Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0969/12
Data do Acordão:01/23/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:BENEFÍCIOS FISCAIS
UTILIDADE TURÍSTICA
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P15171
Nº do Documento:SA2201301230969
Data de Entrada:09/24/2012
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

- Relatório -
1. A Fazenda Pública recorre para este Supremo Tribunal da sentença do tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, de 31 de Maio de 2012, de julgou procedente a impugnação deduzida por A……, com os sinais dos autos, contra o indeferimento de reclamação graciosa tendo por objecto a liquidação do Imposto do Selo com o DUC n.º 163.609.001.826.796, para o que apresentou as seguintes conclusões:
a) A questão decidenda é saber se a aquisição dos imóveis se destinou à instalação do empreendimento ou se este já se encontrava instalado;
b) In casu, não existindo ampliação ou melhoramento em mais de 50%, o reconhecimento dos benefícios respeitantes à isenção de IMT e redução de Imposto de Selo dependem de se considerar que a aquisição do impugnante se destinou a instalar um empreendimento qualificado de utilidade turística como o exige o art.° 20° n.° 1 do Decreto-Lei n.° 423/83 de 05/12;
c) O DL n.° 423/83 de 5/12 reestruturou profundamente o instituto de utilidade turística e previu, no seu art.° 7º, a concessão da utilidade turística a título prévio caso fosse atribuída antes da entrada em funcionamento dos empreendimentos:
i) novos;
ii) já existentes que fossem objecto de remodelação, beneficiação ou de reequipamento totais ou parciais;
iii) já existentes que aumentassem a sua capacidade em, pelo menos, 50%;
d) E previu a concessão da utilidade turística a título definitivo, caso fosse atribuída a empreendimentos já em funcionamento ou quando resultasse da confirmação da utilização turística a título prévio:
e) E foi precisamente ao abrigo destes normativos que, em 25-02-2011, foi publicado no Diário da República a atribuição da utilidade turística a título definitivo ao B……., de 5 estrelas, cujo funcionamento já iniciara em 2008/09/04;
f) Assim, não faz sentido, e carece de apoio legal, sustentar, como se faz na sentença recorrida, que a aquisição das fracções identificadas nos autos, integra a fase de instalação do empreendimento turístico, pois este não só já se encontrava instalado, como também já se encontrava em funcionamento;
g) A interpretação que a Fazenda Pública faz da norma em questão, é a de que esta apenas reconhece a possibilidade de ser atribuída a utilidade turística a empreendimentos que resultem de um directo investimento, traduzido quer na construção de empreendimentos novos, quer na remodelação, beneficiação ou reequipamento totais ou parciais, quer na realização de obras conducentes ao aumento da capacidade em, pelo menos, 50%;
h) Por esse motivo, o legislador entendeu atribuir benefícios fiscais em sede de Imposto de Sisa (IMT) e do Selo, às empresas proprietárias que realizam o esforço do investimento. Pretendeu o legislador impulsionar este sector de actividade, prevendo isenção/redução de pagamento de Sisa/Selo, mediante determinadas condições, a quem vai criar estabelecimentos turísticos, e não a quem se limita a adquirir fracções pertencentes a empreendimentos já instalados;
l) Na verdade, quando o legislador diz, no n° 1 do artigo 20°, “destino à instalação”, tal significa que se trata apenas de aquisições de prédios efectuadas com o intuito de neles construir/melhorar empreendimentos turísticos, e não da mera aquisição de prédios/fracções integradas em empreendimentos já construídos e instalados, como sucedeu no caso concreto;
m) Este é o entendimento e interpretação perfilhados pela Administração Tributária, e que decorre do elemento histórico, racional/teleológico, mas também literal das normas jurídicas em apreço;
n) Entendimento também perfilhado pelo TCA do Sul, acórdão n.° 4424/10, de 2011/10/18, proferido na Impugnação Judicial que correu termos, no TAF de Loulé, sob o n.°78/10.9BELLE;
o) Ao julgar que a aquisição da fracção se destinou à instalação do empreendimento turístico, a decisão contida no aresto ora recorrido viola o disposto naquela norma legal, incorrendo em erro de julgamento, porque não esta preenchido um dos condicionalismos que a lei impõe para que se verifique a isenção prevista no n.° 1 do Art.° 20.° do DL n.° 423/83, nomeadamente, que o imóvel adquirido se destine à instalação do empreendimento turístico.
Face ao exposto, deve ser dado provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogada a sentença recorrida, só assim se fazendo JUSTIÇA”.

