Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01474/21.1BELRS
Data do Acordão:02/16/2022
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL
SUSPENSÃO
PEDIDO DE REVISÃO
PRINCÍPIO DA TUTELA JUDICIAL EFECTIVA
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
Sumário:I - O pedido de revisão oficiosa efectuado ao abrigo do disposto no art. 78.º, n.º 1, 2.ª parte, da LGT, não tem o efeito suspensivo da cobrança da prestação tributária a que se refere o art. 52.º, n.º 1, da mesma lei e o art. 196.º do CPPT, ainda que o pagamento da dívida exequenda e do acrescido se encontre garantido, a menos que seja apresentado no prazo da reclamação graciosa, caso em que equivale a esta e, por isso, pode ser considerado como “reclamação” para efeitos de suspensão da execução fiscal.
II - Esta solução legislativa – de não conferir efeito suspensivo ao pedido de revisão efectuado para além do referido prazo, mesmo que o pagamento da dívida exequenda e do acrescido esteja garantido –, não só resulta da falta de previsão do pedido de revisão oficiosa no texto da lei (art. 52.º, n.º 1, da LGT e art. 196.º, n.º 1, do CPPT), como também se mostra conforme a outras soluções legislativas, designadamente a que resulta da conjugação dos n.ºs 1 e 4, alínea b), do art. 49.º da LGT.
III - Por outro lado, essa solução não se mostra desajustada, na medida em que, enquanto os meios impugnatórios indicados no art. 52.º da LGT e no art. 196.º do CPPT têm de ser deduzidos dentro de prazos relativamente curtos, o pedido de revisão oficiosa pode ser apresentado até quatro anos após a liquidação ou até a qualquer momento, se não tiver havido pagamento do tributo (cfr. 2.ª parte do n.º 1 do art. 78.º da LGT), o que significa que, a ser-lhe concedido efeito suspensivo da execução fiscal, existiriam consequências negativas relevantes ao nível da segurança jurídica e da celeridade na cobrança das receitas tributárias prosseguida pela execução fiscal.
IV - Tal solução também não afecta a tutela judicial efectiva pois o legislador não deixa de ser livre de conformar aqueles meios, não sendo de todo o modo obrigado a prever meios iguais para situações diversas, considerando ainda que a identidade ou diversidade das situações em presença há-de resultar de uma perspectiva global que tenha em conta a multiplicidade de interesses em causa, alguns deles conflituantes entre si.
V - Nem tão pouco é afrontado o princípio da igualdade pois este reconduz-se a uma proibição de arbítrio sendo inadmissíveis quer a diferenciação de tratamento sem qualquer justificação razoável, de acordo com critérios de valor objectivos, constitucionalmente relevantes, quer a identidade de tratamento para situações manifestamente desiguais. A proibição de arbítrio constitui um limite externo da liberdade de conformação ou de decisão dos poderes públicos, servindo o princípio da igualdade como princípio negativo de controlo.
VI - obviamente que o entendimento sobre a diferenciação de regimes, para efeitos de suspensão da execução fiscal, entre os pedidos de revisão do acto tributário no prazo da reclamação administrativa e fora desse prazo, não é abrangida pelos parâmetros conceituais do princípio da igualdade já que não se vislumbra em que termos a disciplina jurídica assim concebida diferencie pessoas e situações que mereçam tratamento igual ou, inversamente, que igualize pessoas e situações que mereçam tratamento diferente.
Nº Convencional:JSTA000P28984
Nº do Documento:SA22022021601474/21
Data de Entrada:11/23/2021
Recorrente:A..............., LDA
Recorrido 1:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


1. – Relatório

Vem interposto recurso jurisdicional pela Sociedade Comercial A……………, Ld.ª, com os demais sinais dos autos, visando a revogação da sentença de 28-09-2021, do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou a reclamação deduzida não provida e improcedente, mantendo, na ordem jurídica o despacho proferido pelo Chefe de Divisão da DGCT da UGC da AT, que, no âmbito do PEF n.º 3344201601120166, indeferiu o pedido formulado pela Reclamante, de manutenção da suspensão da execução fiscal até à decisão definitiva do pedido de revisão oficiosa dos actos tributários, tendo em vista a cobrança coerciva de uma dívida ao Fundo Sanitário e de Segurança Alimentar Mais (FSSAM), relativa a Taxa de Segurança Alimentar Mais (TSAM), referente ao ano 2014 e no valor de € 2 532 621,36.

Inconformado, nas suas alegações, formulou a recorrente Sociedade Comercial A……………, Ld.ª, as seguintes conclusões:

1. Não há nenhuma distinção relevante entre o pedido de revisão apresentado dentro do prazo de reclamação graciosa e o mesmo pedido apresentado para lá desse prazo. Isto, segundo a grelha de análise que aqui importa – ou seja, tendo em consideração os princípios que formam a razão de ser do enquadramento do pedido de revisão no n.º 1 do artigo 169º do CPPT.
2. Se se queria evitar aquela dualidade de efeitos relativamente a meios legais com a mesma razão de ser (o pedido de revisão e a reclamação graciosa, nomeadamente), em nome dos princípios da igualdade e da tutela jurisdicional efectiva de direitos e interesses legalmente protegidos, então o pedido de revisão oficiosa também deveria ser considerado dentro do âmbito daquele dispositivo.
3. Com efeito, a lei, devidamente explicada e densificada pela doutrina e pela jurisprudência, trata este pedido como um expediente normal, próprio, típico e principal de contestação da legalidade de actos tributários, tanto quanto o pedido de revisão dentro do prazo de reclamação administrativa.
4. A doutrina em que nos vimos apoiando, assim como a Sentença recorrida, diz que, do ponto de vista da natureza, da função e dos efeitos, as duas versões do pedido de revisão de actos tributários são iguais, uma vez que a razão material de ser, de uma e de outra, é exactamente a mesma
5. É por isso que, segundo a doutrina e a jurisprudência, em ambas as versões do pedido de revisão os contribuintes podem contestar os actos com base em matéria de facto ou de direito. É por isso que em ambas as versões o erro de direito ou de facto se presume imputável aos serviços da AT. É por isso que em ambas versões o indeferimento expresso ou tácito abre a via da impugnação contenciosa.
6. Dúvidas não restam de que, na ausência do pedido de revisão da letra do n.º 1 do artigo 169º do CPPT, o seu conteúdo, devidamente integrado, teria de prever quer o pedido de revisão apresentado dentro prazo de “reclamação administrativa” quer o pedido deduzido para lá desse prazo, porque, à luz das razões de justiça material que recomendam a inclusão do primeiro, não é legitimamente possível deixar de fora o segundo, relativamente ao qual se aplicam as mesmas razões de justiça material.
7. E não se diga que a inclusão do primeiro tem arrimo na letra da lei (que fala em “reclamação administrativa”) e que o princípio da interpretação segundo o qual não se pode fazer uma interpretação que não tenha um mínimo de correspondência na letra da lei recomendava a abertura da norma apenas ao pedido feito dentro do prazo de “reclamação administrativa”.
8. É que, em primeiro lugar, o pedido de revisão também não é uma reclamação administrativa: a sua inclusão no âmbito de aplicação do n.º 1 do artigo 169º do CPPT não decorre de uma interpretação sobre o seu respaldo literal, mas sim de um raciocínio de equiparação à natureza, função e efeitos da reclamação graciosa, com base nos princípios da igualdade no acesso ao direito, conjugado com o da tutela jurisdicional efectiva de direitos e interesses legalmente protegidos (se o pedido de revisão é a mesma coisa que a reclamação graciosa, então se for apresentado no mesmo prazo pode suspender a execução). Daí que não haja qualquer razão para afastar da previsão da norma o pedido de revisão deduzido em momento posterior ao fim do prazo de reclamação graciosa: este, quanto à sua natureza, função e efeitos, também já é equiparado à reclamação graciosa.
9. De resto, em segundo lugar, obviamente que aquele princípio de interpretação da lei, por muito relevante que seja, não se pode sobrepor aos princípios constitucionais de primeiríssima importância que aqui em jogo.
10. Nestes termos, o n.º 1 do artigo 169º do CPPT é inconstitucional, por violação dos princípios constitucionais da igualdade, na dimensão de igualdade no acesso ao direito, consagrado no artigo 13º da CRP, e da tutela jurisdicional efectiva de direitos e interesses legalmente protegidos, consagrado no artigo 20º e no n.º 4 do artigo 268º da CRP.
11. Assim sendo, o mesmo deve aplicado neste caso como permitindo a suspensão do presente processo executivo em virtude da dedução do pedido de revisão de acto tributário apresentado.
Termos em que o presente recurso deve ser julgado procedente, por provado, com a revogação da Sentença recorrida e as demais consequências legais.

