Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0287/15
Data do Acordão:01/27/2016
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANA PAULA LOBO
Descritores:SISA
PRESCRIÇÃO
INÍCIO DO PRAZO DE PRESCRIÇÃO
Sumário:I - O instituto da prescrição numa lógica de direito civil visa penalizar a inércia do credor em obter o cumprimento da obrigação por parte do devedor.
II - Quando estamos perante uma relação jurídico-tributária, dado o carácter indisponível do crédito, o fundamento da prescrição reside sobretudo «em puras considerações de certeza e segurança jurídica».
III - O termo inicial da contagem do prazo de prescrição da obrigação tributária, em caso de verificação da condição resolutiva da isenção de Sisa (arts. nºs. 11º nº 3, 16° n° 1 CIMSISD e 48º nº 1 da LGT) coincide com data em que ocorreu o facto tributário e não a data da revogação da isenção.

( Elaborado nos termos do disposto no artº 663º, nº 7 do Código de Processo Civil )
Nº Convencional:JSTA000P19982
Nº do Documento:SA2201601270287
Data de Entrada:03/09/2015
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A.........,S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso Jurisdicional
Decisão recorrida – Tribunal Tributário de Lisboa
. 28 de Outubro de 2014



Julgou procedente por prescrição da dívida exequenda a oposição.



Acordam nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:


A Representante da Fazenda Pública veio interpôr recurso da sentença supra mencionada, proferida no âmbito do processo de oposição n.º 2482/10.3 BELRS apresentada pela sociedade A………., S.A. à execução fiscal nº 3255201001063472, instaurada pelo Serviço de Finanças de Lisboa 10, tendo, para esse efeito formulado, a final da sua alegação, as seguintes conclusões:


A. A questão controvertida resume-se a saber desde quando começa a correr o prazo de prescrição das dívidas de Imposto Municipal de SISA: se a partir do facto tributário, que corresponde à aquisição onerosa do imóvel, artigo 2º do CIMSISSD, se da ocorrência da caducidade da isenção, que até então obstara à tributação regra dessa transmissão.

B. A dívida em causa nos presentes autos respeita à aquisição da fracção autónoma designada pela letra "A", do prédio inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 852, da freguesia de ………….., a 25-07-2002, transmissão que ficou isenta de Imposto Municipal de Sisa, nos termos dos artigos 11º nº3 do CIMSISSD, em virtude da compra se destinar a revenda.

C. A 30-12-2002, a sociedade impugnante revendeu a fracção à B………., SA, que também a adquiriu para revenda, conforme declarou aquando da celebração do negócio, tendo a isenção pela aquisição de 25-07-2002 caducado naquela data, nos termos do artigo 16º, nº1 do CIMSISSD, o que levou a administração fiscal a proceder à respectiva liquidação oficiosa de Imposto Municipal de SISA.

D. A Sisa é um imposto sobre a riqueza que pretende tributar o enriquecimento manifestado pela aquisição no momento da transmissão, sendo que tal enriquecimento pode não acontecer quando o bem adquirido entra no giro comercial das empresas, destinando-se a revenda.

E. A isenção prevista no artigo 11º nº3 do CIMSISSD está sujeita a condição resolutiva, caducando se for dado destino diferente, se não for efectuada a revenda no referido prazo ou ainda se for novamente transmitida para revenda, caso dos autos, sendo que os efeitos fiscais da transmissão ficam condicionados à revenda, encontrando-se a Administração Fiscal impedida de liquidar o imposto durante o período em que dura a isenção, bem como de promover a execução fiscal dos créditos tributários.

F. Ficando a liquidação de Sisa dependente de uma condição legal resolutiva, de acordo com o disposto no artigo 11º, nº3 e 16º, nº1, do CIMSISSD, o prazo de prescrição só deverá contar-se a partir da data da caducidade da isenção, de acordo com a regra do artigo 306º, nº1, do Código Civil, o qual determina que o prazo de prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido, preceito aplicável "in casu", por inexistência de norma especial sobre a matéria.

