Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0802/09
Data do Acordão:01/13/2010
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:MIRANDA DE PACHECO
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL
ANULAÇÃO DA VENDA
DIREITO DE RETENÇÃO
ARRENDAMENTO
Sumário: I - Para efeito do disposto na alínea a), n.º 1 do artigo 257.º do CPPT, o conceito de ónus reais abrange os direitos reais de gozo, de garantia e o arrendamento, sendo que os ónus e limitações relevantes são apenas os que não caducam com a venda em execução.
II - O direito de retenção, enquanto direito real de garantia que resulta directamente da lei sem necessidade de declaração judicial nesse sentido, caduca com a venda em execução- primeira parte do n.º 2 do artigo 824.º do Código Civil.
III - O contrato de arrendamento celebrado posteriormente à penhora do imóvel em processo de execução fiscal é inoponível em relação a essa execução-artigo 819.º do Código Civil.
Nº Convencional:JSTA00066198
Nº do Documento:SA2201001130802
Data de Entrada:07/27/2009
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TT1INST LISBOA PER SALTUM.
Decisão:NAGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART249 N5 C ART245 N2 ART257 N1 A.
CPC96 ART890 N5.
CCIV66 ART819 ART824 N2.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC213/07 DE 2007/05/23.
Referência a Doutrina:ALBERTO DOS REIS PROCESSO DE EXECUÇÃO VII PAG420.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1 – A…, não se conformando com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que indeferiu o pedido de anulação da venda realizada no processo de execução fiscal nº 3905200201037900, instaurado pelo Serviço de Finanças de Torres Vedras, dela vem interpor recurso, formulando as seguintes conclusões:
1. O presente recurso vem interposto da douta sentença, proferida em 11 de Março de 2009, nos autos acima identificados, no âmbito de um incidente de anulação da venda efectuada no processo de execução fiscal nº 3905200201037900, instaurado pelo 2° Serviço de Finanças de Torres Vedras contra o executado B…;
2. O aqui Recorrente é credor do executado B…, tendo instaurado contra o mesmo um processo de execução que se encontra pendente, sob o número 1568/04.8TVPRT, pela 3ª Secção do 1° Juízo de Execução do Porto, no qual foi penhorado o prédio urbano sito na freguesia de …, do concelho de Torres Vedras, descrito na Conservatória do Registo Predial daquele concelho sob o nº 139 e inscrito na respectiva matriz urbana daquela freguesia sob o artigo 2653, prédio este que acabou por ser vendido no sobredito processo de execução fiscal nº 3905200201037900;
3. O Recorrente — por via da inscrição definitiva daquela penhora prévia, efectuada no processo de execução pendente pelo 1° Juízo de Execução do Porto — foi notificado para reclamar o respectivo crédito no sobredito processo de execução fiscal, o que fez em 3 de Novembro de 2006, tendo ali reclamado um crédito de € 145.847,65;
4. A venda do supra identificado prédio, no processo de execução fiscal, veio a ocorrer em 28 de Março de 2007, tendo o ora Recorrente ali apresentado uma proposta de € 150.000,00, que, até por falta de outras propostas, foi aceite, tendo aquele procedido, na mesma data, ao depósito da totalidade do preço oferecido e ao pagamento do Imposto de Selo, tendo-lhe sido reconhecida a situação de isenção de pagamento de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis;
5. Em 25 de Setembro de 2007, o Recorrente foi notificado pelo TAF de Loures (Lisboa 2), da admissão de várias reclamações de créditos, no âmbito do processo de verificação e graduação de créditos nº 330/07.OBELRS, entre as quais a de C…, no valor de € 160.000,00, apresentada nos autos de execução fiscal, em 7 de Dezembro de 2006, na qual aquele invocava um direito de retenção, pelo valor de € 160.000,00, sobre o prédio vendido, e a existência, também, de um alegado e pretenso contrato de arrendamento, a favor de D…, igualmente, incidente sobre aquele mesmo prédio;
6. A existência daquele crédito, do alegado direito de retenção no valor de € 160.000,00 e do alegado contrato de arrendamento sobre o prédio vendido, eram absolutamente novos e surpreendentes para o aqui Recorrente, e modificavam e modificaram, por completo, os factos e os pressupostos em que assentara a decisão daquele de apresentação da proposta de compra e de aquisição, em 28 de Março de 2007, do prédio em venda na execução fiscal, tendo manifesta e inequívoca influência na venda;
