Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:045/06.7BEPRT
Data do Acordão:04/07/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:AUDIÊNCIA PRÉVIA
PRINCÍPIO DA IMPUGNAÇÃO UNITÁRIA
PRETERIÇÃO DE FORMALIDADE POSTERIOR À LIQUIDAÇÃO
Sumário:I - O direito de audiência prévia de que goza o administrado incide sobre o objecto do procedimento, tal como ele surge após a instrução e antes da decisão. Estando em preparação uma decisão, a comunicação feita ao interessado para o exercício do direito de audiência deve dar-lhe conhecimento do projecto da decisão, a sua fundamentação, o prazo em que o direito pode ser exercido e a informação relativa à possibilidade de exercício do citado direito por forma oral ou escrita (cfr.artºs.23, nº.4, e 60, nºs.5 e 6, da L.G.T.; artº.122, do C.P.Administrativo).
II - A falta de audição prévia do contribuinte, nos casos em que é obrigatória, constitui um vício de forma do procedimento tributário susceptível de conduzir à anulação da decisão que vier a ser tomada (cfr.artº.60, da L.G.T.; artº.163, do C.P.Administrativo).
III - De acordo com o princípio da impugnação unitária, consagrado no artº.54, do C.P.P.T., a impugnação contenciosa do acto final do procedimento tributário, normalmente a liquidação, acto tributário por excelência, deve abarcar qualquer ilegalidade anteriormente cometida no mesmo procedimento, ressalvando-se os actos destacáveis que o legislador prevê (cfr.v.g.artº.134, do C.P.P.T.).
IV - Nos presentes autos, estamos face a formalidade posterior às liquidações impugnadas, a qual não pode ter qualquer repercussão sobre estas. Por outras palavras, o vício de procedimento em causa (alegada falta de audição prévia), a existir, apenas poderia conduzir à anulação da respectiva decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa deduzido pelo recorrente, por tal efeito se quedando, mas nunca podendo ter como consequência a anulação dos actos tributários impugnados. Face a estes, tal vício de procedimento não surte quaisquer efeitos invalidantes, devendo antes visualizar-se como formalidade não essencial que em nada afectou os direitos de defesa do impugnante/recorrente.
(sumário da exclusiva responsabilidade do relator)
Nº Convencional:JSTA000P27459
Nº do Documento:SA220210407045/06
Data de Entrada:10/22/2018
Recorrente:A.................., SA
Recorrido 1:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
"A………………….., S.A.", com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mº. Juiz do T.A.F. do Porto, exarada a fls.711 a 719 do processo, a qual julgou improcedente a presente impugnação intentada pela sociedade ora recorrente, visando a liquidação adicional de I.V.A. relativa ao ano fiscal de 1995 e no valor total de 300.989.765$00/€ 1.501.330,62, tal como a liquidação de juros compensatórios de I.V.A., relativa ao período 6/95 e no montante de 105.222.723$00/€ 524.848,73.
X
O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.724 a 751-verso do processo físico) formulando as seguintes Conclusões:
1-A douta Sentença recorrida padece de erro de julgamento;
2-Com efeito, e contrariamente ao decidido, não se pode afirmar, em abstracto, que, ainda que tivesse sido concedida ao contribuinte a possibilidade deste exercer o seu direito de audição prévia (antes das liquidações) – e o contribuinte exercesse efectivamente esse direito – essas liquidações, ainda assim, teriam sido inevitavelmente emitidas pela AF nos precisos termos em que o foram;
3-A circunstância da AF ou do Tribunal, passada mais de uma década em relação à data das liquidações, ter vindo considerar que estas não padeciam dos concretos erros de facto ou de direito que lhes foram imputados no processo de reclamação graciosa e, depois, no processo de impugnação nº IMP121/01/21, não significa, necessariamente, que as liquidações não possam padecer de outros erros de facto o de direito;
4-Com efeito, o contribuinte, previamente à emissão das liquidações, poderia ter suscitado outras questões e imputado às liquidações outros vícios, junto da AF, no exercício do seu direito de audição prévia;
5-E ninguém pode garantir, em abstracto, que a posição da AF, perante essa eventual arguição em sede do exercício do direito de audição prévia por parte do contribuinte, teria sido necessariamente a emissão das liquidações nos precisos termos em que as mesmas vieram a ser emitidas;
6-Aliás, o processo de impugnação nº IMP121/01/21 foi julgado procedente em 1ª Instância – ou seja, os vícios aí concretamente imputados aos actos de liquidação foram julgados procedentes;
7-Não se tratando, portanto, de questões de interpretação inequívoca;
8-Pelo que não se pode afirmar, em abstracto, que o eventual exercício do direito de audição, antes das liquidações, seria de todo inútil;
