Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01253/16
Data do Acordão:07/05/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:FALTA DE ENTREGA DE IMPOSTO
CONTRA-ORDENAÇÃO
INFRACÇÃO CONTINUADA
Sumário:I - O actual regime de cúmulo material das sanções nas contra-ordenações tributárias não é incompatível com a prática de infracções sob forma continuada, na medida em que aquele pressupõe o concurso real de infracções, como resulta da expressão “em concurso” constante da previsão do preceito (art. 25.º RGIT, redacção da Lei n.º 55-A/2010, 31 dezembro)
II - Também a natureza do imposto não entregue (IVA) não excluiu in limine a possibilidade de se verificar “contra-ordenação continuada”.
Nº Convencional:JSTA00070275
Nº do Documento:SA22017070501253
Data de Entrada:11/07/2016
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A....., LDA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TT1INST LISBOA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - CONTRA-ORDENAÇÃO
Legislação Nacional:RGIT01 ART3 ART25.
RGCO ART19 ART32.
CP95 ART12 ART30 ART79.
CIVA08 ART27 N1 ART41 N1.
CCIV66 ART8 N3.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC01302/16 DE 2017/05/31.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – A Fazenda Pública vem recorrer para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que, julgou procedente o recurso deduzido pela A………… Ldª, melhor identificada nos autos, contra a decisão administrativa proferida pelo serviço de finanças de Odivelas que lhe aplicou coima no valor de € 2.365,95 por falta de pagamento de imposto liquidado.

Termina a sua alegação de recurso com as seguintes conclusões:

«I. Está imputada à recorrente a prática da contra-ordenação p.p. nos artigos 40.°/1/a) e 26º/1, do CIVA e 114.º/2 e 26.°/4 do RGIT.
II. Porquanto estando registada em IVA no regime normal de periodicidade mensal, fez a entrega da declaração periódica do IVA relativa ao período de Abril de 2014, sem a prestação tributária necessária para satisfazer o imposto exigível, sendo que este comportamento se repetiu ao longo do ano de 2014.
III. Na douta sentença a quo qualifica-se este comportamento da Recorrente como se tratando da prática de uma infracção de carácter continuado, devendo ser-lhe aplicado o mesmo regime que decorre do disposto nos art° 30°, nº 2 e 79°, n° 1 do Código Penal, aplicável ao processo de contra-ordenação tributária ex vi do art.° 3°, alínea b) do RGIT, conjugado com o artigo 32° do RGCO.
IV. Porém, ressalvado o devido respeito por este entendimento, com o mesmo não se pode concordar, porquanto e desde logo, não foi relevado o facto de o imposto em causa consistir no IVA, ou seja, trata-se de um imposto que é devido de cada vez que é realizada uma operação tributável pelo que estamos perante um imposto de obrigação única, resultante de eventos que mesmo que se repitam, são tratados tributariamente como factos autónomos ou instantâneos.
V. Destarte, se o facto tributário que esteve na génese da obrigação de imposto incumprida é tratado como um facto autónomo, não repetitivo e não duradouro, também não se pode atribuir à infracção que dele dimana o carácter de infracção continuada.
VI. Motivo pelo qual, ao invés de se estar perante uma infracção continuada, deve antes considerar-se que se está perante tantas contra-ordenações quantos os períodos a que respeita a obrigação tributária.
VII. Para além do antecedentemente exposto, outro argumento concorre para que não seja de qualificar a presente contra-ordenação como continuada.
VIII. Com efeito, para que se verifique uma contra-ordenação continuada necessário se torna que se verifiquem os seguintes pressupostos: a) - Realização plúrima do mesmo tipo de infracção (ou de vários tipos que protejam fundamentalmente o mesmo bem jurídico; b) - Homogeneidade da forma de execução; c) - Unidade de dolo; as diversas resoluções devem conservar-se dentro de uma linha psicológica continuada; d) - Lesão do mesmo bem jurídico; e) - Persistência de uma situação exterior que facilita a execução e que diminui consideravelmente a culpa do agente.
IX. E no caso concreto, manifestamente, não se verifica o último dos pressupostos antecedentemente referidos, atento o facto de o imposto em causa não ter sido suportado pela infractora, mas antes pelos seus clientes, apenas tendo aquela a obrigação de o entregar nos cofres do Estado.
X. E se não fez entrega desse mesmo imposto ao Estado é porque deu outro destino (indevido) ao respectivo montante, o qual se encontrava à sua guarda.
XI. Sendo certo que a Recorrente, tanto quanto se julga alcançar do probatório, nem sequer aventa qualquer justificação para este comportamento.
XII. Quer isto dizer que não se verifica um dos pressupostos da continuação criminosa, consistente na persistência de uma situação exterior ao infractor que facilita a resolução criminosa e diminui consideravelmente a sua culpa.
XIII. Não ocorre ainda uma situação de contra-ordenação na forma continuada pelo facto de, quer na data em que foram praticadas as infracções tributárias, quer na altura em foi proferida a decisão recorrida, se encontrar em vigor a norma pela qual as sanções aplicadas às contra-ordenações em concurso são sempre objecto de cúmulo material (cfr. o art° 25° do RGIT).
XIV. E perante várias coimas aplicadas e reportadas a várias contra-ordenações, cometidas pelo mesmo infractor, nos termos do disposto no art.° 25° do RGIT, as mesmas a serem cumuladas, são-no materialmente, o que, ressalvado melhor entendimento também obsta à punição por contra-ordenação continuada.
XV. Porquanto, daquele cúmulo material deriva a aplicação de uma única coima resultante da soma das coimas aplicadas a cada uma das contra-ordenações, não havendo lugar a qualquer redução, o que se afigura incompatível com a punição por contra-ordenação continuada.
XVI. Assim, a douta sentença recorrida, ressalvada a devida vénia, fez uma incorrecta interpretação e aplicação da lei, tendo violado, nomeadamente, os normativos constantes dos artigos 19.º do RGCO e 30.º 12 e 79.º do Código Penal e art.° 25° do RGIT.»