7. Com efeito, a ter sido conhecido, previamente, pelo aqui Recorrente, o alegado direito de retenção invocado por C… e o alegado arrendamento do prédio em venda na execução fiscal, não teria aquele apresentado qualquer proposta de compra do prédio, até porque aqueles alegados direito de retenção e contrato de arrendamento influenciavam e influenciam, de forma inequívoca e negativa, o valor do prédio vendido, desvalorizando o valor do prédio e traduzindo-se, sobretudo, o arrendamento, numa forte limitação dos direitos do proprietário quanto à posse, uso, fruição e afectação do prédio;
8. Aquando da publicação dos anúncios/editais para venda do prédio penhorado (em 9 e em 16 de Fevereiro de 2007), o 2° Serviço de Finanças de Torres Vedras, responsável pela venda, sabia, já, desde 7 de Dezembro de 2006, que haviam ali sido apresentadas várias reclamações de créditos, e, especificamente, a de C…, na qual aquele invocava um direito de retenção, pelo valor de € 160.000,00, sobre o prédio penhorado na execução fiscal, bem como sabia, também, que aquele alegava ter arrendado a D… o prédio penhorado e em venda na execução fiscal ali pendente;
9. Ora, porque aquelas informações eram, absolutamente, relevantes e foram, completamente, omitidas nos anúncios e editais publicados a publicitar a venda, entende o aqui Recorrente, que aqueles anúncios e editais e a própria venda estão feridos de nulidade, conforme decorre do disposto nos artigos 201°, 890°, 908° e 909°, todos do C.P.Civil e artigos 249° e 257° do CPPT, a qual deverá ser conhecida e declarada, anulando-se em consequência a venda efectuada no sobredito processo de execução fiscal;
10. E foi precisamente aquilo que o aqui Recorrente pediu, com base nos factos acima referidos, que vieram ao respectivo conhecimento posteriormente à venda, tendo requerido a anulação da venda efectuada na sobredita execução fiscal;
11. No entanto, na douta sentença recorrida, a Mma. a quo entendeu julgar totalmente improcedente o incidente de anulação da venda e todos os demais pedidos formulados pelo Recorrente, defendendo, ali, o entendimento de que é bastante para a perfeição dos anúncios editais a identificação sumária dos bens a vender;
12. O entendimento sustentado pelo aqui Recorrente, e que se crê dominante, vai, no entanto, no sentido de que deverão constar dos anúncios e editais a publicitar a venda, a menção a todos os “litígios” e circunstâncias relevantes que possam afectar a venda, devendo ali constar todos os elementos que possam influenciar o valor do bem a vender — o que não aconteceu no caso em apreço;
13. Tendo, por isso, o ora Recorrente, sem que disso tivesse o menor conhecimento, e sem que tivesse sido, minimamente, publicitado pelo Serviço de Finanças responsável pela venda, adquirido um prédio, no processo de execução fiscal, sobre o qual incide, alegadamente, um direito de retenção pelo montante de € 160.000,00, e que, ainda para mais, se encontra, também, alegadamente, arrendado;
14. As informações relevantes para a formação da vontade do ali comprador — e ora Recorrente — que não era possível obter através do exame do próprio bem penhorado e da respectiva certidão predial, ou seja, o alegado direito de retenção e o alegado arrendamento do prédio em venda, não constaram, pois, dos anúncios/editais publicados, pelo 2° Serviço de Finanças de Torres Vedras, para publicitar a venda do prédio em causa — o que constitui, com o devido respeito, um circunstancialismo bastante para anular a venda;
15. Acresce que, no respectivo pedido de anulação da venda, o ora Recorrente invocou, ainda, e invoca aqui, as expectativas criadas por via do anúncio publicado e por via da aquisição por ele operada do prédio em causa, pois que o Recorrente, quando apresentou uma proposta de aquisição e adquiriu aquele prédio por € 150.000,00, tinha a expectativa de que, uma vez pagas as custas da execução e o credor hipotecário, beneficiaria de uma parte do valor remanescente, o que sai, agora, completamente subvertido e frustrado, atentos os demais créditos reclamados, e, sobretudo, o alegado direito de retenção e a existência do alegado arrendamento incidente sobre o prédio adquirido pelo Recorrente;
16. As expectativas do adquirente — e aqui Recorrente — quanto à graduação de créditos na execução fiscal são perfeitamente relevantes e merecedoras de tutela legal, pois que o Recorrente, tendo em consideração as informações publicitadas e todo o demais conhecimento que tinha, apresentou uma proposta de aquisição e adquiriu o prédio em venda, por um montante que, de acordo com os preceitos legais atinentes à graduação de créditos e à precedência legal estabelecida na lei, lhe permitiria receber de retorno uma parte significativa do valor que desembolsara para adquirir aquele prédio, tendo, assim, uma expectativa legítima que motivou tivesse apresentado uma proposta de aquisição e que adquirisse o prédio em venda, expectativa aquela que sai, assim, completamente, frustrada pelas informações e ocorrências posteriores acima relatadas;