Não houve contra-alegações.

Neste Supremo Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso, no seguinte parecer:


INTRODUÇÃO
A………….., Lda. vem interpor o presente recurso jurisdicional da douta sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, datada de 28 de Setembro de 2021, que julgou improcedente a Reclamação por si deduzida, ao abrigo do disposto no artigo 276º, do CPPT, do despacho proferido pelo Chefe de Divisão da Gestão do Créditos Tributários da Unidade dos Grandes Contribuintes da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Que no âmbito do processo de execução fiscal nº 3344201601120166, contra si instaurado pelo Serviço de Finanças de Lisboa 11, para cobrança coerciva de dívida relativa à Taxa de Segurança Alimentar Mais (TSAM), do ano de 2014, no montante de €2.532,36, lhe indeferiu o pedido de manutenção da suspensão da execução fiscal e, consequentemente, determinou a execução da garantia bancária nela prestada (cf. fls. 230 a 248 do SITAF).
Como melhor se alcança da análise da motivação sub judice, a Recorrente, invocando, erro de julgamento da matéria de direito, pretende com o presente recurso jurisdicional a revogação por este tribunal ad quem da, aliás, douta sentença proferida pelo tribunal a quo,
Por entender que o procedimento de revisão oficiosa apresentado fora do prazo da reclamação administrativa consubstancia uma reclamação nos termos estabelecidos no artigo 52º nº1 da LGT e no artigo 169º do CPPT
E, como tal, tem a virtualidade de permitir a suspensão da execução fiscal,
E que a interpretação contrária viola os princípios da igualdade, na dimensão de igualdade no acesso ao direito, consagrado no artigo 13º da Constituição, e da tutela jurisdicional efectiva, consagrado no artigo 20º e nº4 do artigo 268º da Constituição da República.
Ora resulta expressamente da lei e é univocamente reconhecido pela jurisprudência que o âmbito do presente recurso se encontra delimitado pelas conclusões extraídas da motivação, por parte do recorrente, não podendo o tribunal ad quem conhecer de matéria nelas não inserida, ressalvados os casos do seu conhecimento oficioso, de harmonia com as disposições conjugadas dos artigos 282º, nº 5 a 7 do CPPT e 635º, nº 4, do CPC, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, aqui aplicável ex. vi do artigo 281º do CPPT.
Cumpre-nos, pois, emitir parecer
DO MÉRITO DO RECURSO
Como referimos supra, a questão que cumpre apreciar e decidir consiste assim em saber se a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao julgar que o procedimento de revisão oficiosa apresentado fora do prazo da reclamação administrativa não consubstancia uma reclamação nos termos estabelecidos no artigo 52º nº1 da LGT e no artigo 169º do CPPT
E, como tal, não tem a virtualidade de permitir a suspensão da execução fiscal,
E bem assim se tal interpretação viola os princípios da igualdade, na dimensão de igualdade no acesso ao direito, consagrado no artigo 13º da Constituição, e da tutela jurisdicional efectiva, consagrado no artigo 20º e nº4 do artigo 268º da Constituição da República.
Vejamos.
Ora, a questão nestes termos suscitada é em tudo idêntica à questão foi apreciada e decidida neste Supremo Tribunal Administrativo no Acórdão de 5/12/2018, proferido no recurso 261/18.9BEVIS,disponível em www.dgsi.pt.
Nele se tendo decidido que o pedido de revisão oficiosa efectuado ao abrigo do disposto no artigo 78.º, n.º 1, 2.ª parte, da LGT, não tem o efeito suspensivo da cobrança da prestação tributária a que se refere o artigo 52.º, n.º 1, da mesma lei e o artigo 196º .
Ainda que o pagamento da dívida exequenda e do acrescido se encontre garantido, a menos que seja apresentado no prazo da reclamação graciosa, caso em que equivale a esta e, por isso, pode ser considerado como “reclamação” para efeitos de suspensão da execução fiscal.
Assim e no que respeita à interpretação que o tribunal “a quo” fez do disposto no nº1 do artigo 169º do CPPT, ao restringir ao pedido de revisão oficiosa apresentado no prazo de reclamação administrativa a possibilidade de suspensão da execução fiscal, mediante a prestação de garantia que garanta a dívida exequenda e acrescido.
A mesma está conforme a jurisprudência deste tribunal e doutrina abalizada.
Realçando a citação do Exmo. Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, quando afirma que “…nos casos em que foi ultrapassado o prazo legal de impugnação do ato de liquidação, a revisão do ato tributário não constitui um verdadeiro meio de impugnação, pois não tem os efeitos próprios dos meios impugnatórios, que se reconduzem à destruição retroativa dos efeitos do ato anulado, consubstanciada na “reconstituição da legalidade do ato ou situação objeto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso (art. 100.º da LGT), juros estes contados desde o pagamento indevido até à emissão da respetiva nota de crédito (art. 61.º, n.º 3, do CPPT)” (CPPT, Anotado e Comentado, 6ª edição, volume III, pág. 210).
No mesmo sentido, os Acórdãos deste STA de 26/03/2013, 5/02/2015 e 9/01/2019 proferidos, respectivamente nos processos 0158/13, 01533/14 e 0258/18.9BEVIS, também disponíveis em www.dgsi.pt.
Não vemos razão para alterar tal entendimento, que merece a nossa concordância e cuja fundamentação jurídica tem plena aplicação no caso vertente.
Considera ainda Recorrente que a interpretação do artigo 169º, nº1, do CPPT feita na sentença recorrida padece de vício de inconstitucionalidade, por violação do princípio da igualdade, na dimensão de igualdade no acesso ao direito, consagrado no artigo 13º da Constituição, e do princípio da tutela jurisdicional efetiva, consagrado no artigo 20º e no nº4 do artigo 268º da Constituição da República.
Ora a Recorrente limita-se a invocar a violação de tais princípios, sem especificar os termos em que se verifica essa violação.
Assim sendo, não se vislumbra em que termos os princípios da igualdade da tutela jurisdicional efetiva, tal qual são compreendidos na jurisprudência do Tribunal Constitucional, são afectados pela interpretação efetuada na sentença recorrida.
Com efeito, como é mencionado na doutrina citada, o artigo 169º, nº1, do CPPT não prevê expressamente o “pedido de revisão do ato tributário” como meio processual que, tendo por objeto a impugnação da legalidade da dívida exequenda, constitua condição para a suspensão da execução fiscal.
E só por interpretação extensiva se incluiu o mesmo naquela previsão, o que pressupõe que reúna os requisitos de equiparação à reclamação graciosa.
A opção por tais meios impugnatórios compreende-se na liberdade de conformação do legislador, que não é arbitrária, nem desproporcional aos fins visados, atenta a excepcionalidade da suspensão de execução fiscal (artigo 85º, nº3, do CPPT).
Como tem sido entendimento do Tribunal Constitucional, embora esteja vinculado a criar meios jurisdicionais de tutela efetiva dos direitos e interesses ofendidos dos cidadãos, “o legislador não deixa de ser livre de os conformar, não sendo de todo o modo obrigado a prever meios iguais para situações diversas, considerando ainda que a identidade ou diversidade das situações em presença há-de resultar de uma perspectiva global que tenha em conta a multiplicidade de interesses em causa, alguns deles conflituantes entre si” (cf. acórdão do TC n.º 63/2003).
Por outro lado não se alcança em que termos é violado o princípio da igualdade.
Como se salientou no acórdão do TC n.º 750/95 “O princípio da igualdade reconduz-se […] a uma proibição de arbítrio sendo inadmissíveis quer a diferenciação de tratamento sem qualquer justificação razoável, de acordo com critérios de valor objectivos, constitucionalmente relevantes, quer a identidade de tratamento para situações manifestamente desiguais. A proibição de arbítrio constitui um limite externo da liberdade de conformação ou de decisão dos poderes públicos, servindo o princípio da igualdade como princípio negativo de controle”.
Ora, seguramente que o entendimento sobre a diferenciação de regimes, para efeitos de suspensão da execução fiscal, entre os pedidos de revisão do ato tributário no prazo da reclamação administrativa e fora desse prazo, não é abrangida pelos parâmetros conceituais do princípio da igualdade.
Ou seja, não se vislumbra em que termos a disciplina jurídica assim concebida diferencie pessoas e situações que mereçam tratamento igual ou, inversamente, que igualize pessoas e situações que mereçam tratamento diferente.
Em suma, entendemos que a interpretação efetuada pelo tribunal “a quo” e vertido na douta sentença recorrida do artigo 169º, nº1, do CPPT, não viola os assinalados princípios da tutela jurisdicional efetiva e da igualdade.
Nesta conformidade, entendemos que o recurso não merece provimento
CONCLUSÃO
Termos em que, com os fundamentos expostos deverá ser negado provimento ao recurso e, em consequência, manter-se integralmente a douta sentença recorrida.