2 – Contra-alegou a recorrida, concluindo nos seguintes termos:
A recorrente foi notificada, por carta registada datada de 26 de Junho do corrente, da admissão do recurso interposto, tendo o prazo de 15 dias para apresentação de alegações (cfr. artigo 282º, nº 3 do CPPT) terminado a 14 de Julho (sábado).
As alegações deveriam ter sido apresentadas no 1º dia útil seguinte ao do término do prazo.
Porém, não o foram, apenas tendo dado entrada em juízo a 9 de Agosto.
É certo que correm férias judiciais entre 15 de Julho e 31 de Agosto, de acordo com o artigo 12.º da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro, na redacção em vigor.
Não obstante, o seu decurso em nada interfere com a contagem do prazo da recorrente para alegar, pois este terminou precisamente antes do início de férias judiciais.
A prática do acto no 1º dia útil seguinte ao do termo do prazo não obsta o artigo 143.º n.º 1 do CPC segundo o qual “não se praticam actos processuais nos dias em que os tribunais estiverem encerrados nem durante o período de férias judiciais” já que este artigo só tem aplicabilidade nos casos em que, estando em curso um prazo processual, sobrevêm as férias judiciais, suspendendo-se, então, mesmo.
O que neste caso não aconteceu já que o prazo para apresentação de alegações decorreu todo antes de férias judiciais, razão pela qual não tem aplicação o disposto no artigo 144.º do CPC, nem, consequentemente, o disposto no artigo 143.º do mesmo diploma.
As alegações apresentadas são extemporâneas, o que equivale à sua falta, devendo, por isso, o recurso ser julgado deserto pelo tribunal recorrido, por força do disposto no artigo 282.º, n.º 3 do CPPT.
Ao contrário do alegado pela recorrente, a sentença recorrida não padece de qualquer erro de julgamento nem fez uma errada interpretação do artigo 20º do Decreto-lei 423/83, de 5 de Dezembro.
10ª
Da jurisprudência do STA resulta que sempre foi tido como suficiente, para o reconhecimento dos benefícios fiscais nele previstos, que o imóvel adquirido, em empreendimento turístico declarado como de utilidade turística, fosse destinado a exploração turística e não, como pretende recorrente, que se trate da primeira aquisição de um prédio onde venha a ser construído um empreendimento turístico novo ou, tratando-se de um já existente, que venha a sofrer obras de melhoria.
11ª
O que resulta do artigo 20º, n.º 1 do mencionado DL 423/83, de 5 de Dezembro como condição para que os benefícios fiscais de isenção de IMT e de redução de imposto de selo sejam concedidos é que o uso ou fim a que se destine o imóvel não possa ser outro senão a exploração turística do mesmo.
12ª
O conceito de instalação apresentado pela recorrente reduz inaceitavelmente o âmbito de aplicação do preceito.
13ª
O entendimento do Tribunal a quo, ao decidir que o empreendimento apenas estará definitivamente instalado quando todas as unidades de alojamento iniciarem o seu funcionamento, estando a primeira aquisição de cada fracção integrada nesse processo de instalação é o que se mostra mais consentâneo quer com a letra quer com espírito da lei, quer, ainda, com a interpretação sistemática da norma nele contida.
14ª
Entendimento este que já o Ministério Público tinha adoptado no parecer que precedeu a sentença.
15ª
A posição da recorrente é diametralmente oposta, fazendo com que o Estado, representado pelo Ministério Público e pela Fazenda Pública assuma, em relação ao mesmo assunto, duas posições antagónicas, situação que inadmissível num Estado de Direito em que a lei é única e se aplica a todas as entidades.
16ª
A interpretação do artigo 20º do DL 423/83, de 5 de Dezembro deve tomar em consideração o que actualmente se encontra previsto em matéria de instalação, exploração e funcionamento de empreendimentos turísticos consagrado no decreto-lei 39/2008, de 7 de Março, com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei n.º 228/2009, de 14 de setembro.