9-E para maior evidência desse facto, basta constatar o teor da proposta de deferimento da reclamação graciosa deduzida contra as liquidações em causa, do Exmo. Chefe do 1º SF da Maia, a fls. 35 e ss. dos autos de reclamação apensos àquele processo nº IMP121/01/21 (cfr. doc. 1 aqui anexo);
10-Bem como o teor da Informação dos Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária do Porto, a fls. 43 e 44 daqueles autos de reclamação (cfr. doc. 2 aqui anexo);
11-Uma e outra claramente direccionadas para o deferimento administrativo das pretensões do contribuinte e, por isso, para a anulação das liquidações;
12-Como se afirma no douto Acórdão do Pleno da Secção de CA do STA, de 02.06.2004, Proc. 01591/03, in www.dgsi.pt, «Ora, como este STA tem reiteradamente decidido, “sempre que exista a possibilidade de os interessados, através da audiência prévia, influírem na determinação do sentido da decisão final, não haverá que retirar efeitos invalidantes ao vício de preterição da referida formalidade” (Ac. de 28.11.2001 – Rec. 46.586).»;
13-A decisão proferida no processo de impugnação nº IMP121/01/21 significa apenas que foram julgados improcedentes os vícios que ali foram imputados aos actos de liquidação;
14-Mas não significa, necessariamente, que as liquidações não possam padecer de outros vícios ou erros;
15-Assim, e porque a douta Sentença recorrida expressamente reconhece a ocorrência deste vício de violação do direito de audição prévia antes das liquidações, impõe-se a anulação das mesmas, em virtude da preterição dessa formalidade legal essencial;
16-E a isso nada obsta o conteúdo da decisão proferida naquele processo de impugnação nº IMP121/01/21, já que, neste processo de impugnação nº IMP121/01/21, não estava em causa a violação do direito de audição prévia, pelo que, quanto a ela, o ali decidido não constituiu “caso julgado”;
17-Com efeito, e como é entendimento unânime, ainda que o acto de liquidação eventualmente não padeça de quaisquer outros vícios, a violação do direito de audição prévia é passível de, só por si, conduzir à anulação dessas mesmas liquidações;
18-O respeito pelo “direito de audição” tem assento constitucional, impondo a obrigatoriedade de assegurar a participação dos interessados nas decisões administrativas que lhes dizem respeito, conforme determina o artigo 267º nº 5 da CRP – violado pela douta Sentença recorrida;
19-E conforme estipulava, à data das liquidações, o CPT, no seu artigo 19º c), segundo o qual o “direito de audição” constituía garantia dos contribuintes, sendo perfeitamente autónoma do direito de reclamação ou impugnar contra as liquidações – preceito legal, aquele, igualmente violado pela douta Sentença recorrida;
20-Padecendo a douta Sentença, também, de violação do artigo 100º do CPA, que já impunha, antes da entrada em vigor da LGT, o respeito pelo direito de audição prévia;
21-As decisões proferidas posteriormente às liquidações, em processo de reclamação ou de impugnação judicial, porque autónomas do “direito de audição prévia” em sede administrativa, não podem “prejudicar” a essencialidade ou não deste mesmo direito;
22-A douta Sentença recorrida padece também de errada interpretação e aplicação do artigo 103º nº 2 a) do CPA;
23-Já que este preceito apenas permite a dispensa da audiência prévia se os interessados já se tiverem pronunciado, no procedimento, sobre as questões que importem à decisão – o que, manifestamente, não foi o caso;
24-Sendo claro que não foi conferida ao contribuinte qualquer oportunidade deste exercer o seu direito de audição prévia no procedimento administrativo de liquidação de imposto, é evidente que não se pode dispensar esse direito com fundamento precisamente no facto do contribuinte já se ter pronunciado anteriormente, nesse mesmo procedimento administrativo de liquidação de imposto;
25-Sendo certo que o fornecimento de informações e documentos à AF, a pedido desta, no âmbito do precedente procedimento inspectivo, tem a ver com a “instrução” prévia do procedimento administrativo de liquidação – e não com a concessão ao contribuinte da oportunidade deste exercer o seu direito de audição prévia;
26-Por outro lado, as liquidações adicionais de imposto, no caso, não constituíram “actos de 2º grau ou secundários”;
27-Aliás, a douta Sentença não especifica quais terão sido, então, os actos tributários de “1º grau ou primários”, muito menos por que razões afirma que “o contribuinte já foi ouvido no acto primário ou de 1º grau”;
28-Se a douta Sentença, porventura, se reporta, quando fala em acto de “1º grau ou primário”, ao anterior reembolso de IVA ao contribuinte, importa dizer que esse reembolso ocorre nas situações em que o contribuinte autoliquida, em declaração periódica de IVA, IVA dedutível (a montante) superior ao IVA liquidado (a jusante) e opta por solicitar o reembolso do respectivo crédito líquido de imposto (ao invés de optar pelo reporte desse crédito para períodos de imposto subsequentes);