G. Um dos elementos constitutivos essenciais do instituto da prescrição é a possibilidade legal de o credor exigir do devedor o pagamento da dívida, que encontra a sua previsão no artigo 306º, nº1, do Código Civil, normativo que consagra um princípio de carácter geral inerente à própria teleologia intrínseca da prescrição e, por isso, de aplicação geral, independentemente da sua expressa consagração nas leis gerais tributárias.

H. O facto tributário ocorre na data da caducidade da isenção por ser nessa data que o legislador entende que o adquirente já não tem intenções de alienar o imóvel e o integrar na sua esfera patrimonial, e isto justifica-se, em nosso entender, dada a especificidade do imposto.

I. Não estamos perante uma isenção propriamente dita mas antes perante uma exclusão tributária condicionada, com efeito, tal como acontece no IMT (José Maria Fernandes Pires, ob. cit., pag. 151), a SISA não sujeitava a imposto um aumento líquido da riqueza de um sujeito passivo, nem a entrada de imóveis no seu património, mas antes uma manifestação de uma riqueza já existente no património do adquirente, que se revela no momento da aquisição de imóveis e que se consubstancia nos meios que vão ser mobilizados para financiar essa aquisição.

J. Quando uma empresa adquire um imóvel para uso ou fruição e o afecta ao activo imobilizado, deve pagar SISA, porque essa aquisição é uma manifestação de riqueza sujeita a imposto, assim, do mesmo modo, a existência de um imóvel destinado a venda no património de uma empresa que exerça aquela actividade, não é uma manifestação de riqueza e por isso não deve ser tributada em SISA desde que, naturalmente, esse imóvel seja mantido no activo permutável.

K. Assim, o Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações estatuía para estes prédios um regime de não sujeição - exclusão tributária - durante o período que medeia entre a sua aquisição e a revenda.

L. E porque se trata de uma não sujeição, o facto tributário ocorrerá na data da caducidade da "isenção", ou melhor, da exclusão, por ser nessa data que o legislador entende que o adquirente já não tem intenções de alienar o imóvel e o integra na sua esfera patrimonial.

M. A lei confere relevância à data da cessação da isenção como início do prazo para liquidação da Sisa artº 92 nº1 do CIMSISSD, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.° 472/09, de 8 de Novembro, que estipula que: só poderá ser liquidado imposto municipal de sisa ou imposto sobre sucessões e doações nos oito anos seguintes à transmissão ou à data em que a isenção ficou sem efeito, sem prejuízo do disposto nos parágrafos seguintes, e quanto ao restante, no Art.º 46° da Lei Geral Tributária.

N. Este prazo não se refere apenas à caducidade, pois não faria sentido a Administração Fiscal ter o direito de liquidar o tributo nos oito anos seguintes à data em que a isenção ficou sem efeito, se a obrigação estivesse prescrita.

O. Fundando-se a prescrição na inércia do titular do direito, ela deve, logicamente, só começar a correr no momento em que o direito pode ser exercido. (Cfr. VAZ SERRA, "Prescrição e Caducidade", BMJ, 1961, p 190.).

P. Assim sendo, o prazo de prescrição da dívida exequenda apenas se inicia com a verificação da condição resolutiva de não verificação dos pressupostos que determinaram a atribuição da isenção, ou seja, e concretizando quanto ao caso em análise, a partir de 30-12-2002, pelo que, à data da citação da oponente, a dívida exequenda ainda não tinha prescrito.

Requereu que, concedendo-se provimento ao recurso, seja a decisão recorrida revogada e substituída por acórdão que declare a oposição improcedente.

A oponente, A………., S.A. apresentou contra alegações onde considera que deve concluir-se pela improcedência do recurso submetido pela Fazenda Pública por a decisão a quo, no sentido da declaração da prescrição da dívida em causa, não merecer qualquer censura, devendo a mesma ser mantida, que encerrou com as seguintes conclusões:

A.O caso sub judice é daqueles que permite uma conclusão preliminar categórica, posto que a decisão recorrida segue totalmente a jurisprudência superiormente firmada, designadamente por este Venerando Supremo Tribunal, e, por conseguinte, não merece qualquer censura. Vejamos.

B. A presente controvérsia prende-se com a definição do momento em que se inicia a contagem do prazo de prescrição de dívida de Imposto Municipal de Sisa, caso a isenção daquele imposto, prevista no artigo 11., n.° 3, do CIMSISD, venha a caducar nos termos o n.° 1 do artigo 16.° CIMSISD — nada mais.

