Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0453/09.1BEVIS 0453/18
Data do Acordão:06/09/2022
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SUZANA TAVARES DA SILVA
Sumário:
Nº Convencional:JSTA00071490
Nº do Documento:SA1202206090453/09
Data de Entrada:06/14/2018
Recorrente:A …………., SA (E OUTROS)
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE OVAR
Votação:MAIORIA COM 1 VOT VENC
Aditamento:
Texto Integral: Acórdão na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo

1. B………….., S.A. e C…………………, S.A., com os sinais dos autos, propuseram no TAF de Viseu, acção administrativa especial, contra o Município de Ovar, igualmente com os sinais dos autos, na qual impugnaram o despacho que indeferiu o pedido de autorização respeitante à instalação de uma infra-estrutura de suporte de estação de radiocomunicações.

2. Por acórdão de 25.03.2011, o TAF de Viseu julgou a acção procedente, anulou o acto impugnado e condenou a entidade demandada à prática do devido, deferindo o pedido formulado pelas Autoras.

3. Inconformado, o Município de Ovar recorreu daquela decisão judicial para o TCA Norte, que, por acórdão de 30.11.2017, concedeu provimento ao recurso, revogou o acórdão recorrido e, conhecendo em substituição, julgou a acção improcedente.

4. As AA., em cuja personalidade jurídica entretanto sucederam a D…………, S.A e E………., SA, interpuseram recurso de revista do acórdão antes mencionado e este Supremo Tribunal Administrativo, que, por acórdão de 17.05.2018, admitiu o recurso.

5. Nas alegações que apresentaram, as Recorrentes formularam as seguintes conclusões:
«[…]

A) O presente recurso de revista fundamenta-se tanto no pressuposto da existência de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental, quanto pela evidência de a admissão do presente recurso ser claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.

B) As questões em apreço são suscetíveis de ser recolocadas tanto em litígios pendentes que as Recorrentes têm em tribunal quanto em litígios futuros, uma vez que, permanentemente, para reforçar a sua cobertura, os operadores de comunicações, como a D…………., têm que proceder à instalação de novas antenas de telecomunicações.

C) Por não especificar, em absoluto, os fundamentos de facto que justificam a decisão, forçoso será concluir que o Acórdão em crise é nulo, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea b), do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA, nulidade que redunda em erro de julgamento, na medida em que o Acórdão recorrido decidiu com base em pressupostos de facto que não constam da Matéria Assente.

D) O Acórdão sob recurso padece de falta de fundamentação de direito pois, não especificou os fundamentos concretos de direito e as normas legais que justificaram a sua decisão, estando assim em clara violação do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea b), do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA e ainda o disposto no art. 205º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa.

E) Mesmo que se entendesse que o Acórdão do TCAN estava fundamentado de direito, o que não se concede, sempre teria incorrido em erro de julgamento, por errada aplicação ao caso dos artigos 5.º, n.º 1, al. e) e 11.º, n.º 4 do DL 11/2003, os quais foram consequentemente violados pelo Acórdão recorrido.

F) Porque no Acórdão do TCAN foi decidido que no procedimento de autorização municipal em apreço se observou deferimento tácito nos termos do art. 8º do DL 11/2003, de 18 de janeiro, que o ato em crise nos autos padecia de violação do disposto nos nºs 1 e 2 do art. 9º desse mesmo diploma e que essa norma do art. 9º define um regime especial de audiência prévia, ao ter decidido revogar a decisão da primeira instância quanto a essas matérias, julgou em oposição a essas decisões, o que implica que o Acórdão do TCAN seja nulo nos termos do disposto na al. c) do nº 1 do art. 615º do CPC, aplicável ex vi art. 1º do CPTA.

G) O Acórdão recorrido violou o nº 1, do art. 9º do Decreto-Lei n.º 11/2003, bem como os nºs 2 e 3 desse artigo.

H) A definição de infraestruturas de suporte de estações de radiocomunicações encontra-se na alínea a) do artigo 2º do Decreto-Lei nº 11/2003, de 18 de Janeiro.

I) Existindo um conceito definido de infraestruturas de suporte de estação de radiocomunicações e respetivos acessórios como supra referido mal se compreende que o Tribunal a quo tenha querido subsumir esse conceito dentro de um “conceito indefinido“ como classificou os “Equipamentos públicos técnicos”.

J) Face ao que o Acórdão recorrido ao ter decidido em sentido contrário violou o artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 11/2003, já que o pedido de autorização veio a ser indeferido com base em um fundamento que não se encontra aí previsto, o que implica que o Acórdão recorrido viole igualmente o disposto no art. 8º do Decreto-Lei nº 11/2003, de 18 de janeiro e o art. art. 140º, al. b) do CPA na versão anterior à atual.