29-Não podem os actos liquidação adicional de IVA e de juros compensatórios em questão constituir “actos secundários ou de 2º grau” quando, no caso, inexistem quaisquer actos administrativos de “1º grau ou primários”;
30-E nada se provou no sentido de que o contribuinte tivesse sido previamente ouvido, no mesmo procedimento de liquidação, relativamente a qualquer anterior “acto primário ou de 1º grau”, sequer relativamente ao anterior reembolso de imposto;
31-Os sinais dos autos demonstram que aquele antecedente reembolso de IVA foi deferido e concedido ao contribuinte, constituindo as liquidações aqui impugnadas, por isso, o contrário, o inverso daquele anterior deferimento do reembolso de IVA;
32-Ora, ainda que, por mera hipótese, as liquidações em questão constituíssem, no caso, “actos secundários ou de 2º grau”, justifica-se sempre a prévia audiência dos interessados “quando o acto secundário se basear em matéria de facto nova que não conste do procedimento de primeiro grau e a decisão for desfavorável ao particular” (cfr. Freitas do Amaral, cit. supra);
33-Ora, dos autos não resulta qualquer sinal no sentido de que a concessão do reembolso e as liquidações aqui impugnadas ter-se-ão baseado na mesma matéria - aliás, é evidente que não terá sido o caso, pois são actos completamente opostos e de origem completamente distinta;
34-O contribuinte, antes da emissão do relatório inspectivo e das liquidações, nunca havia sido “confrontado” com o enquadramento jurídico que a AF entendeu conferir aos factos que a própria apurou no procedimento inspectivo;
35-Efectivamente, o contribuinte só teve oportunidade de se defender, quanto a essa concreta factualidade e respectivo enquadramento jurídico, depois de emitidas as liquidações;
36-Como é claro, o direito de audição “prévia” pressupõe a concessão ao contribuinte de uma garantia – de defesa – previamente à conclusão do procedimento administrativo (no caso, do procedimento administrativo de liquidação);
37-O que não foi o caso, como é notório em face dos sinais dos autos - em circunstância alguma foi o contribuinte notificado de qualquer “projecto” de relatório inspectivo ou de liquidação, para efeitos do exercício do direito de audição prévia;
38-E as liquidações aqui impugnadas não foram precedidas de quaisquer outras liquidações, relativamente à mesma questão;
39-Padece a douta Sentença recorrida, por isso, de erro de julgamento;
Quanto à violação do direito de audição prévia antes do despacho de indeferimento do pedido de revisão oficiosa:
40-Embora a violação do direito de audição prévia antes do indeferimento do pedido de revisão oficiosa não produza efeito invalidade das liquidações, por estarem em causa actos tributários distintos;
41-O acto tributário de indeferimento do pedido de revisão oficiosa, constatada que foi a violação do direito de audição prévia, deveria ter sido anulado – e, com isso, a impugnação julgada procedente, ao menos na parte em que esta concerne ao acto tributário de indeferimento do pedido de revisão oficiosa;
42-Sendo certo que a presente impugnação judicial, conforme resulta da respectiva p.i. e dos demais sinais dos autos, teve por “objecto imediato” precisamente o acto tributário de indeferimento expresso do pedido de revisão oficiosa, e, por “objecto mediato”, as referidas liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios;
43-Embora não possa produzir efeito invalidade das liquidações, nem por isso a impugnação deixa de ter por objecto, também, o acto tributário de indeferimento, de modo que, se este padecer de algum vício, deve o mesmo ser anulado, com a consequente procedência da impugnação;
44-Sendo que, conforme reconhece a douta Sentença, também este indeferimento do pedido de revisão oficiosa, proferido já sob a égide da LGT, não foi precedido da concessão, ao contribuinte, da possibilidade deste exercer o seu direito de audição prévia – ao contrário do que impunha e impõe o artigo 60º nº 1 b) e nº 5 da LGT (cfr. artigo 267º nº 5 da CRP), não se verificando qualquer caso de dispensa do direito de audição prévia (artigo 60º nº 2 e 3 da LGT);
45-Padece a douta Sentença recorrida, por conseguinte, e neste segmento decisório, de erro de julgamento e de errada interpretação e aplicação destas disposições legais;
Sem prescindir, quanto à dispensa do remanescente da taxa de justiça,
46-Vem a Impugnante/Recorrente, ao abrigo do artigo 6º nº 7 do RCP, solicitar a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça correspondente ao valor do processo excedente a € 275.000,00;
47-Sendo certo que também a Recorrida requereu esta dispensa, conforme resulta dos sinais dos autos;
48-A douta decisão de mérito proferida nos presentes autos não se revestiu de elevado grau de complexidade;
49-O processo não contém articulados prolixos;
50-Não foi produzida prova testemunhal nem pericial;
51-Não estavam em causa questões de elevada especialização jurídica, especificidade técnica ou a análise de questões jurídicas muito diferenciadas;
