Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0449/18.2BELRA
Data do Acordão:12/17/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P25353
Nº do Documento:SA2201912170449/18
Data de Entrada:11/16/2018
Recorrente:A.............
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

A………….., inconformado, interpôs recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria (TAF de Leiria) datada de 30 de Junho de 2018, que indeferiu liminarmente a impugnação judicial deduzida da decisão da Chefe do Serviço de Finanças das Caldas da Rainha datada de 27 de Novembro de 2017, que decretou a reversão contra si na qualidade de responsável subsidiário, da execução fiscal n.º 1350201701021095, para cobrança coerciva da quantia de € 63.188,94 de que é originariamente devedora a sociedade comercial ………..–……&……., Lda.

Alegou, tendo apresentado conclusões, como se segue:
I. O Recorrente apresentou a sua impugnação judicial porquanto foi ordenada a citação do recorrente como executado nos autos de execução fiscal em que é executada principal a sociedade ……….&………, Lda.
II. Entendeu liminarmente o Tribunal a quo ter existido erro sobre a forma de processo nos termos do artigo 193.º do Código de Processo Civil, aqui aplicável ex vi do artigo 2.º al. e) do CPPT.
III. Considerou o Tribunal a quo a eventual convolação do processo como intempestiva, porquanto o prazo para apresentar a oposição à execução fiscal é diferente do da apresentação da Impugnação Judicial, sendo este último mais alargado que o primeiro, absolvendo assim a Fazenda Pública da Instância.
IV. Ora dispõe o n.º 5 do artigo 22.º da Lei Geral Tributária que a pessoa responsável poderá reclamar ou impugnar a dívida cuja responsabilidade lhe foi atribuída nos mesmos termos que o devedor principal, constituindo fundamento para a impugnação a errónea qualificação e quantificação de rendimentos, lucros, valores patrimoniais e outros factos tributários, incompetência ausência ou vício de fundamentação.
V. Os fundamentos invocados pelo Recorrente, na sua Impugnação Judicial, estão perfeitamente de acordo com a figura jurídica em apreço, nomeadamente das disposições conjugados dos artigos 22.º, n.º 5 da LGT e artigos 97.º e 99.º do CPPT.
VI. Pois ao aqui recorrente ora revertido assistiam os mesmos meios de defesa que caberiam à empresa executada, por exemplo a reclamação graciosa que desemboca em impugnação judicial em caso de indeferimento.
VII. O recorrente queria impugnar o despacho que julgou improcedente as razões invocadas em sede de audição prévia do interessado e que ordenou a reversão da execução fiscal contra o mesmo, porquanto acto prévio à citação para a execução, por ser de deficiente fundamentação e não ter carreado os factos alegados pelo recorrente, quando é notificado do projecto de reversão como devedor subsidiário.
VIII. A AT não indicou nenhum facto conducente à subsunção de qualquer conduta do recorrente como administrador de facto, da sociedade executada, o órgão de execução fiscal, desconsiderado os argumentos e não tendo sequer instruído o processo como lhe era exigível, prejudicando o direito de defesa do recorrente.
IX. Andou o Tribunal a quo quando considerou que o mecanismo processual adequando seria a oposição à execução fiscal, possivelmente julgando que o Recorrente quereria arguir a nulidade da citação, mas não!
X. O que estava em causa era a impugnabilidade de actos praticados pela Autoridade Tributária, na condução do próprio processo de reversão e não a execução fiscal propriamente dita.
XI. E mesmo que se assim não fosse, e se se entendesse que o mecanismo processual correcto seria a oposição à execução fiscal mal andou o Tribunal a quo em entender que não haveria convolação, atendendo à sua extemporaneidade.
XII. Entendendo-se que o meio processual seria a oposição à execução seria sempre lícito ao tribunal optar pela convolação da impugnação naquele outro mecanismo, e aproveitar todos os actos praticados até então tal como previsto no artigo 193.º do CPC.
XIII. A decisão em crise a manter-se será sempre lesiva do princípio da igualdade (art. 13.º CRP),
XIV. Pelo que deve revogar a sentença recorrida e em consequência ser anulado o despacho de reversão notificado ao recorrente.

Não houve contra-alegações.

O Ministério Público notificado, pronunciou-se pela improcedência do recurso. No essencial o Ministério Público entendeu que a convolação para o meio processual idóneo está prejudicada pela intempestividade da petição.

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

Na decisão recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
a) O impugnante foi notificado do despacho de reversão, por citação recebida em 2017.12.05;
b) A petição inicial da presente impugnação judicial foi remetida ao SLF de Caldas da Rainha em 2018.03.05.
Nada mais se deu como provado.