K) O Acórdão recorrido está também ferido do vício de violação de lei, por violação do princípio da proporcionalidade (artigo 5º, n.º 2, do CPA, atual art. 7º do CPA), pois foi adotada uma solução que, sem o esgotamento prévio da busca de soluções alternativas, sacrificou um dos interesses em presença, inerentes à instalação da antena, pelo que o mesmo viola o disposto no artigo 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa e no artigo 5.º, n.º 2, do CPA (atual art. 7º do CPA), face ao que deve ser anulado.”

Termos em que deverá a presente Revista ser aceite e ser julgada procedente, com as legais consequências.

[…]».


6 – O Município de Ovar contra-alegou, concluindo pela não admissão da revista ou, caso assim não se entendesse, pela respectiva improcedência.

7 – O digno Magistrado do MP junto deste STA, notificado nos termos do art.º 146.º, do CPTA, emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Cumpre apreciar e decidir.


II – Fundamentação

1. De facto
No acórdão recorrido deu-se como assente a seguinte matéria de facto:
«[…]

1. Em Novembro de 2007, a F………….., S.A., foi incorporada, por fusão, na A……….., S.A. – por acordo.

2. Por sua vez, a A…………., S.A. e a G…………., S. A., alteraram as suas designações sociais, passando, respectivamente, a serem designadas por B………….., S.A. e por C…………….. S.A..

3. Em 07.07.2008, a Autora “C………….” entregou na Câmara Municipal de Ovar, um requerimento, nos termos e para os efeitos do artigo 5º do Decreto-Lei nº 11/2003, de 18.01, a solicitar autorização municipal para a instalação de uma infra-estrutura de suporte de estação de radiocomunicações no prédio na Rua………, ……., 3880-… Ovar, dando origem ao processo 1869/2008 (cfr. documento nº 4 junto com a petição inicial e fls. 39 a 72 do processo administrativo).

4. O requerimento apresentado foi acompanhado dos seguintes elementos exigíveis nos termos do nº 1, alíneas a), e c) a f) e nº 4 do referido artigo:

-Identificação do titular;

-Documento comprovativo do pedido de instalação da F……….., S.A. à C………….., S.A.;

-Memória descritiva da instalação;

-Planta de localização à escala de 1/25 000;

-Planta de implantação à escala de 1/200;

-Plantas e alçados à escala 1/100;

-Termo de responsabilidade do técnico responsável pela instalação a nível civil;

-Termo de responsabilidade do técnico responsável pela instalação eléctrica;

-Declaração de conformidade nos termos do art. 5º, nº 1, al. e) do D.L. nº 11/2003;

-Cópia do documento de onde consta a autorização expressa do proprietário para a instalação.

(cfr. documento nº 4 junto com a petição inicial e fls. 39 a 72 do processo administrativo).

5. A Autora “C………….” em 30.07.2008, recebeu o ofício nº 2887, datado de 24.07.2008, do qual consta o seguinte:

“(…) o requerimento apresentado nesta Câmara e registado sob o n.º (…), foi objecto do despacho que a seguir se transcreve, emitido por H…………, dr., vereador com competências delegadas, em 24/07/2008:

“Notifique-se nos termos da lei e fundamentos técnicos infra da DGAU/CMO que indefere a pretensão e com a qual concordo.”

PARECER DO DIRECTOR DO DEPARTAMENTO DE PLANEAMENTO ESTRATÉGICO E URBANÍSTICO (DPEU)

“Com fundamento na informação da DGAU com a qual concordo, proponho o indeferimento do requerido.”

PARECER DA DIVISÃO DE GESTÃO E ADMINISTRAÇÃO URBANÍSTICA (DGAU)

“1-É solicitado a autorização de instalação de infra-estrutura de suporte de estação de radiocomunicações.

2-A pretensão localiza-se em “espaço urbano existente, categoria C”, conforme planta de ordenamento do PDM.

3-Atendendo ao quadro regulamentar-anexo do art. 38º do regulamento do PDM, não é viável a instalação de equipamentos públicos técnicos.

4-Considerando o exposto em 3, a pretensão deverá ser indeferida nos termos da alínea a) nº 1 art.º 24º do DL 555/99, de 16/12 na redacção que lhe foi conferida pela Lei 60/2007, de 04/09.”

Deverá para efeitos de audiência prévia, artigos 100º e 101º do Código do Procedimento Administrativo, pronunciar-se no prazo de 15 dias, sobre a intenção de indeferimento.