C. Sobre a mesma, o Tribunal a quo propugna — e bem — que o início do prazo de prescrição se associa ao momento da verificação do facto tributário relevante nos termos do Imposto Municipal de Sisa e não à posterior caducidade de isenção pela verificação de condição resolutiva.

D. Esta mesma questão foi já objecto de pronúncia por parte deste douto Supremo Tribunal Administrativo em recurso de oposição de acórdãos, tendo o Pleno da Secção de Contencioso Tributário adoptado solução em tudo coincidente com a seguida pela sentença do Tribunal a quo, na sequência do que tinha sido propugnado pela ora Recorrida — cfr. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 10 de Abril de 2013, proferido pelo Pleno da Secção do Contencioso Tributário no processo n.° 01135/12.

E. É este o entendimento que a Fazenda Pública contesta — mas mal e contra jurisprudência consolidada deste douto Supremo Tribunal, que optar por omitir — nas alegações de recurso sob análise.

F. Com relevância para a questão dos Autos, o Tribunal a quo considerou como provados, essencialmente, os factos alegados pela ora Recorrida e que se podem resumir nos seguintes pontos:
(i) No dia 25 de Julho de 2002 a então Oponente, ora Recorrida, adquiriu à C……… —, SA. a fracção autónoma em causa, tendo na celebração do relevante negócio a Recorrida declarado destinar-se o bem à sua revenda e, em face dessa finalidade, celebrou-o sob isenção da sua tributação em sede de Imposto Municipal de Sisa, sendo o seu objecto social a compra e venda de imóveis;
(ii) No dia 30 de Dezembro desse ano de 2002 a Recorrida alienou aquela mesma fracção à B…………, S. A., pelo preço de € 3.550.000, tendo esta declarado, na celebração deste negócio, que a destinava igualmente a revenda;
(iii) Esta transmissão não foi isenta como a anterior, antes tendo a nova dona, previamente à sua celebração, a 27 desse mês de Dezembro, pedido a liquidação e satisfeito a respectiva dívida de Imposto Municipal de Sisa;
(iv) Na sequência de indagação da Administração Tributária, a Recorrida esclareceu, em Junho de 2009, que a menção ao destino «para revenda» ínsita nesta segunda escritura não tinha passado de um lapso;
(v) A Administração Tributária decidiu tributar a aquisição pela Recorrida da fracção em apreço (por considerar que a isenção de que anteriormente beneficiou tinha caducado), pelo que elaborou a respectiva liquidação oficiosa, no valor de € 200.000,00, que incluiu ainda juros compensatórios no montante de € 59.068,49 e, tendo-a notificado à Recorrida e não tendo ela procedido à satisfação da divida dela emergente até ao termo do prazo que lhe tinha sido assinalado, foi instaurado no Serviço de Finanças de Lisboa 10, a 10 de Setembro de 2010, o processo visando a sua cobrança coerciva, ao qual coube o n.° 3255201001063472;
(vi) A Recorrida foi para o mesmo citada apenas em 14 de Setembro de 2010.

G.A isenção de Imposto Municipal de Sisa em apreço, da qual a Recorrida beneficiou em 2002, estava plasmada no n.° 3 do artigo 11.º do CIMSISD e aplicava-se às aquisições de prédios para revenda; sendo limitada pela previsão de condição resolutiva que determinava que se o prédio não fosse revendido no prazo de 3 anos ou o fosse novamente para revenda, aquela isenção caducaria — cfr. n.° 1 do artigo 16.° desse mesmo Código.

H. Assim erra a Fazenda Pública ao confundir a previsão de condição resolutiva, como aquela plasmada no artigo 16.° do CIMSISD e que condiciona o pleno benefício da isenção vertente do n.° 3 do artigo 11.º do mesmo código, com uma situação de exclusão de tributação; posto que, na primeira, os pressupostos da incidência verificam-se plenamente pela ocorrência do facto tributário (aquisição onerosa de direito de propriedade sobre um imóvel), mas, esta, fica impedida por outro facto que àquela obsta.