52-Aliás, a decisão sob recurso é exactamente igual à Sentença anteriormente proferida;
53-Pelo que o processo revelou-se de reduzida complexidade, à luz dos critérios legais elencados nas alíneas a) a c) do nº 7 do artigo 530º do CPC;
54-Por outro lado, a Impugnante já suportou elevado valor de taxa de justiça em virtude do respectivo “impulso processual,” conforme resulta dos sinais dos autos;
55-E a conduta processual das partes foi e tem sido exemplar;
56-De modo que exigir custas pelo valor do processo excedente a € 275.000,00, no caso concreto, mostra-se desproporcionado e violador dos princípios da proporcionalidade e igualdade;
57-As normas legais definidoras das custas processuais - quando interpretadas no sentido em que o montante da taxa de justiça devida no processo e recursos neles interpostos é definido em função do valor da acção sem qualquer limite máximo ao montante das custas, e na medida em que se não permite ao tribunal que limite o montante de taxa de justiça devido no caso concreto - é materialmente inconstitucional;
58-A desproporção intolerável e o montante manifestamente excessivo das custas em causa releva também em sede de inconstitucionalidade orgânica;
59-Pelo exposto, a norma legal constante da tabela I do RCP, na interpretação atrás referida, é inconstitucional por violação do disposto no art.º 2.º e 18.º, n.º 2, 2.ª parte da CRP (violação do princípio da proporcionalidade), do art.º 20.º da CRP (violação do direito ao acesso aos tribunais) e do artigo 13.º da CRP (violação do princípio da igualdade);
60-Por conseguinte, o artigo 6º nº 7 do RCP, na interpretação segundo a qual o volume da taxa de justiça se determina exclusivamente em função do valor processual da causa (sem qualquer limite máximo, pois), deve declarar-se materialmente inconstitucional por violação dos ditos princípios constitucionais da proporcionalidade de justiça (artigo 266º nº 2 da CRP).
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Não foram produzidas contra-alegações no âmbito da instância de recurso.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no qual termina pugnando pelo não provimento do recurso (cfr.fls.757 a 759 do processo físico).
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Corridos os vistos legais (cfr.fls.768 e 769 do processo físico), vêm os autos à conferência para deliberação.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.713 a 715 do processo físico):
1-Na sequência de uma acção de fiscalização a que procederam os Serviços de Inspecção Tributária da Direcção do Porto, foram efectuadas correcções à impugnante, A………………., S. A., em sede de Imposto sobre o Valor Acrescentado, relativamente ao ano de 1995 - cf. relatório de inspecção tributária constante de fls. 40 a 44 e 107 a 125 do processo administrativo apenso aos autos;
2-Na sequência de tal acção, a Administração Tributária concluiu ter reembolsado indevidamente a impugnante Imposto sobre o Valor Acrescentado no montante de 300.989.765$00;
3-Da nota de fundamentação das correcções técnicas subjacentes à liquidação impugnada, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido (fls. 40 a 44 do apenso), consta o seguinte:
"1-Para além da compra e venda de imóveis, a actividade da empresa consistiu na construção de um imóvel, entre 1994 e 1995, no Lugar do (…), freguesia e concelho de Azambuja, e seu arrendamento, actividade esta enquadrada como isenta nos termos do n.º 30 do art.° 9.° do CIVA.
2-No entanto, a empresa optou pela renúncia à isenção de IVA relativamente ao referido imóvel ("prédio urbano destinado a armazenamento e entreposto de produtos, com a área coberta de 21.964,5 m2 e descoberta de 143.955,5 m2"), nos termos dos n.º 4 a 7 do art.° 12° do CIVA e do Dec. Lei n.º 241/86, de 20 de Agosto.
3-Foi, pois, na sequência desta renúncia à isenção que a empresa solicitou no período 95-06 o reembolso de IVA, no valor de Esc.300.989.765$00, que após análise interna foi deferido pela sua totalidade.
4-O Decreto-Lei n.º 241/86 estabelece as formalidades e os condicionalismos a observar pelos S. P.s que decidem optar pela aplicação do IVA à transmissão ou à locação de bens imóveis ou partes autónomas. Na observância daqueles formalismos, a empresa:
a)- Solicitou e obteve o certificado a que aludem os n.ºs 4 e 6 do art.° 12.° do CIVA e o art.° 1.° do Dec.- Lei referido.
b)- No aspecto contabilístico, procedeu em conformidade com o disposto no n.º 2 do art.° 23.° do CIVA - afectação real dos bens e serviços utilizados.
c)- Atempadamente deu cumprimento ao disposto no art.º 3º do citado Decreto -Lei, dado que o Certificado de renúncia foi emitido em 08/05/95. A declaração do mês seguinte ao da emissão do certificado - Junho/95 - evidencia o valor de todas as aquisições e o imposto nelas contido relativamente ao imóvel e foi solicitado o reembolso.