Se não se pronunciar no prazo indicado o indeferimento é definitivo.”

(cfr. documento nº 5 junto com a petição inicial e fls. 38 do processo administrativo).

6. Por despacho de 24.07.2008, o referido Vereador, nos termos da aludida informação técnica de 22.07.2008 da DGAU, sufragada pelo parecer do Director do Departamento de Planeamento Estratégico, de 23.07.2008, concordando com aquela proposta de indeferimento denomina a sua notificação à Requerente, o que foi feito através ofício nº 2807, de 24.07.2008, tendo sido dado à Autora C……….., para efeitos de audiência prévia, um prazo de 15 dias para se pronunciar sobre a intenção daquele indeferimento (cfr. fls. 36 a 38 do processo administrativo).

7. A Autora “C…………”, por carta datada de 21.08.2008, enviou requerimento dirigido à Câmara Municipal de Ovar, recepcionado por esta a 22.08.2008, do qual se extrai o seguinte:

“(…) N/ REFERÊNCIA: 255U3_VALEGA_UMTS

Assunto: INSTALAÇÃO DE ESTAÇÃO DE RADIOCOMUNICAÇÕES – PROC. 1869/2008.

Ex.mo Senhor Presidente: A C……………., S.A., com sede no Lugar do……….., Via ……….., pessoa colectiva n.º…………., notificada do ofício supra mencionado, VEM POR ESTE MEIO E MUI RESPEITOSAMENTE, informar e requerer o seguinte:

No que respeita ao teor da notificação supra descrita, devemos salientar que o processo de autorização municipal entregue no presente Município a 7 de Julo de 2007, foi elaborado sob a égide e estrito respeito pelo preceituado no D.L. 11/2003 de 18 de Janeiro.

Este diploma legal visa regular a autorização municipal inerente à instalação e funcionamento das infra-estruturas e suporte das estações de radiocomunicações e respectivos acessórios, definidas no D.L. 151-A/2000, de 20 de Junho.

Além de estabelecer todos os requisitos formais e materiais deste tipo de Processo de Autorização, este diploma consagrou no seu capítulo II, sob a epígrafe “Autorização Municipal” o conjunto de elementos, que de forma taxativa, devem instruir o processo, bem como os procedimentos pelos quais este se deverá coadunar.

Neste sentido, o Operador, ou a sociedade que desenvolva a actividade de instalação e exploração de infra-estruturas de suporte de estações de radiocomunicações, deverá com o requerimento dirigido ao presidente da câmara municipal, entregar os elementos constantes no artigo 5º do Decreto-Lei 11/2003, não havendo, nem se retirando pela interpretação do presente diploma legal, necessidade de entregar outros elementos.

Salientamos que com o D.L. 11/2003 de 18 de Janeiro aplica-se especificamente, conforme foi referido supra, à instalação e funcionamento das infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações e respectivos acessórios definidas no D.L. 151-A/2000, de 20 de Junho, não se podendo aplicar acessoriamente ou cumulativamente outro diploma legal ou instrumento jurídico, uma vez que estes têm uma aplicação factual e jurídica completamente diferenciada e distinta.

Nunca é demais lembrar que o próprio preâmbulo do Decreto Lei 11/2003 de 18 de Janeiro refere que “O presente diploma pretende também dar resposta ao vazio legislativo relativo à autorização municipal para a instalação e funcionamento de infra-estruturas de suporte de estações de radiocomunicações, tendo em conta a natureza atípica e específica das mesmas e a necessidade de uniformização da actuação dos municípios nesta matéria (…)”

Na mesma sequência, a Associação Nacional de Municípios, na Circular 130/2003, datadas de 22/09/2003, vem referir in fine que “Tem-se verificado, no entanto, que as Câmaras Municipais têm diferentes entendimentos quanto à interpretação do Decreto-Lei n.º 11/2003 de 18 de Janeiro. A publicação do novo quadro legal visou colocar um fim às dúvidas que se levantam sobre quais os normativos que se aplicavam à instalação de infra-estruturas de radiocomunicações. Por isso, revela-se de toda a utilidade que se proceda a uma aplicação homogénea da lei. Para isso, deverão as Câmaras Municipais observar as normas legais em vigor, consubstanciadas no Decreto-Lei n.º 11/2003, de 18 de Janeiro, enquadramento legal este que é o único actualmente aplicável” (Bold e sublinhado nosso).

No que diz respeito ao parecer do Director do Departamento do Planeamento Estratégico e Urbanístico, no seu ponto 3, a Requerente manifesta a sua total discordância com a classificação atribuída à infra-estrutura, uma vez que a classifica como “equipamento público técnico”. Bem como a intenção de indeferimento nos termos da alínea a) do 1 art. 24 do D.L. 555/99, não aplicável ao presente pedido de autorização municipal.