I. O artigo 48.° da LGT, aplicável às obrigações de Imposto Municipal de Sisa nos termos do artigo 180.° do CIMSISD, fixa em 8 anos o prazo de prescrição, contado no caso dos impostos de obrigação única da verificação do facto tributário.

J. Com referência ao Imposto Municipal de Sisa, o facto tributário forma-se aquando da aquisição onerosa do direito de propriedade ou de figuras parcelares desse direito sobre bens imóveis — cfr. artigo 2.° do CIMSISD.

K. Considerando o disposto nas disposições legais já mencionadas — ao contrário do que sucede no direito civil, no qual, pela aplicação do disposto no artigo 306.° do Código Civil, o início do prazo de prescrição está associado à possibilidade de a divida ser determinada — o prazo de prescrição das obrigações tributárias inicia-se, nos impostos de obrigação única, como o Imposto Municipal de Sisa, com a verificação do facto tributário, o que ocorre quer a obrigação tributária se encontre, ou não, liquidada, uma vez que a mesma se refere directamente ao facto tributário e pode assim suceder sem que tenha havido lugar à correspondente liquidação.

L. O afastamento da regra prevista no n.° 1 do citado artigo 306.° do Código Civil para as obrigações do direito civil afigura-se ter sido mesmo «representado» pelo legislador que, para efeitos de caducidade do direito à liquidação, estabeleceu que o respectivo prazo se suspende, no caso de benefícios fiscais de natureza condicionada, desde a apresentação da declaração até ao termo do prazo legal de cumprimento da condição — cfr. alínea c) do n.° 2 do artigo 46.° da LGT — e nada previu para o prazo de prescrição — cfr. artigo 49.° da LGT —, tendo optado pelo estabelecimento de regras particulares quanto a certos impostos.

M. O aludido afastamento compreende-se também tendo em conta que se a prescrição sanciona uma inércia do credor no que às obrigações de direito privado diz respeito, o mesmo não sucede com as obrigações tributárias, uma vez que, dado o carácter indisponível do crédito, o fundamento da prescrição não reside tanto na inércia do credor, mas essencialmente em razão de considerações de certeza e segurança jurídica.

N. De novo, erra a Recorrente ao fundar as suas alegações na aplicação às obrigações tributárias do disposto no artigo 306.° do Código Civil, a qual, como vimos, não é admissível, nem foi sequer pretendida pelo legislador.

O. Mas mais, os elementos essenciais da prescrição encontram-se sujeitos ao princípio da legalidade, na vertente de reserva de lei formal — çfr. alínea a) do n.° 2 do artigo 8.° da LGT —, pelo que considerando que as disposições tributárias aplicáveis in casu, a que acima fizemos referência, fixaram como momento determinante para a contagem do início do prazo de prescrição a ocorrência do facto tributário e não a data da caducidade dos benefícios fiscais, só seria possível a assunção daquela como momento de início da contagem do prazo de prescrição se existisse norma que o previsse, o que não acontece — de todo em todo — no caso dos Autos.

P. Finalmente, atenta a letra do artigo 48.° da LGT e não sendo possível distinguir onde o legislador não distingue, não tem cabimento o entendimento sustentado nas alegações de recurso da Fazenda Pública no sentido de que a norma constante do artigo 48.°, n.° 1, da LGT se deveria interpretar restritivamente, com o sentido de que nos impostos de obrigação única o prazo de prescrição se inicia a partir da data da ocorrência do facto tributário apenas quando este gerar a formação imediata da obrigação tributária, por inexistência de facto impeditivo configurado em isenção — cfr. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 10 de Abril de 2013, proferido pelo Pleno da Secção do Contencioso Tributário no processo n.° 01135/12.

Q. Aplicando tudo quanto acima se plasmou ao caso em apreço, urge concluir no sentido do não provimento do recurso submetido pela Fazenda Pública, e pela necessidade de ser mantida a sentença do Tribunal a quo que, adoptando a jurisprudência consolidada deste Supremo Tribunal sobre esta matéria, concluiu que o prazo de prescrição se conta, no caso do Imposto Municipal de Sisa, como imposto de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu.

