada com eventual relevo para a apreciação da prescrição temos:
1. O PEF foi instaurado em 2001.01.03.
2. A recorrente deduziu impugnação judicial contra a liquidação exequenda em 2000.10.30, tendo sido proferida sentença em 2012.12.28, que não foi objecto de recurso judicial.
3. A recorrente foi citada para o PEF em 2001.01.12.
4. Em 2001.11.06 foram penhorados bens como garantia de pagamento da obrigação exequenda.
5. Por via dessa penhora em 2011.11.14 foi suspenso o PEF.
Há que aplicar o prazo de prescrição de 8 anos estatuído no artigo 48.º da LGT, por faltar igual período de tempo para a ocorrência da prescrição à data da entrada em vigor da LGT (1999.01.01).
Na redacção anterior à Lei 53-A/2006, o artigo 49.º da LGT atribuía efeito interruptivo aos vários eventos atrás enunciados, nos pontos 2 e 3 (idem, páginas 64/66).
Não resulta do citado normativo que, em teoria, não mereçam relevância todos os factos interruptivos da prescrição, ainda que alguns deles venham a ocorrer durante a produção de efeitos de outros.
Como refere o Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa na obra citada, em nota de roda—pé, a fls. 71, numa situação similar à, ora, análise, ou seja, ocorrência de uma nova causa de interrupção antes de 1 de Janeiro de 2007, enquanto uma anterior ainda está a produzir os seus efeitos, por o processo não ter estado parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte e em que o primeiro processo vem a parar por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, quando o segundo já estava pendente, “… a instauração do segundo processo tem potencialidade para só por si eliminar o período que decorreu anteriormente e obstar ao decurso da prescrição até ao trânsito em julgado da decisão que lhe puser termo”.
No mesmo sentido vai a mais recente jurisprudência do STA. (Acórdãos de 24 de Outubro de 2010-P0720/10 e de 2013.06.05-P 0903/13, disponíveis no sitio da Internet www.dgsi.pt).
O prazo de prescrição iniciou-se em 1999.01.01 (data da entrada em vigor da LGT) e interrompeu-se com a interposição da impugnação judicial em 2000.10.30.
Ainda que, por hipótese, a impugnação judicial tivesse parado por mais de um não por facto não imputável à recorrente, com a citação para o PEF, em 2001.01.12, o período anterior à instauração da impugnação judicial continua eliminado, começando a correr um novo de prescrição após trânsito da decisão que vier a pôr termo ao PEF (Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª edição 2011, página 259, III volume, Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa).
De facto, o PEF não esteve parado por mais de um ano por facto não imputável à recorrente, uma vez que foi suspenso em 2001.01.14, por prestação de garantia por bens dados à penhora em 2001.11.06
Temos, assim, que ainda não decorreu qualquer período de tempo do prazo prescricional de 10 anos.
Por outro lado, com a efectivação da penhora/prestação de garantia em 2001.11.06 sempre se suspenderia o prazo de prescrição do tributo exequendo, que só recomeçaria a contar a partir do trânsito em julgado da decisão que veio a pôr termo à impugnação judicial, nos termos do disposto no artigo 49.º/3 da LGT.
“Existindo uma causa de suspensão autónoma em relação ao facto com efeito interruptivo, ela produzirá os seus próprios efeitos independentemente dos produzidos pelo facto interruptivo, pelo que poderá obstar ao decurso do prazo de prescrição em situações em que não é produzido esse efeito pelo facto interruptivo. Se tanto esse facto como o facto interruptivo eliminarem a relevância do mesmo período de tempo para prescrição, será irrelevante a existência de causa de suspensão, pois esse período já não será contado para a prescrição por força do acto interruptivo. Mas, se houver algum período do prazo que não é eliminado pelo facto interruptivo e é pelo facto suspensivo, cumular-se-ão os efeitos dos dois factos (Sobre a prescrição … citado).
Como se viu, no caso em análise, há que relevar o prazo de prescrição de 8 anos estatuído no artigo 48.º da LGT, sendo certo que mesmo que fosse caso de relevar o prazo de 10 anos estatuído no artigo 34.º do CPT, atento o disposto no artigo 12.°/2 do CC, aos factos interruptivos/suspensivos da prescrição haveria, sempre, que aplicar a LGT, ao contrário da tese sustentada pela recorrente (neste sentido a mais recente jurisprudência do STA, entre outros, acórdão de 2013.08.28 -. 0136/13, disponível no sítio da Internet www.dgsi.pt ).
É assim manifesto que não se mostra prescrita a dívida exequenda.
Termos em que deve negar-se provimento ao recurso e manter-se a sentença recorrida na ordem jurídica.»