A infra-estrutura da Requerente é classificada, nomeadamente à luz do DL 11/2003 como infra-estrutura de suporte de estação de radiocomunicações e respectivos acessórios”, jamais se podendo considerar um equipamento público.

Assim, a fundamentação do presente município para indeferir a pretensão da requerente é desprovida de qualquer suporte legal.

Mais, a Requerente frisa que o pedido de autorização apresentado refere-se unicamente à implantação de um pequeno armário e pequenos elementos junto à torre de telecomunicações do operador I………. já existente no local, não havendo lugar a instalação de nova torre.

Isto posto, acresce que a Requerente não concorda com a notificação no âmbito e para os efeitos do art. 100º e 101º do CPA, notificação esta que se considera manifestamente ilegal uma vez que a Requerente deveria ter sido notificada ao abrigo do artigo 9º do D.L. 11/2003, de 18 de Janeiro, regime especial este, que se configura como um verdadeiro procedimento de audiência prévia dos interessados, não se aplicando o estatuído nos artigos 100º e seguintes do CPA, sendo o regime especial do artigo 9º o aplicável neste âmbito aos presentes autos de autorização.

Impõe-se o cumprimento o disposto no artigo 9º do D.L. 11/2003, de 18 de Janeiro. Ora face ao exposto conclui-se que a audiência prévia ora realizada é ilegal por violar o disposto no artigo 9º do D.L. 11/2003.

Finalmente, com a notificação da resposta que ora se remete, será retomado o prazo considerado para autorização municipal em subject, nos termos do D.L. 11/2003, de 18 de Janeiro.”

(cfr. documento nº 6, junto com a petição inicial e fls. 27 a 29 do processo administrativo).

8. Por despacho de 02.09.2008 exarado no parecer de 01.09.2008 da DGAU, o Vereador, com competências delegadas, concordando com aquele parecer, determinou a sua notificação à Autora (cfr. fls. 25 do processo administrativo).

9. Mediante ofício nº 3356, datado de 02.09.2008 e recepcionado a 05.09.2008, foi, de novo, a Autora “C…………” notificada quanto ao processo de autorização municipal quanto à infra-estrutura aqui em causa, do qual conta o seguinte:

“(…) o requerimento apresentado nesta Câmara e registado sob o n.º (…), foi objecto do despacho que a seguir se transcreve, emitido por H…………., dr., vereador com competências delegadas, em 02/09/2008: Notifique-se nos termos da lei o parecer técnico infra da DGAU/CMO, com o qual concordo.” (…)

“- Deverá notificar-se a requerente, nos termos do art. 9.º do DL 11/2003, de 18/01. Deverá para efeitos de audiência prévia, artigos 100º e 101º do Código do Procedimento Administrativo, pronunciar-se no prazo de 15 dias, sobre a intenção de indeferimento.

Se não se pronunciar no prazo indicado o indeferimento é definitivo”.

(cfr. documento nº 7 junto com a petição inicial e fls. 14 e 15 do processo administrativo).

10. O projecto de indeferimento teve por base o parecer da Divisão de Gestão e Administração Urbanística (DGAU), do qual consta o seguinte:

“(…) Assim, em conformidade com o art. º 38º do regulamento do PDM, a classificação deste tipo de instalações é “equipamento público técnico”, onde pode ler-se:

“Instalações e serviços de interesse geral, podendo considerar-se, entre outras, as seguintes rubricas:

(...) Estes equipamentos têm um carácter mais industrial, podendo fazer parte do “Espaço Industrial”, sendo as garagens consideradas à parte”.

- Tem sido entendimento perfilhado por estes Serviços a inclusão de infra-estruturas de suporte de estações de radiocomunicações, em “equipamento público técnico”.

- Atendendo a que o terreno se insere em “espaço urbano existente, categoria C”, a sua instalação não é viável”. (…)

(cfr. documento nº 7, junto com a petição inicial e fls. 14 e 15 do processo administrativo).

11. Na sequência do referido ofício nº 3356, a Autora “C………….”, apresentou defesa que enviou para a Câmara Municipal de Ovar em 24.09.2008 (cfr. documento nº 8, junto com a petição inicial e fls. 16 a 22 do processo administrativo).

12. Em 2011.2008, pelo ofício nº 4359, assinado pelo Vereador, com competências delegadas a Autora “C……………”, foi de novo notificada pela CMO, cujo teor foi o seguinte:

“…e para o devido conhecimento, junto envio fotocópia da informação n.º 201/DP/08, do Departamento Administrativo e Financeiro, que mereceu o meu despacho “Mantenho o indeferimento nos termos e fundamentos da presente informação jurídica”, de 13/11/2008”.

