Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0693/14
Data do Acordão:01/11/2017
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:RECURSO CONTENCIOSO
EXTEMPORANEIDADE
RECTIFICAÇÃO DO ACTO ADMINISTRATIVO
FUNDAMENTAÇÃO DO ACTO ADMINISTRATIVO
ACTO DE HOMOLOGAÇÃO
CONCURSO
FARMÁCIA
Sumário:I - A rectificação a que se refere o art. 148º, nº 1 do CPA (na sua versão original) apenas se refere aos erros manifestos e pode ter lugar a todo o tempo, de acordo com o referido preceito, incluindo em prazo posterior ao prazo legal para a interposição de recurso.
II – Se a rectificação podia afectar a situação jurídica da recorrente contenciosa, sendo que a alterou, sem que se possa vislumbrar imediata e ostensivamente quais os motivos que determinaram essa alteração, só na data da publicação da rectificação a interessada passou a deter todos os elementos que lhe permitiam aferir da sua situação definitiva no procedimento (nomeadamente a sua classificação no concurso), iniciando-se, como tal, o prazo para a interposição do recurso nesta data e não na da primeira publicação, sendo, com tal, o recurso tempestivo (cfr. arts. 28º, nº 1, al. a) e 29º, nº 1 da LPTA).
III – A dispensa de fundamentação dos actos de homologação de deliberações tomadas por júris, prevista no art. 124º, nº 2 do CPA, justifica-se pela obrigatoriedade de estas deliberações serem fundamentadas, mas, apropriando-se o acto de homologação da deliberação do júri, faz seus os vícios que afectem esta deliberação, nomeadamente o vício de forma por falta de fundamentação.
IV – Enferma de vício de forma por falta de fundamentação, o acto de homologação de deliberação do júri de concurso para instalação de nova farmácia, no qual apenas se refere que o júri analisou a documentação entregue e atribuiu as pontuações de acordo com os critérios descritos na portaria nº 936-A/99, de 22/10.
Nº Convencional:JSTA00069969
Nº do Documento:SA1201701110693
Data de Entrada:06/12/2014
Recorrente:B...
Recorrido 1:A... E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAC LISBOA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR ADM GER.
DIR ADM CONT.
Legislação Nacional:CPA ART148 ART124 ART125.
LPTA ART28 ART29.
PORT 936-A/99 ART10.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0869/09 DE 2009/12/09.; AC STA PROC02/08 DE 2008/07/14.
Referência a Doutrina:MÁRIO ESTEVES OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES E J. PACHECO AMORIM - CÓDIGO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO ANOTADO PAG105-106.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo

1. Relatório
A…………. intentou no TAC de Lisboa, recurso contencioso de anulação dos actos do Conselho de Administração do INFARMED, entidade recorrida, sendo contra-interessados B……………. e outros, com vista à anulação da decisão daquela entidade, que homologou as listas definitivas dos candidatos aos concursos nº 7968-DE/2001 e nº 7968-DC/2001, para instalação de farmácia, no lugar de ……, freguesia de ………. e de ……….. (zona Sul), freguesia de …………, respectivamente.
Por sentença datada de 31.01.2014, o referenciado Tribunal decidiu:
a) Julgar improcedente a excepção de extemporaneidade do recurso;
b) Conceder provimento ao recurso e, em consequência, anular o acto recorrido, na parte em que homologou os concursos para instalação de farmácias, abertos pelos avisos n.ºs 7968-DE/2001 e 7968-DC/2001, por falta de fundamentação.

Notificados da sentença que julgou improcedente a excepção de extemporaneidade e concedeu provimento ao recurso contencioso de anulação da deliberação de 27.09.2002 que homologou as listas de classificações finais insertas nas actas n.º 5, elaboradas pelos júris dos concursos públicos abertos pelos avisos n. 7968-DE/2001 e 7968-DC/2001, respeitantes à instalação de duas farmácias no concelho de Vila Franca de Xira, respectivamente no lugar de ………. e outra no lugar de ………. de ………….. autoria do Conselho de Administração do INFARMED, e com ela não concordando, vêm agora os recorrentes apresentar recurso para esta Secção do Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal Administrativo.

