Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0112/12
Data do Acordão:03/21/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DA HIERARQUIA
MATÉRIA DE FACTO
MATÉRIA DE DIREITO
Sumário:I - Para determinação da competência hierárquica, à face do preceituado nos artigos 26.º, alínea b), e 38.º, alínea a) do ETAF de 2002 e artigo 280.º, n.º 1, do CPPT, o que é relevante é que o recorrente, nas alegações de recurso e respectivas conclusões, suscite qualquer questão de facto ou invoque, como suporte da sua pretensão, factos que não foram dados como provados na decisão recorrida.
II - Os juízos de facto (juízos de valor sobre matéria de facto ou sua omissão indevida) só podem ser apreciados pelos tribunais com poderes no domínio da fixação da matéria de facto.
Nº Convencional:JSTA000P13919
Nº do Documento:SA2201203210112
Data de Entrada:02/02/2012
Recorrente:A.........
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, neste Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo
1 – RELATÓRIO
A………, SA , não se conformando com decisão judicial que negou provimento à sua reclamação que deduziu contra o despacho do Chefe de Finanças de São João da Madeira que determinou a existência de incumprimento do plano de pagamento prestacional formulou no presente recurso as seguintes conclusões:
I - No caso em apreço a executada não pagou algumas prestações do plano prestacional acordado, mas efectuou pagamentos interpolado*, nunca tendo estado mais de dois meses seguidos sem pagar.
II - O Artigo 200.9 do CPPT exige o falta de pagamento de três prestações seguidas e não o vencimento de três prestações seguidas.
III - A alteração legislativa introduziu um regime mais benéfico para os contribuintes, não tendo qualquer suporte no texto legai, ou sequer no espírito da norma a interpretação constante da Sentença ora em crise.
IV - Atento o que, não estão verificados no caso em apreço os pressupostos previstos no Artigo 200.9 do CPPT, designadamente que se tenha verificado a falta de pagamento de três prestações sucessivas, ou sequer de 6 prestações interpoladas.
III - Fazer outra interpretação da citada norma legal teria como consequência que a alteração legislativa introduzida pela Lei n.^ 3-B/2010, de 28 de Abril jamais tivesse aplicação pratica,
IV - A Sentença proferida não fez pois a correcta interpretação da norma legal aplicável ao caso em apreço, atentos os factos provados.
Atento o que antecede, deve ser revogada a Sentença proferida e substituída por outra que, atentos os factos provados, julgue procedente a reclamação apresentada, assim se fazendo a costumada Justiça
Não foram apresentadas contra-alegações:
Neste Tribunal o Ministério Público emitiu parecer do seguinte teor:
Recorrente: A………,S.A.
Objecto do recurso: sentença declaratória da improcedência da reclamação apresentada contra decisão do órgão da execução fiscal declaratória da situação de incumprimento de plano autorizado de pagamento em prestações de dívida exequenda (fls.60)
FUNDAMENTAÇÃO
l. No actual regime de pagamento em prestações de dívidas exigíveis em processo de execução fiscal a falta de pagamento sucessivo de três prestaçÕes, ou de seis interpoladas, determina o vencimento das prestações seguintes e o prosseguimento da tramitação da execução se, no prazo de 30 dias a contar da notificação para o efeito, o executado não efectuar o pagamento das prestações incumpridas (art.200° n°1 CPPT redacção Lei n° 3-B/201C,28 Abril)
A formulação actual do regime acolhe inovação relevante, ao permitir a possibilidade de pagamento de uma prestação sem pagamento de prestações vencidas anteriormente, como resulta da referência à falte de pagamento de prestações interpoladas e da abrangência nas prestações incumpridas das prestações seguidas (em termos cronológicos) e das prestações interpoladas
A data de vencimento de cada prestação corresponde ao termo do prazo para o respectivo pagamento voluntário.
A falta de pagamento de seis prestações interpoladas (igualmente determinante da aplicação da cominação supra enunciada) não implica a previa falta de pagamento de três prestações sucessivas, se houver omissão no pagamento de prestações intercaladas entre prestações sucessivas objecto de pagamento nas dates dos respectivos vencimentos. O actual regime revela a intenção do legislador em retirar o benefício do pagamento em prestações ao executado cujo comportamento revele um incumprimento prolongado ou demasiado errático do plano prestacional autorizado
2.Aplicando estas considerações ao caso concreto:
-o plano de pagamento em prestações da dívida exequenda autorizado pelo órgão da execução fiscal compreendia 12 prestações iguais e sucessivas, tendo-se vencido a primeira ern 31.07.2010 e as subsequentes no último dia dos meses seguintes (cf. informação e despacho fls.19;probatório n°s 4/10)
-o tribunal recorrido considerou indevidamente que o pagamento efectuado em 31.05.2011 se devia imputar a prestação anterior ainda não paga (9aprestação) e não ao pagamento da prestação que se vencia nessa data ( 11a prestação)
-a imputação do pagamento efectuado em 31.08.2001 é distinta porque posterior à data de vencimento da última prestação em 30.06.2011, segundo o plano prestacional autorizado.
-resulta dos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido que na data do proferimento da decisão reclamada, em 3 Agosto 201 / (ordenando a notificação do executado para pagamento das prestações incumpridas) já se tinha verificado a falta de pagamento sucessivo de três prestações (10ª 11ª e 12ª prestações, com datas de vencimento em 30-Abril .20] 1.31.Maio.201J e 30Junho.2011; probatório nºs 8/10)
- o pagamento da 10a prestação em 31 Agosto 2011 é posterior ao proferimento da decisão reclamada.
-actuando na qualidade de tribunal de revista.com cognição circunscrita ao domínio da matéria de facto, o STA aplica o regime jurídico adequado aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, os quais não podem ser alterados, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova (arts.722° n°3 e 729° n°s ½ CPC)
-no quadro da matéria de facto fixada a sentença impugnada procedeu a correcta interpretação da norma constante do art.200° n°1 CPPT (redacção da Lei n°3-B/2010,28 Abril)
CONCLUSÃO O recurso não merece provimento.
A sentença impugnada deve ser confirmada
2- FUNDAMENTAÇÃO:
A decisão recorrida deu por assente a seguinte matéria de facto:
Considero provados os seguintes factos com relevância para a decisão da causa, com base no teor dos documentos, juntos aos autos:
1 - Em 27/03/2010 foi instaurado no SF de São João da Madeira o processo de execução fiscal n° 0167201001004077 por dívidas de IVA do 4° trimestre de 2009 no montante de € 119.931,54 e respectivos juros legais;
2 - A Reclamada foi citada em 12/04/2010;
3 -Em 11/05/2010, via faxe apresentou requerimento solicitando o pagamento em 20 prestações mensais;
4 - Sobre o requerimento referido em 3) foi proferido despacho autorizando o
pagamento em 12 prestações mensais;
5 - A primeira prestação venceu-se em 31/07/2010;
6 - As primeiras oito prestações foram pagas dentro do prazo limite de pagamento;
7 - A 9° prestação venceu-se em 31/03/2011 e foi paga em 31/05/201 ;
8 -A 10° prestação venceu-se em 30/04/2011 e foi paga em 31/08/2011;
9 -A 11° prestação venceu-se em 31/05/2011 e ainda não foi paga:
10 - A 12° prestação venceu-se em 30/06/2011 e não foi paga;
11 - Em 03/08/2011 foi emitida uma notificação á Reclamante dando-lhe conta que se encontrava em situação de incumprimento, pelo que devia proceder no prazo de 30 dias, de todas as prestações incumpridas (prestações n° 10°, 11° e 12° - referidas em 8, 9 e 10) que veio devolvida com a menção de "objecto não reclamado";
12- Em 29/08/2011 foi emitida nova notificação que foi notificada em 06/09/2011;
13-A presente reclamação foi enviada pelo correio registado em 16/09/2011 para o Serviço de Finanças de São João da Madeira;
Não se provaram outros factos relevantes para a decisão da causa.
3- DO DIREITO
Na conclusão primeira do recurso a recorrente põe em causa a matéria de facto fixada em 7) a 10) do probatório da sentença de 1ª instância, admitindo a mesma a fls. 141 que foi posta em causa a matéria de facto dada como provada.
Vejamos:
Como se decidiu no Ac. deste STA de 11/05/2011, tirado no recurso nº 0324/11, o recurso não versa exclusivamente matéria de direito, se nas conclusões do respectivo recurso se questionar a questão factual, manifestando-se divergência, por insuficiência, excesso ou erro, quanto à matéria de facto provada na decisão recorrida, quer porque se entenda que os factos levados ao probatório não estão provados, quer porque se considere que foram esquecidos factos tidos por relevantes, quer porque se defenda que a prova produzida foi insuficiente, quer ainda porque se divirja nas ilações de facto que se devam retirar dos mesmos (v., entre outros, os acórdãos do STA de 16/12/2009 e de 21/04/2010, proferidos nos recursos n.ºs 738/09 e 189/10, respectivante).
No caso em apreço, a recorrente afirma na conclusão 1ª “No caso em apreço a executada não pagou algumas prestações do plano prestacional acordado, mas efectuou pagamentos interpolados, nunca tendo estado mais de dois meses seguidos sem pagar”.
Ou seja, é invocado um facto que é fundamento da pretensão da recorrente o qual não foi fixado e considerado na decisão recorrida.
Assim e pelo exposto, tem de entender-se que o recurso não tem por fundamento exclusivamente matéria de direito, pelo que o Supremo Tribunal Administrativo é hierarquicamente incompetente para o conhecimento do recurso, e das questões prévias nele solicitadas, cabendo a competência para o conhecimento do mesmo à Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte – artigos 26.º, alínea b), e 38.º, alínea a) do ETAF de 2002 e artigo 280º, n.º 1, do CPPT.
4- DECISÃO:
Termos em que, face ao exposto, se decide julgar a Secção de Contencioso Tributário do STA incompetente, em razão da hierarquia, para conhecer do presente recurso jurisdicional, indicando-se, nos termos do art. 18.º, n.º 3, do CPPT., como tribunal que se considera competente o Tribunal Central Administrativo Norte (Secção do Contencioso Tributário), para o qual a recorrente poderá requerer a remessa do processo, de harmonia com o preceituado no n.º 2 do mesmo artigo.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça devida em 2 UC(s).
Lisboa, 21 de Março de 2012. - Ascensão Lopes (relator) - Pedro Delgado - Valente Torrão.