(cfr. documento nº 1, junto com a petição inicial e fls. 3 do processo administrativo).

13. Na informação 201/DP/08, de 29.10.2008, do Departamento Administrativo e Financeiro (DAF), consta o seguinte:

“(…) No caso em apreciação, conforme consta das informações técnicas, o local onde se pretende instalar as infra-estruturas de suporte de estação de radiocomunicações, insere-se em zona classificada no PDM do Município de Ovar, como “Espaço urbano Existente Categoria c”, no qual, nos termos do quadro regulamentar do Anexo I do mesmo regulamento, não é permitida a instalação de “equipamento público técnico”.

Ora, nos termos das Notas Explicativas que constituem o Anexo II do Regulamento do PDM de Ovar, “Equipamento Público técnico” são instalações e serviços de interesse geral, onde se inclui estações emissoras de rádio, televisão, etc.

Face à informação técnica, foi proferido despacho de indeferimento, comunicado à requerente nos termos e para os efeitos previstos no art. 9.º do DL n.º 11/2003. É nesta sede de audiência prévia que a requerente vem pronunciar-se contra o indeferimento, alegando em resumo e com relevo para efeitos do presente parecer, que o fundamento invocado para o indeferimento não procede, pois as infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações não integram o conceito de equipamento público técnico, por não serem instalações e serviços de interesse geral do tipo dos constantes das Notas explicativas do Anexo II do regulamento do PDM de Ovar.

(…)

Assim sendo, a situação é subsumível ao constante da primeira parte da alínea b) do art. 7.º do DL n.º 11/2003, que determina que o pedido deve ser indeferido quando a instalação das infra-estruturas de suporte de estações de radiocomunicações violarem restrições previstas no plano municipal de ordenamento do território que seria, como vimos, a situação do caso presente.”

(cfr. documento nº 1, junto com a petição inicial e fls. 4 e 5 do processo administrativo).

14. O Vereador H…………. actuou ao abrigo da subdelegação e delegação de competências que lhe foi conferida, conforme consta de proposta e despacho – cfr. documentos 1 e 2 juntos com a contestação.”;

[…]».

2. De Direito

No recurso são suscitadas as nulidades de não especificação dos fundamentos de facto da decisão (violação do artigo 615.º, n.º 1, al. b) do CPC), de falta de fundamentação de direito por não especificação dos fundamentos jurídicos da decisão e indicação das normas legais em que a mesma se sustenta (artigo 615.º, n.º 1, al. b) do CPC) e por oposição entre a fundamentação e a decisão (artigo 615.º, n.º 1, al. c) do CPC).

E é também invocado o erro de julgamento por errada interpretação e aplicação dos artigos 2.º, al. a), 5.º, n.º 1, al. e), 7.º, 8.º, 9.º e 11.º, n.º 4 do Decreto-Lei n.º 11/2003 e por violação do princípio da proporcionalidade, previsto no artigo 266.º, n.º 2 da CRP.

2.1. Das alegadas nulidades

O TCA Norte, por acórdão de 19.04.2018, defendeu a inexistência de qualquer das nulidades que as Recorrentes imputam ao acórdão recorrido de 30.11.2017.

E com razão.

Inexiste nulidade por não especificação dos fundamentos de facto da decisão, pois não se verifica uma omissão total de matéria de facto provada, como aliás resulta da transcrição supra, e a haver alegada insuficiência da matéria de facto para sustentar a decisão adoptada, essa insuficiência redundaria sempre num erro de julgamento e não numa nulidade do aresto.

Inexiste também a alegada falta de fundamentação ou de especificação dos pressupostos de direito em que a decisão se apoia, pois eles estão devidamente enunciados na mesma. O que existe é uma divergência da interpretação que as Recorrentes fazem dos preceitos legais face àquela que foi sufragada e aplicada pelo Tribunal a quo; mas, uma vez mais, um tal argumento consubstancia um erro de julgamento e não uma nulidade da decisão. Não pode falar-se em nulidade do acórdão, pois, como se percebe até pela alegação que consta do recurso a respeito dos erros de julgamento, a fundamentação do mesmo existe e foi apreendida pelas recorrentes, que divergem dela.

Por último, também não se verifica o alegado erro lógico na construção da decisão que estaria na origem da violação da alínea c) do artigo 615.º do CPC. As recorrentes alegam nesta parte que se o acórdão considerou que o acto impugnado violou o disposto nos nºs. 1 e 2 do art.º 9.º do DL n.º 11/2003, deveria concluir que a realização da audiência prévia nos termos previstos nesse preceito sempre teria um “efeito prático”.