As alegações de B………….., recorrida particular, têm conclusões do seguinte teor, a fls. 644 dos autos:
A. O presente recurso vem interposto da douta sentença datada de 31.01.2014, remetida por meio de ofício datado de 03.02.2014, que julgou improcedente a questão prévia/excepção de extemporaneidade do recurso contencioso de anulação e deu provimento ao recurso contencioso de anulação, anulando o acto da autoria do Presidente do Conselho de Administração do INFARMED, I.P (deliberação de 27.09.2002) que homologou as listas de classificações finais insertas nas actas n.º 5, elaboradas pelos júris dos concursos públicos abertos pelos avisos n. 7968-DE/2001 e 7968-DC/2001, respeitantes à instalação de duas farmácias no concelho de Vila Franca de Xira, respectivamente no lugar de ……… e outra no lugar de ………. de …………., com fundamento na alegada procedência do vício de forma por falta de fundamentação.
B. De harmonia com o disposto no artigo 28º, n.º1 alínea a) da LPTA, o prazo de recurso contencioso de actos anuláveis, é de dois meses, o qual se conta, nos termos do artigo 29º da mesma Lei, no que diz respeito a actos expressos, a partir da respectiva publicação.
C. Nos termos do disposto no artigo 148.º n.º 2, do CPA, a “Rectificação n.º 2300/2002”, embora tenha sido publicada em 19.11.2002, tem efeitos retroactivos a 17.10.2002, data da publicação em Diário da República da lista de classificação final elaborada pelo júri do concurso e homologada por deliberação do Conselho de Administração do INFARMED de 27 de Setembro de 2002, através do Aviso n.º 10736/2002 (2. série), pelo que o prazo para instauração do competente recurso iniciou-se no dia 17.10.2002, com a publicação da lista de classificação final elaborada pelo júri do concurso e homologada por deliberação do Conselho de Administração do INFARMED de 27 de Setembro de 2002, através do Aviso n. 10736/2002 (2) Série), e terminou, decorridos dois meses, no dia 17.12.2002.
D. A petição de recurso contencioso de anulação, só deu entrada em Tribunal, no dia 15.01.2003 (cfr. ponto 1. dos factos considerados assentes conforme constantes da sentença proferida pelo Tribunal a quo) ou seja, deu entrada manifestamente fora de prazo.
E. Por tudo o exposto, torna-se evidente que a solução encontrada pelo Tribunal a quo, que erroneamente, concluiu pela tempestividade do recurso contencioso de anulação, violou o disposto no artigo 28.º, n.º 1, alínea a) e 29.º, n.º 1, da LPTA e artigo 148.º n.º 2 do CPA padecendo, assim, de erro de julgamento da matéria de direito.
F. Olvidou a sentença proferida pelo Tribunal a quo a circunstância fulcral de que o acto que homologou a lista de classificação final dos candidatos admitidos a concurso público para instalação de nova farmácia no lugar de ………., freguesia de …………, concelho de Vila Franca de Xira, distrito de Lisboa — a deliberação do Conselho de Administração do INFARMED, de 27 de Setembro de 2002 — não carece de fundamentação, por estar claramente dentro do âmbito de aplicação do n.º 2, do artigo 124.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA), nos termos do qual “não carecem de ser fundamentados os actos de homologação de deliberações tomadas por júris».
G. Ao homologar a lista de classificação final dos candidatos admitidos ao concurso público para a instalação de uma farmácia no lugar de ………, freguesia de ………, concelho de Vila Franca de Xira, distrito de Lisboa, o Conselho de Administração do INFARMED está perfeitamente exonerado de especificar as razões pelas quais decidiu nesse sentido, uma vez que estas se presumem contidas na correspondente deliberação daquele júri do concurso.
H. Atenta a objectividade dos critérios previstos no artigo 10.º n.º 1, alíneas a) e b), da Portaria n. 936-A/99, de 22 de Outubro, estamos perante uma situação em que é perfeitamente possível reconstituir o itinerário cognoscitivo e valorativo que conduziu à decisão. E, tal ocorreu, inequivocamente no caso sub judice, conforme o demonstra o petitório e vícios suscitados pela Recorrente e ora Recorrida, no Recurso Contencioso de Anulação apresentado nos autos, no qual a ora Recorrida soube discriminar quantos pontos foram atribuídos a cada concorrente, de acordo com os critérios previstos no artigo 10.º n.º 1, alíneas a) e b), da Portaria n.º 936-A/99, de 22 de Outubro.
I. Por todo o exposto, a sentença recorrida, na parte em que conclui quanto à procedência do vício de forma por falta de fundamentação, violou o disposto no artigo 124.º do CPA, padecendo, assim, de erro de julgamento da matéria de direito.