5. Nos termos do n.º 2 do art.° 4° do Dec. - Lei n.º 241/86, a empresa não pode solicitar o reembolso nos termos dos n.º 5 e 6 do art.º 22º do CIVA antes da celebração do contrato de locação do imóvel. No entanto, o documento que titula a locação do imóvel é um contrato-promessa de arrendamento.
Esta situação não dá cumprimento ao pressuposto no referido Dec.-Lei pelo que somos de opinião que o pedido de reembolso foi deferido indevidamente e propomos uma liquidação adicional de IVA, relativamente ao período 95-06, de Esc. 300.989.765$00."
cf. nota de fundamentação de correcções técnicas constante de fls. 40 a 44 do Processo Administrativo apenso aos autos;
4-No seguimento da referida fiscalização, a Administração Tributária emitiu, em 2 de Fevereiro de 1998, a liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado n.º 98017405 e de juros compensatórios, com o n.º 98117404 que constituem o objecto da presente impugnação, nos montantes 300.989.765$00 e 105.222.723$00, respectivamente – cf. liquidações constantes de fls. 42 e 43 dos autos, numeração referente ao processo físico, para as quais se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
5-Em 24.07.1998, a Impugnante apresentou Reclamação Graciosa, a qual por decisão datada de 10.04.2002 seria totalmente indeferida - cf. fls. 188 a 210 dos autos, numeração referente ao processo físico, documentos para cujo teor se remete e o qual aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
6-A impugnante apresentou revisão oficiosa incidindo sobre as referidas liquidações em 20.02.2003, a qual por decisão de 19.09.2005, proferida pelo Subdirector-geral do IVA, foi totalmente indeferida – cf. decisão constante de fls. 99 a 104 do Processo Administrativo apenso aos autos, para a qual se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
7-Através da escritura pública de arrendamento celebrada no dia 31 de Outubro de 1997, no 1.° Cartório Notarial do Porto, a Impugnante deu de arrendamento à sociedade "B…………………., S.A." um prédio urbano, destinado a central de distribuição, sito no ………………, da freguesia e concelho de Azambuja, inscrito na matriz sob o artigo 3170, tendo o início do contrato sido reportado a 1 de Fevereiro de 1995 - cf. cópia da escritura de arrendamento constante de fls. 71 a 78 do Processo Administrativo apenso aos autos, documento para cujo teor se remete e o qual se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
8-Conforme consta do Relatório de Inspecção tributária do sujeito passivo, A……………………., S.A. (fls. 107 a 125 do Processo Administrativo apenso aos autos), documento cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais:
- Não foi comunicado ao contribuinte, previamente ao seu início, a realização de exame à escrita, a sua extensão e âmbito nos termos do art. 75° do CPT;
- A escrita foi facultada e estava em dia e foram prestados os esclarecimentos solicitados sobre a sua organização.
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: "…Nada de mais se provou com relevância para a decisão a proferir. As demais asserções insertas na douta petição constituem conclusões de facto e/ou direito…".
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Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: "…A convicção do tribunal baseou-se nos documentos juntos aos autos e constantes do Processo Administrativo (n.º 3/2007), bem como aqueles juntos com a Petição Inicial, conforme se deixou indicado ao longo do rol de factos provados, por deles se extraírem com toda a clareza, atendendo ainda à credibilidade que tal documentação encerra a que acresce o facto do seu teor não ter sido posto em causa pelas partes…".
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou integralmente improcedente a presente impugnação, em consequência do que manteve a liquidação adicional de I.V.A. identificada no nº.4 do probatório supra, no montante de 300.989.765$00/€ 1.501.330,62.
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Relembre-se que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal "ad quem", ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, "ex vi" do artº.281, do C.P.P.Tributário).
O recorrente dissente do julgado alegando, em primeiro lugar e em sinopse, que a decisão proferida no processo de impugnação nº.IMP121/01/21 significa, apenas, que foram julgados improcedentes os vícios que ali foram imputados aos actos de liquidação. Que a sentença recorrida, expressamente, reconhece a ocorrência do vício de violação do direito de audição prévia antes das liquidações objecto da presente impugnação, pelo que se impõe a anulação das mesmas, em virtude da preterição dessa formalidade legal. Que padece a decisão recorrida de erro de julgamento, nomeadamente, violando os artºs. 267, nº.5, da C.R.Portuguesa, 19, al.c), do C.P.Tributário, 100 e 103, nº.2, al.a), ambos do C.P.Administrativo, então em vigor (cfr.conclusões 1 a 39 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
Consagra o artº.267, nº.5, da Constituição da República Portuguesa, o direito de todos os cidadãos participarem na formação das decisões ou deliberações da Administração que lhes disserem respeito. A lei ordinária, concretizou, inicialmente, este direito no artº.100, do C.P.Administrativo, aprovado pelo dec.lei 442/91, de 15/11, estando actualmente tal direito expressamente previsto no artº.60, da Lei Geral Tributária, aprovada pelo dec.lei 398/98, de 17/12 (cfr.artº.45, do C.P.P.T.).