Porém, essa situação poderá configurar um erro de julgamento por não haver lugar à aplicação do princípio do aproveitamento do acto administrativo e não a aludida nulidade, uma vez que não existe qualquer desconformidade lógica entre os fundamentos da decisão e a parte dispositiva da mesma.

2.2. Dos alegados erros de julgamento

Cumpre começar por lembrar que o TAF de Viseu julgara a acção procedente e anulara o despacho que indeferira o pedido de autorização de instalação da infra-estrutura de suporte da antena de radiocomunicações por entender, no essencial:

- que tinha havido deferimento tácito do pedido: i) o pedido havia sido formulado pela C…………. em 07.07.2008; ii) a este pedido aplicava-se o disposto no artigo 8.º do DL n.º 11/2003, que, para o efeito, consubstanciava legislação especial relativa à autorização municipal para a instalação e funcionamento de infra-estruturas de suporte de estações de radiocomunicações, “tendo em conta a natureza atípica e específica das mesmas e a necessidade de uniformização da actuação dos municípios nesta matéria, garantindo a celeridade de todo o processo, características fundamentais para o cumprimento das obrigações inerentes à prestação do serviço pelos operadores de telecomunicações móveis”; e iii) nos termos do disposto no artigo 8.º do DL n.º 11/2003, a autorização tinha de se ter por tacitamente deferida em 06.10.2008, ou seja, contando o prazo de 30 dias para a decisão e descontados os períodos em que decorreram os prazos para a audiência prévia;

- que o despacho de indeferimento violara o artigo 7.º do DL n.º 11/2003, na medida em que inferira o pedido de autorização com base num fundamento – o da inadmissibilidade de autorização daquela instalação naquele local, face às regras do PDM, que proibiam a implantação de “equipamentos públicos técnicos” na localização pretendida – que não se encontrava previsto neste artigo legal; e

- que inexistia nulidade do acto de deferimento tácito da autorização porque não se podia considerar verificada a violação das regras do PDM, uma vez que as Recorrentes tinham razão ao argumentar que uma infra-estrutura de suporte de uma antena de radiocomunicações não podia reconduzir-se ao conceito de “equipamentos públicos técnicos”, tal como definido nas notas explicativas do Regulamento do PDM de Ovar.

O acórdão recorrido aceita a tese de que houve deferimento tácito do pedido de autorização de implantação da infra-estrutura de suporte da antena de telecomunicações, mas considera que o dito deferimento tácito é nulo porque consubstancia a violação das regras do PDM de Ovar, que, neste caso, se teriam de sobrepor.

Para o TCA Norte, o facto de no Regulamento do PDM de Ovar se proibir a instalação naquela localização de “equipamentos públicos técnicos” e de este conceito abranger, segundo aquele Regulamento, entre outros equipamentos, as “estações emissoras de rádio e televisão” era em si suficiente para que se “anuísse” em considerar dentro da margem de discricionariedade técnica a recondução pelo município, também àquele conceito de “equipamento público técnico”, das infra-estruturas para suporte de antenas de telecomunicações, cuja autorização estava a ser requerida. E, com este fundamento, considera que o TAF de Viseu errou na interpretação e aplicação que fez do direito, pelo que revogou o acórdão daquele Tribunal e, decidindo em substituição, julgou a acção improcedente.

As Recorrentes refutam os argumentos do acórdão recorrido alegando, em síntese, que ele erra na interpretação que faz do conceito de “Equipamentos públicos técnicos”, contante das notas explicativas do Regulamento do PDM de Ovar, bem como da relação jurídica entre o disposto no artigo 7.º do DL n.º 11/2003 e nas ditas normas do regulamento do PDM.

E acrescentam, por último, que a solução jurídica em que se fundamenta o acórdão recorrido – prevalência de uma regulamentação de um PDM que “inviabiliza” a instalação de infra-estruturas de suporte de antenas de telecomunicações (e, consequentemente, das mesmas) numa ampla área da cidade, alegando que aqueles equipamentos são equiparáveis a infra-estruturas públicas como estações de tratamento de águas ou mesmo emissoras de televisão e rádio – conduz a uma violação desproporcionada (e, por isso, inconstitucional) do poder de fiscalização da conformidade da implantação aqueles equipamentos de prestação de serviços de comunicações, na vertente da implantação das respectivas infra-estruturas, com os valores do urbanismo municipal.

Vejamos se têm razão.