A Recorrente veio requerer a junção aos autos da petição inicial da impugnação judicial do indeferimento tácito do pedido de revisão de acto tributário referida a fls. 7 das alegações de recurso, a qual corre termos no Tribunal Tributário de Lisboa sob o n.º 2157/21.8BELRS.

Notificada do requerimento, a Representante da Fazenda Pública veio expor e requerer o seguinte:

1.º
Vem a Reclamante [ora Recorrente] requerer a junção aos autos de cópia da petição inicial da impugnação judicial movida contra o indeferimento tácito do pedido de revisão apresentado contra a Taxa de Segurança Alimentar Mais [TSAM] do ano de 2014.
2.º
Sendo que, considerando o teor das alegações [mais concretamente o alegado a fls. 7], deduz a RFP que a Recorrente pretende sanar “o caso vertente segundo os princípios da sentença recorrida”.
3.º
Ora, dada a pertinência quanto a esta matéria, a RFP socorre-se do decidido no âmbito do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo [STA], no âmbito do processo 0427/17, em 03/05/2017, onde se pode ler que “não tendo o pedido de revisão oficiosa, deduzido ao abrigo do disposto no segmento final do nº 1 do art. 78° da LGT, a virtualidade de determinar, quando associado à constituição ou prestação de garantia idónea, a suspensão da execução fiscal, igualmente não poderá esse desiderato ser alcançado através da impugnação do indeferimento desse mesmo pedido de revisão oficiosa
Sem prescindir e à cautela,
4.º
A decisão que há-de recair sobre os presentes autos deve circunscrever-se à situação fática existente à data da prolação despacho [e que serviu de suporte ao mesmo], não podendo um evento posterior [dedução de impugnação judicial na sequência do indeferimento tácito de um pedido de revisão] vir sanar uma falta pré-existente como admite e pretende a Recorrente.
5.º
Termos em que, ainda que não vendo qualquer impedimento legal para a junção aos autos do referido documento, do mesmo não deverá ser extraído a consequência pretendida pela Recorrente.

Na sequência de tal requerimento, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto veio promover o seguinte:

A……………, Lda. vem requerer a junção aos autos da petição inicial da impugnação judicial do indeferimento do pedido de revisão do acto tributário referido nas alegações de recurso e que corre termos no Tribunal Tributário de Lisboa sob. O nº 2157/21.8BELRS (cf. fls. 301, do SITAF).
Do teor das mencionadas alegações de recurso constata-se que a Recorrente pretende “sanar o caso vertente segundo os princípios da sentença recorrida.”
Ora, constitui jurisprudência consolidada deste STA que só o pedido de revisão oficiosa efectuado pelo contribuinte dentro do prazo de reclamação administrativa, quando associado à constituição ou prestação de garantia idónea, pode determinar a suspensão da execução fiscal.
Já o pedido de revisão oficiosa efectuado ao abrigo do disposto no artigo 78°, n° 1, 2ª parte da LGT, como é caso, não tem efeito suspensivo da cobrança da prestação em dívida (cf. o douto acórdão do Pleno de 12/12/2012, in Rec. n° 0932/12, disponível em www.dgsi.pt.
A demais jurisprudência nele citada, podendo acrescentar-se, entre muitos outros, os doutos acórdãos de 05/02/2015 e de 25/06/2015, in processos n° 01533/14 e 0735/15, respectivamente, igualmente disponíveis em www.dgsi.pt.
E. também, nesse sentido e pelo relevante contributo doutrinal, Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, 6 edição, vol. III, anot. ao art. 169°, a pgs. 210 a 214).
Ora, não tendo o pedido de revisão oficiosa efectuado ao abrigo do disposto no artigo 78°, n°1, 2 parte da LGT a virtualidade de determinar, quando associado à constituição ou prestação de garantia idónea, a suspensão da execução fiscal.
Igualmente não poderá esse desiderato ser alcançado através da impugnação do indeferimento do pedido de revisão oficiosa, sob pena de completa subversão dos critérios legais que permitem a suspensão da cobrança coerciva da dívida tributária.
Nesta conformidade, por manifesta irrelevância, afigura-se-nos ser de indeferir a junção do documento acima identificado.
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Os autos vêm à conferência corridos os vistos legais.