17. A douta argumentação expendida na sentença recorrida pondo em causa o crédito reclamado por C… e o direito de retenção por ele invocado no montante de € 160.000,00, e, bem assim, o alegado e pretenso arrendamento, a favor de D…, do prédio vendido ao Recorrente na execução fiscal, só poderá ter-se como assente/segura quando proferida, e transitada em julgado, a sentença de verificação e de graduação de créditos, e caso ali se perfilhe igual entendimento;
18. Nesta altura, o que é facto é que o Recorrente se vê surpreendido e confrontado com uma reclamação de créditos por parte de C…, com a alegação, por este, de um direito de retenção no montante de € 160.000,00, e com um alegado arrendamento, a favor de D…, do prédio vendido na execução fiscal e quando o Recorrente apresentou a proposta de aquisição e adquiriu aquele prédio julgava que o mesmo estava completamente livre e desocupado, e, portanto, apto a ser alienado, ocupado, ou rentabilizado;
19. Tendo em conta tudo o que precede, e o mais que doutamente será suprido, entende, pois, o aqui Recorrente que os anúncios editais a publicitar a venda e a própria venda efectuada na execução fiscal estão feridos de nulidade, que deverá ser conhecida e declarada, anulando-se em consequência a venda efectuada no sobredito processo de execução fiscal;
20. A douta decisão violou, por erro de interpretação e de aplicação, nomeadamente, o disposto nos artigos 201°, 890°, 908° e 909°, todos do C.P.Civil e os artigos 249° e 257° do CPPT.
2 – A recorrida Fazenda Publica, não contra-alegou.
3 – O Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer nos seguintes termos:
“Objecto do recurso: sentença declaratória da improcedência de pedido de anulação de venda em processo de execução fiscal
FUNDAMENTAÇÃO
1.A venda em execução transfere para o adquirente os direitos do executado sobre a coisa vendida; os bens são transmitidos livres dos direitos de garantia que os onerarem, apenas subsistindo os que tenham sido registados antes do registo da penhora, arresto ou garantia e os que, não estando sujeitos a registo, tenham sido constituídos antes da penhora, arresto ou garantia (art.824° n°2 C Civil)
Os direitos de terceiro que caducarem transferem-se para o produto da venda dos respectivos bens, sem prejuízo dos direitos do exequente ou dos credores que tenham preferência sobre o titular do direito caduco (art.824° n°3 C Civil)
Por outro lado, sem prejuízo das regras do registo, são ineficazes em relação ao exequente os actos de disposição, oneração ou arrendamento dos bens penhorados (art.819° C Civil)
Assim sendo:
a)os ónus e limitações do bem transmitido, que constituem fundamento da anulação da venda, só se impõem ao adquirente se se tiverem constituído antes do registo da penhora ou do arresto, nos casos dos bens registáveis, ou antes de a penhora ou arresto se concretizarem, se se tratar de bens não sujeitos a registo.
b)no caso de os ónus e limitações não serem oponíveis à execução caducam com a venda, à semelhança do que sucede com os direitos reais indicados no art. 824° n°2 Código Civil
(cf. Jorge Lopes de Sousa CPPT anotado e comentado Volume 11 2007 p.581)
O regime legal vigente consagra uma solução equilibrada que promove a tramitação regular do processo de execução sem prejudicar o interesse do adquirente, na medida em que o prejuízo que poderia resultar da aquisição de um bem com ónus ou limitações que desconhecia é eliminado pela caducidade dos direitos de garantia que o onerar (art. 824° n°2 C Civil)
2.Aplicando estas considerações ao caso em análise:
a) o arrendamento invocado por C… (com início em 1 .10.2006) é posterior às penhoras incidentes sobre o imóvel transmitido nas diversas execuções (a última das quais registada em 28.11.2005)(probatório nºs 6 e 25)
b) a caducidade do direito ao arrendamento (independentemente da natureza real, obrigacional ou mista do direito do locador, controvertida na doutrina e na jurisprudência) é consequência automática da venda em execução e não de eventual declaração judicial proferida em outro processo onde, especificamente se discuta a validade e eficácia daquele contrato
c )o direito de retenção invocado por C… não deu origem a uma acção de declaração de execução específica com registo anterior ao do registo da penhora efectuada no processo de execução fiscal, apenas tendo sido reclamado o respectivo crédito garantido (probatório nºs 20/24;arts.755° n.º al. f) e 759° n°1 C. Civil)
CONCLUSÃO
O recurso não merece provimento.