17ª
Este diploma consagra um novo paradigma em termos de exploração e funcionamento, encontrando-se as unidades de alojamento permanentemente em regime de exploração turística (artigo 45º).
18ª
Quem adquire uma unidade de alojamento num empreendimento turístico constituído ao abrigo do regime previsto no Decreto-lei n.º 39/2008, de 7 de Março, não pode dar-lhe outro destino senão a exploração para fins turísticos, sendo inclusivamente obrigado a mantê-lo equipado e pronto para ser locado para essa finalidade.
19ª
Pelo que, tal aquisição não constitui um negócio imobiliário, mas sim um investimento turístico, encontrando-se a propriedade, embora plena, limitada quanto ao uso a dar ao imóvel e quanto à possibilidade de a explorar, já que não pode ser o adquirente a fazê-lo, mas sim a entidade exploradora do aldeamento.
20ª
Além do mais, estando o empreendimento constituído em propriedade plural, o mesmo é composto, incindivelmente por cada uma das fracções autónomas que o integram, chamadas unidades de alojamento, de tal forma que cada uma delas constitui, em si, uma parte do empreendimento e sem cada uma delas o empreendimento não existe como tal.
21ª
Se cada unidade de alojamento tem obrigatoriamente de ser afecta à exploração turística - como foi, de facto, a dos recorridos - e se cada uma dessas unidades constitui ela própria uma parte do empreendimento, significa isso que quem adquire uma dessas unidades de alojamento, o faz para nela instalar (parte indivisível) de um empreendimento turístico.
22ª
De forma que não corresponde à realidade que só o promotor que adquire um imóvel para nele construir um empreendimento turístico ou para nele realizar obras de melhoria realiza investimentos turísticos.
23ª
Até porque, na realidade, quem realiza o investimento logo na fase de licenciamento e construção do empreendimento (dita de “instalação” pela recorrente) são os adquirentes das fracções, através do pagamento do sinal e dos reforços de sinal por força dos contratos promessa.
24ª
O promotor é que só realiza um investimento imobiliário, porque constrói e vende as unidades de alojamento.
25ª
Além do mais, são os proprietários das unidades de alojamento que garantem o nível de serviços do aldeamento, e não o promotor, ao pagarem uma prestação periódica mensal, cujo valor para o primeiro ano tem que ficar inscrito no contrato promessa e na escritura de compra e venda sob pena de nulidade dos mesmos, nos termos do disposto 54º, n.º 7 do DL 39/2008, de 7 de Março
26ª
Mesmo antes da entrada em vigor do DL 39/2008, de 7 de Março, sempre foi pacificamente admitido que basta que o imóvel adquirido em empreendimento classificado de utilidade turística venha a ser explorado turisticamente para que possa haver lugar aos benefícios fiscais de isenção de IMT e de redução de imposto de selo, não tendo de se tratar da primeira aquisição do imóvel para nele construir o próprio empreendimento (cfr. Acórdão do STA de 12 de Janeiro de 1999, disponível em www.dgsi.pt).
27ª
A data de abertura 04.09.2008 não significa o funcionamento do empreendimento nem a sua instalação, tanto assim que essa abertura (através de titulo válido de abertura) também é anterior à licença de utilização turística nº. 43/09 emitida em 05 de Março de 2009
28ª
O pleno funcionamento das 141 unidades de alojamento que compõem a totalidade do empreendimento só se conclui com a venda e concomitante cedência das mesmas à exploração por via de contratos de exploração turística celebrados em simultâneo com a escritura pública, entrando a partir dai em funcionamento, como bem entende o tribunal recorrido, não padecendo, por isso, a sentença recorrida de qualquer erro ou vício.
TERMOS EM QUE DEVE SER NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO MANTENDO-SE A DOUTA DECISÃO RECORRIDA, DESSA FORMA FAZENDO V/ EXAS. A COSTUMADA JUSTIÇA.

3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Supremo tribunal emitiu parecer nos seguintes termos:
(…)
A recorrida suscitou a questão prévia da intempestividade das alegações da recorrente, mas sem razão, a nosso ver.
De facto, a recorrente presume-se notificada do despacho de ADMISSÃO DO RECURSO EM 29 DE Junho de 2012 (fls. 120).
O prazo de 15 dias para produzir alegações terminaria a 14 de Julho, que corresponde a um sábado.
Assim, em princípio, o termo do prazo transferir-se-ia para o primeiro dia útil (artigo 144.º/2 do CPC).
Sucede que de 15 de Julho a 31 de Agosto decorreram as férias judiciais de Verão, pelo que durante esse período se suspendeu o prazo (artigo 144º/1 do CPC).
Ou seja o prazo para alegar terminaria em 3 de Setembro de 2012.
Uma vez que a alegações entraram em juízo em 9 de agosto de 2012 (fls. 122) é certo que a sua apresentação foi tempestiva.
A nosso ver o recurso merece provimento.
Situações em tudo idênticas à, ora, em apreciação têm vindo a ser decididas de forma pacífica pelo STA, no sentido da isenção de IMT e redução a 1/5 do Imposto do Selo (Acórdãos de 1999.02.09 – P907799; de 2010.01.20 – P. 934/09; de 2010.02.10 – P. 935/09; de 2010.04.14 – P. 0120/10, todos disponíveis no sítio da Internet www.dgsi.pt).
De facto, tem entendido o STA que os benefícios fiscais previstos no art. 20.º/1 do DL 423/83, de 5/12, não foram revogados pelo DL 485/88, de 30/12, uma vez que o âmbito da revogação operada pelo artigo 3.º/22 deste último diploma restringe-se apenas aos benefícios fiscais atribuídos em sede de contribuição industrial e imposto complementar; que tais benefícios são de aplicação automática desde que verificadas as condições previstas nesse mesmo preceito: que a aquisição do imóvel se destine à instalação de empreendimento qualificado de utilidade turística, ainda que tal qualificação seja atribuída a título prévio, desde que esta se mantenha válida e seja observado o prazo fixado para a abertura ao público do empreendimento e que atenta a natureza dos benefícios em causa não é condição que os mesmos constem do despacho de atribuição de utilidade pública.
No caso em análise apenas constitui objecto do recurso saber se a aquisição da fracção se destina à instalação de empreendimento qualificado de utilidade turística, questão que nos citados acórdãos do STA, embora a situação fáctica seja similar à, ora, em apreciação, nunca foi directamente questionada, pois que se aceitou o destino à instalação do empreendimento e, por conseguinte, nunca foi analisada.
Entende a Fazenda Pública que a aquisição da fracção não se destinou à instalação do empreendimento, uma vez que tal instalação já havia sido feita pela outorgante vendedora e proprietária/exploradora do empreendimento, “C……., Limitada.”
Por sua vez o tribunal recorrido, o MP junto da 1ª instância e a recorrida entendem, exactamente, o contrário, ou seja que a aquisição da fracção se destinou à instalação do empreendimento para os devidos e efeitos legais.
A nosso ver e ressalvado melhor juízo, a razão está do lado da recorrente, cujo discurso fundamentador se subscreve por inteiro.
Na verdade, nos termos do estatuído no artigo 20.°/l do DL 423/83, de 5/12, é condição para que seja concedida a redução do imposto de selo que a aquisição se destine à instalação de empreendimento turístico.
Ora, resulta, claramente, do probatório que à data da aquisição da fracção em causa (2009.12.09), o empreendimento turístico “B………” já se encontrava, absolutamente, instalado e em funcionamento desde 2008.09.04, por promoção da entidade proprietária/exploradora “C…….,, Limitada”.
De facto, a recorrida não adquiriu a unidade de alojamento (fracção autónoma) para instalação de empreendimento turístico, uma vez que o mesmo já estava instalado, embora seja certo que o mesmo ficou afecto à exploração turística do empreendimento e do qual faz parte integrante.
Apenas a transmissão inicial beneficia de isenção de IMT e redução de IS a 1/5 e já não as transmissões subsequentes, como é o caso da aquisição, ora, em apreciação.
A redução do imposto de selo em 1/5 consubstancia um benefício fiscal (artigo 2.°/2 do EBF).
Os benefícios fiscais são medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes e que sejam superiores aos da própria tributação que impedem (artigo 2.°/1 do EBF).
As normas que estabelecem benefícios fiscais não são susceptíveis de integração analógica, embora admitam interpretação extensiva (artigo 10.º do EBF).
De qualquer modo, não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência, ainda que imperfeitamente expresso (artigo 9.°/2 do C. Civil).
A interpretação da sentença recorrida de que a isenção e redução de impostos se aplica, também, às transmissões subsequentes à inicial, ou seja, a respeitante à aquisição do imóvel por parte da entidade promotora do investimento, (ressalvada a situação, expressamente, prevista no n.° 2 do artigo 20.° do DL 423/83), a nosso ver, não tem na letra da lei a menor correspondência verbal, sendo, pois, ilegal.
A sentença recorrida, merece, pois, censura.
Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso jurisdicional, revogando-se a sentença recorrida e mantendo-se, consequentemente, na ordem jurídica a liquidação impugnada.

4 – Notificadas as partes do parecer do Ministério Público (fls. 164 a 166 dos autos) nada vieram dizer.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
- Fundamentação -
5 – Questões a decidir
Importa, a título prévio, decidir da tempestividade da apresentação das alegações de recurso pela recorrente Fazenda Pública, questão suscitada pela recorrida nas suas contra-alegações e que, por ser matéria de excepção, importa conhecer como questão prévia.
Improcedendo a excepção de intempestividade das alegações haverá que conhecer do mérito do recurso, sendo a questão de mérito objecto deste a de saber se, como alegado, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao decidir que a impugnante beneficiava da redução a 1/5 do Imposto do Selo prevista no artigo 20.º do Decreto-lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro pois que a aquisição da fracção integrada em empreendimento a que foi atribuída utilidade turística se destinava à instalação do mesmo.

6 – É do seguinte teor o probatório fixado na sentença recorrida:
A) Em 9 de Dezembro de 2009, entre a Impugnante, na qualidade de segundo outorgante e “C…….., LIMITADA”, com sede nas ……. Loulé, ............, freguesia de Almancil, concelho de Loulé, pessoa colectiva ……., na qualidade de primeiro outorgante e outros, foi celebrada a escritura pública de compra e venda de fls. 23 a 28, que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os legais efeitos.

B) Declarou a Primeira Outorgante (fls. 25):
«Que vende à segunda outorgante, pelo preço de UM MILHÃO E CINQUENTA MIL EUROS, QUE JÁ RECEBEU, a fracção autónoma designada pela letra “W” Bloco B zero, Zona da Praia, fracção R14, primeiro andar, destinada a habitação e classificada para fins turísticos, de um prédio urbano designado denominado “C……. ou B………”, Aldeamento Turístico de Cinco Estrelas, situado em .................., freguesia de Almancil, concelho de Loulé, inscrito na matriz sob o artigo 12988, com o valor patrimonial tributável de 286.890,00 euros;
Descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob o número dez mil duzentos e oitenta e dois/dois mil e oito zero quatro zero zero nove, registada a favor da sociedade sua representada pelas apresentações quarenta e seis, quarenta e sete e quarenta e oito de onze de Março de dois mil e três; registada a constituição de Empreendimento Turístico com propriedade horizontal pela apresentação cinco mil duzentos e doze de dezasseis de Março de dois mil e nove (…)»

C) Em 8/12/2009, a Impugnante efectuou o pagamento do IS a que se refere a liquidações de fls. 34.

D) Em 9/11/2009, entre a Impugnante e B'…….., S.A., foi celebrado um contrato de exploração turística relativo à fracção a que se refere a alínea B), cfr. fls. 21 e segs. da reclamação graciosa.

E) Resulta do contrato a que se refere a alínea anterior:
«É celebrado o presente contrato, em conformidade com o disposto o artigo 45, número 3 do Decreto-Lei n.° 39/2008 de 7 de Março, através do qual o signatário, na qualidade de proprietário de uma fracção considerada unidade de alojamento do B……., habilita a entidade exploradora à exploração da sua fracção, nos termos e condições constantes do clausulado que se anexa, rubricado pelas partes. »

F) A fracção autónoma a que se refere a alínea B) no Aldeamento Turístico denominado B…….., composto por 141 fracções, nomeadamente um CIub House e 140 unidades de alojamento que fazem parte integrante do mesmo, com a classificação definitiva de cinco estrelas, cfr. fls. 35 e segs..

G) Em 05/03/2009, a Câmara Municipal de Loulé emitiu a “Licença de Utilização Turística N.º 43/09” a favor do C……., Lda., que constitui fls. 80 da impugnação e que aqui se dá por integralmente reproduzido, donde resulta com interesse para a decisão:
8 CLASSIFICAÇÃO PROVISÓRIA QUATRO ESTRELAS
9 CAPACIDADE MÁXIMA PROVISÓRIA
Efectivo total do CLUBHOUSE é de 483 pessoas, efectivo total nos blocos de apartamentos de 650 pessoas – efectivo total nas moradias de 48 pessoas.
10 CLASSIFICAÇÃO DEFINITIVA CINCO ESTRELAS
11 CAPACIDADE MÁXIMA DEFINITIVA
372 camas fixas individuais e 140 duplas, equivalente a 652 utentes, distribuídas por 140 unidades de alojamento (9 T1, 76 T2 e 55 T3), uma das quais adaptada a pessoas com mobilidade condicionada. Por despacho do Turismo de Portugal, I.P. de 13/02/2009
H) Resulta do despacho n.° 3716/2011, publicado na II Série n.° 40, de 25/02/2011:









I) Em 24/06/2011, a ora Impugnante reclamou graciosamente contra a liquidação de IS, cfr. reclamação graciosa em apenso.

J) Na reclamação graciosa a que se refere a alínea foi prestada a seguinte informação (fls. 41 da reclamação graciosa): (reproduzida a fls. 87 a 89 dos autos)

K) Na Direcção de Finanças de Faro, foi proferida a informação de fls. 54 e segs., que aqui se dá por integralmente reproduzida e donde resulta com interesse para a decisão: (reproduzido a fls. 89 a 92 dos autos)

L) Sobre a informação a que se refere a alínea anterior recaiu o seguinte projecto de despacho (fls. 54 da reclamação graciosa):
«Concordo
Indefiro nos termos propostos
2011/07/28»

M) A Impugnante notificada exerceu o direito de audição, cfr. fls. 62 da RECLAMAÇÃO GRACIOSA.

N) Em apreciação do direito de audição foi elaborada a informação de fls. 68 e segs. da reclamação graciosa, que aqui se dá por integralmente reproduzida e donde resulta com interesse para a decisão: (fls. 93 a 95 dos autos).

O) Sobre a informação a que se refere a alínea anterior recaiu o seguinte despacho (fls. 67 da reclamação graciosa).
« Concordo.
Torno definitivo o projecto de despacho de indeferimento de 2011/07/28
Faro, 2011/08/08»
P) A Impugnante foi notificada do despacho a que se refere a alínea anterior em 10/08/2011, cfr. fls. 71 a 74 da reclamação graciosa.

Q) A petição inicial foi apresentada em 23/08/2011, cfr. fls. 2.

R) Resulta do DUC 160.611.013.985.003, de 11/05/2011, de fls. 31 da reclamação graciosa:
SUJEITO PASSIVO – ……..
D…….
AV …….. – ……. – ……..
ALMANCIL
Território Nacional
Estado Civil: Cas. Regime Casamento: separação de bens NIF do Cônjuge: ……..
FACTO TRIBUTÁRIO
1 – Aquisição do direito de propriedade plena sobre Imóveis
BEM – 1
Prédio: U – 12988-BE Concelho: LOULE Freguesia: ALMANCIL Localização: Urb. ……. Sitio do ..........., Apartado ……. Almancil 8135-…… ALMANCIL Tipo: Presente Destino: Serviços
ALIENANTE DO BEM – 1
Identificação Fiscal: ……. Nome: B’'…………. LDA Parte 1/1 N.º Liquidação: 4270958 Valor Patrimonial IMT: €172.490,00 Valor Declarado: €640.000,00 Benefícios: 33 – Utilidade Turística (Art.º 20.º do D.L. 423/83), 100% sobre a matéria colectável Matéria Colectável: € 640.000,00 Taxa: 6,50% Colecta: € 0,00

Valor Global do acto ou Contrato: € 640.000,00

S) Resulta do DUC 163.811.000.243.048, de 11/05/2011, de fls. 32-a da reclamação graciosa:
SUJEITO PASSIVO – …….
D……..
AV …….. – ……. – …….
ALMANCIL
Território Nacional
Estado Civil: Cas. Regime Casamento: separação de bens NIF do Cônjuge: ……..
FACTO TRIBUTÁRIO
1 – Aquisição do direito de propriedade plena sobre Imóveis
BEM – 1
Prédio: U – 12988-BE Concelho: LOULE Freguesia: ALMANCIL Localização: Urb. …….., Sitio do............., Apartado ……. Almancil 8135-……. ALMANCIL Tipo: Presente Destino: Serviços
ALIENANTE DO BEM – 1
Identificação Fiscal: …… Nome: B’'………… LDA Parte 1/1 N.º Liquidação: 4270958 Valor Patrimonial IMT: €172.490,00 Valor Declarado: €640.000,00 Benefícios: 33 – Utilidade Turística (Art.º 20.º do D.L. 423/83), 80% sobre a matéria colectável Matéria Colectável: € 640.000,00 Taxa: 0,80% Colecta: € 1.024,00

Valor Global do acto ou Contrato: € 640.000,00

7. Apreciando
7.1 Questão prévia: Da alegada extemporaneidade da apresentação das alegações de recurso
Nas contra-alegações de recurso que apresentou, a recorrida alega a título prévio a extemporaneidade da apresentação das alegações de recurso por parte da Fazenda Pública, pretendendo que o recurso seja julgado deserto por falta de apresentação tempestiva das respectivas alegações, visto que a recorrente foi notificada, por carta registada datada de 26 de Junho do corrente, da admissão do recurso interposto, tendo o prazo de 15 dias para apresentação de alegações (cfr. artigo 282º, nº 3 do CPPT) terminado a 14 de Julho (sábado), deveriam, pois, ter sido apresentadas no 1º dia útil seguinte ao do término do prazo, mas, não o foram, apenas tendo dado entrada em juízo a 9 de Agosto e, não obstante as férias judiciais entre 15 de Julho e 31 de Agosto, o seu decurso em nada interfere com a contagem do prazo da recorrente para alegar, pois este terminou precisamente antes do início de férias judiciais, pelo que entende que as alegações foram apresentadas intempestivamente, o que corresponde à sua falta e conduz a que o recurso seja julgado deserto (cfr. conclusões 1.ª a 8.ª das contra-alegações).
Não tem, contudo, razão a recorrida, pois que que o presente processo não reveste natureza urgente, sendo apenas esse o caso em que lhe era exigível ter apresentado as alegações no primeiro dia útil seguinte ao termo do respectivo prazo dentro do período de férias judiciais, pois que para os processos urgentes tais prazos não se suspendem (cfr. o n.º 1 do artigo 144.º do Código de Processo Civil – CPC).
Ora, não sendo o processo urgente, o prazo de 15 dias para alegações estabelecido no n.º 3 do artigo 282.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que se iniciou no dia 29 de Junho de 2012 - pois que foi dado à recorrente conhecimento do despacho de admissão do recurso por carta registada do dia 26 de Junho (fls. 120 dos autos), presumindo-se esta notificada no terceiro dia posterior ao do registo postal (ex vi do disposto no n.º 3 do artigo 254.º do CPC) – apenas teve o seu termo no dia 3 de Setembro de 2012 (pois que, no ano de 2012, os dias 14 e 15 de Julho e 1 e 2 de Setembro foram dias não úteis, Sábados e Domingos), pois que o prazo de 15 dias, contado de forma contínua, terminou a um sábado, transferindo-se pois para o termo do prazo para o primeiro dia útil seguinte (cfr. o n.º 2 do artigo 144.º do CPC) e nesse dia estava já suspenso em virtude das férias judiciais de verão, férias estas que, como é sabido, decorrem entre 15 de Julho e 31 de Agosto.
Ora, tendo as alegações de recurso da recorrente dado entrada no tribunal recorrido no dia 9 de agosto de 2012 (cfr. a data constante do carimbo nelas aposto, a fls. 122 dos autos), ou seja no decurso das férias judiciais, impõe-se concluir que foram tempestivamente apresentadas, pois que em momento anterior ao termo do prazo, que, como dissemos já, apenas terminava efectivamente no dia 3 de Setembro.

Não há, pois, ao contrário do alegado, que julgar deserto o recurso por intempestividade da apresentação das alegações pela recorrente, improcedendo deste modo a excepção invocada pela recorrida.

7.2 Do mérito do recurso
A sentença recorrida, a fls. 82 a 108 dos autos, julgou procedente a impugnação deduzida pela ora recorrida contra a liquidação do Imposto do Selo sindicada, por ter entendido que a aquisição que está na origem do imposto sindicado se destinou à instalação de empreendimento qualificado de utilidade turística, porquanto a primeira aquisição de cada fracção está integrada no processo de instalação do empreendimento e, no caso dos autos, a Impugnante realizou a primeira aquisição da fracção, beneficiando assim do disposto no artº 20.º, nº 1, do Decreto-Lei n.º 423/83, por se tratar de aquisição com destino à instalação do empreendimento (cfr. sentença recorrida, a fls. 107 e 108 dos autos).
Discorda do decidido a Fazenda Pública, imputando à sentença recorrida erro de julgamento porque não está preenchido um dos condicionalismos que a lei impõe para que se verifique a isenção prevista no n.° 1 do Art.° 20.° do DL n.° 423/83, nomeadamente, que o imóvel adquirido se destine à instalação do empreendimento turístico, pois que este estava já instalado e em funcionamento quando a aquisição do imóvel teve lugar, pugnando por que se entenda que quando o legislador diz, no n° 1 do artigo 20°, “destino à instalação”, tal significa que se trata apenas de aquisições de prédios efectuadas com o intuito de neles construir/melhorar empreendimentos turísticos, e não da mera aquisição de prédios/fracções integradas em empreendimentos já construídos e instalados, como sucedeu no caso concreto.
Importa, pois, determinar, se a primeira aquisição de imóvel integrado em empreendimento a que foi atribuída utilidade turística ainda integra a fase de instalação do empreendimento.
Vejamos, pois.
Questão idêntica à que é objecto dos presentes autos foi hoje decidida em julgamento ampliado, nos termos do disposto no artigo 148.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, no rec. n.º 968/12, ao qual devemos aderir, atento o dever do juiz de contribuir para a uniformidade de jurisprudência, não obstante aí termos consignado, por adesão ao voto de vencido da Senhora Conselheira Dulce Neto, o entendimento diverso que temos da questão decidenda.
Reitera-se, pois, também nos presentes autos, acolhendo os fundamentos daquele outro acórdão, que para efeitos do benefício fiscal previsto no n.º 1 do artigo 20.º do Decreto-lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, que a primeira aquisição de fracção destinada à exploração turística não integra já a fase de instalação do empreendimento, razão pela qual, no provimento do recurso, haverá que revogar a sentença recorrida e julgar improcedente a impugnação.

O recurso merece, pois, provimento.

- Decisão -
8 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da secção de contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar improcedente a impugnação.

Custas pela recorrida, em 1ª instância e neste STA.

Lisboa, 23 de Janeiro de 2013. - Isabel Marques da Silva (relatora) - Lino Ribeiro - Dulce Neto.