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2. FUNDAMENTAÇÃO:

2.1. - Dos Factos:

Na decisão recorrida foi fixado o reputado relevante para a decisão:

1. Por ofícios de 30.06.2014, com as referências 013765 e 013766, a DGAV notificou o A…………. da liquidação da TSAM relativa ao ano 2014, no valor global de € 2 532 621,36 - cfr. Doc. 1 junto ao Doc. 3 junto à petição inicial, que se dá aqui por integralmente reproduzido;
2. A 13.02.2015, o A………….. deduziu impugnação judicial contra o acto de liquidação da TSAM, impugnação que foi autuada sob o Processo n.º 2782/14.3BELRS, do Tribunal Tributário de Lisboa – facto não controvertido (cfr. artigos 1.º da petição inicial e 4.º da resposta da Fazenda Pública);
3. A 02.09.2016, através da respectiva caixa postal electrónica do ViaCTT, o A…………. recebeu citação pessoal para os termos do PEF n.º 3344201601120166, instaurado tendo em vista a cobrança coerciva de uma dívida ao FSSAM, relativa à TSAM do ano 2014 e no valor de € 2 532 621,36 - cfr. CITAÇÃO PESSOAL, constante de fls. 72 a fls. 74 do SITAF e que se dá aqui por integralmente reproduzida;
4. A 20.09.2016, no âmbito do PEF n.º 3344201601120166, o A………….. apresentou a Garantia Bancária n.º 962300484020590, do Banco Santander Totta, S. A., tendo em vista a suspensão da execução fiscal - cfr. GARANTIA BANCÁRIA N.º 962300484020590 e documentos relacionados, constantes de fls. 79 a fls. 89 e de fls. 159 a 161 do SITAF, que se dão aqui por integralmente reproduzidas;
5. A 22.09.2016, no âmbito do PEF n.º 3344201601120166, foi lavrada a INFORMAÇÃO N.º 106-GDE/2016, da UGC da AT, da qual se exara, entre o mais, o seguinte:
(…)
Face ao exposto propõe-se a aceitação da garantia prestada por ser idónea e suficiente, sendo prestada a favor da Autoridade Tributária e Aduaneira – Serviço de Finanças de Lisboa 11, para efeitos da suspensão do PEF 3344201601120166.
(…)
- cfr. INFORMAÇÃO N.º 106-GDE/2016, constante a fls. não numeradas de fls. 162 a fls. 169 do SITAF e que se dá aqui por integralmente reproduzida;
6. A 26.09.2016, no âmbito do PEF n.º 3344201601120166, o Director da UGC da AT proferiu despacho, do qual se exara, entre o mais, o seguinte:
(…)
1. Concordo com a aceitação da garantia bancária prestada
(…)
- cfr. Despacho, constante a fls. não numeradas de fls. 162 a fls. 169 do SITAF e que se dá aqui por integralmente reproduzido;
7. A 10.11.2020, no âmbito do Processo n.º 2782/14.3BELRS (Impugnação), o Tribunal Constitucional proferiu o ACÓRDÃO N.º 599/2020, no Recurso n.º 472/2020, que indeferiu a reclamação apresentada pelo A………… e confirmou a Decisão Sumária do Tribunal Central Administrativo Sul, que julgou improcedente o recurso da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que, por sua vez, julgou improcedente a impugnação judicial dos actos de liquidação da TSAM - facto não controvertido (cfr. artigos 2.º da petição inicial e 7.º a 9.º da resposta da Fazenda Pública, bem como o ACÓRDÃO N.º 599/2020, constante de fls. 194 a fls. 199 do SITAF e que se dá aqui por integralmente reproduzido);
8. A 26.04.2021, no âmbito do PEF n.º 3344201601120166, o A…………. requereu a manutenção da suspensão da execução fiscal até à decisão definitiva do pedido de Revisão dos actos tributários subjacentes às dívidas em execução fiscal - cfr. o respectivo requerimento, constante a fls. 90 e seguintes do SITAF e que se dá aqui por integralmente reproduzido;
9. A 06.05.2021, o A…………… apresentou, junto da DGAV, um pedido de Revisão dos actos tributários subjacentes às dívidas em execução fiscal - cfr. Doc. 3 junto à petição inicial, que se dá aqui por integralmente reproduzido, mormente o carimbo aposto na respectiva página 1/25;
10. A 06.05.2021, no âmbito do PEF n.º 3344201601120166, foi lavrada informação, da qual se extrai, entre o mais, o seguinte:
(…)

[Imagem]

(…)

[Imagem]

(…)
- cfr. Doc. 2 junto à petição inicial e Informação a fls. não numeradas constante entre fls. 90 e fls. 158 do SITAF, que se dão aqui por integralmente reproduzidos;
11. A 11.05.2021, no âmbito do PEF n.º 3344201601120166, o Chefe de Divisão da DGCT da UGC da AT proferiu despacho, do qual se exara, entre o mais, o seguinte:

[Imagem]

- cfr. Doc. 2 junto à petição inicial e Despacho a fls. não numeradas constantes entre fls. 90 e fls. 158 do SITAF, que se dão aqui por integralmente reproduzidos;
12. A 12.05.2021, através do seu Ofício n.º 737, de 11.05.2021, a DGCT da UGC da AT notificou o A………….. da decisão de indeferimento do pedido de manutenção da suspensão do PEF n.º 3344201601120166 - cfr. Doc. 2 junto à petição inicial, NOTIFICAÇÃO DE INDEFERIMENTO DO REQUERIMENTO APRESENTADO PARA EFEITOS DE MANUTENÇÃO DA SUSPENSÃO DO PEF N.º 3344201601120166 e respectivos registo e aviso de recepção, estes a fls. não numeradas constantes entre fls. 90 e fls. 158 do SITAF, que se dão aqui por integralmente reproduzidos;
13. Na mesma data (12.05.2021), a DGCT da UGC da AT notificou o A………… nos termos que parcialmente de transcrevem:
(…)

[Imagem]

- cfr. INTERPELAÇÃO PARA PAGAMENTO - PROSSEGUIMENTO DO PROCESSO EXECUTIVO N.º 3344201601120166 e respectivos registo e aviso de recepção, a fls. não numeradas constantes entre fls. 90 e fls. 158 do SITAF, que se dão aqui por integralmente reproduzidas;
14. Ainda na mesma data (12.05.2021), o Banco Santander Totta, S. A., foi citado para os termos do PEF n.º 3344201601120166 pela DGCT da UGC da AT nos termos que parcialmente de transcrevem:
(…)

[Imagem]

- cfr. CITAÇÃO PARA EXECUÇÃO DE GARANTIA BANCÁRIA (N.º 962300484020590) e respectivos registo e aviso de recepção, a fls. não numeradas constantes entre fls. 90 e fls. 158 do SITAF, que se dão aqui por integralmente reproduzidas.
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2.2.- Motivação de Direito