A sentença impugnada deve ser confirmada.”
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
4-A sentença recorrida fixou a seguinte matéria de facto:
1. Em 9 de Novembro de 2001, foi instaurado no serviços de finanças de Torres Vedras 2 (SFTV2), o processo de execução fiscal (PEF) n.º 3905200201037900, contra “E…”, por dívida no montante de Euros 70.198,09, relativa a IVA, referente ao exercício de 2001 (cf. fls. 1 e certidões de dívida a fls. 2-8, do PEF apenso)
2. Face à ausência de bens da devedora originária, a execução foi revertida contra B… (cf. despacho de fis.102, verso, fls. 103 a 116, e fls. 119, do PEF apenso).
3. B… foi citado para a execução em 28 de Setembro de 2005 (cf. mandado e certidão de notificação com hora certa, a fls. 138 a 141, do PEF apenso).
4. Em 6 de Outubro de 2005 foi emitido mandado de penhora “nos bens pertencentes” a B… “suficientes para o pagamento da dívida exequenda, bem como dos juros de mora e das custas processuais devidos até final” (cf. mandado a fia. 142, do PEF apenso).
5. Na sequência do que, em 18 de Novembro de 2005 foi penhorado o prédio urbano “composto por casa de habitação de r/chão com 6 assoalhadas, cozinha e 2 casas de banho, corredores, despensa, hall, garagem e logradouro, com a. c. 216 m2 logradouro 354 m2, a confrontar do norte com caminho, sul com …, Nascente com caminho e poente com …, inscrito no art. 2653 da freguesia da …”, descrito na Conservatória do Registo Predial de Torres Vedras sobre o n.º 00139, da freguesia de …, para garantia da quantia exequenda (cf. auto de penhora, a fls. 152, do PEF apenso).
6. A penhora melhor identificada no ponto anterior, foi registada em 28 de Novembro de 2005 (cf. certidão emitida pela Conservatória do Registo Predial de Torres Vedras, a tis. 169-171,do PEF apenso).
7. Sobre o imóvel melhor identificado no ponto 5, foi constituída hipoteca voluntária a favor da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Torres Vedras, CRL, para garantia “de todas e quaisquer obrigações pecuniárias a assumir”, registada em 1 de Setembro de 1995 (cf. certidão emitida pela Conservatória do Registo Predial de Torres Vedras, a fls. 169-171, do PEF apenso).
8. Sobre o imóvel melhor identificado no ponto 5, foi constituída penhora a favor de F…., para garantia de quantia exequenda no montante de Euros 25.562,13, registada em 14 de Janeiro de 2005 (cf. certidão emitida pela Conservatória do Registo Predial de Torres Vedras, a fls. 169-171, do PEF apenso).
9. O edital relativo à venda do bem imóvel penhorado, melhor identificado no ponto 5, teve o seguinte teor (cf. fls. 269 a 292, do PEF apenso):
EDITAL
O Chefe do Serviço Local de Finanças de Torres Vedras 2.
Faz saber que no próximo dia 28 de Março de 2007, pelas 14 horas, neste Serviço Local de Finanças se há-de proceder à venda por meio de proposta em carta fechada no bem penhorado a B…, executado por reversão da firma E…, com residência na Calçada … … - … - Torres Vedras, por divida de IVA do ano de 2001 no processo de execução fiscal n.º 3905200201037900.
BEM PENHORADO
Prédio urbano, composto por casa de habitação de r/c com seis divisões assoalhadas, cozinha, duas casas de banho, corredor, despensa, hall, garagem e logradouro, com a área coberta de 216 m2, logradouro de 354 m2, a confrontar do norte com caminho, sul com …, nascente com caminho e poente com …, inscrito no artigo 2653 da freguesia de ventosa.
O prédio encontra-se descrito na Conservatória do registo predial de Torres Vedras sob o n.º l39/Ventosa.
O valor base para a venda é de 183 600 euros.
A venda será realizada por meio de proposta em carta fechada, nos termos do nº 1 do artigo 248.° e servirá de base à mesma 70% do valor supra, e a ela poderão assistir os proponentes, os reclamantes e quem puder exercer o direito de preferência ou remição.
