Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0430/08
Data do Acordão:11/19/2008
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:BRANDÃO DE PINHO
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL
OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
FUNDAMENTO DA OPOSIÇÃO
TÍTULO EXECUTIVO
Sumário:A falta de requisitos essenciais do título executivo, que, quando não puder ser suprida por prova documental, constitui nulidade insanável do processo de execução fiscal – artigo 165.º, n.º 1, alínea b), do Código de Procedimento e de Processo Tributário -, não constitui fundamento de oposição, não sendo enquadrável na alínea i) do n.º 1 do seu artigo 204.º.
Nº Convencional:JSTA00065389
Nº do Documento:SAP200811190430
Data de Entrada:05/21/2008
Recorrente:A...
Recorrido 1:INST DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL
Votação:UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Meio Processual:REC OPOS JULGADOS.
Objecto:AC TCA DE 2007/10/02 - AC STA PROC21699 DE 1998/02/18.
Decisão:NEGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL / OPOSIÇÃO.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART151 N1 ART165 N1 B ART203 N1 ART204 N1 I ART278 N1.
CPCI63 ART178 G.
CPTRIB91 ART286 N1 B.
CPC96 ART2 N2.
LGT98 ART5 N1.
Jurisprudência Nacional:AC STAPLENO PROC452/07 DE 2007/09/26.; AC STJ DE 2003/01/28 IN CJSTJ N166 PAG61.; AC STAPLENO PROC574/04 DE 2005/02/23.; AC STA PROC26762 DE 2007/10/23.; AC STA PROC950/06 DE 2007/03/14.; AC STA PROC1178/06 DE 2007/02/28.; AC STA PROC1701/02 DE 2002/11/20.
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA CPPT ANOTADO 2V NOTA16 AO ART165.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
A… vem recorrer, por oposição de acórdãos, do aresto do Tribunal Central Administrativo de 2 de Outubro de 2007, que negou provimento ao recurso interposto da sentença que, por sua vez, julgou improcedente oposição a execução fiscal.
Fundamentou-se a decisão recorrida, em que a nulidade do título executivo não é fundamento de oposição à execução, por não enquadrável em qualquer das alíneas do n.º 1 do artigo 204.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, particularmente na sua alínea i), constituindo, antes, a falta de requisitos essenciais do título executivo, nulidade insanável, nos termos do artigo 165.º do CPPT.
O recorrente formulou as seguintes conclusões:
I. Não é pacífico na doutrina e jurisprudência que o elenco de fundamentos de oposição à execução seja taxativo.
II. "Ao contrário do que parece resultar da utilização do advérbio "só" no n° 1, dando a entender tratar-se de uma enumeração taxativa dos fundamentos de oposição, para além dos fundamentos específicos enunciados nas alíneas a) a h), a alínea i) permite invocar quaisquer outros fundamentos de oposição, contando que a respectiva prova possa ser efectuada apenas por documento e desde que não envolva apreciação da legalidade da liquidação da dívida exequenda, nem represente interferência em matéria da exclusiva competência da entidade que houver extraído o título." [João António Valente Torrão, in Código de Procedimento e Processo Tributário - Anotado e Comentado, Almedina, Coimbra, Janeiro, 2005, pg. 786, em anotação ao art. 204° do CPPT]
III. "A nulidade do processo de execução fiscal por falta de requisitos essenciais do título executivo, pode apreciar-se em processo de oposição à execução fiscal" [Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo datado de 18/2/98, no processo n° 21699, disponível em www.dgsi.pt]
IV. "A falta de requisitos essenciais do título executivo, quando não puder ser suprida por prova documental, gera nulidade absoluta, de conhecimento oficioso, a qual tem por efeito a anulação do processado posterior ao momento em que foi praticada e por ela absolutamente prejudicado (art. 76, alínea b), § l e 3, do C.P.C.I.). “ [Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo datado de 20/4/94, no processo nº 16152, disponível em www.dgsi.pt]
V. A oposição à execução fiscal, embora com tramitação autónoma em relação ao processo executivo, funciona na dependência deste como uma contestação à pretensão do exequente, tendo por fim a extinção ou suspensão da execução fiscal. Consequentemente, na oposição à execução devem apenas ser admitidos como fundamentos aqueles que possam conduzir à suspensão ou extinção da execução.