2 – A recorrida, A……….., Ldª veio contra alegar a fls. 100/101, sustentando a tese da infracção continuada porque a sua prática se subsume nos condicionalismos previstos no artº 30º, nº2, do CP.

3 O Exmº Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido do provimento do recurso, com o seguinte fundamentação que, na parte relevante se transcreve:
(…..)Nos termos do estatuído nos artigos 3.°/b) do RGIT e 32.º do RGCO é certo que, quando estivermos perante uma contraordenação na forma continuada, se aplica o regime do artigo 30.º/2 e 79.º do Código Penal.
Como decidiu o STJ (Acordão de 30 de janeiro de 1986, BMJ, 353.º, 240.)
“1. Se tiver havido um só desígnio criminoso, o crime há-de ser necessariamente único, já que subsumível a um mesmo tipo criminal, ou seja, ofensivo de idêntico bem jurídico.
2. Ao invés, se o comportamento do arguido revelar uma pluralidade de resoluções poder-se-ão pôr e só então as hipóteses de pluralidade de infrações ou de crime continuado.
3. Tendo havido mais do que uma resolução, a regra será o concurso real de crimes, constituindo a continuação criminosa uma exceção a aceitar quando a culpa se mostre consideravelmente diminuída, mercê de fatores exógenos que facilitaram a recaída ou recaídas”.
São pressupostos da infração continuada:
“1. Realização plúrima do mesmo tipo de infração (ou de vários tipos que protejam fundamentalmente o mesmo bem jurídico;
2. Homogeneidade da forma de execução;
3. Unidade de dolo; as diversas resoluções devem conservar-se dentro de uma linha psicológica continuada;
4. Lesão do mesmo bem jurídico;
5 Persistência de uma situação exterior que facilita a execução e que diminui consideravelmente a culpa” (RGIT, anotado, 4ª edição 2010, página 123/124, Conselheiros Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos).
Ora, como resulta, claramente, do probatório se, no caso em análise se podem verificar os pressupostos referidos em 1,2,3 e 4, é manifesto que não ocorre o pressuposto referido em 4.
Na verdade, não ocorre qualquer situação exterior que diminua consideravelmente a culpa da arguida.
Aliás, como resulta do probatório, a recorrida nem sequer invoca qualquer tipo de justificação para o comportamento subjacente à prática das contraordenações que lhe são imputadas (p.p. pelas disposições conjugada dos artigos 27.°/l e 41.º/l/ a) do CIVA e 26.°/4 e 114.°/2/5 do RGIT).
Mas se, viesse, hipoteticamente, invocar alegadas dificuldades económicas decorrentes de qualquer causa as mesmas não diminuiriam, seguramente, a culpa da recorrida.
Com efeito, o pagamento do imposto em causa (IVA) não é suportado pela arguida, antes tendo cobrado o mesmo dos seus clientes para entregar nos cofres do Estado.
Assim se não fez a entrega desse mesmo imposto ao Estado é porque deu outro destino (indevido) ao respetivo montante que estava à sua guarda.
Portanto, e repetindo, as dificuldades económicas, se tivessem sido invocadas, e não foram, não diminuiriam, nem sequer levemente, a culpa da arguida recorrente (acórdão do TCAS de 01/03/2005, proferido no processo nº 0580/01, disponível no sitio da internet www.dgsi.pt).
Portanto, a douta sentença recorrida ao decidir como decidiu, fez uma incorreta interpretação da lei, tendo violado, nomeadamente, os normativos dos artigos 30.°/2 e 79.° do Código Penal e 25.° do RGIT.
Mas, mesmo que que se estivesse perante uma situação de infração continuada, o que não é, manifestamente o caso, sempre poderia deveria o tribunal recorrido proceder, até oficiosamente, à apensação dos processos de contraordenação que pendem contra a arguida/recorrida, nos termos do disposto nos artigos 24.°/2 e 25.° do CPP, e, se depois de efetuado o julgamento, chegasse à conclusão de que se estava perante uma situação de infração continuada, deveria, então, revogar a decisão de aplicação da coima por erro sobre os pressupostos de facto e de direito.
A nosso ver, a sentença recorrida merece, assim, censura.
Termos em que deve dar-se provimento ao recurso e revogar-se a decisão recorrida, baixando os autos à instância para apreciação e decisão das restantes questões suscitadas pela, ora, recorrida, no recurso judicial da decisão de aplicação da coima.»

4. Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

5 – No Tribunal Tributário de Lisboa foram dados como provados e com interesse para a decisão os seguintes factos:
a) No dia 16/10/2014, foi lavrado auto de notícia, imputando-se à arguida, ora recorrente, a não entrega, até 10/09/2014, de IVA no montante de € 6.813,34 respeitante ao período 2014/07 - auto de notícia de fls. 2 e 3 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido, para todos os legais efeitos.
b) Em 06/12/2014, foi proferida, pelo chefe do serviço de finanças de Odivelas, decisão administrativa que a condenou, na coima de € 2.365,93 (dois mil, trezentos e sessenta e cinco euros e noventa e três cêntimos), pela prática da infracção prevista pelos artigos 27°, n°1 e 41.°, n.°1, alínea a) do CIVA (falta de pagamento do imposto) e punida pelos artigos 26°, n°4 e 1 14.°, n.º 2 e n.°5, alínea a) do CIVA, cuja ocorrência respeita ao seguinte período: 2014/07 - decisão administrativa de fixação de coima de fls. 10 e 11 dos autos, cujo conteúdo aqui dou por reproduzido.
c) Da decisão recorrida, consta taxativamente a seguinte fundamentação de facto e de direito:
“Descrição Sumária dos factos:
À arguida foi levantado auto de notícia pelos seguintes factos: 1. Montante de imposto exigível: € 9.813,34; 2. Valor da prestação tributária entregue: € 3.000,00; 3. Valor da prestação tributária em falta: € 6.813,34; 4. Termo do prazo para cumprimento da obrigação: 2014/09/10; 5. Período a que respeita a infracção: 2014/07; os quais se dão como provados.
Normas Infringidas e Punitivas
Os Factos relatados constituem violação dos artigos abaixo indicados, punidos pelos artigos do RGJT referidos no quadro, aprovado pela Lei n° 15/2001, de 05/07, constituindo contra-ordenação.
Normas Infringidas: artigo 27. n.º 1 e 41.º n.º 1, alínea a) do CIVA — Falta de pagamento do imposto.
Normas Punitivas: Artigo 114. N° 2, n.º 5 a) e 26 n.º 4 do RGIT — Falta entrega prest. Tributária dentro prazo.
Período Tributação: 201407
Data infracção: 2014-09-10
Coima fixada: 2.365,93.
Responsabilidade contra-ordenacional
A responsabilidade própria do arguido deriva do artigo 7° do Dec-Lei n° 433/82 de 27/10, aplicável por força do art° 3° do RGJT, concluindo-se dos autos a prática, pela arguida e como autora material da contra-ordenação identificada supra.
Medida da coima
Para fixação da coima em concreto deve ter-se em conta a gravidade objectiva e subjectiva da contra-ordenação praticada, para tanto importa ter presente e considerar o seguinte quadro (Art°27 do RGIT):
Requisitos/Contribuintes
Actos de Ocultação: Não
Beneficio Económico: 0,00
Frequência da prática: Frequente
Negligência. Simples
Obrigação de não cometer infracção: Não
Situação Económica e Financeira. Desconhecida
Tempo decorrido desde a prática da infracção: <3 meses.
Despacho:
Assim, tendo em conta estes elementos para a graduação da coima e de acordo com o disposto no artigo 79º do RGIT aplico ao arguido a coima de Eur. 2.365,93 cominada nos artigos 114°, n°2, n°5 a) e 26 n° 4, do RGJT, com respeito pelos limites do Art° 26 do mesmo diploma, sendo ainda devidas custas nos termos do N°2 do Dec-Lei N°29/98 de 11 de Fevereiro.”
d) A arguida não entregou nos cofres do Estado a quantia relativa a IVA respeitante ao período 2014/07, no montante de € 6.818,34 - citada decisão e facto admitido por acordo das partes.
e) A arguida foi regularmente notificada para proceder ao pagamento da coima, identificada nas alíneas antecedentes, tendo apresentado o presente recurso a 21/01/2015 - documentos de notificação de fls. 13 a fls. 15 dos autos e articulado de fls. 16 e segs. dos autos, donde consta o respectivo carimbo de recepção, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido.
f) À ora recorrente foram aplicadas coimas, por decisões administrativas proferidas em 2013 e 2014, pela prática de factos idênticos aos referidos em b) e relativamente aos períodos 201404 (Recurso de C.O. n.º 725/15.6 BELRS) e 12/2012 (Recurso de C.O. n.º 1188/13.6) - Consulta do SITAF, relativamente aos processos de Contra-Ordenação n.ºs 725/15.6 e 1188/13.6, que nos estão distribuídos.