O INFARMED - Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, IP, notificado da admissão do recurso, a fls. 601 dos autos, apresentou alegações com as seguintes conclusões a fls. 668 dos autos:
1. O acto recorrido, a deliberação que homologou a lista de classificação final, não carece de fundamentação.
2. De facto, o ato de homologação está no âmbito de aplicação do n.° 2 do artigo 124.º CPA, que dispõe que não carecem de ser fundamentados os actos de homologação de deliberações tomadas por júris.
3. É inequívoco que a dispensa de fundamentação é justificada, neste caso, pela circunstância de que o acto de homologação, enquanto aceitação pura e simples do acto homologado, in casu, a deliberação do júri do concurso, absorve os fundamentos e conclusões desta.
4. Ao homologar as listas de classificação final propostas pelo júri do concurso, o Conselho de Administração do INFARMED está dispensado de especificar as razões pelas quais decidiu nesse sentido, porque estas se presumem contidas na correspondente deliberação daquele júri.
5. Da Acta n.° 5, consta remissão inequívoca para os critérios da Portaria n.° 936-A199, 2210, sendo que a decisão alcançada, em virtude da sua ponderação concreta, se traduz numa operação de subsunção aritmética.
6. Logo, esta deliberação homologatória não enferma de vício de forma, por falta de fundamentação, não violando quer a alínea d) do n.°1 do artigo 124.º CPA, quer os nºs 3 e 4 do artigo 268.º da Constituição da República Portuguesa, CRP.

A Recorrente contenciosa, aqui recorrida, A………….., notificada das alegações de recurso, vem apresentar as suas contra-alegações, a fls. 690, com o seguinte conteúdo:
A sentença recorrida não padece de qualquer erro de julgamento, tendo julgado correctamente a questão da extemporaneidade do contencioso de anulação do acto administrativo, invocada bem assim do vício de forma de falta de fundamentação acto recorrido.
Julgamento, tendo julgado interposição do recurso pela Recorrida Particular, e conducente à anulação do Impunha-se a total improcedência da questão prévia da extemporaneidade pelo tribunal a quo, pois a publicação em 19 de Novembro de 2002 da Declaração de Rectificação, não poderia ter um efeito retroactivo lesivo dos direitos e interesses dos candidatos, pelo que se produziram efeitos derivados da publicação da rectificação, designadamente, os atinentes à contagem do prazo de recurso a partir daquela data:
É que, a declaração de rectificação não se compadeceu com uma simples rectificação de nomes ou correcção de imprecisões do aviso publicado em 17 de Outubro de 2002.
O acto em apreço corrigiu o posicionamento da Recorrente na Lista de classificação final.
Por conseguinte, a publicação do aviso rectificado afectou os direitos da Recorrente, uma vez que o 1º aviso não estava conforme à acta do júri do concurso.
Tendo ficado colocada em 2º lugar, a publicação da lista em que figura em lugar diferente, teria sempre de ser rectificada; e só a partir da rectificação final, é que se iniciou o decurso do prazo de recurso.
Pois este conta-se a partir da data de publicação em Diário da República, não sendo aceitáveis erros de transcrição como o ocorrido.
Pelo que a entrada da petição de recurso em juízo respeitou aquele prazo.
Quanto à decisão sobre o vício de forma de que padece o acto recorrido por falta de fundamentação:
Ao contrário do que alega a Recorrente, as deliberações dos júris dos concursos têm de ser fundamentadas, por forma a permitirem ao candidato compreender o iter cogniscitivo percorrido pelo júri para decidir como decidiu.
Ora, nada disso é possível, porque limita-se a referir genericamente a a actividade do júri e a afirmar que foram cumpridos os critérios, sem se deter na forma como os mesmos foram aplicados aos candidatos.
Donde só poderia concluir-se pela total falta de fundamentação.
Pelo exposto, ao decidir como decidiu, o Tribunal andou bem, não incorrendo em qualquer erro de julgamento.