VI. A nulidade do título executivo tem como consequência a extinção do processo de execução, pelo que a arguição de tal nulidade se harmoniza com as finalidades do processo de execução devendo ser considerada como fundamento de oposição à execução.
VII. "(...) apesar de não estar expressamente indicado nas várias alíneas do nº 1 do artº 204° deste Código, a falta de requisitos do título executivo cabe na fórmula genérica da referida alínea i), já que se trata de um fundamento que pode ser provado documentalmente, não envolve apreciação da legalidade da liquidação da quantia exequenda nem representa interferência em matéria da exclusiva competência que emitiu o título." [Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, Vislis Editores, Lisboa, 2002, pg. 829, em anotação ao art. 165° do CPPT]
VIII. O recorrente invocou a nulidade do título executivo, porquanto a certidão de dívida que serviu de base à execução não cumpre os requisitos plasmados nos art°s 88° e 163° n° l al. d) do CPPT, o que consubstancia uma nulidade de conhecimento oficioso, nos termos do disposto no artº 165° n° 4 do CPPT.
IX. A inexequibilidade do título executivo é um dos fundamentos típicos do processo de oposição à execução regulado no CPC, nos termos do disposto no artº 814° al. a) do CPC, conduzindo à extinção da execução.
X. A falta de requisitos essenciais do título executivo ainda que não consubstanciasse uma nulidade passível de ser arguida em sede de oposição à execução - o que não se concede, mas pondera por mero dever de patrocínio -sempre conduziria à inexequibilidade do título e, por consequência, à extinção da execução.
XI. A falta de requisitos essenciais do título executivo, na medida padece de vícios tais que o tornam inexequível, constitui fundamento para deduzir oposição à execução fiscal.
XII. O acórdão recorrido viola os artigos 88°, 163°, 165° e 204° do CPPT, o art. 814° do CPC.
Não houve contra-alegações.
O Exmo. Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido de, verificando-se efectivamente oposição, dever esta “ser resolvida pela consagração da doutrina do acórdão fundamento, por ser a boa, constituindo, de resto, jurisprudência seguida na secção”.
E, corridos os vistos legais, nada obsta à decisão.
Em sede factual, vem apurado que:
A). Em 02/03/2005 foi emitida pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social a certidão de divida em nome de A… referente a contribuições dos meses de Março de 2003 a Fevereiro de 2004 no montante total de € 31.243,27 como consta da certidão de dívidas de fls. 18 dos presentes autos.
B). Na referida certidão consta o montante e a natureza da divida, os períodos a que se referem, o valor referente a cada período, a data e termos em que deveriam ser entregues (cfr. documento de fls. 18 cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
C). Em 02/03/2005 foi emitida pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social a certidão de dívida em nome de A… referente a contribuições dos meses de Março de 2004 a Janeiro de 2005 no montante total de € 26.171,62, como consta da certidão de divida de fls. 19 dos presentes autos.
D). Na referida certidão consta o montante e a natureza da divida, os períodos a que se referem, o valor referente a cada período, a data e termos em que deveriam ser entregues (cfr. documento de fls. 19 cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
E). Em 02/03/2005 foi emitida pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social a certidão de dívida em nome A… referente a quotizações dos meses de Março de 2003 a Fevereiro de 2004 no montante total de € 14.470,56 como consta da certidão de dívida de fls. 20 dos presentes autos.
F). Na referida certidão consta o montante e a natureza da divida, os períodos a que se referem, o valor referente a cada período, a data e termos em que deveriam ser entregues (cfr. documento de fls. 20 cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
G). Em 02/03/2005 foi emitida pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social a certidão de divida em nome de A… referente a quotizações dos meses de Março de 2004 a Janeiro de 2005 no montante total de € 12.121,59 como consta da certidão de divida de fls. 21 dos presentes autos.
H). Na referida certidão consta o montante e a natureza da divida, os períodos a que se referem, o valor referente a cada período, a data e termos em que deveriam ser entregues (cfr. documento de fls. 21 cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
I). Em 06/06/2005 e com base nas certidões referidas nos pontos anteriores foi autuado no Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social - Secção de Processos de Setúbal, o processo de execução fiscal n. ° 1501200501004409 por dívida total de € 84.007,04 como consta de fls. 17.
J). O ora oponente foi citado em 16/06/2005 como consta dos documentos de fls. 22 e do aviso de recepção de fls. 23.
K). A petição de oposição foi apresentada por via electrónica em 29/09/2005 (cfr. fls. 4 dos presentes autos).
L). A acção declarativa de recuperação de empresa com processo especial, intentada por A… junto do Tribunal de Comércio de Lisboa, foi objecto de decisão no sentido dos autos não poderem prosseguir como processo de recuperação nem como processo de falência, determinando aquele tribunal o arquivamento dos autos e confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa (cfr. documento de fls. 58/75).
Vejamos, pois:
Assim, quanto à Oposição de Acórdãos:
O presente processo de oposição iniciou-se em 2005, pelo que lhe é aplicável o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais de 2002 – cfr., desenvolvidamente, sobre o tema, o Acórdão do Pleno desta Secção, de 26 de Setembro de 2007 – recurso n.º 0452/07.
São, assim, pressupostos expressos do recurso para o Pleno, por oposição de julgados, que se trate do mesmo fundamento de direito, que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica e se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução expressa oposta.
O que naturalmente supõe a identidade de situações de facto já que, sem ela, não tem sentido a discussão dos referidos requisitos; por isso, ela não foi referida de modo expresso.
Para que exista oposição é, pois, necessária tanto uma identidade jurídica como factual.
Que, por natureza, se aferem pela análise do objecto das decisões em confronto: o acórdão recorrido, do Tribunal Central Administrativo – Sul, de 2 de Outubro de 2007, e o aresto fundamento, do Supremo Tribunal Administrativo, de 18 de Fevereiro de 1998, proferido no recurso n.º 21.699.
Ora, verifica-se, efectivamente, a invocada oposição.
Trata-se, nos dois arestos, de saber se a nulidade do título executivo, por falta dos seus requisitos essenciais, e quando não puder ser suprida por prova documental, é, ou não, fundamento de oposição à execução fiscal, nos termos da alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, sendo que o acórdão recorrido se pronunciou pela negativa e o fundamento pela positiva.
Certo que o acórdão fundamento foi proferido no domínio de vigência do Código de Processo das Contribuições e Impostos pelo que poderia concluir-se não haver oposição, à míngua do respectivo pressuposto da existência do mesmo quadro legal.
A conclusão seria, todavia, precipitada.
É que as diversas disposições legais que, no ponto, se sucederam no tempo – artigos 178.º, alínea g), do CPCI, 286.º, n.º 1, alínea b), do CPT e 204.º, n.º 1, alínea i), do CPPT -, têm o mesmo conteúdo jurídico, mau grado pequenas diferenças de redacção, abrangendo, todas, fundamentos a provar apenas por documento e que “não envolvem apreciação da legalidade da liquidação da dívida exequenda nem representem interferência em matéria de exclusiva competência da entidade que houver extraído o título”.
Tem-se, pois, por verificada a invocada oposição.
Quanto ao mais:
A questão decidenda é, como já se deixou referido, a de saber se a nulidade do título executivo, por falta dos seus requisitos essenciais, e quando não puder ser suprida por prova documental, é, ou não, fundamento de oposição à execução fiscal, nos termos da alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.
Ora, há que reconhecer que tal fundamento cabe na literalidade da referida norma pois que patentemente não envolve a apreciação da legalidade da liquidação – desde logo, é-lhe posterior – nem interfere em matéria da exclusiva competência da entidade que emitiu o título.
Por outro lado, tal nulidade conduz à extinção da execução pelo que, sendo esta o fim primacial da oposição, não haverá, por aí, obstáculo à predita resposta afirmativa.
Cfr. Jorge de Sousa, CPPT anotado, 2.º volume, nota 16 ao artigo 165.º.
Todavia, outros parâmetros há a considerar.
Dispõe o artigo 2.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, que “a todo o direito (…) corresponde a acção adequada a fazê-lo reconhecer em juízo”.
E, em termos semelhantes, preceitua o artigo 97.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária, que “a todo o direito de impugnar corresponde o meio processual mais adequado de o fazer valer em juízo”.
Assim, a cada direito corresponde uma só acção: unidade, que não pluralidade.