6 – Com dispensa de vistos, dada a natureza urgente do processo, cumpre apreciar e decidir.

7- Em sede factual apurou-se a seguinte matéria de facto:
A) Contra a sociedade A…………, Lda, foi, em 03-01-2001, instaurada a execução fiscal nº 0078200101001183, para cobrança de dívidas de IRC, dos períodos de 1995 a 1998, no valor total de € 24.236,19, cfr. teor do doc. de fls. 1 dos autos.
B) A Executada foi citada naquela execução em 12-01-2001, cfr. teor do doc. de fls. 5 dos autos.
C) Em 25-01-2001, a mesma executada requereu a suspensão da execução, por ter deduzido Impugnação Judicial das liquidações que deram origem à dívida exequenda, em 30-10-2000, cfr. teor de fls. 6 e ss. dos autos e Processo de Impugnação Judicial apenso.
D) Após indeferimento de pedido de isenção de prestação de garantia para suspensão do processo executivo, a Executada, em 20-08-2001, ofereceu à penhora determinados bens móveis, para garantia da quantia exequenda, cfr. teor do doc. de fls. 133 dos autos.
E) Em 06-11-2001 foram tais bens penhorados, cfr. teor do doc. de fls. 136 e 137 dos autos.
F) Em 14-11-2001 foi proferido despacho de suspensão do processo executivo supra referido, nos termos do art.º 169° do CPPT, cfr. teor do doc. de fls. 138 dos autos.
G) Na Impugnação Judicial supra referida foi proferida sentença em 28-12-2012, não tendo sido interposto qualquer recurso da mesma, cfr. teor de fls. 190 e segts. do Processo de Impugnação Judicial apenso.
H) Em 05-04-2013 foi a Reclamante notificada de que tendo sido considerada procedente Impugnação Judicial relativa a parte da dívida exequenda, quanto ao IRC de 1996, deveria a mesma pagar parte da quantia exequenda no prazo de 30 dias, cfr. teor do doc. de fls. 180 dos autos.
I) Em 11-04-2013 a Reclamante apresentou no SF de Espinho requerimento no qual solicitava o reconhecimento da prescrição da dívida exequenda referente ao IRC de 1996, em relação à qual havia sido proferida decisão de improcedência da impugnação judicial respectiva, cfr. teor do doc. de fls. 181 e ss. dos autos.
J) Por despacho datado de 16-04-2013, e na sequência de informação prestada para o efeito, foi indeferido o requerimento da Reclamante, cfr. teor do doc. de fls. 185 a 188 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido.
K) A Reclamante foi notificada de tal despacho em 17-04-2013, tendo apresentado a presente Reclamação em 24-04-2013, cfr. teor dos docs. de fls. 190 e 192 dos autos.

