Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0897/11
Data do Acordão:06/14/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:IRS
DEFICIÊNCIA
ATESTADO MÉDICO
INFORMAÇÃO VINCULATIVA
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
PRINCÍPIO DA JUSTIÇA
Sumário:Aceitando a administração tributária que parte dos contribuintes que pretendem comprovar ter uma incapacidade igual ou superior a 60% a comprovem com a simples apresentação de atestado médico emitido à luz do regime anterior ao Decreto-Lei nº 202/96, de 23 de Outubro, não poderá, sob pena de violação dos princípios de igualdade e justiça material cuja observância constitucional e legalmente lhe está imposta, deixar de aceitar essa prova como bastante para todos os demais, independentemente da data em que foram notificados para apresentar tal documento comprovativo.
Nº Convencional:JSTA00067684
Nº do Documento:SA2201206140897
Data de Entrada:10/07/2011
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A......
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF BRAGA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR FISC - IRS
Legislação Nacional:DL 202/96 DE 1996/10/23
CPPTRIB99 ART55 ART57
LGT98 ART68 ART5 N2
Jurisprudência Nacional:AC TCAN PROC258/107BEBRG DE 2011/10/12; AC TCAN PROC10/100BEBRG DE 2011/11/30; AC TCAN PROC224/102BEBRG DE 2012/05/25; AC STA PROC31/92 DE 2012/06/06
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -
1 – A Fazenda Pública recorreu para o Tribunal Central Administrativo Norte da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 9 de Novembro de 2011, que julgou procedente a impugnação deduzida por A………, com os sinais dos autos, contra liquidação de IRS relativa ao ano de 2005, apresentando as seguintes conclusões:
1. A factualidade e as respectivas circunstâncias que estão na génese da emissão das conclusões da “informação vinculativa” n.º 1717/08, da D.S.I.R.S. não são idênticas às que foram alegadas pelos impugnantes, justificando e motivando aqueloutros o procedimento administrativo excepcional (não discricionário) previsto no n.º 3 daquela informação, verificados que sejam pela administração tributária, os condicionalismos e os limites aí consignados, em contraponto ao procedimento – regra, seguido pela administração fiscal, em conformidade com os n.ºs 1 e 2 da cit. Informação.
2. Ora, quanto á situação da impugnante, não esteve em questão uma impossibilidade de, em 2007, obter um novo atestado médico de incapacidades ao abrigo da Tabela Nacional de Incapacidades aprovada pelo D.L. 341/93, de 30.09, complementada pelas normas e critérios essencialmente previstos no D.L. n.º 302/96, de 23.10, sendo que não foram trazidos ao processo o resultado dessa eventual avaliação a que a impugnante se poderia submeter em 2007, tendo em vista a apresentação desse novo atestado médico de incapacidade.
3. A situação da impugnante mantém, tal como é configurada pela impugnante e considerando os factos, dados como assentes, no probatório, não se enquadra no âmbito material da excepção consignada em 3. da dita informação vinculativa.
4. O âmbito da excepção, balizado temporalmente e em pressuposto concretos, constitui em si mesmo um limite ao arbítrio da administração tributária no que concerne à aceitação (ou não) de uma prova (ou meio de prova) de uma deficiência fiscalmente relevante.
5. A alteração dos rendimentos declarados em 2005, nos termos do artigo 66º do CIRS, como acto prévio e pressuposto da liquidação impugnada, foi motivada e justificada na lei e jurisprudência consolidada nos tribunais superiores (STA e T.C.A.), em consonância, aliás, também com os princípios consignados em 1. a 2. da que viria a ser a informação nº 1717/08.
6. A excepção, consignada em 3. da dita informação, não constitui um poder discricionário da administração, mas vinculado e legal, pelo que não faz sentido falar em violação do princípio da igualdade, quando se tratou, in casu, uma situação igual de forma igual à de tantos outros contribuintes.