O direito de audiência prévia de que goza o administrado incide sobre o objecto do procedimento, tal como ele surge após a instrução e antes da decisão. Estando em preparação uma decisão, a comunicação feita ao interessado para o exercício do direito de audiência deve dar-lhe conhecimento do projecto da mesma decisão, a sua fundamentação, o prazo em que o mesmo direito pode ser exercido e a informação relativa à possibilidade de exercício do citado direito por forma oral ou escrita (cfr.ac.S.T.A.-2ª. Secção, 25/1/2000, rec.21244, Ac.Dout., nº.466, pág.1275 e seg.; ac.S.T.A.-2ª. Secção, 2/7/2003, rec.684/03; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 19/09/2018, rec.754/17; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 4/12/2019, rec.299/08.4BECBR; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 17/06/2020, rec.141/13.4BEMDL; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, Encontro da Escrita Editora, 4ª. Edição, 2012, pág.502 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.426 e seg.; Joaquim Freitas da Rocha, Lições de Procedimento e Processo Tributário, 6ª. Edição, Almedina, 2018, pág.57 e seg.).
A falta de audição prévia do contribuinte, nos casos em que é obrigatória, constitui um vício de forma do procedimento tributário susceptível de conduzir à anulação da decisão que vier a ser tomada (cfr.artº.60, da L.G.T.; artº.163, do actual C.P.Administrativo; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 19/09/2018, rec.754/17; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 3/10/2018, rec. 2950/14.8BEBRG; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 4/12/2019, rec.299/08.4BECBR; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 17/06/2020, rec.141/13.4BEMDL; Diogo Leite de Campos e Outros, ob.cit., pág.515; Jorge Lopes de Sousa, ob.cit., pág.437; José Maria Fernandes Pires e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Almedina, 2015, pág.618).
"In casu", o Tribunal não deve conhecer deste esteio do recurso por duas ordens de razões:
1-Levando em consideração o princípio da impugnação unitária consagrado no artº.54, do C.P.P.T., de acordo com o qual a impugnação contenciosa do acto final do procedimento tributário, normalmente a liquidação, acto tributário por excelência, deve abarcar qualquer ilegalidade anteriormente cometida no mesmo procedimento, ressalvando-se os actos destacáveis que o legislador prevê (cfr.v.g.artº.134, do C.P.P.T.). Ora, no caso concreto, já correu termos anterior processo de impugnação judicial tendo por objecto os mesmos actos de liquidação identificados no nº.4 do probatório supra, tudo conforme reconhece a sociedade impugnante/recorrente, no qual se concluiu, com trânsito em julgado, pela legalidade dos identificados actos tributários (cfr. certidão junta a fls.665 a 698 do processo físico-III volume), sendo nessa impugnação que a sociedade recorrente devia ter alegado o fundamento da apelação agora sob exame;
2-O vício de violação do direito de audição prévia antes das liquidações objecto da presente impugnação, como em regra todos os vícios do acto administrativo-tributário, são fundamento da sua anulabilidade, só implicando a nulidade do mesmo quando se verifique a falta de qualquer dos seus elementos essenciais (v.g. autor do acto; destinatário do acto; fim público do acto; acto viciado por usurpação de poder) ou quando houver lei que expressamente preveja essa forma de invalidade (cfr.artº.133, nº.2, do C.P.A.). No caso concreto, gerando o vício alegado a mera anulabilidade dos actos de liquidação impugnados, como reconhece a própria sociedade apelante, o articulado inicial do presente processo devia ser deduzido no prazo previsto no artº.102, nº.2, do C.P.P.T., então em vigor, portanto, nos quinze dias posteriores ao indeferimento da reclamação graciosa identificada no nº.5 do probatório supra, o qual ocorreu em 10/04/2002, sendo que a petição inicial deste processo deu entrada em Tribunal em 27/12/2005 (cfr. data de entrada aposta a fls.2 do processo físico-I volume).
Face ao exposto, o Tribunal nega provimento ao presente fundamento do recurso deduzido, mais se confirmando a decisão recorrida neste segmento.