Ao valor da venda acresce o Imposto de Selo e o IMT a liquidar à taxa legal em vigor. As propostas poderão ser entregues pessoalmente ou enviadas pelo correio para este Serviço de Finanças, sito na Praceta …, n.º … 2560 Torres Vedras, devendo conter a designação do bem e o preço oferecido, bem como a identificação clara do proponente através do nome, morada ou sede, número de contribuinte e assinatura devendo ser inseridas num segundo envelope fechado em cujo exterior constará apenas a identificação deste Serviço e o número do processo antes referido.
Os proponentes deverão comprovar a sua identidade e qualidade ou poderes com que intervêm
As referidas propostas podem dar entrada neste Serviço até ao dia e hora designados para a venda do bem.
No acto da venda deverá ser depositada a importância mínima de 1/3 e nos quinze dias imediatos, a parte restante com excepção dos casos em que forem exercidos os direitos de preferência ou remição em que será obrigatório o depósito imediato da totalidade do preço (arts 896.° n.º 3 e 912.° n.º 3 do Código de processo Civil).
Os bens poderão ser examinados pelos possíveis interessados na compra, contactando o fiel depositário o Sr. G…, residente na … n.º … em … - A dos Cunhados -Torres Vedras, o qual poderá mostrar os bens a quem pretenda examiná-los, até ao final do dia anterior ao da venda.
E para constar se passou o presente edital e outros de igual teor que vão ser afixados nos lugares designados por lei aos dezoito dias do mês de Janeiro do ano de 2007.
(…)
10. O edital melhor identificado no ponto anterior foi publicitado, tendo sido publicados anúncios em 9 e 16 de Fevereiro e tendo o mesmo sido afixado “nos locais designados por lei” (cf. fls. 269 a 292, verso do PEF apenso).
11. Em 7 de Janeiro de 2007, foi dado conhecimento à requerente, através do oficio n.º 430, de 18 de Janeiro de 2007, do SFTV2, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, da data para realização da venda do imóvel melhor identificado no ponto 5 (cf. fls. 279-278, do PEF apenso).
12. A ora requerente apresentou em 28 de Março de 2007, uma proposta de aquisição do imóvel melhor identificado no ponto 5, pelo montante de Euros 150.000,00 (cf. fls. 293 a 254, do PEF apenso).
13. Na mesma data, a requerente procedeu ao depósito da totalidade do preço oferecido, tendo liquidado o imposto de selo devido e tendo-lhe sido reconhecida a situação de isenção de pagamento de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (cf. título de transmissão, a fls. 296, e confirmação da ocorrência do pagamento, a fia. 310, todas do PEF apenso).
14. Em 28 de Março de 2007, foi exarado despacho pelo chefe do SFTV2, com o seguinte teor (cf. fls. 285, do PEF apenso):
Mostrando-se efectuado o depósito do preço e satisfeitas as obrigações fiscais inerentes à transmissão, adjudico o bem imóvel ao A… (...), passe titulo de transmissão onde se identifique o bem transmitido e se certifique o pagamento do preço e o cumprimento das obrigações fiscais.
Encontram-se reunidas as condições previstas no art. 8.° do CIMT.
(…)
15. Em 22 de Março de 2004, a requerente deu entrada na 9ª vara cível, 2ª secção, do Porto, a um requerimento executivo, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e que veio a dar origem ao processo de execução comum n.º 1 568/04.8TVPRT, e que actualmente corre termos no 1º juízo, 3ª secção, dos juízo de execução do Porto, em que são executados, entre outros, B… e H…, para pagamento da quantia de Euros 131.261,69, referindo-se na “exposição dos factos”, que “em virtude de operações de crédito praticadas no exercício da sua actividade bancária, o Banco Exequente é legitimo dono e portador das duas livranças juntas a deante como títulos executivos, as quais apresentadas a pagamento na data do respectivo vencimento, não foram pagas, então nem posteriormente”, pelo que “o Exequente tem o direito de haver dos Executados — co-obrigados cambiários.— e estes têm a obrigação de pagar àquele, em regime de solidariedade, o capital titulado por aquelas livranças e, bem assim, os respectivos juros moratórios à taxa legal sucessivamente em vigor, desde a data do vencimento até efectivo e integral pagamento” (cf. certidão extraída do proc. nº 330/07,OBELRS, junta aos autos).
16. Na sequência do que foi constituída penhora a favor da ora requerente, A..., para garantia da quantia exequenda no montante de Euros 138.546,71, registada em 16 de Novembro de 2004 (cf. certidão emitida pela Conservatória do Registo Predial de Torres Vedras, a fls. 169-171, do PEF apenso).
17. Tendo sido notificada para o efeito, em 3 de Novembro de 2006 a ora requerente reclamou créditos em sede do PEF n.º 3905200201037900, no montante total de Euros 145.847,65, relativo à quantia em causa no processo executivo melhor identificada no ponto 5, acrescida de juros de mora (cf. certidão extraída do proc. n.º 330/07.OBELRS, junta aos autos).