7. Também não foi, in casu, afrontado o princípio da justiça material, na medida a que o alegado direito a benefícios fiscais sempre dependeria da comprovação, de forma legalmente válida, dos pressupostos do direito a esses benefícios, ónus do contribuinte e que, porém, não se mostra satisfeito.
8. Assim, por inadequada valoração da factualidade relevante, dada como assente, e na indevida subsunção, aos princípios da igualdade e da justiça, terá sido feito errado julgamento.

2 – Por Acórdão de 22 de Junho de 2011 (fls. 113 a 118 dos autos) o Tribunal Central Administrativo Norte declarou-se incompetente em razão da hierarquia para conhecimento do recurso e para tal competente o Supremo Tribunal Administrativo, sendo os autos remetidos a este Supremo Tribunal precedendo requerimento da recorrente dessa remessa (cfr. fls. 126 dos autos).

3 - Não foram apresentadas contra-alegações.

4 - O Excelentíssimo Procurador-Geral adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer nos seguintes termos:
Está em causa a aplicação do Dec.-Lei n.º 202/96, de 23/10, nos termos em que foi recusada pelo Mmº juiz do Tribunal administrativo e Fiscal de Braga, quanto à exigência de novo atestado médico comprovativo de incapacidade para efeitos do I.R.S. do ano de 2005.
Certo é que da matéria de facto provada não resulta em que ano ocorreu a exigência do dito novo atestado, o que se afigura que teria interesse considerar.
É sabido que após a publicação daquele diploma se firmou o entendimento foi firmado em vários acórdãos do S.T.A., alguns dos quais do Pleno, no sentido de que, após o Dec.-Lei n.º 202/96, de 23/10, a administração Tributária (A.T.), podia exigir novo atestado médico que afirmasse a existência de uma incapacidade e respectivo grau, nos termos que passou aí especificamente a dispor-se – no sentido de que quanto a casos anteriores “este regime legal não é materialmente inconstitucional, à face do princípio da segurança jurídica “decidiu ainda o ac. do S.T.A. de 10-9-08, proferido no proc. 0474/05, ponto VII.
Com efeito, anteriormente recorria-se ao previsto nas Tabelas Nacionais de Incapacidades aprovadas pelo D.L. n.º 43189, de 23/9/60 e DL 341/93, de 30/9, na falta de legislação específica.
Afigura-se que tal entendimento não parece resultar prejudicado no caso em apreciação, no qual foi ainda considerada uma 2informação vinculativa” da A.T. de 12-12-2008.
Nesta se estabelecem procedimentos a adoptar face a uma nova tabela que foi aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/07, de 23/10, em termos de não ser exigível o dito atestado, a título excepcional, em 2008, mesmo relativamente a anos anteriores, por manifesta impossibilidade de os obter.
À dita informação que vincula directamente os serviços, nos termos do n.º 4 do art. 68º da L.G.T., apenas são de reconhecer alguns direitos a terceiros, relacionadas com a boa fé e a sua não aplicação retroactiva – cfr. ainda n.ºs 5 e 6.
Sem mais, afigura-se não ser possível concluir, nos termos que se fez, no sentido da sua aplicação resultar uma situação injustificadamente discriminatória, por contrária aos princípios da igualdade e da justiça material.
Com efeito, “também por exigência do princípio da igualdade se impõe que aos factos tributários ocorridos no mesmo momento seja dado idêntico tratamento” e que “as mudanças de orientações genéricas da A.T. não impeçam a aplicação das anteriores orientações a todos os factos ocorridos no período em que elas estiveram em vigor” – assim, prof. Leite de Campos e outros em L.G.T. Anotada e Comentada, 3.ª ed. p. 344-5.