Aduz, igualmente, o recorrente que se verificou a violação do direito de audição prévia antes do indeferimento do pedido de revisão oficiosa. Que também este indeferimento do pedido de revisão oficiosa, proferido já sob a égide da L.G.T., não foi precedido da concessão, ao contribuinte, da possibilidade de exercer o seu direito de audição prévia, contrariamente ao que impunha o artº.60, nºs.1, al.b), e 5, do citado diploma. Que padece a sentença recorrida, neste segmento, de erro de julgamento que se consubstancia na errada interpretação e aplicação destas disposições legais (cfr. conclusões 40 a 45 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar mais um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
Também neste caso carece de razão o apelante. Conforme se retira do probatório (cfr. nºs.4 e 6 da matéria de facto supra exarada), estamos perante alegada formalidade preterida no âmbito de processo administrativo gracioso posterior à estruturação das liquidações que são objecto destes autos e que o recorrente visa anular. Ora, sendo formalidade posterior às liquidações não pode ter a mesma qualquer repercussão sobre estas. Por outras palavras, o vício de procedimento em causa (alegada falta de audição prévia), a existir, apenas poderia conduzir à anulação da respectiva decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa deduzido pelo recorrente, por tal efeito se quedando, mas nunca podendo ter como consequência a anulação das liquidações impugnadas. Face a estas, tal vício de procedimento não surte quaisquer efeitos invalidantes, devendo antes visualizar-se como formalidade não essencial que em nada afectou os direitos de defesa do impugnante/recorrente (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 16/06/2004, rec.1877/03; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 15/10/2008, rec.542/08; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 25/06/2009, rec.345/09; Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, II, Almedina, 3ª. Edição, 2016, pág.345).
Mais se deve vincar, conforme alude a sentença recorrida, que os presentes autos, atenta a sua forma - impugnação judicial e não acção administrativa especial, forma de processo então existente - visam a anulação das liquidações impugnadas, que não de um mero acto de procedimento gracioso posterior às mesmas.
Concluindo, não vislumbra o Tribunal "ad quem" que a sentença recorrida padeça do examinado erro de julgamento de direito, assim sendo forçoso julgar improcedente também este fundamento do recurso, mais se confirmando a decisão recorrida neste segmento.
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, nega-se provimento ao presente recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, embora com a presente fundamentação, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
X
Resta apreciar o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
As duas vertentes essenciais da conta ou liquidação de custas são a taxa de justiça e os encargos (as custas de parte têm um tratamento próprio e autónomo - cfr.artºs.25 e 26, do R.C.P.), conforme resulta do artº.529, do C.P.Civil, tal como do artº.3, nº.1, do R.C.P. Em relação a qualquer destas vertentes das custas se deve aplicar, necessariamente, a prévia decisão judicial que implicou a condenação em custas, da qual deriva o próprio acto de contagem (cfr.artº.30, nº.1, do R.C.P.; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 3/02/2021, rec. 1709/05.8BEPRT; Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais anotado e comentado, Almedina, 4ª. edição, 2012, pág.424).

O artº.6, do Regulamento das Custas Processuais (R.C.P.), na redacção resultante do artº.2, da Lei 7/2012, de 13/2, contém a seguinte versão:
Artigo 6.º
Regras gerais

1 - A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente Regulamento, aplicando-se, na falta de disposição especial, os valores constantes da tabela I-A, que faz parte integrante do presente Regulamento.
2 - Nos recursos, a taxa de justiça é sempre fixada nos termos da tabela I-B, que faz parte integrante do presente Regulamento.
3 - Nos processos em que o recurso aos meios electrónicos não seja obrigatório, a taxa de justiça é reduzida a 90% do seu valor quando a parte entregue todas as peças processuais através dos meios electrónicos disponíveis.
4 - Para efeitos do número anterior, a parte paga inicialmente 90% da taxa de justiça, perdendo o direito à redução e ficando obrigada a pagar o valor desta no momento em que entregar uma peça processual em papel, sob pena de sujeição à sanção prevista na lei de processo para a omissão de pagamento da taxa de justiça.
5 - O juiz pode determinar, a final, a aplicação dos valores de taxa de justiça constantes da tabela I-C, que faz parte integrante do presente Regulamento, às acções e recursos que revelem especial complexidade.
6 - Nos processos cuja taxa seja variável, a taxa de justiça é liquidada no seu valor mínimo, devendo a parte pagar o excedente, se o houver, a final.
7 - Nas causas de valor superior a € 275.000,00, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.


O nº.7, do preceito sob exegese (normativo que reproduz o artº.27, nº.3, do anterior C.C.Judiciais, a propósito da taxa de justiça inicial e subsequente), estatui que o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta final do processo, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo, designadamente, à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o seu pagamento.
Recorde-se que nos termos do artº.529, nº.2, do C.P.Civil, a taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual de cada interveniente e é fixada em função do valor e complexidade da causa, nos termos do R.C.P. (cfr.v.g.artº.6 e Tabela I, anexa ao R.C.P.). Acresce que a taxa de justiça devida pelo impulso processual de cada interveniente não pode corresponder à complexidade da causa, visto que essa complexidade não é, em regra, aferível na altura desse impulso. O impulso processual é, grosso modo, a prática do acto de processo que origina núcleos relevantes de dinâmicas processuais nomeadamente, a acção, o incidente e o recurso (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 3/02/2021, rec.1709/05.8BEPRT; Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais anotado e comentado, Almedina, 4ª. edição, 2012, pág.72).