18. As reclamações de créditos apresentadas no PEF n.º 3905200201037900, deram origem aos autos de verificação e graduação de créditos, que correm termos no Tribunal tributário de Lisboa com o n.º 330/07.OBELRS.
19. Em 25 de Setembro de 2007, a requerente foi notificada pelo Tribunal tributário de Lisboa da admissão dos créditos por si reclamados no processo n.º 330/07.OBELRS (cf. certidão extraída do proc. n.º 330/07.OBELRS, junta aos autos).
20. Tomou, então, conhecimento que além do seu credito, foi reclamado um crédito pela Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Torres Vedras, CRL, no montante de Euros de 33.213,89, outro pelo Instituto da Segurança Social, no montante de Euros 76,000,00, um crédito de C… e outro pela Fazenda Nacional (cf. certidão extraída do proc. n.º 330/07.OBELRS, junta aos autos).
21. Tomou ainda conhecimento da motivação invocada por C… e dos documentos juntos pelo mesmo naquele processo n.º 330/07.OBELRS.
22. Em 7 do Dezembro de 2006, deu entrada no SFTV2 requerimento de C…, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e que faz parte do proc. n.º 330/07.OBELRS, através do qual são reclamados créditos no PEF n.º 3905200201037900, no montante de Furos 160.000,00, com fundamento em “incumprimento definitivo” de contrato-promessa alegadamente celebrado entre o executado B… e sua mulher e C… (cf. certidão extraída do proc. n.º 330/07.OSELRS, junta aos autos).
23. C…, reclamante no processo n.º 330/07.0BELRS, juntou àqueles autos cópia de um documento intitulado “contrato promessa de compra e venda”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, no qual figuram como “primeiro outorgantes e promitentes vendedores”, B… e H…, e como segundo outorgante e promitente comprador”, C…, sendo o mesmo datado de 29 de Julho de 2005 (cf. certidão extraída do proc. n.º 330/07.OBELRS, junta aos autos)
24. C…, reclamante no processo n.º 330/07.OBELRS, juntou àqueles autos uma certidão, emitida pelos serviços do 3. ° juízo do Tribunal judicial de Torres Vedras, na qual se faz constar que em 15 de Janeiro de 2007, deram entrada naquele Tribunal os autos de acção de processo ordinário com o n.º 131/07.6TBTVD, em que o mesmo é autor e são réus B… e H…, o Estado português e “credores desconhecidos”, figurando como pedido na respectiva petição inicial que seja declarada a resolução do contrato promessa alegadamente celebrado entre o aí A. e “os RR., que estes sejam condenados a pagar a quantia de Euros 160.000,00, a titulo de devolução do sinal em dobro; que seja reconhecido ao aí A. o direito de retenção e que sejam “os RR. Estado português e credores desconhecidos condenados a reconhecerem o direito do A.” (cf. certidão extraída do proc. n.º 330/07.OBELRS, junta aos autos)
25. C…, reclamante no processo n.º 330/07.OBELRS, juntou àqueles autos cópia de um documento intitulado “contrato de arrendamento”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, no qual figuram como “contraentes”, C… e D…, e no qual o primeiro “na qualidade de senhorio dá de arrendamento ao segundo, na qualidade de arrendatário, que aceita o prédio rústico situado na Calçada …, n.º …, …, … TVD”, “descrito na Conservatória do Registo Predial de Torres Vedras, n.º 00139 de 27-03-86, Artigo: 2653”, sendo o mesmo datado de 1 de Outubro de 2006 (cf. certidão extraída do proc. n.º 330/07.OBELRS, junta aos autos).
26. Em 11 de Maio de 2007, a Fazenda Nacional reclamou créditos no âmbito do PEF n.º 3905200201037900, no montante de Euros 228,45, decorrentes de dívida de IMI e Contribuição autárquica (cf. certidão extraída do proc. n.º 330/07.OBELRS, junta aos autos).
27. Em 31 de Julho de 2008, foi proferido despacho nos autos de execução n.º 1568104.8TVPR, melhor identificados no ponto 15, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, no qual se determina não ser de declarar a respectiva extinção da instância (cf. fls. 135-137, dos autos).
5- A sentença sob recurso julgou totalmente improcedente o incidente de anulação da venda do imóvel identificado no 9. do probatório no âmbito de um processo de execução fiscal pendente no 2.º Serviço de Finanças de Torres Vedras.