R. Donde, in casu em 25 de Julho de 2010, volvidos 8 anos sobre o facto tributário relevante, i.e. a aquisição pela Recorrida do Prédio em apreço, prescreveu qualquer dívida de Imposto Municipal de Sisa que fosse, alegadamente, imputável à Recorrida e relativa à mencionada aquisição.

S. Tudo visto, no momento da efectivação da citação da Recorrida, em meados de Setembro de 2010, para o processo de execução fiscal em crise, já o direito subjectivo do credor tributário de poder exigir o cumprimento da obrigação tributária estava extinto, devendo a declaração de prescrição ser imediatamente confirmada, mantendo-se in totum o que foi decidido em primeira instância.

O Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido da confirmação da decisão recorrida.



A Sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:
A)No dia 25 de Julho de 2002 a Opoente, A………., Lda., adquiriu à C………. – Imobiliária, SA, a fracção autónoma, à qual atribuíram o valor de €3.500.000,00, designada pela letra “A”, correspondente à subcave, cave e rés-do-chão, com loja e dois pisos intermédios em galeria, com entrada pelos números de polícia …. e …….. …….. e …. e ………, em ………., fracção pertencente ao prédio situado naquela primeira rua, tornejando para a segunda, freguesia de ………….., e inscrito na respectiva matriz sob o art.852º, descrito na 8ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob a ficha 2178.

B) Na celebração do negócio a Opoente declarou destinar o bem à sua revenda e, em face dessa finalidade, celebrou-o sob a isenção da sua tributação em sede de Imposto Municipal de Sisa, sendo o seu objecto social, também, a compra e venda de imóveis.

C) Assim, no dia 30 de Dezembro desse mesmo ano a Opoente por sua vez alienaria a fracção à B…………, S.A., pelo preço de €3.550.000,00, tendo esta declarado, na celebração deste negócio, que a destinava igualmente a revenda.

D) Porém, esta transmissão não foi isenta como a anterior, antes tendo a nova dona, previamente à sua celebração, a 27 desse mês de Dezembro, pedido a liquidação e satisfeito a respectiva dívida de Imposto Municipal de Sisa, a que correspondeu então o conhecimento nº 979/2002, do Serviço de Finanças de Lisboa 10, sendo certo que à data, e apesar do seu nome, esta sociedade também estava colectada pela actividade principal de compra e venda de bens imobiliários.

E) Detetando a declaração de revenda da adquirente nesta segunda transmissão, a Administração Tributária notificou a Opoente, em finais de Maio de 2009, de que a isenção referida nos pontos 1-2 tinha caducado com a segunda transmissão e que, por isso, deveria ter pago o imposto antes isentado, em 30 dias após tal negócio, pelo que a convidou a pronunciar-se sobre tanto, ou a pagar o Imposto Municipal de Sisa em falta, em dado prazo, indicando-lhe como proceder e, bem assim, expondo-lhe a liquidação desse imposto nos seguintes termos: (…)”

F) Em 9 de Junho de 2009 a Opoente pronunciou-se dizendo que a menção da adquirente, de que a fracção se destinava a ser novamente vendida por si, fora fruto de mero lapso não condizente com a vontade das partes, o que se demonstrava pelo facto de, na preparação da escritura para realizar esse negócio, a adquirente dias antes ter pedido lhe fosse liquidado o Imposto Municipal de Sisa por si devido pela aquisição, e tê-lo pago também, como aliás constava da própria escritura, pelo que concluía por que a tributação relativamente a si não era devida, por não ter caducado a isenção de que beneficiara.

G) Todavia, a Administração Tributária manteve a decisão de tributar a aquisição, pelo que elaborou a respectiva liquidação oficiosa, que incluiu ainda juros compensatórios no montante de €59.068,49 e, tendo-a notificado à Oponente e não tendo ela procedido à satisfação da dívida dela emergente até ao termo do prazo que lhe tinha sido assinalado, 31 de Julho de 2010, no Serviço de Finanças de Lisboa 10 foi instaurado, a 10 de Setembro de 2010, o processo visando a sua cobrança coerciva, ao qual coube o nº 32552010010633472, com base em certidão de dívida da liquidação extraída, com o nº 2010/053.