O mencionado remanescente está conexionado com o que se prescreve no final da Tabela I, anexa ao R.C.P., ou seja, que para além de € 275.000,00, ao valor da taxa de justiça acresce, a final, por cada € 25.000,00 ou fracção, três unidades de conta, no caso da coluna “A”, uma e meia unidade de conta, no caso da coluna “B”, e quatro e meia unidades de conta no caso da coluna “C”.
É esse o remanescente, ou seja, o valor da taxa de justiça correspondente à diferença entre € 275.000,00 e o efectivo e superior valor da causa para efeitos de determinação daquela taxa, o qual deve ser considerado para efeitos de conta final do processo, se o juiz não dispensar o seu pagamento.
A decisão judicial de dispensa, com características excepcionais, depende, segundo o legislador, da especificidade da concreta situação processual, designadamente, da complexidade da causa e da conduta processual das partes. A referência a tais vectores, em concreto, redunda na constatação de uma menor complexidade ou simplicidade da causa e na positiva cooperação das partes durante o processo, como pressupostos de tal decisão judicial. Concretizando, de acordo com a jurisprudência deste Tribunal, justifica-se a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida se a conduta processual das partes não obstar a essa dispensa e se o concreto montante da mesma se afigurar desproporcionado em face do serviço de justiça prestado, pondo em causa a relação sinalagmática que a taxa pressupõe (cfr.ac.S.T.A.-1ª.Secção, 23/05/2019, rec. 1224/16.4BEPRT; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 16/09/2020, rec.249/14.9BESNT).
Mais se dirá que a maior, ou menor, complexidade da causa deverá ser analisada levando em consideração, nomeadamente, os factos índice que o legislador consagrou no artº.447-A, nº.7, do C.P.Civil (cfr.actual artº.530, nº.7, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6).
Diz-nos este normativo, o actual artº.530, nº.7, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, o seguinte:
Artigo 530º.
Taxa de justiça
(…)
7. Para efeitos de condenação no pagamento de taxa de justiça, consideram-se de especial complexidade as ações e os procedimentos cautelares que:
a) Contenham articulados ou alegações prolixas;
b) Digam respeito a questões de elevada especialização jurídica, especificidade técnica ou importem a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso; ou
c) Impliquem a audição de um elevado número de testemunhas, a análise de meios de prova complexos ou a realização de várias diligências de produção de prova morosas.

No que se refere às questões de elevada especialização jurídica ou especificidade técnica são, grosso modo, as que envolvem intensa especificidade no âmbito da ciência jurídica e grande exigência de formação jurídica de quem tem que decidir. Já as questões jurídicas de âmbito muito diverso são as que suscitam a aplicação aos factos de normas jurídicas de institutos particularmente diferenciados (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 3/02/2021, rec.1709/05.8BEPRT; Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais anotado e comentado, Almedina, 5ª. edição, 2013, pág.71 e seg.).
No que diz respeito à conduta processual das partes a ter, igualmente, em consideração na decisão judicial de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça nos termos do examinado artº.6, nº.7, do R.C.P., deve levar-se em conta o dever de boa-fé processual estatuído no actual artº.8, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6 (cfr. anterior artº.266-A, do C.P.Civil). Nos termos deste preceito, devem as partes actuar no processo pautando a sua conduta pelo princípio da cooperação, o qual onera igualmente o juiz, tal como de acordo com a boa-fé, tendo esta por contra-face a litigância de má-fé e a eventual condenação em multa (cfr. artº.542, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6).
Por último, recorde-se que a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, quando concedida, aproveita a todos os sujeitos processuais (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 14/05/2014, rec.456/14; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 3/02/2021, rec. 1709/05.8BEPRT).
Revertendo ao caso dos autos, do exame da actividade processual desenvolvida no processo, da conduta processual das partes e da pouca complexidade das questões colocadas pelos sujeitos processuais, deve concluir-se que se justifica a aludida intervenção moderadora, assim devendo dar-se provimento a este pedido do recorrente.
X
DISPOSITIVO
X
Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DESTE SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO EM NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA, a qual, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
X
Condena-se o recorrente em custas, mais se ordenando que se proceda à estruturação da conta de custas do presente processo tendo em conta o máximo de € 275.000,00 fixado na Tabela I, anexa ao R.C.P., e desconsiderando-se o remanescente.
X
Registe.
Notifique.
X
Lisboa, 7 de Abril de 2021. - Joaquim Manuel Charneca Condesso (relator) – Gustavo André Simões Lopes Courinha – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia.