Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0195/08.5BESNT
Data do Acordão:10/07/2021
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
EMPREITADA DE OBRAS PÚBLICAS
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Não é de admitir a revista do acórdão do TCA que manteve a decisão do TAF julgou parcialmente procedente ação administrativa - na qual, nomeadamente, se discutia pretensão relativa ao direito à prorrogação legal do prazo de execução da empreitada e anulação de multa contratual aplicada - se no entendimento firmado de forma uniforme das instâncias não se vislumbra que, no plano dos raciocínios lógicos ou jurídicos, o mesmo enferme de erros manifestos e se relativamente às questões suscitadas não se descortina uma especial relevância jurídica e social.
Nº Convencional:JSTA000P28288
Nº do Documento:SA1202110070195/08
Data de Entrada:09/07/2021
Recorrente:SERVIÇOS MUNICIPALIZADOS DE AGUA E SANEAMENTO DE SINTRA
Recorrido 1:SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES A……………, S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:


1. MUNICÍPIO DE SINTRA [doravante R.], invocando o disposto no art. 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA], peticiona a admissão do recurso de revista por si interposto do acórdão de 20.05.2021 do Tribunal Central Administrativo Sul [doravante TCA/S] [cfr. fls. 2959/3004 - paginação «SITAF» tal como as ulteriores referências à mesma, salvo expressa indicação em contrário], que negou provimento ao recurso e manteve a sentença, de 21.01.2011, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra [doravante TAF/SNT] [cfr. fls. 2605/2693] na ação administrativa comum contra si movida pela atual MASSA INSOLVENTE DA SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES A…………………, SA [doravante A.], que havia julgado a pretensão da A. parcialmente procedente [com o seguinte segmento decisor: «a) reconhece-se o direito da Autora à prorrogação legal do prazo de execução da empreitada até 16.3.2006; b) anula-se a multa contratual aplicada à Autora, no valor de €: 399.652,94, por não preencher os requisitos estabelecidos pelo art. 201.º do DL n.º 59/99, de 2.3; c) caso tal multa tenha sido paga, condena-se o Réu a devolver à Autora o respetivo montante, de €: 399.652,94, acrescido dos juros à taxa legal em vigor, desde a data em que o réu procedeu à retenção da referida quantia até integral e efetivo pagamento; d) condena-se o Réu no pagamento à Autora da quantia que vier a ser liquidada a título de sobrecustos derivados da falta de disponibilização do edifício A, da ocorrência de rocha na escavação, das correções e definições do Projeto de Execução, das perturbações decorrentes de outros trabalhos simultâneos do dono da obra (art. 661.º, n.º 2 do Código de Processo Civil); e) condena-se o Réu no pagamento à Autora do valor de trabalhos a mais realizados, de montante apurado de €: 47.348,07 e em execução de sentença no montante não apurado, acrescido de juros vencidos, desde a data da receção provisória e até efetivo pagamento; f) condena-se a Autora a pagar ao Réu a quantia que vier a ser liquidada a título de custos: a) com o pagamento de honorários e despesas com as empresas que asseguraram a prestação de serviços de fiscalização da obra e coordenação da segurança da obra, no período compreendido entre 17.3.2006 e 17.5.2006, b) bem como com o pagamento de honorários pela assistência técnica à obra, prestada por ………….. – Arquitectura, Lda., no período compreendido entre os dias 17.3.2006 a 31.3.2006»].

2. Motiva a necessidade de admissão do recurso de revista [cfr. fls. 3013/3026] para efeitos de «uma melhor aplicação do direito», ante os erros de julgamento acometidos ao acórdão recorrido [violação expressa, segundo alega, das «disposições legais aplicáveis em matéria de apreciação da prova e da lei substantiva então vigente sobre os contratos de empreitadas de obras públicas» e que concretizou, ao que se extrai/infere da peça recursiva, na incorreta interpretação e aplicação, mormente do disposto nos arts. 164.º, 194.º, e 201.º, n.º 1, do DL n.º 59/99, de 02.03, cláusula 1.7.4 das cláusulas gerais do Caderno de Encargos, e 805.º, n.º 3, do Código Civil (CC)].

3. A A. notificada veio produzir contra-alegações [cfr. fls. 3033/3053], nas quais pugna, mormente, pela sua não admissão.

Apreciando:

4. Dispõe-se no n.º 1 do art. 150.º do CPTA que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

5. Do referido preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s no uso dos poderes conferidos pelo art. 149.º do CPTA, conhecendo em segundo grau de jurisdição, não são, em regra, suscetíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar quando: i) esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, revista de importância fundamental; ou, ii) o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

6. O TAF/SNT, apreciando a pretensão deduzida pela A., aqui recorrida, julgou-a parcialmente procedente tendo o R. sido condenado nos termos supra descritos.

7. O TCA/S manteve integralmente tal juízo, extraindo-se da sua pronúncia que a sentença daquele TAF, por um lado, não enfermava da nulidade de decisão que lhe foi acometida [«fundamentos estarem em oposição com a decisão» - art. 615.º, n.º 1, al. c), do CPC/2013 (cfr. págs. 30/36 do acórdão recorrido)] e que, por outro lado, a mesma não incorreu em erro de julgamento no segmento em que condenou o R. no pagamento dos juros de mora relativamente à quantia peticionada a título de trabalhos a mais realizados [cfr. págs. 36/43 do mesmo acórdão].

8. Compulsados os autos importa, destarte, apreciar «preliminar» e «sumariamente» se se verificam os pressupostos de admissibilidade referidos no n.º 1 do citado art. 150.º do CPTA.

9. E entrando nessa análise temos que não se mostra persuasiva a motivação/argumentação expendida pelo R., aqui recorrente, não se descortinando, em concreto, a necessidade de melhor aplicação do direito.

10. Com efeito, ante e presente aquilo que foi a efetiva pronúncia do TCA sob impugnação ressalta, desde logo, que os acometidos erros de julgamento, invocados em sede de revista, enquanto centrados no direito da A. à prorrogação legal do prazo de execução da empreitada e na validade da multa contratual aplicada, apresentam-se com e de dubitativa viabilidade de lograr procedência, já que não se extrai ou retira do acórdão recorrido uma expressa pronúncia sobre tais matérias/questões em termos de emissão de um concreto juízo quanto ao acerto ou desacerto do que havia sido o julgamento do TAF, porquanto a referência que é feita às mesmas surge para efeitos e no contexto/sede da pronúncia quanto à invocada nulidade de decisão, que, aliás, veio a ser julgada insubsistente, juízo este não impugnado e que, manifestamente, resulta diverso das questões/matérias ora invocadas enquanto erro de julgamento.

11. E para além da completa irrelevância que decorre da alegação do R. da ocorrência de violação expressa de «disposições legais aplicáveis em matéria de apreciação da prova e da lei substantiva então vigente sobre os contratos de empreitadas de obras públicas», motivadora da necessidade de melhor aplicação de direito, temos que, primo conspectu, quanto à demais motivação em que se estriba o outro erro de julgamento, o juízo que nesse segmento foi efetivamente firmado pelo TCA não aparenta padecer de erros lógicos ou jurídicos manifestos, mostrando-se o discurso estribado numa interpretação coerente e razoável do quadro legal em crise.

12. Em decorrência do exposto, não nos deparando ante pronúncia do tribunal a quo que claramente reclame a intervenção do órgão de cúpula da jurisdição para melhor aplicação do direito, não se justifica admitir a revista.

DECISÃO
Nestes termos e de harmonia com o disposto no art. 150.º do CPTA, acordam os juízes da formação de apreciação preliminar da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal em não admitir a revista.
Custas a cargo do R./recorrente.
D.N..

Lisboa, 07 de outubro de 2021. – Carlos Carvalho (relator) – Teresa de Sousa – José Veloso.