8. A questão objecto do presente recurso consiste em saber se ocorreu ou não a prescrição da divida de IRC referente ao ano de 1996.
Como se vê fls. 265 e segs. a sentença recorrida entendeu que o prazo de prescrição da dívida proveniente de IRC do ano de 1996 se iniciou em 01/01/1997, concluindo que em 01.01.1999 se haviam completado 2 anos do prazo prescricional e que o prazo de 8 anos previsto na Lei Geral Tributária não era mais curto do que o prazo previsto no CPT, que já vinha correndo desde 01.01.1997.
Com base neste discurso argumentativo concluiu que o prazo de prescrição aplicável seria o prazo de 10 anos, previsto no CPT.
Mas também considerou que a em relação à contagem da prescrição não se verificaram quaisquer factos susceptíveis de interromper ou suspender o decurso do prazo prescricional durante a vigência do CPT sendo de considerar aplicáveis os factos interruptivos e suspensivos aplicáveis de acordo com a lei vigente à data em que os mesmos se verifiquem ou seja a Lei Geral Tributária.
Assim ponderou o Tribunal recorrido que a Reclamante foi citada em 12-01-2001, tendo o processo executivo sido suspenso em 14-11-2001, por motivo de apresentação, por parte da mesma Reclamante, de Impugnação Judicial da liquidação de IRC de 1996, o que significa que o prazo de prescrição se interrompeu em 12-01-2001 e se suspendeu em 14-11-2001, até ao trânsito em julgado da sentença proferida no processo de Impugnação Judicial, em 28-12-2012, já que, encontrando-se o processo garantido, a suspensão ordenada tinha a virtualidade de suspender o prazo prescricional em curso.
Para a final concluir que, nesses termos, o prazo prescricional interrompido, cuja contagem se iniciou em 13-01-2001, manifestamente não se encontrava ainda esgotado, dado o seu decurso quase integral se encontrar a decorrer desde o início do ano de 2013.

É deste entendimento que discorda a recorrente, sustentando que tais dívidas não se encontram prescritas, porquanto, em sua opinião, o regime da prescrição da dívida e obrigação tributária em causa é o regulado pelo artigo 34°, nº 1, 2 e 3 do Código de Processo Tributário, não sendo aplicável ao caso subjudice a Lei Geral Tributária, uma vez que esta só em 01-01-1999 entrou em vigor e não é aplicável a factos ocorridos antes da sua entrada em vigor, por força do disposto no artigo 6° do Decreto-Lei preambular N° 398/98, de 17 de Dezembro.
Sustenta assim que o processo de Impugnação Judicial foi o primeiro facto interruptivo, sendo este que releva para efeitos do artigo 34° do Código de Processo Tributário, irrelevando qualquer outro que ocorresse posteriormente, no âmbito da Lei Geral Tributária, como seja a instauração do processo de execução fiscal em causa em 03-01-2001.
E conclui que sendo a dívida de IRC, do ano de 1996, o início do prazo de prescrição se conta a partir de 01/01/1997 prazo esse que, com a dedução da Impugnação em 30/10/2000, ficou interrompido.
Porém com a paragem do processo por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, que ocorreu em 19 de Março de 2002 (artº 34º, nº 3 do CPT), o prazo de prescrição voltou a contar-se a partir de 19/03/2003 pelo que, somando-lhe o período de tempo decorrido até à data da autuação, ou seja, o período decorrido de 01/01/1997 até 30/10/2000, teria já ocorrido, há muito tempo, o prazo de prescrição de 10 anos.

8.1 Cumpre desde já referir que o recurso não merece provimento e que, pese embora não se subscreva toda a fundamentação da sentença recorrida, também se chegará à conclusão de que não ocorreu a prescrição da dívida exequenda.

Em primeiro lugar importa sublinhar que não assiste razão à recorrente quando afirma que «É inquestionável que no caso dos autos, o Regime geral da prescrição da obrigação tributária é o que consta do artigo 34°, nºs 1, 2 e 3 do Código de Processo Tributário», como, de igual modo não se subscreve a sentença na parte em que considera ser aplicável o prazo de prescrição de 10 anos previsto no artº 34º daquele diploma legal.
Vejamos.
Quanto à aplicação da lei no tempo relativamente às normas que regulam a prescrição há que ter em conta o disposto no art. 297º do Código Civil.
De acordo com este normativo a lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar.
O que significa que no caso subjudice, será aplicável, o prazo de prescrição de 8 anos previsto no art. 48° nº 1 da Lei Geral Tributária, por confronto com o prazo de prescrição de 10 anos (art. 34° nº 1 CPT).
Com efeito, estando em causa dívida tributária respeitante ao IRC do ano 1996, cujo prazo de prescrição começou a correr em 1 de Janeiro de 1997 (início do ano civil seguinte aquele em que ocorreu o facto tributário), constata-se que em 1 Janeiro 1999 (data do início da vigência da LGT) faltava o mesmo tempo para se completar o prazo de prescrição à face da lei nova e da lei antiga.
Ou seja, por outras palavras, não faltava menos tempo à face do CPT (lei antiga) para a prescrição se completar, por isso será de aplicar o prazo da lei nova (Lei Geral Tributária), por força da regra do artº 297º, nº 1 do Código Civil.

8.2 Dando, pois, por assente que no caso subjudice será aplicável o prazo de prescrição de oito anos previsto na Lei Geral Tributária importa apurar se ocorreram causas de interrupção ou suspensão relevantes.
Como vem decidindo a jurisprudência dominante deste Supremo Tribunal Administrativo as causas de interrupção ou suspensão da prescrição atendíveis para o cômputo em concreto do prazo de prescrição são as previstas na lei vigente à data da respectiva ocorrência, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 12.º do Código Civil, e não, as previstas na lei cujo prazo for aplicável, independentemente do momento em que tais factos se tenham efectivamente verificado.
Sobre a questão esclarece Jorge Lopes de Sousa, na sua obra Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2ª edição, pag. 118 «a solução do problema da aplicação da lei no tempo depende do momento em que ocorrer o facto interruptivo e não eventualidade de, face às regras do artº 297º do Código Civil, ser aplicável o regime do CPT ou da Lei Geral Tributária no que concerne à duração do prazo e prescrição».
Em síntese, e como impressivamente se diz no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 19.01.2011, recurso 629/09, in www.dgsi.pt, pode-se concluir que a aplicação de diferentes regimes no tocante aos prazos prescricionais não determina a aplicação de um ou outro regime em bloco, porquanto o art.º 297.º só manda aplicar o prazo prescricional mais curto, e não as disposições legais que regem os termos em que esse prazo se conta e tudo o mais que releva para o seu curso.

8.3 Em termos de incidência processual com relevo para o cômputo da prescrição resulta dos autos que o processo de execução fiscal foi instaurado em 2001.01.03 e que a recorrente foi citada naquela execução em 2001.01.12.
A recorrente deduziu impugnação judicial contra a liquidação exequenda em 2000.10.30, tendo sido proferida sentença em 2012.12.28, que não foi objecto de recurso judicial.
Em 2001.11.06 foram penhorados bens como garantia de pagamento da obrigação exequenda e, por via dessa penhora, em 2001.11.14 foi suspenso o processo de execução fiscal.