Para tanto, afrontando o fundamento que fora invocado para a anulação da venda traduzido no facto de informações relevantes para a formação de vontade na decisão de compra desse imóvel por parte de requerente, como era o caso do direito de retenção e contrato de arrendamento que sobre ele incidiam, terem sido omitidas nos anúncios e editais que publicitaram a venda, a sentença ponderou do modo que segue.
Relativamente ao contrato de arrendamento considerou-se que, sendo posterior às penhoras que incidiam sobre o imóvel em causa, o mesmo não seria oponível à execução nos termos do disposto no artigo 819.º do CC, o mesmo se dizendo quanto ao também alegado contrato de promessa de venda do imóvel e direito de retenção dele decorrente por incumprimento, a que acresce a circunstância de caducarem com a concretização da venda, à semelhança de do que acontece com os direito reais indicados no n.º 2 do artigo 824.º do CC.
Já no que concerne à nulidade do edital que publicitou a venda, entendeu-se que a alínea c) do n.º 5 do artigo 249.º do CPPT não exige mais do que a identificação sumária do mesmo, não sendo exigível “a indicação da existência de ónus sobre o mesmo, e muito menos, da identificação dos credores na execução, e dos créditos detidos ou reclamados pelos mesmos”.
Vejamos, então, do eventual acerto do assim decidido.
Comecemos por enfrentar a questão da nulidade do edital.
Torna-se indiscutível, como se afirma na sentença, que a alínea c) do n.º 5 do artigo 249.º do CPPT apenas exige para a publicidade da venda em processo de execução fiscal a descrição sumária dos bens, não constando dos restantes requisitos elencados nas outras alíneas do mesmo número, a exigência relativa à existência de litígio que possa afectar a estabilidade da venda, como sucede na previsão constante do n.º 5 do artigo 890.º do CPC
Todavia, sendo os editais e os anúncios as únicas vias para os potenciais compradores se informarem sobre as características do bem a vender, dos mesmos deverá constar todas as informações relevantes para a formação da vontade do comprador, bem como influenciar o próprio valor do bem a vender, o que constitui uma “exigência imposta pelas regras de boa fé que devem pautar a generalidade das relações contratuais (artigo 227, n.º1 do CC) e toda a actividade da administração pública (artigo 266.º, n.º 2, da CRP- in CPPT, anotado e comentado, de Jorge Lopes de Sousa, 5.ª edição, fls. 543, anotação 2 ao artigo 249.º.
Ora, na situação em apreço, é um facto que a recorrente apenas teve conhecimento de que sobre o imóvel que comprara no âmbito da execução fiscal em causa incidia um direito de retenção decorrente de incumprimento de um contrato de promessa de compra e venda, assim como de um contrato de arrendamento, através da notificação, em momento posterior, que lhe foi feita da admissão dos créditos reclamados no processo n.º 330/07.OBELRS (17. a 21. do probatório).
Ónus esses que apenas foram invocados e dados a conhecer pelo reclamante C… no âmbito do aludido processo de reclamação de créditos (22. a 25. do probatório).
Acontece que embora as reclamações devam ser apresentadas no órgão de execução fiscal, este limita-se a organizar o respectivo processo por apenso ao processo de execução fiscal e o envia posteriormente ao tribunal tributário de 1.ª instância com cópia do processo principal (artigo 245.ºn.º 2 do CPPT), onde será proferida a sentença de graduação e verificação dos créditos reclamados, o que no caso ainda não ocorreu.
Isto significa que não compete ao órgão de execução fiscal tomar conhecimento dos termos em que vêm formuladas as reclamações de créditos apresentadas e o teor dos documentos que as acompanham, limitando-se a sua intervenção, como já acima se disse, a organizar o processo e remetê-lo a tribunal.
Sendo assim, como é, o órgão de execução fiscal na altura em que elaborou o edital publicitando a venda desconhecia, nem tinha a obrigação de conhecer, que fora alegado pelo reclamante um direito de retenção sobre o imóvel em causa, assim como um contrato de arrendamento.
Daí que ao questionado edital vicio algum possa ser assacado em decorrência de uma omissão de informações relevantes para a formação da decisão de compra por parte da ora recorrente, nada permitindo afirmar que o procedimento do órgão de execução fiscal tenha violado as regras da boa fé, sendo certo que no caso foram observados os requisitos impostos pelo n.º 5 do artigo 249.º do CPPT.
Bem se andou, portanto, na sentença ao concluir-se que “De facto, poderá, não fazendo tal indicação, sujeitar-se à eventualidade de o adquirente pedir a anulação invocando o disposto no art. 257, n.º 1, alínea a) do CPPT, mas não comete qualquer nulidade nos termos do disposto no art. 249.º do mesmo diploma”.
Vejamos, de seguida, a questão da requerida anulação da venda.
Estabelece a alínea a), n.º 1 do artigo 257.º do CPPT que a anulação da venda poderá ser requerida dentro do prazo de 90 dias “No caso de a anulação se fundar na existência algum ónus real que não tenha sido tomado em consideração e não haja caducado ou em erro sobre o objecto transmitido ou sobre as qualidades por falta de conformidade com o que foi anunciado”.
Por sua parte, prevê o artigo 819.º do CC que “ Sem prejuízo das regras de registo, são inoponíveis em relação à execução os actos de disposição, oneração ou arrendamento dos bens penhorados”.
Sendo certo que sob a epígrafe “Venda em execução”, o n.º 2 do artigo 824.º do CC prevê o seguinte:” Os bens são transmitidos livres dos direitos de garantia que os onerarem, bem como dos demais direitos reais que não tenham registo anterior ao de qualquer arresto, penhora ou garantia, com excepção dos que, constituídos em data anterior, produzam efeitos em relação a terceiros independentemente de registo” e o n.º 3 do mesmo artigo “Os direitos de terceiro que caducaram nos termos do número anterior transferem-se para o produto da venda dos respectivos bens”.
Como primeira nota, importará salientar que para efeito da previsão normativa constante da citada alínea a), n.º 1, do artigo 257.º do CPPT, ao abrigo da qual foi a anulação da venda requerida, o conceito de ónus reais abrange os direitos reais de gozo, de garantia e o arrendamento (Alberto dos Reis, Processo de Execução, vol. 2.º, pag. 420), sendo que os ónus ou limitações relevantes são apenas os que não caducam com a venda em execução.
Ora, o direito de retenção, enquanto direito real de garantia que resulta directamente da lei sem necessidade de declaração judicial nesse sentido, sendo certo que a sua eficácia também não depende de registo, caduca com a venda em execução, como resulta da primeira parte do n.º 2 do artigo 824.º do CC, transferindo-se para o produto da venda os direitos do seu titular- cfr acórdão de 23/05/07, no recurso n.º 213/07 e Jorge Lopes de Sousa, in obra já citada, anotação 3 .º ao artigo 257.º.
Caducidade essa que decorre directamente da lei e, como tal, constitui uma consequência automática da venda em execução, não carecendo de qualquer declaração judicial nesse sentido.
Em decorrência do exposto, o alegado direito de retenção não configura fundamento relevante para efeito de anulação da venda à luz do disposto na aludida alinea a).
Já no que ao invocado contrato de arrendamento diz respeito, tendo sido celebrado a 1/10/06 (25. do probatório), quando já anteriormente se concretizara a penhora do imóvel no processo de execução fiscal, mais concretamente a 18/11/05 (5. do probatório), esse contrato nos termos do citado artigo 819.º do CC é inoponível à execução.
Aliás, o mesmo se diga quanto ao invocado contrato promessa de compra e venda, cujo incumprimento gerou o direito de retenção, já que por ter sido celebrado a 25/7/05 ( 23. do probatório) não é oponível ao ora recorrente, que beneficiava de um penhora sobre o imóvel arrendado desde 16/11/04 no âmbito de uma execução a correr seus termos nos Juízos de Execução do Porto (15. e 16. do probatório).
De tudo o que acaba de ser dito resulta que o alegado direito de retenção, contratos promessa de compra e venda e de arrendamento, para além de não constituírem fundamento para anulação de venda em processo executivo à luz da alínea a) do n.º1 do artigo 257.º do CPPT, sempre seriam inoponíveis à ora recorrente e daí que não se possa dizer, como faz o recorrente, que desvalorizam o valor do prédio e, sobretudo, o arrendamento se traduza numa forte limitação dos direitos do proprietário quanto à posse, uso, fruição e afectação do prédio (conclusão 7.).
Neste contexto, o desconhecimento dos aludidos ónus sobre o imóvel vendido, do qual o órgão de execução fiscal não pode ser responsabilizado (como vimos), não consubstanciava informação relevante para a formação da vontade do comprador- ora recorrente.
Improcedem, deste modo, todas as conclusões da alegação da recorrente.
Termos em que se acorda negar provimento ao recurso, confirmando-se, em consequência, a sentença recorrida.
Custas a cargo da recorrente, fixando-se a procuradoria em 1/6.
Lisboa, 13 de Janeiro de 2010. - Miranda de Pacheco (relator) - Pimenta do ValeJorge Lino.