2.2.1.- Da junção de documentos

Antes de tudo, cumpre tomar posição sobre a admissibilidade, ou não, do documento cuja junção a Recorrente requereu após as suas alegações, que constitui a petição inicial da impugnação judicial do indeferimento do pedido de revisão do acto tributário referido nas alegações de recurso e que corre termos no Tribunal Tributário de Lisboa sob. o nº 2157/21.8BELRS (cf. fls. 301, do SITAF).
Contra essa junção se manifestaram a recorrida e o Ministério Público nos termos supra expostos, considerando, no essencial, que do teor das aludidas alegações de recurso constata-se que a Recorrente pretende “sanar o caso vertente segundo os princípios da sentença recorrida” quando é certo que constitui jurisprudência consolidada do STA que só o pedido de revisão oficiosa efectuado pelo contribuinte dentro do prazo de reclamação administrativa, quando associado à constituição ou prestação de garantia idónea, pode determinar a suspensão da execução fiscal. Já o pedido de revisão oficiosa efectuado ao abrigo do disposto no artigo 78°, n° 1, 2ª parte da LGT, como é caso, não tem efeito suspensivo da cobrança da prestação em dívida (cf. o douto acórdão do Pleno de 12/12/2012, in Rec. n° 0932/12, disponível em www.dgsi.pt, e demais jurisprudência nele citada, podendo acrescentar-se, entre muitos outros, os doutos acórdãos de 05/02/2015 e de 25/06/2015, in processos n° 01533/14 e 0735/15, respectivamente, igualmente disponíveis em www.dgsi.pt e também, nesse sentido e pelo relevante contributo doutrinal, Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, 6 edição, vol. III, anot. ao art. 169°, a pgs. 210 a 214).
Por esse prisma, não tendo o pedido de revisão oficiosa efectuado ao abrigo do disposto no artigo 78°, n°1, 2 parte da LGT a virtualidade de determinar, quando associado à constituição ou prestação de garantia idónea, a suspensão da execução fiscal, também não poderá esse desiderato ser alcançado através da impugnação do indeferimento do pedido de revisão oficiosa, sob pena de completa subversão dos critérios legais que permitem a suspensão da cobrança coerciva da dívida tributária.
Assim sendo, por manifesta irrelevância e porque a decisão que há-de recair sobre os presentes autos deve circunscrever-se à situação fática existente à data da prolação despacho [e que serviu de suporte ao mesmo], não podendo um evento posterior [dedução de impugnação judicial na sequência do indeferimento tácito de um pedido de revisão] vir sanar uma falta pré-existente como admite e pretende a Recorrente, sustentam que é de indeferir a junção do documento acima identificado.
Cumpre, pois, determinar da pertinência e admissibilidade do aludido documento neste momento atento o princípio da oportunidade da prova e da manutenção do referido documento nos autos.
Vigora no direito português o modelo de apelação restrita, de acordo com o qual o recurso não visa o reexame, sem limites, da causa julgada em 1ª. Instância, mas tão-somente a reapreciação da decisão proferida dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrava o Tribunal a quo no momento em que proferiu a sentença. Como resulta de uma jurisprudência uniforme e reiterada, os recursos são meios processuais de impugnação de anteriores decisões judiciais e não ocasião para julgar questões novas. Em princípio, não pode alegar-se matéria nova nos Tribunais Superiores, em fase de recurso, não obstante o Tribunal ad quem tenha o dever de apreciar as questões de conhecimento oficioso. Daí que, não devam ser juntos documentos novos na fase de recurso. A lei, porém, prevê excepções que passamos a analisar.
Dispõe o artº.523º, do C. P. Civil (princípio da oportunidade da prova) que os documentos, como meios de prova, da acção ou da defesa, devem ser apresentados com o articulado em que se invoquem os factos que se destinem a demonstrar. Não sendo apresentados com o respectivo articulado, ainda e por livre iniciativa das partes litigantes, enquanto apresentantes, podem ser juntos ao processo até ao encerramento da discussão em 1ª Instância, embora com a condenação do apresentante em multa, salvo demonstração de que os não pôde oferecer com o articulado próprio.
Em fase de recurso, a lei processual civil (cfr. artºs.524 e 693-B, do C.P.Civil), somente possibilita a junção de documentos ao processo, sempre e só com as alegações (ou contra-alegações) e não em momentos posteriores, quando ocorra alguma das seguintes circunstâncias:
1-Quando não tenha sido possível a respectiva apresentação em momento anterior (artº.524, nº.1, do C.P.Civil);
2-Quando se destinem à demonstração de factos posteriores aos articulados (artº.524, nº.2, do C.P.Civil);
3-Quando a respectiva apresentação se tenha tornado necessária em resultado de ocorrência posterior ao encerramento da discussão em 1ª Instância (artº.524, nº.2, do C.P.Civil);
4-Quando a junção de documentos se torne necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª Instância (cfr.artº.693-B, do C.P.Civil);
5-Nos casos previstos no artº.691, nº.2, als.a) a g) e i) a n), do C. P. Civil (cfr.artº.693-B, do C.P.Civil).
A verificação das circunstâncias elencadas tem como pressuposto necessário que os factos documentados sejam relevantes/pertinentes à decisão a proferir, o que decorre, desde logo, directamente da circunstância dos documentos cuja junção se pretende terem de ter por desiderato a prova dos fundamentos da acção e/ou da defesa (citado artº.523, do C.P.Civil) e, indirectamente e como consequência do que se vem de referir, do facto de o juiz se encontrar vinculado a mandar retirar do processo os que sejam impertinentes ou desnecessários, por força do estipulado no artº.543, do mesmo compêndio legal (cfr. José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.96 e seg.; António Santos Abrantes Geraldes, Recurso em Processo Civil, Novo Regime, 2ª. Edição Revista e Actualizada, Setembro de 2008, Almedina, pág.227 e seg.).
No que diz respeito à hipótese de junção de documentos quando esta se torne necessária em virtude do julgamento efectuado em 1ª Instância (cfr.nº.4 supra), o advérbio “apenas”, usado no artº.693-B, do C. P. Civil, significa que a junção só é possível se a necessidade do documento era imprevisível antes de proferida a decisão na 1ª Instância, isto é, se a decisão da 1ª Instância criar, pela primeira vez, a necessidade de junção de determinado documento. A lei quis manifestamente cingir-se aos casos em que, pela fundamentação da sentença ou pelo objecto da condenação, se tornou necessário provar factos com cuja relevância a parte não podia razoavelmente contar antes de a decisão da 1ª. Instância ser proferida (cfr. Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.533 e 534).
Descendo ao caso dos autos, é manifesto que, atenta a data da sua emissão e dos factos a que o documento junto em fase de recurso pela recorrente se reporta, esta não podia ter procedido à junção do referido documento com a petição que iniciou o presente processo e, portanto, também antes da prolação da sentença de 1ª. Instância. Quer isto dizer que o documento junto pela recorrente após as alegações do recurso não visam provar factos com natureza superveniente. Mas poder-se-ia entender, em vista da descoberta da verdade material que está legitimada tal junção com a própria fundamentação da sentença exarada na 1ª. Instância.
Mas não logra procedência aquela que parece ser a alegação da recorrente, de que o documento ora em apreço visava esclarecer a dúvida com que a Tribunal a quo ficou e o ad quem possa ter na apreciação do recurso.
É que, analisando o documento, na senda da posição assumida pela recorrida e pelo Ministério Público supra relatada, cremos que do seu teor não se pode extrair qualquer factualidade relevante, não se vê até que ponto o documento junto agora pela Recorrente, possa provar, ou pretender provar o que quer que seja.
Concluindo, dada a sua inoportunidade (após a resposta ao Parecer do Ministério Público junto deste STA) impertinência e desnecessidade, não se admite o documento junto que deverá ser desentranhado e remetido à procedência com tributação, fixando-se o mínimo de taxa de justiça pelo incidente a que a Recorrente deu causa (cfr. artº.543, nº.1, do C.P.Civil; artº.10, do R.C.Processuais).