É certo que, de harmonia com o disposto no artigo 49.° nº 3 da LGT, na redacção introduzida pela Lei 53-A/2006, de 29 de Dezembro (LOE 2007) a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar.
Porém a Lei de Orçamento de Estado de 2007 entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2007, e, sendo uma norma sobre os efeitos dos factos, ela só se aplica após a sua entrada em vigor, por força do estatuído no artigo 12.º, nº 2 do Código Civil (cf., neste sentido Jorge Lopes de Sousa, ob. citada, 2ª edição, pag. 73).
Ora, na redacção anterior à Lei 53-A/2006 o artº 49º, nº 1 daquele diploma legal atribuía efeitos interruptivos à citação, à reclamação, ao recurso hierárquico, à impugnação e ao pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo.
Sendo que, como bem nota o ilustre Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo, não resulta do citado normativo que, em teoria, não mereçam relevância todos os factos interruptivos da prescrição, ainda que alguns deles venham a ocorrer durante a produção de efeitos de outros.
Com efeito as causas de interrupção da prescrição que ocorreram antes da alteração ao nº 3 do art. 49º da LGT, introduzida pela Lei 53-A/2006, ou seja, antes de 01.01.2007, produzem os efeitos que a lei vigente no momento em que elas ocorreram associava à sua ocorrência: eliminam o período de tempo anterior à sua ocorrência e obstam ao decurso do prazo de prescrição, enquanto o respectivo processo estiver pendente ou não estiver parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte – cf., entre outros, neste sentido, os acs. deste Supremo Tribunal Administrativo de 16.10.2013, 05.06.2013, 06.03.2013, 19/12/2012, 20/10/2010 e 2/3/2011, nos recursos 1476/13, 903/13, 208/13, 1372/12, 720/10 e 1038/10, respectivamente, bem como Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, 2ª ed., 2010, p. 73.
Temos assim que, em relação às dívidas tributárias em causa no presente recurso (IRC de 1996), cujo prazo de prescrição se começa a contar a partir de 1 de Janeiro de 1999, ocorreu em 30/10/2000 uma primeira interrupção da prescrição por força da a impugnação judicial da liquidação.
Porém logo em 12.01.2001, ou seja 2 meses e 13 dias depois, data em que ainda estava produzir efeito a interrupção do prazo de prescrição por força da dedução de impugnação, ocorreu a citação para o processo de execução fiscal.
Assim, e ao contrário do que sustenta a recorrente na conclusão 8ª das suas alegações de recurso, haverá que dar o necessário relevo a esta causa interruptiva já que, como vem sublinhando a jurisprudência deste Tribunal, ocorrendo sucessivas causas de interrupção da prescrição, antes da entrada em vigor da actual redacção do nº 3 do art. 49º da LGT, devem todos elas ser consideradas autonomamente, para efeitos de contagem do respectivo prazo, desde que susceptíveis de influir no seu decurso (cfr. Acórdãos 06.03.2013, recurso 208/13 e de 17/3/2011, rec. nº 0177/11, e jurisprudência aí citada).
Esta segunda causa de interrupção, decorrente da citação no processo de execução fiscal, pese embora o período anterior à primeira estivesse eliminado e não tivesse decorrido qualquer período para a prescrição, mantém a sua própria potencialidade para produzir os mesmos efeitos em relação ao período anterior (eliminação) e durante o próprio processo de execução fiscal (obstando ao decurso do prazo). (Cf., neste sentido, Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, 2ª edição, pags. 78-79.)
Por isso com a citação para o processo de execução fiscal, em 2001.01.12, o período anterior à instauração da impugnação judicial continua eliminado, começando a correr um novo prazo de prescrição após trânsito da decisão que vier a pôr termo ao processo de execução fiscal (artº 327º, nº 1 do Código Civil, Jorge Lopes de Sousa, ob. citada, pag. 57 e Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª edição, Áreas Editora, 2011, página 259, III volume, do mesmo autor).
Por outro lado, como bem nota o Ministério Público, o processo de execução fiscal não esteve parado por mais de um ano por facto não imputável à recorrente, uma vez que foi suspenso em 2001.01.14, por prestação de garantia por bens dados à penhora em 2001.11.06.
Ainda assim, no caso subjudice, vista a eficácia interruptiva autónoma dessa citação na execução fiscal, uma vez que não ocorreu paragem do processo executivo, por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte até 1/1/2007 (revogação do n.º 2 do artigo 49.º da LGT), a suspensão desse processo de execução determinante da suspensão do prazo de prescrição, nos termos do n.º 3 do artigo 49.º do mesmo diploma, acaba por não ter influência sobre o decurso do prazo.

Daí que se entenda em face do exposto que, por força da eficácia interruptiva autónoma decorrente da citação efectuada na execução fiscal, com o correspondente efeito de eliminação de todo o tempo decorrido anteriormente, determinando o início de novo prazo de prescrição após trânsito da decisão que vier a pôr termo ao processo de execução fiscal, é manifesto que não ocorreu ainda a prescrição da dívida exequenda, objecto do presente recurso, pelo que deve confirmar-se a sentença recorrida, que assim decidiu.


9. Decisão:
Nestes termos acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso, confirmando, com esta fundamentação, o julgado recorrido.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 9 de Abril de 2014. - Pedro Delgado (relator) - Dulce Neto - Isabel Marques da Silva.