H) Nele citada a Opoente a 14 desse mês de Setembro de 2010, no dia 8 de Outubro seguinte, apresentou a petição na origem dos presentes autos.

I) Paralelamente, a Opoente reclamou graciosamente daquela liquidação pelo menos no dia 8 de Outubro de 2010, o que deu origem ao procedimento com o nº 3255201004004833 no citado Serviço de Finanças e, pelo menos a 4 de Outubro de 2010, impugnou a decisão de indeferimento ali proferida em 15 de Setembro de 2011, o que por deu causa à impugnação judicial nº 1942/11.3BELRS deste Tribunal, que pelo menos até 13 de Setembro de 2013 estava pendente.

J) Ainda, no processo executivo a Opoente prestou garantia bancária a 3 de Dezembro de 2010, a qual foi implicitamente aceite pelo órgão de execução fiscal, desde então quedando suspensa a decisão dos processos.


Para a decisão do presente recurso importa dilucidar quando começa a correr o prazo de prescrição das dívidas de Imposto Municipal de SISA:
Ø se a partir do facto tributário, que corresponde à aquisição onerosa do imóvel, artigo 2º do CIMSISSD,
Ø se a partir da ocorrência da caducidade da isenção, que até então obstara à tributação regra dessa transmissão.

Sobre esta mesma questão e em sentido em tudo coincidente com a decisão recorrida foi, em 10 de Abril de 2013, proferido acórdão pelo Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo no processo n.° 01135/12 onde foi decidido que « O termo inicial da contagem do prazo de prescrição da obrigação tributária, em caso de verificação da condição resolutiva da isenção de Sisa (arts. nºs. 11º nº 3, 16° n° 1 CIMSISD e 48º nº 1 da LGT) reporta-se à data do facto tributário e não à data da revogação da isenção.»
A Representante da Fazenda Pública interpõe, mais uma vez, recurso numa circunstância em que litiga contra jurisprudência uniforme e consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, sem apresentar argumentos não considerados nas decisões anteriores que tenham a virtualidade de nos projectar para uma melhor aplicação do direito.
Paradoxalmente, em representação da Administração Tributária persiste no enquadramento da questão jurídica numa lógica de direito civil em que o instituto da prescrição visa penalizar a inércia do credor em obter o cumprimento da obrigação por parte do devedor, quando estamos indubitavelmente perante uma relação jurídico-tributária em que «dado o carácter indisponível do crédito, o fundamento da prescrição não reside tanto na inércia do credor, como em puras considerações de certeza e segurança jurídica», nas palavras do Prof.º Alberto Xavier, in Conceito e Natureza do Acto Tributário, 1972, pag. 553. Neste caso, para efeitos de prescrição, como veio também a ser expresso no artº 48.º da LGT a lei atribui relevância à obrigação de imposto – que nasce com a ocorrência do facto tributável descrito na previsão normativa - independentemente do momento em que será praticado o acto tributário – concebido como acto de aplicação da lei ao caso concreto -, necessariamente em momento posterior, e, não ao momento em que a cobrança pode ser efectuada - no momento que a lei fixa para o vencimento da obrigação tributária-.
A aplicação das regras de direito civil em matéria de prescrição regulamentada nas leis tributárias, sempre estaria arredada na medida em que nos não deparamos com um caso omisso a determinar a aplicação subsidiária do Código Civil.
A questão jurídica foi detalhada e suficientemente analisada no referido acórdão do Pleno do Supremo Tribunal Administrativo supra referido, em termos que já anteriormente no acórdão 01421/14, de 29-04-2015 aderimos, sem que, entretanto novos elementos de análise hajam surgido que imponham um diverso entendimento, pelo que remetemos para os argumentos dele constante a que aderimos integralmente.
A decisão recorrida que se suportou na mesma linha jurisprudencial, não enferma, pois, de qualquer erro de julgamento, impondo-se a sua confirmação.


Deliberação

Termos em que acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.

Custas pela recorrente.
(Processado e revisto com recurso a meios informáticos (art.º 131º nº 5 do Código de Processo Civil, ex vi artº 2º Código de Procedimento e Processo Tributário).


Lisboa, 27 de Janeiro de 2016. – Ana Paula Lobo (relatora) – Dulce Neto – Ascensão Lopes.