Cfr. o acórdão do STJ, de 28 de Janeiro de 2003, in Colectânea, 166, p. 61.
Ora, o artigo 165.º do CPPT considera nulidade insanável em processo de execução fiscal “a falta de requisitos essenciais do título executivo, quando não puder ser suprida por prova documental”.
E estabelece o respectivo regime, e efeitos: a anulação dos termos subsequentes do processo que do acto anulado dependam absolutamente, sendo (a nulidade) de conhecimento oficioso e podendo ser arguida até ao trânsito em julgado da decisão.
A lei elegeu, pois, tipicamente, o respectivo regime legal: trata-se de uma nulidade.
E, como tal, estabelece-se igualmente o seu regime de arguição.
Assim sendo, foi propósito legal desconsiderá-la como fundamento de oposição, ainda que seja a mesma, substancialmente, a consequência resultante: a extinção da execução consubstanciada na nulidade do próprio título.
Por outro lado, a tutela jurídica concedida à nulidade é, até, mais consistente do que a resultante da oposição, na medida em que pode ser arguida até ao trânsito em julgado da decisão final, que não apenas no prazo de 30 dias contados da citação – cfr. artigo 203.º, n.º 1, do CPPT.
Aliás, a entender-se dever ser conhecida pelo Chefe do Serviço de Finanças (ou, porventura, pelo juiz – cfr. o artigo 151.º, n.º 1, do CPPT), sempre o respectivo processo seria urgente – artigo 278.º, n.º 5 – o que é mais consentâneo com a celeridade querida para o processo de execução fiscal, atenta essencialmente a sua finalidade de cobrança de impostos que visam “a satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas” e a promoção da justiça social, da igualdade de oportunidades e das necessárias correcções das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento – artigo 5.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária.
Nada, pois, parece justificar a apontada dualidade – em termos de nulidade processual da execução fiscal e de fundamento de oposição à mesma -, aliás proibida nos termos do referido artigo 2.º do Código de Processo Civil.
Conclui-se, assim, que a nulidade da falta de requisitos essenciais do título executivo – nos termos do artigo 165.º, n.º 1, alínea b), do CPPT – não é fundamento de oposição à execução fiscal por não enquadrável no seu artigo 204.º, n.º 1, alínea i).
No sentido exposto, e por mais recentes, cfr. os acórdãos do Pleno do STA de 23 de Fevereiro de 2005 – recurso n.º 0574/04, tirado por unanimidade, e da Secção de 23 de Outubro de 2007 – recurso n.º 026.762, de 14 de Março de 2007 – recurso n.º 0950/06, de 28 de Fevereiro de 2007 – recurso n.º 01178/06 e de 20 de Novembro de 2002 – recurso n.º 01701/02, expressando forte corrente jurisprudencial no sentido ora proposto.
Termos em que se acorda negar provimento ao recurso, confirmando-se o aresto recorrido.
Custas pelo opoente, na instância e neste STA, sempre com procuradoria de 50%.
Lisboa, 19 de Novembro de 2008. – Domingos Brandão de Pinho (relator) – Jorge Lino Ribeiro Alves de Sousa – António José Martins Miranda de Pacheco – António Francisco de Almeida Calhau – Francisco António Vasconcelos Pimenta do Vale – Lúcio Alberto de Assunção Barbosa – Jorge Manuel Lopes de Sousa (Votei conforme a declaração junta).
Declaração de Voto
A jurisprudência do STA, depois de, inicialmente, ter afirmado a possibilidade de arguição da nulidade derivada de falta de requisitos do título executivo em processo de oposição à execução fiscal, ( Neste sentido, aliás, tem vindo a decidir o STA, como pode ver-se pelos seguintes acórdãos:
- de 22-1-92, recurso 13528, AP-DR de 30-12-93, página 50;
- de 20-4-94, recurso n. 16152, AP-DR de 23-12-96, página 1178;
-de 26-10-94, recurso n. 14382, AP-DR de 20-1-97, página 2370, e
- de 18-2-98. recurso n.º 21699, AP-DR de 8-11-2001, página 502.) acabou por inverter essa posição, passando a entender que tal nulidade só pode conhecer-se no processo de execução fiscal. ( Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos:
- da Secção do Contencioso Tributário de 14-4-1999, recurso n. 22906;
- de 20-11-2002, recurso n.º 1701/02;
- do Pleno de 23-2-2005, recurso n.º 574/04;
- de 28-2-2007, recurso n.º 1178/06;
- de 14-3-2008, recurso n.º 950/06;
- de 23-10-2007, recurso n.º 26762;
- do Pleno de 19-11 -2008, recurso n. 364/08. )
Trata-se de questão sem alcance prático apreciável, uma vez que a falta de requisitos do titulo executivo, quando constitui nulidade (por não poder ser suprida por prova documental), pode ser arguida a todo o tempo no processo de execução fiscal, pelo que, se for invocada como único fundamento de oposição, será viável a convolação da petição de oposição em requerimento de arguição de nulidade, e, quando não for o único fundamento, pode sempre fazer-se a arguição da nulidade no processo de execução fiscal, na sequência da decisão que não admita esse fundamento de oposição.
No entanto, sem prejuízo de ser aconselhável o acatamento desta última jurisprudência uniforme mais recente para evitar mais tergiversações jurisprudenciais sobre esta matéria, por a estabilidade jurisprudendal ( Como decorre do n. 3 do art. 8. do CC, deve-se procurar «obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito».) e a confiança que ela gera nos cidadãos serem valores a prosseguir pelos Tribunais que, quando não estão em causa reflexos substantivos, se devem sobrepor à adequação dos meios processuais ( Que são de importância manifestamente secundária a partir do momento em que foi introduzido no art. 265.º-A do CPC o princípio da adequação formal que impõe ao juiz quando entender que a tramitação processual prevista na lei não se adequa às especificidades da causa, determinar a prática dos actos que melhor se ajustem ao fim do processo, bem como as necessárias adaptações.
) parece-me que a não admissibilidade de invocação da falta de requisitos do titulo executivo no processo de oposição só tem fundamentação aceitável nos casos em que puder ser suprida por prova documental, isto é, quando essa falta não constitui nulidade, pois, só nesses casos, essa falta de requisitos, não conduz à extinção da execução. O que se reconduz a que, nos casos em que tal falta é nulidade (por não poder ser suprida por prova documental, como sucede no caso da falta de assinatura da entidade que emite o titulo) não se vislumbra qualquer obstáculo à sua invocação em oposição à execução fiscal.
Na verdade, a questão de saber se uma causa de extinção da execução fiscal é fundamento de oposição à execução fiscal é simples, à face do critério que emana do art. 204.º do CPPT: se ela se enquadra em qualquer das situações aí previstas, a resposta é afirmativa; no caso contrário, a resposta é negativa.
A nulidade por falta de requisitos do título executivo é causa de extinção da execução fiscal e enquadra-se na alínea i) do n.º 1 do art. 204.º.
No caso em apreço, a deficiência do titulo executivo consubstancia-se na falta de indicação do nome do devedor, que e susceptível de ser suprida por prova documental.
Isto é, a deficiência não implica nulidade do título executivo nem provoca a extinção da execução fiscal.
É, por isso, que, neste caso, não se está perante um fundamento de oposição à execução fiscal.
De resto, não se vislumbra como um legislador que, em matéria processual, tem como preocupação de primeira linha a economia processual, a ponto de a erigir em fundamento para um insólito anúncio explícito de responsabilização disciplinar dos funcionários que pratiquem actos inúteis (art. 137.º do CPC) poderia consagrar um regime legal idolatradamente formalista, em que uma causa de extinção da execução fiscal, invocada num processo próprio para conhecer de causas de extinção da execução fiscal, não pudesse ser nele conhecida, o que permitiria pôr imediatamente fim ao processo, obrigando, antes, o interessado, a parte contrária e o Tribunal a desenvolverem actividade complementar, na sequência da arguição autónoma da nulidade no processo de execução fiscal, para atingir precisamente o mesmo objectivo, sem qualquer benefício para ninguém.
Este hipotético entendimento legislativo, para além de estar ao arrepio da unidade do sistema jurídico, que é o elemento primacial da interpretação jurídica, seria, decerto, uma solução desacertada que, por o ser, tem de se presumir não ter sido adoptada (art. 9.º, n.º 3, do CC).
Jorge Manuel Lopes de Sousa