Há que conhecer do recurso que nos vem dirigido.
A questão colocada pelo recorrente já não é nova e tem sido decidida, desde sempre, em sentido contrário ao propugnado pelo recorrente.
Assim, e porque a decisão recorrida seguiu a jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal sobre tal questão, a do meio processual legalmente adequado à impugnação do despacho de reversão, segue-se o que se deixou dito no acórdão datado de 19.10.2016, recurso n.º 0346/16:
Como vem afirmando, de modo pacífico, a jurisprudência desta Secção de Contencioso Tributário a impugnação judicial, regulada nos artigos 99.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), constitui o meio de reacção paradigmático de que dispõe o contribuinte para atacar, com fundamento em qualquer ilegalidade, o acto tributário, tomado este em sentido próprio, ou seja, como acto de liquidação do tributo, sendo igualmente este o meio processual adequado para reagir contra outros actos em matéria tributária para os quais a lei preveja ser este o meio de reacção do contribuinte (cfr. o n.º 1 do artigo 97.º do CPPT) – vide, neste sentido, entre outros, os Acórdãos deste Supremo Tribunal de 30 de Setembro de 2009, rec. n.º 626/09, de 14.07.2007, recurso 172/07, de 5.07.2012, recurso 328/12, e de 10.04.2013, recurso 230/13, todos in www.dgsi.pt)
É também pacificamente aceite existirem fundamentos que são invocáveis tanto como fundamento de oposição à execução fiscal como de impugnação judicial, decorrendo ainda do artº 22º nº 4 da Lei Geral Tributária que as pessoas solidária ou subsidiariamente responsáveis poderão reclamar ou impugnar a dívida cuja responsabilidade lhes for atribuída nos mesmos termos do devedor principal, devendo, para o efeito, a notificação ou citação conter os elementos essenciais da sua liquidação, incluindo a fundamentação nos termos legais.
No caso em apreço cumpre notar que a recorrente, na petição inicial, não assaca aos actos de liquidação objecto da execução contra ela revertida (liquidações de IVA, relativas ao 1º, 2º e 3º trimestres de 2000), qualquer vício formal ou substancial.
De facto os vícios legais invocados pela recorrente são sempre reportados ao processo executivo e não aos procedimentos de liquidação, questionando apenas a legalidade do acto de reversão, por falta de verificação dos pressupostos da responsabilidade subsidiária que lhe é imputada e ainda por vícios que imputa àquele despacho de reversão e a prescrição da dívida, os quais constituem fundamentos de oposição, nos termos do artigo 204.° do CPPT e não de impugnação judicial (artigo 99.° do CPPT).
(…)
Em suma, o ponto axial da sua pretensão tem a ver com a ilegalidade da reversão operada no processo de execução fiscal, cuja anulação constitui o objecto do pedido formulado pela recorrente na petição inicial.
Sendo que ali não é formulado qualquer pedido atinente ao meio processual de impugnação, a saber, a declaração de inexistência, nulidade ou anulação das liquidações dos tributos.
Ora, o meio processual adequado para impugnar uma decisão relativa à reversão da execução fiscal, com fundamento de o revertido não ser responsável pelo pagamento da dívida (ilegitimidade substantiva) é a oposição à execução fiscal, nos termos da alínea b) do nº 1 do art. 204º do CPPT.
(…)
Por outro lado, por força do preceituado no nº1 do art. 151º do CPPT, todas as questões relacionadas com os pressupostos da responsabilidade subsidiária deverão ser apreciadas em processo de oposição, sendo que os vícios do despacho que ordena a reversão, mesmo de carácter formal, constituem fundamentos enquadráveis na alínea i) do nº 1 do artº 204º do CPPT. (Neste sentido, Jorge Lopes de Sousa, no seu Código de Procedimento e Processo Tributário anotado, 6ª ed., vol. III, pag. 479 e 499, e Lei Geral Tributária Anotada, Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, 4ª edição, Encontro da Escrita, pag. 275/276).
Sendo este o entendimento da doutrina, que subscrevemos, no mesmo sentido se tem pronunciado a jurisprudência desta Secção de Contencioso Tributário, de que são exemplo, os Acórdãos de 27.01.2016, recurso 1353/15, de 29/06/2005, recurso 0501/05, de 14.07.2007, recurso 0172/07, de 27.05.2009, recurso 448/09, de 9/2/2011, recurso 845/2010, de 2/5/2012, recurso 300/2012, de 12.09.2012, recurso 453/12, de 6/03/2014, recurso 639/13 e de 08/04/2015, recurso 715/14, todos in www.dgsi.pt.
Por último, importa sublinhar que no caso não ocorre também possibilidade de convolação para ao meio processual adequado – oposição à execução fiscal - uma vez que, como claramente se demonstra no parecer do Exmº Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo, a petição inicial é manifestamente intempestiva.
Ora, como vem afirmando a jurisprudência consolidada deste Supremo Tribunal Administrativo, não deve operar-se, sob pena da prática de actos inúteis, proibida por lei, a convolação da impugnação judicial em oposição à execução fiscal se a petição é intempestiva para o efeito, pois logo haveria lugar a indeferimento liminar por extemporaneidade – vide acórdãos de 10.04.2013, recurso 230/13, 11.04.2007, recurso 19/07, de 21.06.2000, recurso 24605, de 10.09.2008, recurso 358/08 e de 12.09.2012, recurso 453/12, todos in www.dgsi.pt.
Bem andou, pois, a decisão recorrida ao rejeitar liminarmente a impugnação por erro na forma de forma de processo, e ao não ordenar a convolação na forma processual adequada, por, manifesta extemporaneidade, com consequente nulidade de todo o processo.

No caso dos autos também se surpreende que a causa de pedir constante da petição inicial de impugnação judicial apresentada pelo recorrente se reconduz, unicamente, a questões que se prendem com o despacho de reversão, da sua não qualidade de gerente de facto e ainda de omissão de actos instrutórios no procedimento tendente à prolação do despacho de reversão, ou seja, o processo de impugnação não serve para este desiderato, antes deveria ter lançado mão do processo de oposição à execução fiscal.
Igualmente, não ocorre a possibilidade de convolação para a forma de processo correcta, uma vez que o recorrente foi citado em 05.12.2017, e só apresentou a petição inicial em juízo no dia 05.03.2018, ou seja, três meses após a citação, sendo que o prazo para a dedução da oposição é de 30 dias, nos termos do disposto no artigo 203º, n.º 1, al. a) do CPPT, pelo que, sempre seria extemporânea a dedução da oposição à execução fiscal.

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso e confirmar o despacho recorrido.
Custas pelo recorrente.
D.n.

Lisboa, 17 de Dezembro de 2019. - Aragão Seia (relator) – Suzana Tavares da Silva – Aníbal Ferraz.