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2.2.2.- Do mérito da causa:

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA e 2º, al. e) do CPPT.
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pela recorrente, a questão que cumpre decidir subsume-se a saber se a decisão vertida na sentença, a qual julgou improcedente a reclamação deduzida, padece de erro de julgamento, uma vez que o procedimento de revisão oficiosa apresentado fora do prazo da reclamação administrativa consubstancia uma reclamação, nos termos estabelecidos no artigo 52º nº1 da LGT e no artigo 169º do CPPT, tendo a virtualidade de permitir a suspensão da execução fiscal, sendo que o n.º 1 do artigo 169º do CPPT seria inconstitucional, por violação dos princípios constitucionais da igualdade, na dimensão de igualdade no acesso ao direito, consagrado no artigo 13º da CRP, e da tutela jurisdicional efectiva de direitos e interesses legalmente protegidos, consagrado no artigo 20º e no n.º 4 do artigo 268º da CRP, se não for aplicado como permitindo a suspensão do presente processo executivo em virtude da dedução do pedido de revisão de acto tributário apresentado.
Como denota o EPGA a questão suscitada é em tudo idêntica à questão que foi apreciada e decidida neste Supremo Tribunal Administrativo no Acórdão de 5/12/2018, proferido no recurso 261/18.9BEVIS, disponível em www.dgsi.pt em que se doutrinou que o pedido de revisão oficiosa efectuado ao abrigo do disposto no artigo 78.º, n.º 1, 2.ª parte, da LGT, não tem o efeito suspensivo da cobrança da prestação tributária a que se refere o artigo 52.º, n.º 1, da mesma lei e o artigo 196º, ainda que o pagamento da dívida exequenda e do acrescido se encontre garantido, a menos que seja apresentado no prazo da reclamação graciosa, caso em que equivale a esta e, por isso, pode ser considerado como “reclamação” para efeitos de suspensão da execução fiscal.
Essa unívoca jurisprudência foi adoptada inter alia, nos Acórdãos deste STA de 12/12/2012, in Rec. n° 0932/12 (Pleno), disponível em www.dgsi.pt, e demais jurisprudência nele citada, podendo acrescentar-se, entre muitos outros, os acórdãos de 26/03/2013, 5/02/2015 e 9/01/2019 proferidos, respectivamente nos processos 0158/13, 01533/14 e 0258/18.9BEVIS, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
Doutrinalmente, pontifica a respeito o ensinamento de Jorge Lopes de Sousa de que “…nos casos em que foi ultrapassado o prazo legal de impugnação do ato de liquidação, a revisão do ato tributário não constitui um verdadeiro meio de impugnação, pois não tem os efeitos próprios dos meios impugnatórios, que se reconduzem à destruição retroativa dos efeitos do ato anulado, consubstanciada na “reconstituição da legalidade do ato ou situação objeto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso (art. 100.º da LGT), juros estes contados desde o pagamento indevido até à emissão da respetiva nota de crédito (art. 61.º, n.º 3, do CPPT)” (CPPT, Anotado e Comentado, 6ª edição, volume III, pág. 210).
Assim, o pedido de revisão oficiosa efectuado ao abrigo do disposto no art. 78.º, n.º 1, 2.ª parte, da LGT, não tem o efeito suspensivo da cobrança da prestação tributária a que se refere o art. 52.º, n.º 1, da mesma lei e o art. 196.º do CPPT, ainda que o pagamento da dívida exequenda e do acrescido se encontre garantido, a menos que seja apresentado no prazo da reclamação graciosa, caso em que equivale a esta e, por isso, pode ser considerado como “reclamação” para efeitos de suspensão da execução fiscal.
Esta solução legislativa – de não conferir efeito suspensivo ao pedido de revisão efectuado para além do referido prazo, mesmo que o pagamento da dívida exequenda e do acrescido esteja garantido –, não só resulta da falta de previsão do pedido de revisão oficiosa no texto da lei (art. 52.º, n.º 1, da LGT e art. 196.º, n.º 1, do CPPT), como também se mostra conforme a outras soluções legislativas, designadamente a que resulta da conjugação dos n.ºs 1 e 4, alínea b), do art. 49.º da LGT.
Por outro lado, essa solução não se mostra desajustada, na medida em que, enquanto os meios impugnatórios indicados no art. 52.º da LGT e no art. 196.º do CPPT têm de ser deduzidos dentro de prazos relativamente curtos, o pedido de revisão oficiosa pode ser apresentado até quatro anos após a liquidação ou até a qualquer momento, se não tiver havido pagamento do tributo (cfr. 2.ª parte do n.º 1 do art. 78.º da LGT), o que significa que, a ser-lhe concedido efeito suspensivo da execução fiscal, existiriam consequências negativas relevantes ao nível da segurança jurídica e da celeridade na cobrança das receitas tributárias prosseguida pela execução fiscal.
Uma vez que não sobrevieram razões alterar tal entendimento consolidado na jurisprudência e doutrina assinaladas, que merece a nossa concordância e cuja fundamentação jurídica tem plena aplicação no caso vertente, limitamo-nos a remeter para os mesmos para julgar improcedente esse fundamento recursório.