O DL n.º 11/2003 veio regular a autorização municipal inerente à instalação das infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações, e respectivos acessórios, definidos no Decreto-Lei n.º 151-A/2000, de 20 de Julho, e adoptar mecanismos para fixação dos níveis de referência relativos à exposição da população a campos electromagnéticos.

Este diploma legal surge no contexto normativo da transposição para o direito interno do pacote europeu das Directivas em matéria de liberalização do serviço de comunicações electrónicas, para o qual o regime de regulação (acesso, partilha e livre implantação) das infra-estruturas era crucial, como resultava da Directiva 2002/21/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 7 de Março de 2002 relativa a um quadro regulamentar comum para as redes e serviços de comunicações electrónicas (directiva-quadro).

As directrizes europeias em matéria de liberalização do sector das comunicações assentavam, de resto, em novos institutos jurídicos em matéria de regulação da implantação das infra-estruturas – os direitos de passagem (artigo 11.º da Directiva 2002/21/CE) e a partilha de locais e recursos (artigo 12.º da Directiva 2002/21/CE) -, os quais seriam depois incorporados no direito nacional por via da sua transposição pela Lei das Comunicações, Lei n.º 5/2004. Lei que no seu artigo 2.º remetia expressamente para o antes mencionado Decreto-Lei n.º 151-A/2000, fazendo assim a assunção daquele regime jurídico prévio por este diploma de regulação do quadro geral da liberalização desta actividade económica de serviço de interesse económico geral, em linha com as directrizes europeias deste sector.

No preâmbulo do Decreto-Lei n.º 151-A/2000 pode ler-se que “Relativamente à instalação de redes e estações, incluindo antenas, mantém-se o actual princípio de que o licenciamento radioeléctrico não dispensa quer as autorizações inerentes ao direito de propriedade, quer os actos de licenciamento, autorização ou outros previstos na lei, nomeadamente da competência dos órgãos autárquicos, os quais visam tutelar interesses diversos dos que estão cometidos à entidade gestora do espectro radioeléctrico”.

Ora, a salvaguarda legal do regime dos “licenciamentos autárquicos”, tinha em vista assegurar que a implantação no terreno das infra-estruturas necessárias à prestação do serviço de comunicações respeitava os valores definidos pelo planeamento urbano. Mas esta remissão não é em si suficiente para neutralizar a necessidade de interpretar as regras municipais aplicáveis a estes procedimentos em conformidade com o direito europeu e com as normas legais que, para o efeito, foram aprovadas como legislação especial, e nas quais se incluiu o DL n.º 11/2003.

A breve referência ao contexto normativo do artigo 7.º do DL n.º 11/2003 é fundamental para compreender que a interpretação correcta dos pressupostos normativos aplicáveis ao pedido de autorização, cujo acto de indeferimento é impugnado nos autos, tem de respeitar aquelas directrizes, maxime a harmonização da salvaguarda dos interesses municipais, com a garantia da prestação do serviço económico de interesse geral. Daqui resultam algumas premissas essenciais para a resolução do litígio em apreço.

Primeiro, o indeferimento do pedido de autorização teria de ter sido fundamentado de acordo com o disposto no mencionado artigo 7.º do DL n.º 11/2003 e não o foi.

Segundo, a isso acresce que a interpretação que o acórdão recorrido faz do conceito de “Equipamentos públicos técnicos” constante das já mencionadas notas explicativas do Regulamento do PDM de Ovar e que o leva a incluir no mesmo as infra-estruturas de suporte de antenas de radiocomunicações é manifestamente desrazoável: i) porque não estamos a falar de equipamentos públicos e sim privados, tendo em conta que no sector das telecomunicações os equipamentos são propriedade das empresas; ii) porque o tipo de volume e impacto (visual e de outras forma de inquinamento) não é comparável ao das infra-estruturas elencadas na exemplificação do conceito de “Equipamentos públicos técnicos”; e iii) porque ao contrário dos exemplos ali mencionados as infra-estruturas de comunicações móveis têm de estar localizadas dentro das áreas habitacionais para assegurar a cobertura do serviço e, com isso, a efectiva prestação do mesmo e a sua qualidade.