6. Do objecto do recurso

Da análise da decisão recorrida e dos fundamentos invocados pela recorrente para pedir a sua alteração, podemos concluir que a questão objecto do recurso consiste em saber se, incorre em erro de julgamento e violação das normas constantes dos artigos 19.º do RGCO e 30.º 12 e 79.º do Código Penal e art.° 25° do RGIT, a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa proferida no recurso de decisão de aplicação de coima por infracção aos arts. 27º, nº1 e 41º, nº 1 do CIVA, que, perante requerimento da sociedade recorrente pedindo a apensação aos autos de vários processos de contra-ordenação pendentes no Tribunal ou ainda no Serviço de Finanças, alegadamente todos eles pela prática da mesma infracção e que, na sua perspectiva, atento o condicionalismo que rodeou a prática continuada das alegadas acções ilícitas, constituiria “infracção continuada”, determinou a anulação da decisão de aplicação de coima para que em sua substituição o órgão decisor da Administração Tributária proceda ao necessário julgamento das referidas contra-ordenações, considerando a possibilidade de aplicação do regime jurídico das infracções continuada (artº 79º, nº 1 do Código Penal, subsidiariamente aplicável nos termos do artº 3º do RGIT e 32º do RGCO).

Não conformada com o assim decidido veio a Fazenda Pública interpor o presente recurso.
A base da sua argumentação assenta nas seguintes proposições:
- Não foi relevado o facto de o imposto em causa consistir no IVA;
- Assim se o facto tributário que esteve na génese da obrigação de imposto incumprida é tratado como um facto autónomo, não repetitivo e não duradouro, também não se pode atribuir à infracção que dele dimana o carácter de infracção continuada;
- No caso concreto, não se verifica um dos pressupostos da infracção continuada - persistência de uma situação exterior que facilita a execução e que diminui consideravelmente a culpa do agente - atento o facto de o imposto em causa não ter sido suportado pela infractora, mas antes pelos seus clientes, apenas tendo aquela a obrigação de o entregar nos cofres do Estado;
- Perante várias coimas aplicadas e reportadas a várias contra-ordenações, cometidas pelo mesmo infractor, nos termos do disposto no art.° 25° do RGIT, as mesmas a serem cumuladas, são-no materialmente, o que também obsta à punição por contra-ordenação continuada.

6.1 A questão nestes termos suscitada – e que se reconduz a saber se a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa incorreu em erro de julgamento, violando designadamente os normativos constantes dos artigos 19.º do RGCO e 30.º, 12.º e 79.º do Código Penal e art.º 25.º do RGIT, ao ter anulado a decisão administrativa de aplicação da coima e determinado a baixa dos autos ao serviço de finanças para que profira nova decisão que pondere a eventual prática de contra-ordenação continuada - é em tudo idêntica à questão foi apreciada e decidida neste Supremo Tribunal Administrativo no acórdão de 31.05.2017, proferido no recurso 1302/16, interposto pela mesma recorrente, sendo idênticas as alegações de recurso e os pressupostos de facto, como idêntica é a fundamentação da sentença recorrida, pelo que se acompanhará a argumentação jurídica aduzida naquele aresto, que aliás também subscrevemos na qualidade de adjunto, por com a respectiva fundamentação concordarmos, e também tendo em vista uma interpretação e aplicação uniformes do direito (cfr. artigo 8.º n.º 3 do CC).
Será, pois, pertinente a remissão para o que sobre tal matéria se decidiu no supra citado Acórdão 1302/16.
Como ficou dito no referido aresto, «em lado algum se descortina na decisão sindicada que, in casu, se verificam ou deixam de verificar os pressupostos legais da figura da continuação criminosa. Apenas se determina que o Serviço de Finanças, perante a multiplicidade de processos semelhantes em que figura como arguida a recorrente, apure dessa eventual possibilidade que, nem a natureza do imposto não entregue (IVA), nem o disposto do artigo 25.º do RGIT, in limine exclui.
Também nós perfilhamos tal entendimento, que a doutrina e jurisprudência citadas na decisão recorrida e no parecer do Ministério Público sustentam.
O artigo 25.º do RGIT trata da punição do concurso efectivo de contra-ordenações e a sua aplicação pressupõe, logicamente, que tenham sido efectivamente cometidas várias contra-ordenações. Ora, na infracção continuada, verificados os respectivos pressupostos, há uma unificação (legal) de uma pluralidade de condutas, que constituem uma só infracção, e não infracções em concurso. Para a punição do concurso efectivo de contra-ordenações, o RGIT prevê expressamente norma especial, que se afasta da que vigora do domínio do RGCO.
Sobre a figura da infracção continuada nada diz, sendo esta aplicável por via da aplicação subsidiária do Código Penal, verificados que seja, in casu, os respectivos pressupostos.
Também não surge evidente, nem a recorrente minimamente demonstra, que o facto de em causa estar o não pagamento atempado do IVA, um imposto de obrigação única, exclua em abstracto a possibilidade de se terem como preenchidos os pressupostos da “continuação criminosa”, a saber e concretamente a verificação de uma determinação psicológica semelhante no cometimento de cada uma das infracções e a existência de um mesmo quadro externo que diminua consideravelmente a culpa do agente. A verificação, ou não, de tais pressupostos terá de ser feita caso a caso, em concreto, e não em abstracto, fundada apenas do facto de em causa estar um imposto de determinada espécie.

Acresce finalmente que, como bem diz a decisão recorrida, citando jurisprudência deste STA, ninguém melhor que a AT se encontra em condições de verificar, prima facie, se estão ou não preenchidos os pressupostos legais da infracção continuada e daí retirar as necessárias consequências, sendo esse o caso, ou, não sendo, e verificando haver in casu um efectivo concurso de contra-ordenações, proceder à respectiva punição através da aplicação de uma coima única, resultante do cúmulo material das sanções aplicadas às várias contra-ordenações em concurso, como prescreve o artigo 25.º do RGIT.» (fim de citação).

É esta a jurisprudência que se reitera, por com a respectiva fundamentação concordarmos, e, por isso, se conclui também que a decisão recorrida não merece censura e que o presente recurso não merece provimento,

7. Decisão

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 5 de Julho de 2017. – Pedro Delgado (relator) – Dulce Neto – Isabel Marques da Silva.