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No tangente ao outro vector, flui das conclusões que a Recorrente considera que a interpretação do artigo 169º, nº1, do CPPT formada na sentença recorrida padece de vício de inconstitucionalidade, por violação do princípio da igualdade, na dimensão de igualdade no acesso ao direito, consagrado no artigo 13º da Constituição, e do princípio da tutela jurisdicional efectiva, consagrado no artigo 20º e no nº4 do artigo 268º da Constituição da República.
Como acabamos de afirmar, a doutrina tem admitido o efeito suspensivo quando a revisão tenha sido requerida dentro do prazo da reclamação graciosa (cfr. art. 78.º, n.º 1, 1.ª parte, da LGT), mas apenas porque, nesse caso, fazem equivaler o pedido de revisão à reclamação graciosa. Na verdade, a revisão a pedido do sujeito passivo prevista na 1.ª parte do n.º 1 do art. 78.º da LGT consubstancia uma reclamação graciosa, pois tem o mesmo prazo, é dirigida ao próprio autor do acto e por ele decidida e, sobretudo, o mesmo fundamento, ou seja, “qualquer ilegalidade” (cfr. os arts 70.º, n.º 1, e 99.º do CPPT).
«A reclamação graciosa, prevista no CPPT, e a revisão dos actos tributários por iniciativa do sujeito passivo, prevista na LGT, são um só instituto, pese as suas diferentes denominações e as discrepâncias existentes entre as duas normas quanto ao órgão competente para decidir, pelo que concluímos que o mecanismo previsto no art. 78.º, n.º 1 da LGT obedece à disciplina procedimental constante do capítulo VI do CPPT» (RUI DUARTE MORAIS, Manual de Procedimento e Processo Tributário, Almedina, 2012, pág. 167.).
Portanto, por força do preceituado no art. 52.º, n.º 1, da LGT, que faz uma referência genérica a “reclamação”, este pedido de revisão terá efeito suspensivo, dentro do condicionalismo do n.º 1 do art. 169.º. Por outro lado, em caso de procedência a AT fica obrigada à «reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade» (cfr. art. 100.º da LGT), designadamente com o pagamento de juros indemnizatórios, contados desde o pagamento até à emissão da nota de crédito (cfr. art. 61.º, n.º 3, do CPPT).
Já quando a revisão seja por iniciativa da AT (caso em que não pode configurar-se como uma reclamação) ou a pedido do sujeito passivo mas após estar esgotado o prazo da reclamação graciosa – ou seja, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo, caso o tributo não tenha sido pago (art. 78.º, n.º 1, 2.ª parte, da LGT) –, a lei não lhe reconhece efeito suspensivo. Neste caso, o pedido de revisão não se assume como um verdadeiro meio impugnatório, com efeito de destruição retroactiva dos efeitos do acto, mas antes «reconduz-se a um meio de restituição do indevidamente pago, com revogação e cessação para o futuro dos efeitos do acto de liquidação» (Cfr. DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., anotação 3 ao art. 78.º, pág. 705.), como resulta do facto de os juros indemnizatórios só serem devidos caso haja atraso na decisão do pedido e já não da data do pagamento [cfr. art. 43.º, n.º 3, alíneas b) e c), da LGT].
Pontifica a respeito o princípio da indisponibilidade dos créditos tributários que impede a AT de conceder moratórias no pagamento das correspondentes dívidas. A indisponibilidade dos créditos tributários está expressamente prevista no n.º 2 do art. 30.º da LGT, que dispõe: «O crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária».
Como se expende no acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 14 de Junho de 2012, proferido no processo n.º 816/11, disponível em www.dgsi.pt «a lei fiscal determina a indisponibilidade do crédito tributário, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributárias, prevalecendo esta disposição sobre qualquer legislação especial – artigo 30.º/2 e 3 da LGT, na redacção dada pelo art. 123.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro», motivo por que «[…] a indisponibilidade dos créditos tributários impõe-se à própria AT e a todos os particulares e não pode ser afastada por vontade das partes ou de terceiros, sendo decorrência directa dos fundamentais princípios da legalidade e igualdade tributárias, os quais encontram guarida nos artigos 266.º, 13.º, 103.º e 104.º, todos da CRP».).
A indisponibilidade dos créditos tributários – que significa que AT não pode discricionariamente alterar a relação jurídica tributária e, assim, dispor livre e autonomamente dos seus créditos – decorre, em última análise, do princípio da legalidade tributária (O princípio da legalidade, consagrado no art. 266.º, n.º 2, da CRP – «Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei […]» – impõe aos órgãos da AT que actuem no sentido da obtenção das prestações devidas nos termos da lei fiscal, certificando-se que os cidadãos cumprem a obrigação decorrente, desde logo, do n.º 3 do art. 103.º, n.º 3, da CRP, de pagar os impostos que «tenham sido criados nos termos da lei e cuja liquidação e cobrança» se façam nas formas «prescritas pela lei».), que impõe à AT que actue com vista à obtenção da prestação efectivamente devida nos termos da lei fiscal [cfr. arts. 103.º, n.º 3, e 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP) e art. 3.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo (CPA)], e do princípio da igualdade [cfr. arts. 13.º e 266.º, n.º 2, da CRP e art. 6.º, do CPA], que lhe impõe a obrigação de prosseguir o objectivo de tratar igual e uniformemente todos os contribuintes, maxime na exigência, modificação ou extinção das obrigações tributárias deles. Ambos os princípios estão também consagrados no art. 55.º da LGT, que enumera os princípios a observar pela AT na sua actividade.
Acresce que o art. 36.º da LGT, no seu n.º 2, é claro: «Os elementos essenciais da relação jurídica não podem ser alterados por vontade das partes» (Como dizem DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., anotação 8 ao art. 36.º, pág. 297, «nenhum elemento da relação tributária pode ser alterado por vontade das partes: nem o objecto da obrigação; nem os juros; nem o prazo de pagamento, etc.» pois «a isto se opõe o princípio da legalidade dos impostos e o princípio da legalidade da actividade administrativa».); concretizando, no campo das moratórias, o princípio do citado n.º 2, o n.º 3 do mesmo artigo afirma: «A administração tributária não pode conceder moratórias no pagamento das obrigações tributárias, salvo nos casos expressamente previstos na lei». Em sincronia com o n.º 3 do art. 36.º da LGT, o art. 85.º, n.º 3, do CPPT («A concessão da moratória ou a suspensão da execução fiscal fora dos casos previstos na lei, quando dolosas, são fundamento de responsabilidade tributária subsidiária».), prevê que possam ser responsabilizados subsidiariamente os que, dolosamente, concederem moratórias fora dos casos previstos na lei.
Do que vem dito deve concluir-se que a indisponibilidade do crédito tributário e a impossibilidade de a AT conceder moratórias só consentem excepções concretizadas mediante intervenção legislativa, concretizada em lei formal da Assembleia da República ou Decreto-Lei do Governo, na sequência de uma Lei de Autorização Legislativa emitida pelo Parlamento para esse efeito, sob pena de violação do princípio da legalidade e da tipicidade tributária.
A essa luza, a não concessão de efeito suspensivo da execução fiscal ao pedido de revisão formulado para além do prazo da reclamação graciosa não se apresenta sequer como uma solução desajustada ou desproporcionada.
Na senda de Jorge Lopes de Sousa, enquanto os meios impugnatórios indicados no art. 52.º da LGT e no art. 196.º do CPPT têm de ser deduzidos dentro de prazos relativamente curtos, o pedido de revisão oficiosa pode ser apresentado até quatro anos após a liquidação ou até a qualquer momento, se não tiver havido pagamento do tributo. O que significa que, se o legislador lhe tivesse conferido a virtualidade de suspender a execução fiscal (fora das situações em que é apresentado dentro do prazo da reclamação graciosa, situação em que deve merecer o mesmo tratamento que esta, como vimos), a suspensão ocorreria as mais das vezes num momento em que a execução fiscal se encontraria já numa fase em que a suspensão teria efeitos negativos muito superiores àqueles que advirão da suspensão numa fase precoce do processo (A título de exemplo, o Autor refere: «basta ter presente que, se um pedido de revisão oficiosa fosse apresentado no segundo ou terceiro ano posterior à liquidação, por exemplo, poderia a execução fiscal estar já em fase de pendência de anúncios de venda ou de período de apresentação de propostas ou mesmo em fase posterior à venda, antes da sua entrega aos compradores, e a suspensão nesse momento seria mais onerosa não só para o exequente (os anúncios da venda perderiam a sua utilidade) como para os potenciais compradores, que poderiam já ter efectuado despesas para conhecerem e avaliarem os bens em que pudessem estar interessados».).