Terceiro, como o Recorrente também alegava na sua P.I. e foi, em certa medida, considerado um argumento procedente no acórdão do TAF de Viseu, o procedimento previsto no DL n.º 11/2003 tem diversas especificidades que acautelam a especialidade em que se tem de fundamentar a análise pelos municípios da conformidade da implantação daqueles equipamentos no terreno com os valores urbanísticos municipais que os procedimentos de autorização visam acautelar. Desde logo, quando impõe que ante um projecto de indeferimento do pedido de autorização, a audiência prévia “deva” oferecer a possibilidade de uma alternativa num raio de 75m. Não se trata apenas de assegurar a audiência do interessado nos termos gerais do CPA, mas também de impor à entidade autorizante que não se limite a inviabilizar o pedido, antes contribua activamente para a sua viabilização, dada a essencialidade do respectivo objecto para a garantia da prestação de um serviço de interesse económico geral. E o raio de 75m é também indicador da diferença que existe entre este tipo de infra-estruturas e aquelas que o Regulamento do PDM de Ovar enquadrava sob o conceito de “Equipamentos públicos técnicos” e obrigava a que ficassem fora dos núcleos habitacionais.

Por fim, cabe sublinhar que também o argumento da violação do princípio da proporcionalidade acabava aqui por ser relevante se reconduzido à desrazoabilidade da solução alcançada no aresto recorrido, que apenas permitia, afinal, a instalação de antenas de comunicações fora do perímetro urbano da cidade, o que, in extremis, podia levar a uma solução de inviabilização de prestação do serviço de comunicações em condições adequadas aos munícipes.

Pelas razões antes elencadas, a decisão recorrida não pode manter-se.

Decisão

Assim, nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da Secção do Contencioso Administrativo do STA em julgar procedente o recurso, revogar a decisão recorrida e manter na ordem jurídica o acórdão do TAF de Viseu.

Custas pelo Recorrido no Supremo e nas instâncias.

Lisboa, 9 de junho de 2022. – Suzana Maria Calvo Loureiro Tavares da Silva - Carlos Luís Medeiros de Carvalho – José Francisco Fonseca da Paz (Vencido, nos termos da declaração anexa)

De acordo com o projecto de acórdão que elaborei, negaria provimento à revista com fundamento nas razões que, de seguida, se sintetizam:

- Além de nulidades, que entendo não se verificarem, os recorrentes imputaram ao acórdão recorrido erros de julgamento por o acto impugnado padecer de vício de forma por não ter sido precedido da formalidade da audiência do interessado prevista no art.° 9° do DL n.° 11/2003, de 18/1 e violar o princípio da proporcionalidade e os art°s. 7.° e 8.°, do mesmo diploma legal, dado que a estação em causa não correspondia a um “equipamento público técnico” para efeitos do que dispõe o RPDM de Ovar.

- Quanto à violação do citado art.° 9.°, n.° 1, o acórdão recorrido, apesar de a ter considerado verificada, entendeu que, por aplicação do princípio do aproveitamento do acto administrativo, não lhe deveria ser atribuída eficácia invalidante. Ora, as recorrentes, nem na conclusão G), nem no corpo da sua alegação, contestaram a aplicação do referido princípio, tendo-se limitado a afirmar a verificação do vício que o próprio acórdão entendeu existir. Assim, por ausência de impugnação pelos recorrentes, não pode deixar de se concluir que o acórdão subsiste na parte em que considerou que o vício não tinha eficácia invalidante.

- A violação do princípio da proporcionalidade, enquanto vício autónomo, só ocorre quando a Administração actua no exercício de poderes discricionários, funcionando como um seu limite interno, dado que no domínio da actividade vinculada, em que o conteúdo do acto administrativo decorre da própria lei o que importa ver é se esta foi respeitada. Ora, no caso em apreço, o art.° 7.°, do DL n.° 11/2003, ao abrigo do qual foi indeferida a instalação da estrutura em causa, confere ao Município um poder vinculado, dado que perante a constatação da violação do PDM este tinha de proferir um acto de indeferimento. Assim, este vício nunca poderia proceder.

- Ao contrário do entendimento que fez vencimento, considero que o indeferimento do pedido das recorrentes fundamentou-se na al. b) do n.° 1 do citado art.° 7.° e não vejo que a caracterização das instalações em causa como equipamento público técnico seja “manifestamente desrazoável”, quando cabe na definição constante do RPDM de Ovar como “instalações e serviços de interesse geral” e nada impede os Municípios de obstarem à instalação das infraestruturas dentro de determinadas áreas habitacionais. Tendo o legislador adoptado, para a definição de equipamentos públicos técnicos e não técnicos, um sistema misto de combinação de uma cláusula geral com a referência ao elenco exemplificativo dos equipamentos que serve para limitar o campo de aplicação daquela cláusula, entendo que é de considerar como técnico o equipamento que cabe naquela definição como instalação ou serviço de interesse geral e que tem natureza e características idênticas a um dos que aí é elencado, como sucede com as “estações emissoras de rádio e televisão, etc.”.

Fonseca da Paz