A Excelentíssima Procuradora-Geral Adjunta, junto deste Tribunal Supremo, emitiu parecer, de fls. 706 a 714 dos autos, no sentido de se negar provimento ao recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

2. Os Factos:
A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:
1) O presente recurso contencioso deu entrada em 15.01.2003. (Factos respeitantes ao concurso n.° 7968-DE/2001)
2) Pelo Aviso n.° 7968-DE/2001 (2 série), publicado no DR, II série, de 15.06.2001, o INFARMED tomou público a abertura de concurso público para instalar uma farmácia no lugar de ………., freguesia de ………., concelho de Vila Franca de Xira (doc. fls. 13 es. do vol. 1 do processo instrutor).
3) Em acta n.° 3, de 06.12.2001, o júri do concurso “estudou e analisou as candidaturas individualmente”, tendo verificado a existência, ou não de documentação válida e avaliou as candidaturas à luz das incompatibilidades, tendo na sequência elaborado lista dos candidatos admitidos e excluídos (doc. fls. 70 do vol. 1 do processo instrutor).
4) Em ata n.° 4, de 29.01.2002, o júri apreciou e decidiu as reclamações da lista de candidatos admitidos e excluídos (doc. fls. 73 do vol. 1 do processo instrutor).
5) Em ata n.° 5, de 25.09.2002, o júri elaborou a lista de classificação final dos candidatos, colocando em primeiro lugar a aqui contra-interessada, B…………., e em segundo lugar a Recorrente, A………….. (doc. fls. 37/39 e 73/74 do vol. 1 processo instrutor).
6) Na referida acta n.° 5 consta o seguinte:
“Em relação ao ponto 1º da ordem de trabalhos [Estudo detalhado e avaliação das candidaturas dos candidatos previamente admitidos, de modo a determinar a sua pontuação], o júri estudou e analisou as candidaturas individualmente, respeitantes aos candidatos admitidos ao concurso, tendo verificado a documentação entregue e obtido a pontuação respetiva, de acordo com os critérios descritos na Portaria n.º 936-A/99 de 22 de outubro.
Relativamente ao ponto 2.º da ordem de trabalhos [Elaboração de lista de classificação final para publicação em Diário da República] foram seriados os candidatos por ordem decrescente de pontuação, de acordo com a apreciação realizada anteriormente, sendo incluída a data de nascimento, para o caso de haver empate na pontuação obtida por dois ou mais candidatos, de acordo com os critérios descritos na Portaria n.° 936-A/99 de 22 de outubro.” (doc. fls. 37/39 e 73/74 do vol. I processo instrutor).
7) Na mesma ata consta uma indicação manuscrita do Presidente do Conselho de Administração do INFARMED Com o seguinte teor: “Homologado” (doc. fls. 37 do vol. 1 do processo instrutor).
8) A lista de classificação final dos candidatos ao referido concurso, aberto pelo aviso n.° 7968-DE/2001, foi homologada por deliberação do Conselho de Administração do INFARMED, constante da ata n.°51/CA/2002, datada de 27.09.2002, à qual se encontra anexa a citada ata n.°5 do júri do concurso (docs. fls. 41 e s. e 43 e s. do vol. I do processo instrutor).
9) Pelo Aviso n.° 10736/2002 (2 série), publicado no DR, I série, de 17.10.2002, foi tomada pública a lista de classificação final dos candidatos admitidos ao citado concurso público, publicado com o n.°7968-DE/2001, da qual constava, em primeiro lugar, B………….., em segundo lugar, C………….. e em sexto lugar a aqui Recorrente (doc. fls. 48 do vol. I do processo instrutor).
10) Em Rectificação n.° 2294/2002, publicada no DR, II série, de 19.11.2002, foi novamente publicada a referida lista de classificação final, por ter saído com inexatidão, continuando a constar em primeiro lugar B…………. e passando a constar, em segundo lugar, A………….. (doc. fls. 52 do vol. I do processo instrutor).
(Factos respeitantes ao concurso n.°7968-DC/2001)
11) Pelo Aviso n.°7968-DC/2001 (2 série), publicado no mesmo DR, de 15.06.2001, o INFARMED tomou público a abertura de concurso público para instalar uma farmácia no lugar de …….. de ………… (Zona Sul), freguesia de ……….., concelho de Vila Franca de Xira (doc. fls. 27 do vol. I do processo instrutor).
12) Em ata n.° 3, de 06.12.2001, o júri do concurso, aberto pelo Aviso n.° 7968- DC/2001, “estudou e analisou as candidaturas individualmente”, tendo verificado a existência, ou não de documentação válida e avaliou as candidaturas à luz das incompatibilidades, tendo na sequência elaborado lista dos candidatos admitidos e excluídos (doc. fls. 54 do vol. II do processo instrutor).
13) Em ata n.°4, de 29.01.2002, o júri apreciou e decidiu as reclamações da lista de candidatos admitidos e excluídos neste concurso (doc. fls. 61 do vol. II do processo instrutor).
14) Em ata n.° 5, de 25.09.2002, o júri elaborou a lista de classificação final dos candidatos ao concurso aberto pelo aviso n° 7968-DC/2001, colocando, em primeiro e segundo lugar, os aqui contra-interessados, D……….. e B………… e, em quarto lugar, a Recorrente, A………….. (doc. fls. 62/64 do vol. I processo instrutor).
15) Na referida acta n.°5, consta o seguinte:
“Em relação ao ponto 1º da ordem de trabalhos [Estudo detalhado e avaliação das candidaturas dos candidatos previamente admitidos, de modo a determinar a sua pontuação], o júri estudou e analisou as candidaturas individualmente, respeitantes aos candidatos admitidos ao concurso, tendo verificado a documentação entregue e obtido a pontuação respetiva, de acordo com os critérios descritos na Portaria n.°936-A/99 de 22 de outubro.
Relativamente ao ponto 2.° da ordem de trabalhos [Elaboração de lista de classificação final para publicação em Diário da República] foram seriados os candidatos por ordem decrescente de pontuação, de acordo com a apreciação realizada anteriormente, sendo incluída a data de nascimento, para o caso de haver empate na pontuação obtida por dois ou mais candidatos, de acordo com os critérios descritos na Portaria n.° 936-A/99 de 22 de outubro.” (doc. fls. 62/64 do vol. II processo instrutor)
16) Na mesma ata consta uma indicação manuscrita do Presidente do Conselho de Administração do INFARMED com o seguinte teor: “Homologado” (doc. fls. 62 do vol. II do processo instrutor).
17) A lista de classificação final dos candidatos ao referido concurso, aberto pelo aviso n.°7968-DC/2001, foi homologada por deliberação do Conselho de Administração do INFARMED, constante da ata n.°51/CA/2002, datada de 27.09.2002, à qual se encontra anexa a citada ata 11.05 do júri do concurso (docs. fls. 65/69 do vol. I do processo instrutor).
18) Pelo Aviso n.º 10734/2002 (2 série), publicado no DR, II série, de 17.10.2002, foi tomada pública a lista de classificação final dos candidatos admitidos ao citado concurso público, publicado com o n.°7968-DC/2001, da qual constava, em primeiro e segundo lugar, D………….. e B…………. e, em quarto lugar, E………….. e em décimo primeiro lugar a aqui Recorrente (doc. fls. 71 do vol. II do processo instrutor).
19) Em Rectificação n.°2300/2002, publicada no DR, II série, de 19.11.2002, foi novamente publicada a referida lista de classificação final, por ter saído com inexatidão, continuando a constar em primeiro e segundo lugar D……….. e B………….. e passando a constar, em quarto lugar, A…………….. (doc. fls. 74 do vol. II do processo instrutor).