Nestes termos, afigura-se que o recurso é de proceder, termos em que é de revogar a decisão proferida que julgou anulou a liquidação, a qual deve ser mantida.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

- Fundamentação -
5 – Questão a decidir
É a de saber se a sentença recorrida enferma do erro de julgamento que lhe é imputado pela Fazenda Pública ao ter decidido que os princípios da igualdade e da justiça material impõem que, tendo-se a Administração tributária auto-vinculado a aceitar os atestados comprovativos de incapacidade emitidos em data anterior ao Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de Outubro para comprovação de deficiência fiscalmente relevante relativamente aos anos de 2004 a 2007 e relativamente aos contribuintes notificados para os apresentarem em 2008 (cfr. o n.º 3 da informação vinculativa n.º 1717/08, da D.S.I.R.S.), não poderá deixar de os aceitar também quando em causa esteja IRS relativo aos mesmos anos independentemente da data da notificação e da alegação da impossibilidade de os obterem.

6 – Matéria de facto
Na sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga objecto de recurso os seguintes factos:
1 – Oportunamente, a impugnante apresentou a declaração de rendimentos mod. 3 de IRS, para o ano de 2006, na qual fez constar a existência de doença fiscalmente relevante, geradora de uma incapacidade superior a 60% daí retirando o correspondente benefício fiscal.
2 – A referida doença encontrava-se documentada por atestado resultante de uma junta médica realizada em 09-03-1993.
3 – Após o devido procedimento, que incluiu a prévia audiência do impugnante, a Administração Tributária concluiu que o referido atestado não constituía prova documental bastante da doença em causa, susceptível de justificar o benefício fiscal correspondente, pelo que emitiu a liquidação oficiosa relativa ao ano de 2005, objecto dos presentes autos.
4 – Em 12-12-2008 foi estatuída nos termos legais pela Administração Tributária, uma informação vinculativa sobre o assunto “Comprovação da deficiência fiscalmente relevante. Validade dos atestados de incapacidade emitidos em data anterior à da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de Outubro”, com o seguinte teor:
“1. A prova da deficiência para fins fiscais tem de ser efectuada de acordo com os critérios técnico-legais que vigoram no último dia do período de tributação, pelo que os atestados de incapacidade emitidos anteriormente à entrada em vigor do decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de Outubro, não são válidos para comprovar a deficiência fiscalmente relevante, relativamente ao ano fiscal de 1996 e posteriores.
2. Não se pode aceitar como princípio a validade automática dos documentos que certificam deficiências quando as regras ao abrigo das quais foram emitidos foram substituída por outras que são susceptíveis de interferir com as medida da invalidez permanente, a fixar através do acto de avaliação.
3. Porém, face à alegada impossibilidade de os sujeitos passivos obterem em 2008 uma declaração de incapacidade ao abrigo do Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de Outubro, uma vez que em Janeiro entrou em vigor uma nova Tabela de Incapacidades, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de Outubro, deverá a Administração Tributária, a título excepcional, aceitar os atestados de incapacidade emitidos ao abrigo da legislação vigente à data da verificação da deficiência, para comprovação das situações relativas aos anos de 2004 a 2007, no âmbito das notificações efectuadas aos sujeitos passivos no decurso de 2008.”

7 – Apreciando
7.1 Do alegado erro de julgamento da sentença recorrida
A sentença recorrida, a fls. 56 a 59 dos autos, julgou procedente a impugnação de IRS deduzida pela ora recorrida contra liquidação oficiosa de IRS do ano de 2005 no valor de €2.892,16, justificando o decidido nos termos seguintes (cfr. sentença recorrida, a fls. 58 e 59):
«A situação em causa nos presentes autos é de fácil configuração.
O que se passa é que um contribuinte, portador de deficiência física susceptível de lhe conferir benefício fiscal, comprovada por atestado de incapacidade emitido em data anterior à da entrada em vigor do decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de Outubro, não diligenciou, posteriormente à entrada em vigor deste diploma, pela obtenção de novo atestado, continuando, todavia a fazer constar da sua declaração de rendimentos a deficiência em causa, deduzindo o competente benefício fiscal.
A Administração Tributária não aceita o referido atestado de incapacidade emitido em data anterior à da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de Outubro, e desconsidera o benefício fiscal, pretendido pelo contribuinte.
A este respeito, sobre a “Validade dos atestados de incapacidade emitidos em data anterior à da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de Outubro”, conforme resulta do probatório, a Administração Tributária emitiu informação vinculativa a determinar que deverá a Administração Tributária, a título excepcional, aceitar os atestados de incapacidade emitidos ao abrigo da legislação vigente à data da verificação da deficiência, para comprovação das situações relativas aos anos de 2004 a 2007, no âmbito das notificações efectuadas aos sujeitos passivos no decurso de 2008.”.
Esta informação vincula a própria Administração Tributária perante todos os contribuintes, nos termos dos artigos 55.º e 57.º do CPPT e 68.º da LGT, e aplica-se directamente à liquidação de IRS do ano de 2005, abrangida no âmbito temporal da mesma.
Entende a Fazenda pública, sufragada pelo Ministério Público, que a referida informação versa sobre situações excepcionais, que tenham sido alvo de notificação em procedimento inspectivo ocorrido no ano de 2008, e em que haja sido alegado pelo contribuinte a impossibilidade de obter atempadamente um atestado válido, emitido ao abrigo do DL 202/96 de 23-10.
Todavia, a diferenciação de tratamento para as restantes situações, seria, sempre, injustificadamente discriminatória, e, por isso, contrária aos princípios da igualdade e da justiça material, consagrados no art.º 5.º/2 da LGT.
Ou seja, nem uma nem outra das circunstâncias referidas poderá justificar a diferença de tratamento entre os contribuintes.
Isto é, nem a diferente data da notificação levada a cabo pela Administração tributária, nem o eventual silêncio do contribuinte em sede procedimental poderão justificar um tratamento diferente face aos restantes directamente abrangidos pela informação em causa.
Daí que, considerando a Administração Tributária que os atestados de incapacidade emitidos em data anterior à da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de Outubro, são idóneos para documentar deficiência fiscalmente relevante para efeitos de atribuição de benefícios fiscais, para os anos de 2004 a 2007, quando as notificações para a sua apresentação se tenham dado em 2008, necessariamente (por identidade de razão) que há-de considerar os mesmos idóneos para prova da deficiência fiscalmente relevante para efeitos de atribuição de benefícios fiscais para os mesmos anos, quando a notificação se haja dado noutra altura, sob pena de cair no arbítrio e violação dos supra-referidos princípios.
Deve por isso a impugnação proceder» (fim de citação)
Discorda do decidido a Fazenda Pública, imputando à sentença recorrida erro de julgamento, por inadequada valoração da factualidade relevante, dada como assente, e (…) indevida subsunção, aos princípios da igualdade e da justiça, porquanto a factualidade e as respectivas circunstâncias que estão na génese da emissão das conclusões da “informação vinculativa” n.º 1717/08, da D.S.I.R.S. não são idênticas às que foram alegadas pelos impugnantes, não se enquadrando a situação da impugnante no âmbito material da excepção consignada em 3. da dita informação vinculativa, sendo que o âmbito da excepção, balizado temporalmente e em pressuposto concretos, constitui em si mesmo um limite ao arbítrio da administração tributária no que concerne à aceitação (ou não) de uma prova (ou meio de prova) de uma deficiência fiscalmente relevante, mais alegando que a excepção, consignada em 3. da dita informação, não constitui um poder discricionário da administração, mas vinculado e legal, pelo que não faz sentido falar em violação do princípio da igualdade, quando se tratou, in casu, uma situação igual de forma igual à de tantos outros contribuintes e que também não foi, in casu, afrontado o princípio da justiça material, na medida a que o alegado direito a benefícios fiscais sempre dependeria da comprovação, de forma legalmente válida, dos pressupostos do direito a esses benefícios, ónus do contribuinte e que, porém, não se mostra satisfeito.
Vejamos.
Não oferece dúvidas que a situação dos autos não é directamente contemplada pela regra enunciada no n.º 3 da informação vinculativa n.º 1717/08, da D.S.I.R.S. nos termos da qual deverá a Administração Tributária, a título excepcional, aceitar os atestados de incapacidade emitidos ao abrigo da legislação vigente à data da verificação da deficiência, para comprovação das situações relativas aos anos de 2004 a 2007, no âmbito das notificações efectuadas aos sujeitos passivos no decurso de 2008 (sublinhados nossos).
Como resulta da sua letra, a regra do n.º 3 da referida informação apenas é directamente aplicável no âmbito das notificações efectuadas aos sujeitos passivos no decurso de 2008, e embora não conste do probatório fixado a data em que a recorrida foi notificada para apresentar atestado médico certificativo da sua deficiência, ela própria assume na sua petição de impugnação que o foi em 2007 (cfr. o números 9 e 13 da petição inicial de impugnação, a fls. 3 e 4 dos autos), decorrendo do doc. n.º 5 junto com a mesma (e bem assim do processo administrativo junto aos autos) que terá sido por ofício datado de 11 de Setembro de 2007 notificada para o exercício do direito de audição prévia relativamente ao IRS do ano de 2003, 2004 e 2005 (cfr. fls. 2 do processo administrativo).
O que se decidiu, porém, não foi que a situação dos autos estava directamente abrangida pela excepção consignada pelo n.º 3 da informação vinculativa, antes que «(…) considerando a Administração Tributária que os atestados de incapacidade emitidos em data anterior à da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 202/96, de 23 de Outubro, são idóneos para documentar deficiência fiscalmente relevante para efeitos de atribuição de benefícios fiscais, para os anos de 2004 a 2007, quando as notificações para a sua apresentação se tenham dado em 2008, necessariamente (por identidade de razão) que há-de considerar os mesmos idóneos para prova da deficiência fiscalmente relevante para efeitos de atribuição de benefícios fiscais para os mesmos anos, quando a notificação se haja dado noutra altura, sob pena de cair no arbítrio e violação dos supra-referidos princípios» (da igualdade e da justiça material).
Ora, ao contrário do alegado, parece-nos que assim é efectivamente.
Respeitando a liquidação impugnada a um ano – 2005 – relativamente ao qual a Administração tributária se auto-vinculou, nos termos dos artigos 55.º e 57.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 68.º da Lei Geral Tributária, a aceitar como válidos, para efeitos comprovação da incapacidade fiscalmente relevante atendível para efeitos de IRS, nos termos do artigo 16.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (então vigente), os atestados de incapacidade emitidos em data anterior à da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 202/96, de 23 de Outubro apresentados pelos sujeitos passivos notificados para os apresentar em 2008 – e independentemente da alegação e/ou prova da impossibilidade de os obterem naquele ano, pois que tais circunstâncias apenas aparecem referidas como justificativas da consagração do regime excepcional (cfr. a parte inicial do n.º 3 da informação) não havendo razão para se não crer na alegação da recorrida de fls. 49 dos autos, aliás verosímil, de que a impossibilidade dos sujeitos passivos obterem a declaração de incapacidade ao abrigo do D-Lei nº 202/96, já se verificava no ano de 2007, sendo que a informação refere apenas o ano de 2008, uma vez que se trata de um processo de 2008 -, não parece que os princípios da igualdade e da justiça material consintam na não extensão de idêntico tratamento apenas em razão de o contribuinte ter sido notificado para apresentar o novo atestado alguns meses antes do início do ano de 2008. É que, como tem reiteradamente afirmado o Tribunal Central Administrativo Norte em (múltiplos) casos de contornos idênticos (cfr. a título de exemplo, os Acórdãos do TCA-Norte de 12 de Outubro de 2011, rec. n.º 258/10.7BEBRG, de 30 de Novembro de 2011, rec. n.º 10/10.0BEBRG e de 25 de Maio de 2012, rec. n.º 224/10.2BEBRG), «(…) a exclusão da aplicação desse regime excepcional de um contribuinte assente no facto de ter sido antes de 2008 notificado para fazer essa prova (…) conduziria inaceitavelmente à aplicação de dois regimes totalmente distintos para situações materialmente iguais e com consequências graves já que a parte dos contribuintes objecto de acção inspectiva relativamente ao ano de IRS de 2004» - ou outro dos anos abrangido no âmbito da excepção - « (…), que tivessem declarado serem titular de benefício fiscal por serem portador de incapacidade igual ou superior a 60%, a Administração aceita o atestado apresentado ou a apresentar emitido em data anterior a Outubro de 1996; aos demais, colocados exactamente na mesma circunstância (inspecção), a administração não aceita os referidos atestados como bastantes e procede a nova liquidação, ficando a sorte dos mesmos dependente do momento em que a própria administração entendeu fazer essa inspecção, emitir um ofício ou do contribuinte ser mais ou menos expedito a receber (ou não receber) essa mesma carta ou a invocar que já não podia obter esse atestado. Ou seja, não pode ser tudo deixado ao arbítrio da oportunidade da actuação inspectiva e de circunstâncias voláteis e irrelevantes do ponto de vista de uma justa e igual justiça tributária».
O ano em que o contribuinte foi notificado (de 2008 ou outro) para a apresentação de atestado médico para comprovação de deficiência fiscalmente relevante emitido nos termos do Decreto-Lei n.º 202/96 de 23 de Outubro não constitui, pois, critério material bastante para fundamentar a diversidade de tratamento dos contribuintes relativamente aos mesmos períodos de tributação, resultando da aplicação de tal critério uma diferenciação de tratamento entre contribuintes em situação substancialmente igual injustificada e contrária ao princípio da justiça, princípios a cuja observância a Administração tributária está vinculada no exercício das suas funções (cfr. o n.º 2 do artigo 266.º da Constituição da República e o artigo 55.º da Lei Geral Tributária), designadamente na emissão de informações vinculativas e sua aplicação a casos semelhantes.
No mesmo sentido decidiu este Supremo Tribunal no recente Acórdão do passado dia 6 de Junho, proferido no rec. n.º 31/12.
Ao contrário do implicitamente alegado pela recorrente (cfr. conclusão 5 das suas alegações de recurso) o decidido quanto à necessária extensão do âmbito da excepção consagrada no n.º 3 da informação vinculativa mercê do princípio da igualdade e da justiça de modo algum afronta a jurisprudência consolidada deste Supremo Tribunal no sentido de que, após a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 202/96 de 23 de Outubro, não era ilegal a exigência de novo atestado nos termos do Decreto-Lei n.º 202/96 para comprovação de deficiência fiscalmente relevante. É que se este Supremo Tribunal sancionou tal exigência, certo é que nunca a impôs, pois que cabe à Administração, desde que observe a Constituição e a lei, verificar os pressupostos do facto tributário ou do direito a benefícios fiscais. Contudo, se Administração se auto-vinculou perante os contribuintes a excepcionalmente aceitar como meio de prova da deficiência fiscalmente relevante para efeitos de IRS dos anos de 2004 a 2007 os atestados de incapacidade emitidos ao abrigo da legislação vigente à data da verificação da deficiência, cabe aos tribunais verificar, quando para tal solicitados, se daí não resulta tratamento discriminatório dos demais contribuintes merecedores de tratamento idêntico, e sancionar tal discriminação, quando ocorra, invalidando os actos que a traduzam.

O recurso não merece, pois, provimento.
- Decisão -
8 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 14 de Junho de 2012. - Isabel Marques da Silva (relatora) - Lino Ribeiro - Dulce Neto.