Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01874/11.5BELSB
Data do Acordão:05/04/2023
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:FONSECA DA PAZ
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
MAGISTRADO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
ACUMULAÇÃO DE FUNÇÕES
REMUNERAÇÃO ADICIONAL
Sumário: Não se justifica admitir a revista quando a questão principal que nela se coloca, referente à atribuição de remuneração suplementar a magistrados do MP por acumulação de funções, tem sido resolvida de modo uniforme por este STA, existindo, por isso, uma jurisprudência firme sobre a matéria que veio a ser perfilhada pelo acórdão recorrido e que não exige outra ponderação.
Nº Convencional:JSTA000P30965
Nº do Documento:SA12023050401874/11
Data de Entrada:04/03/2023
Recorrente:AA
Recorrido 1:MINISTÉRIO DA JUSTIÇA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA FORMAÇÃO DE APRECIAÇÃO PRELIMINAR DA SECÇÃO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA:

1. AA, magistrada do MP, intentou, no TAC, contra o Ministério da Justiça, acção administrativa especial para condenação à prática de acto devido, pedindo que este fosse condenado a praticar os actos de fixação da remuneração suplementar que lhe era devida nos termos dos nºs. 4 e 6 do art.º 63.º e do n.º 4 do art.º 64.º do Estatuto do Ministério Público (EMP), aprovado pela Lei n.º 60/98, de 27/8, no período, entre 1/9/2007 e 30/6/2010, em que esteve em acumulação de funções.
Por sentença do TAC, foi a acção julgada procedente, tendo-se condenado o Ministério da Justiça a praticar os actos de fixação da aludida remuneração suplementar pela acumulação de funções exercida pela A. nos Juízos ... com a instrução de processos abreviados no DIAP durante o período referido.
A entidade demandada apelou para o TCA-Sul, o qual, por acórdão de 12/1/2023, concedeu provimento ao recurso, revogando o acórdão recorrido e julgando a acção totalmente improcedente.
É deste acórdão que a A. vem pedir a admissão do recurso de revista.

2. Tem-se em atenção a matéria de facto considerada pelo acórdão recorrido.

3. O art.º 150.º, n.º 1, do CPTA, prevê que das decisões proferidas em 2.ª instância pelos tribunais centrais administrativos possa haver excepcionalmente revista para o STA “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.
Como decorre do texto legal e a própria jurisprudência deste STA tem reiteradamente sublinhado, está-se perante um recurso excepcional, só admissível nos estritos limites fixados pelo citado art.º 150.º, n.º 1, que, conforme realçou o legislador na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs. 92/VIII e 93/VIII, corresponde a uma “válvula de segurança do sistema” que apenas pode ser accionada naqueles precisos termos.
No caso em apreço, o acórdão recorrido, para concluir que à A. não assistia o direito à remuneração por acumulação de funções, invocou a falta de emissão de parecer do CSMP sobre essa pretensão, que era essencial para a sua quantificação e, transcrevendo parte do acórdão deste STA de 10/3/2016 – Proc. n.º 01428/15, que decidira questão idêntica, referiu que, de qualquer modo, a situação da A. não configurava uma acumulação de funções para efeitos do disposto nos nºs. 4, 5 e 6 do art.º 63.º do EMP.
A A. justifica a admissão da presente revista com a inexistência de uma jurisprudência consolidada sobre a matéria e a necessidade de proceder a uma correcta aplicação do direito, alegando também que a interpretação acolhida pelo acórdão recorrido legitima uma situação de abuso de direito, na modalidade de “venire contra factum proprium”, e padece de inconstitucionalidade por violação do princípio da igualdade, pelo que a rejeição da revista violaria o princípio da tutela jurisdicional efectiva.
Mas, para além da alegada inconstitucionalidade por violação do princípio da igualdade e de o abuso de direito não terem sido conhecidos no acórdão recorrido, sem que a recorrente lhe impute a nulidade de omissão de pronúncia, e de, como tem entendido esta formação, as questões de inconstitucionalidade não constituírem o objecto próprio da revista, podendo ser separadamente colocadas ao Tribunal Constitucional, entendemos que não se justifica o recebimento do presente recurso, como, aliás, já decidiu esta formação em situação idêntica (cf. Ac. de 14/1/2021 – Proc. n.º 0957/11.6BELSB). Com efeito, a questão principal que nele se coloca tem sido resolvida de modo uniforme por este STA (cf., além do citado Ac. de 10/3/2016, os de 7/4/2016 – Proc. n.º 1389/15, de 14/4/2016 – Proc. n.º 904/15 e de 12/5/2016 – Proc. n.º 1427/15), pelo que existe uma jurisprudência firme sobre a matéria que veio a ser perfilhada pelo acórdão recorrido e que não exige outra ponderação.
Quanto à pretensa violação do princípio da tutela jurisdicional efectiva que resultaria da não admissão do recurso, importa referir que a jurisprudência do Tribunal Constitucional tem sido constante no sentido que a CRP não assegura a existência em todos os processos e em todas as decisões de um direito ao recurso, gozando o legislador ordinário, nesse âmbito, de uma ampla liberdade de conformação (cf., entre muitos, o Ac. de 15/7/93 in DR, II Série, de 23/4/94), pelo que ela (designadamente através dos seus artºs. 20.º, n.º 1 e 268.º, n.º 4) não impõe que o recorrente beneficie de dois graus de recurso jurisdicional (cf. os Acs. nºs. 144/99, de 9/3 e 431/02, de 22/10), motivo por que não se pode afirmar que o art.º 150.º, do CPTA, viola aquele princípio por o comprimir intoleravelmente (cf. Ac. n.º 63/08, de 31/1).
Nestes termos, estando a matéria sobre que incide o recurso esclarecida ao nível deste STA e tendo o acórdão recorrido seguido, no essencial, essa linha de entendimento, não se está perante uma questão fundamental para efeitos da sua admissão nem se revela que esta seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.

4. Pelo exposto, acordam em não admitir a revista.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 4 de maio de 2023. – Fonseca da Paz (relator) – Teresa de Sousa – José Veloso.