3. O Direito
Vêm interpostos recursos pela Recorrida particular acima identificada e pela Entidade Recorrida suscitando-se, em ambos, o erro de julgamento da sentença recorrida ao considerar que o acto recorrido padecia do vício de forma por falta de fundamentação e, alegando, ainda, aquela, que se verifica a extemporaneidade do recurso contencioso.
Começaremos por apreciar a questão do erro de julgamento no que se refere à extemporaneidade do recurso contencioso, conhecendo, caso esta não proceda, conjuntamente dos recursos quanto ao erro de julgamento na apreciação do vício de forma por falta de fundamentação.

3. 1 Da extemporaneidade do recurso contencioso
Quanto à extemporaneidade do recurso contencioso alega a Recorrente que tendo a rectificação dos actos administrativos efeitos retroactivos (art. 148º, nº 2 do CPA) o prazo para a interposição do recurso contencioso iniciou-se com a publicação – em 17.10.2002 -, dos actos que vieram a ser objecto de rectificação, publicada esta em 19.11.2002.
O recurso contencioso ao ter dado entrada em 15.01.2003, estaria fora do prazo previsto no art. 28º, nº 1, al. a) da LPTA (cfr. art. 29º, nº 1 LPTA), tendo a sentença recorrida, ao assim não entender, violado tais preceitos, incorrendo em erro de julgamento.

Resulta do probatório, com relevância para a questão em apreço, que as listas de classificação final dos dois concursos foram publicadas em DR, de 17.10.2002, mediante avisos, mas contendo tais listas inexactidões, nomeadamente, no que se refere ao lugar em que a recorrente contenciosa tinha sido ordenada. E, por isso, foram posteriormente publicadas rectificações a ambas as listas, em 19.11.2002, com as listas devidamente corrigidas.
A retroactividade dos efeitos da rectificação (cfr. art. 148º, nº 1 do CPA), tem que cingir-se aos efeitos materiais do acto. Isto é, apenas simples erros de cálculo e erros materiais na expressão da vontade do órgão administrativo, quando manifestos, estão abrangidos naquele preceito.
Só estes erros manifestos, que sejam revelados no próprio contexto da declaração ou através das circunstâncias em que esta é feita, e que são detectáveis por um destinatário normal do acto, podem ser corrigidos pelos órgãos administrativos competentes, sem limites temporais (cfr. art. 249º do CC).
Com efeito, a rectificação a que se refere o art. 148º, nº 1 do CPA apenas se refere aos erros manifestos e pode ter lugar a todo o tempo, de acordo com o referido preceito, incluindo em prazo posterior ao prazo legal para a interposição de recurso.
No caso em apreço, não estamos perante erros óbvios, imediatamente perceptíveis nas graduações dos candidatos, publicadas no DR de 17.10.2002.
Efectivamente, conforme resulta do constante na acta nº 5 (cfr. pontos 6 e 15 do probatório), não eram conhecidos os concretos requisitos das alíneas a) e b) do nº 1 do art. 10º da Portaria nº 936-A/99 que, em relação a cada candidato foram considerados pelo júri, ao não constarem dessa acta (ou de qualquer outra) do procedimento a descrição dos requisitos concretos de cada um dos candidatos, nem o percurso valorativo que conduziu às respectivas ordenações assim publicadas.
Assim, tem que entender-se que a rectificação podia afectar a situação jurídica do recorrente contencioso, sendo que a alterou, sem que se possa vislumbrar imediata e ostensivamente quais os motivos que determinaram essa alteração, pelo que só nesta última data a interessada passou a deter todos os elementos que lhe permitiam aferir da sua situação definitiva no procedimento (nomeadamente a sua classificação no concurso), iniciando-se, como tal, o prazo para a interposição do recurso na data da publicação da rectificação e não na da primeira publicação.
Ou seja, não é aqui aplicável o regime do art. 148º do CPA, sendo, com tal, o recurso tempestivo, tal como entendeu a sentença recorrida (cfr. arts. 28º, nº 1, al. a) e 29º, nº 1 da LPTA).

3.2 Do vício de forma por falta de fundamentação
Os Recorrentes imputam à sentença recorrida erro de julgamento considerando, por um lado, que o acto de homologação está no âmbito de aplicação do nº 2 do art. 124º do CPA, que dispõe que não carecem de ser fundamentados os actos de homologação de deliberações tomadas por júris. Por outro lado, defendem que, face à objectividade dos critérios previstos no art. 10º, nº 1, alíneas a) e b) da portaria nº 936-A/99, se está perante uma situação em que é perfeitamente possível reconstituir o itinerário cognoscitivo e valorativo que conduziu à decisão.

Atentando na Acta nº 5, relativa à reunião de 25.09.2002, em que o júri do concurso procedeu à classificação dos candidatos, constata-se que dela consta, nomeadamente, o seguinte:
“Em relação ao ponto 1º da ordem de trabalhos [Estudo detalhado e avaliação das candidaturas dos candidatos previamente admitidos, de modo a determinar a sua pontuação], o júri estudou e analisou as candidaturas individualmente, respeitantes aos candidatos admitidos ao concurso, tendo verificado a documentação entregue e obtido a pontuação respetiva, de acordo com os critérios descritos na Portaria n.º 936-A/99 de 22 de outubro.
Relativamente ao ponto 2.º da ordem de trabalhos [Elaboração de lista de classificação final para publicação em Diário da República] foram seriados os candidatos por ordem decrescente de pontuação, de acordo com a apreciação realizada anteriormente, sendo incluída a data de nascimento, para o caso de haver empate na pontuação obtida por dois ou mais candidatos, de acordo com os critérios descritos na Portaria n.º 936-A/99 de 22 de outubro.”
É isto e apenas isto o que consta como motivação para a graduação dos candidatos a que o júri procedeu e que foi homologado pelos actos recorridos. Ou seja, que o júri verificou a documentação entregue e atribuiu a pontuação respectiva, de acordo com os critérios descritos na Portaria nº 936-A/99, de 22/10, sem qualquer concretização dos mesmos.
Como se refere na sentença recorrida, com a simples remissão para “os critérios descritos na Portaria nº 936-A/99, de 22 de Outubro”, sem qualquer explicitação sobre o modo como estes critérios foram concretizados, “fica por saber como é que o júri preencheu os conceitos indeterminados relevantes para a pontuação tais como «ano completo» ou «residência habitual» (precisamente uma das questões suscitadas pela Recorrente para fundamentar um dos vícios de violação de lei, prende-se com a forma como terão sido contabilizados os termos inicial e final do «ano completo»)”.
Com efeito, na pontuação a que se refere o nº 10, alíneas a) e b) da citada Portaria nº 936-A/99, que estabelece as regras e condições de instalação e transferência de novas farmácias, faz-se apelo a conceitos indeterminado como «ano completo» (correspondendo a cada um desses anos um ponto, até um máximo de 10 pontos) e «residência habitual no concelho» (correspondendo 1 ponto por cada ano completo de residência, num máximo de 5 pontos).
Como se viu, o júri não indicou ainda que de forma sucinta o fundamento das pontuações, não explicitando minimamente os parâmetros que utilizou para determinar um “ano completo” ou “residência habitual no concelho”.
Aliás, não indicou sequer a valoração numérica de cada item, limitando-se à indicação da totalidade da pontuação, sem expor as razões que levaram ao resultado concreto. Ou seja, em face do conteúdo das actas, fica-se sem saber em concreto qual a razão por que foi dada determinada pontuação e não outra a cada um dos candidatos, não resultando compreensível para os candidatos (e muito menos para um destinatário normal) qual o critério utilizado pelo júri para o preenchimento dos conceitos referidos naqueles preceitos, que veio a determinar a ordenação dos mesmos.
Ora, a razão da dispensa de fundamentação dos actos que homologam deliberações tomadas pelos júris, é a obrigatoriedade de as deliberações homologadas serem fundamentadas – cfr. Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, in Código do Procedimento Administrativo Comentado, vol. II, págs. 105 e 106.
Significa isto que “o que se dispensa é a indicação, no acto de homologação, das razões por que se concorda com o deliberado pelo júri. Mas, apropriando-se o acto de homologação do conteúdo da deliberação do júri, ele faz seus os vícios que afectem esta deliberação, inclusivamente o vício de forma por falta de fundamentação, se afectar a deliberação homologada” – cfr. acs. deste STA de 09.12.2009, P. nº 0869/09 (citado) e de 14.07.2008, P. nº 02/08.
O art. 125º do CPA (na sua versão original aqui aplicável), estabelece os requisitos da fundamentação dos actos administrativos.
É jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal Administrativo que a fundamentação é um conceito relativo que varia conforme o tipo de acto e as circunstâncias do caso concreto, mas que a fundamentação só é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do acto para proferir a decisão, ou seja, por que o autor do acto decidiu como o fez e não de forma diferente, de forma a poder desencadear os mecanismos de impugnação cabíveis (cfr. ac. de 09.12.2009 supra indicado e toda a jurisprudência nele referida).
Assim, não constando, nem do acto de homologação impugnado nem da deliberação do júri homologada qualquer indicação das razões por que se classificaram os candidatos da forma como foi feita, não pode considerar-se satisfeito o dever de fundamentação previsto no art. 125º do CPA, tal como entendeu a sentença recorrida.

Pelo exposto, acordam em negar provimento ao recurso e em confirmar a sentença recorrida.
Custas pela contra-interessada (o INFARMED está isento, no presente processo, nos termos do art. 2º da Tabela de Custas), com taxa de justiça de € 350 e 50% de procuradoria.

Lisboa, 11 de Janeiro de 2017. – Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa (relatora) – José Francisco Fonseca da Paz – Alberto Acácio de Sá Costa Reis.