Por outro lado, como salienta o mesmo Autor, «com a possibilidade de pedir a revisão oficiosa com efeito suspensivo da execução fiscal, colocar-se-ia ao dispor dos executados um meio de paralisarem a execução repetidamente em momentos em que tal paralisação era inconveniente para o interesse público, com previsível descrédito da eficácia das vendas efectuadas em execução fiscal e desmotivação de potenciais compradores, com os evidentes efeitos a nível da obtenção de melhores preços de venda que a concorrência entre os interessados pode propiciar».
São patentes e compreensíveis, em face da finalidade essencial do processo de execução fiscal (a cobrança célere das dívidas tributárias, assegurando-se que o Estado obtém as receitas imprescindíveis ao seu funcionamento e ao cumprimento das tarefas que lhe estão cometidas) e do modo em que o mesmo está estruturado – «em termos mais simples do que o processo de execução comum, com o objectivo de conseguir uma maior celeridade na cobrança dos créditos, recomendada pelas finalidades de interesse público das receitas que através dele são cobradas» (Cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., volume III, anotação 2 ao art. 148.º, pág. 28.) –, os motivos que terão levado o legislador a não conferir efeito suspensivo da execução fiscal ao pedido de revisão da liquidação apresentado para além do termo do prazo da reclamação graciosa.
A Recorrente argumenta com a inconstitucionalidade da interpretação que subscrevemos para o n.º 1 do art. 169.º do CPPT, na medida em que não contempla o pedido de revisão entre os meios processuais aí previstos como susceptíveis de suspender a execução fiscal. Essa falta de previsão, na tese que sustenta, acarreta a violação do princípio constitucional da igualdade consagrado no art. 13.º da CRP, na dimensão de igualdade no acesso ao direito, e a violação do princípio da tutela jurisdicional efectiva de direitos e interesses legalmente protegidos, consagrado no arts. 20.º e 268.º, n.º 4, da CRP.
Mas não se aceita esse modo de ver.
Em primeiro lugar, não lobrigamos em que medida o princípio da igualdade sai beliscado pela solução legislativa que apenas reconhece o efeito suspensivo da execução fiscal ao pedido de revisão quando este se reconduz à reclamação graciosa e já não nos demais casos. Pese embora o esforço argumentativo da Recorrente no sentido de tentar estabelecer uma identidade absoluta entre o pedido de revisão deduzido dentro do prazo da reclamação graciosa (situação em vimos que aquele equivale plenamente a esta) e o que foi deduzido para além daquele prazo, deixámos já expostos os motivos por que não existe essa identidade: são distintos os efeitos da procedência de um e de outro; também as consequências negativas que advêm para a execução fiscal de uma suspensão operada por força da reclamação graciosa, que tem de ser deduzida no prazo de 120 dias após os factos previsto no n.º 1 do art. 102.º do CPPT (cfr. art. 70.º, n.º 1, do CPPT) são bem distintas daqueles que adviriam da suspensão da execução fiscal quando motivada por um pedido de revisão deduzido quando estava já expirado aquele prazo, sobretudo tendo em conta que pode ser apresentado muito para além do termo para o pagamento voluntário do tributo (quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não estiver pago, nos termos da 2.ª parte do n.º 1 do art. 78.º da LGT).
Doutra banda, igualmente não entrevemos que a ausência de efeito suspensivo sobre a execução fiscal no caso em que o pedido de revisão é apresentado para além do termo do prazo da reclamação graciosa constitua uma intolerável compressão dos direitos dos sujeitos passivos.
Com efeito, o sujeito passivo teve ao seu dispor toda uma série de meios impugnatórios que lhe permitiriam a suspensão da execução fiscal e o facto de o legislador não facultar o efeito suspensivo da execução relativamente a um meio processual que pode ser desencadeado pelo sujeito passivo tão para além do termo do prazo para o pagamento voluntário não se nos afigura constituir um entrave desproporcionado ao princípio da tutela jurisdicional efectiva, pois este tem de ser balanceado com o interesse público da cobrança célere do tributo, de que é expressão o art. 177.º do CPPT.
Mas, não menos importante, é manifesto que a Recorrente se limita a invocar a violação de tais princípios, sem substanciar e especificar os termos em que advém essa violação, não se antolhando que os princípios da igualdade da tutela jurisdicional efectiva, sob o prisma da avaliação que dos mesmos é feita na jurisprudência do Tribunal Constitucional, são afectados pela interpretação adoptada na sentença recorrida.
Na verdade, como vimos, o artigo 169º, nº1, do CPPT não prevê expressamente o “pedido de revisão do ato tributário” como meio processual que, tendo por objecto a impugnação da legalidade da dívida exequenda, constitua condição para a suspensão da execução fiscal e, tal como destaca o EPGA, só por interpretação extensiva se incluiu o mesmo naquela previsão, o que pressupõe que reúna os requisitos de equiparação à reclamação graciosa.
Acompanhando ainda o douto Parecer, “A opção por tais meios impugnatórios compreende-se na liberdade de conformação do legislador, que não é arbitrária, nem desproporcional aos fins visados, atenta a excepcionalidade da suspensão de execução fiscal (artigo 85º, nº3, do CPPT).
Como tem sido entendimento do Tribunal Constitucional, embora esteja vinculado a criar meios jurisdicionais de tutela efetiva dos direitos e interesses ofendidos dos cidadãos, “o legislador não deixa de ser livre de os conformar, não sendo de todo o modo obrigado a prever meios iguais para situações diversas, considerando ainda que a identidade ou diversidade das situações em presença há-de resultar de uma perspectiva global que tenha em conta a multiplicidade de interesses em causa, alguns deles conflituantes entre si” (cf. acórdão do TC n.º 63/2003).
Por outro lado não se alcança em que termos é violado o princípio da igualdade.
Como se salientou no acórdão do TC n.º 750/95 “O princípio da igualdade reconduz -se […] a uma proibição de arbítrio sendo inadmissíveis quer a diferenciação de tratamento sem qualquer justificação razoável, de acordo com critérios de valor objectivos, constitucionalmente relevantes, quer a identidade de tratamento para situações manifestamente desiguais. A proibição de arbítrio constitui um limite externo da liberdade de conformação ou de decisão dos poderes públicos, servindo o princípio da igualdade como princípio negativo de controle”.
Ora, seguramente que o entendimento sobre a diferenciação de regimes, para efeitos de suspensão da execução fiscal, entre os pedidos de revisão do ato tributário no prazo da reclamação administrativa e fora desse prazo, não é abrangida pelos parâmetros conceituais do princípio da igualdade.
Ou seja, não se vislumbra em que termos a disciplina jurídica assim concebida diferencie pessoas e situações que mereçam tratamento igual ou, inversamente, que igualize pessoas e situações que mereçam tratamento diferente.”
Destarte, é forçoso concluir que a interpretação gizada pelo tribunal “a quo” e vazado na decisão recorrida sobre o artigo 169º, nº1, do CPPT, não afronta os indicados princípios da tutela jurisdicional efectiva e da igualdade.
Improcedem, pois e in totum os fundamentos de recurso esgrimidos, o que importa que se negue provimento ao recurso e, em consequência, se mantenha integralmente a douta sentença recorrida na ordem jurídica.
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3.- Decisão:

Termos em que, acordam, em conferência, os Juízes que integram a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, negar ao provimento ao recurso jurisdicional e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.
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Lisboa, 16 de Fevereiro de 2022

José Gomes Correia (relator) - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz – Pedro Nuno Pinto Vergueiro.