Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01069/12
Data do Acordão:01/23/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FERNANDA MAÇÃS
Descritores:BENEFÍCIOS FISCAIS
ISENÇÃO DE SISA
REDUÇÃO DE IMPOSTO
INTERPRETAÇÃO
INTERPRETAÇÃO DA LEI FISCAL
EMPREENDIMENTO TURÍSTICO
Sumário:I - Na determinação do sentido e alcance das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis”, sendo que “Sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer directamente da lei” (art. 11º, nºs. 1 e 2, da LGT).
II - No âmbito do regime jurídico da instalação, exploração e funcionamento dos empreendimentos turísticos, estabelecido no Decreto-Lei nº 39/2008, de 7 de Março, o conceito de instalação de um empreendimento turístico compreende o conjunto de actos jurídicos e os trâmites necessários ao licenciamento (em sentido amplo, compreendendo comunicações prévias ou autorizações, conforme o caso) das operações urbanísticas necessárias à construção de um empreendimento turístico, bem como a obtenção dos títulos que o tornem apto a funcionar e a ser explorado para finalidade turística (cfr. Capítulo IV, arts. 23º ss).
III - Quando o legislador utiliza a expressão aquisição de prédios ou de fracções autónomas com destino à «instalação», para efeitos do benefício a que se reporta o nº 1 do art. 20º, do Decreto-Lei nº 423/83, de 5 de Dezembro, não pode deixar de entender-se como referindo-se precisamente à aquisição de prédios (ou de fracções autónomas) para construção de empreendimentos turísticos, depois de devidamente licenciadas as respectivas operações urbanísticas, visando beneficiar as empresas que se dedicam à actividade de promoção/criação dos mesmos.
IV - Este conceito de «instalação» é o que se mostra adequado a todo o tipo de empreendimentos turísticos e não é posto em causa pelo facto de os empreendimentos poderem ser construídos/instalados em regime de propriedade plural, uma vez que esta tem a ver com a «exploração» e não com a «instalação».
V - Nos empreendimentos turístico constituídos em propriedade plural (que compreendem lotes e ou fracções autónomas de um ou mais edifícios, nos termos do disposto no art. 52º, nº 1, do Decreto-Lei nº 39/2008, de 7 de Março), destacam-se dois procedimentos distintos, ainda que possam ocorrer em simultâneo: um relativo à prática das operações necessárias a instalar o empreendimento; outro, relativo às operações necessária a pô-lo em funcionamento e a explorá-lo, sendo que a venda das unidades projectadas ou construídas faz necessariamente parte do segundo.
VI - O legislador pretendeu impulsionar a actividade turística prevendo a isenção /redução de pagamento de Sisa /Selo, para os promotores que pretendam construir/criar estabelecimentos (ou readaptar e remodelar fracções existentes) e não quando se trate da mera a aquisição de fracções (ou unidades de alojamento) integradas nos empreendimentos e destinadas à exploração, ainda que sejam adquiridas em data anterior à própria instalação/licenciamento do empreendimento.
VII - Quem adquire as fracções não se torna um co-financiador do empreendimento, com a responsabilidade da respectiva instalação, uma vez que está a adquirir um produto turístico que foi posto no mercado pelo promotor, seja a aquisição feita em planta ou depois de instalado o empreendimento, como um qualquer consumidor final, tanto mais que as fracções podem ser adquiridas para seu uso exclusivo e sem qualquer limite temporal (no caso de empreendimentos turísticos constituídos em propriedade plural).
VIII - Não estando em causa a aquisição de prédios ou de fracções autónomas destinados à construção/instalação de empreendimentos turísticos, mas sim a aquisição de unidades de alojamento por consumidores finais, ainda que porque integradas no empreendimento em causa se encontrem afectas à exploração turística, a mesma não pode beneficiar das isenções consagradas no art. 20º, nº 1, do Decreto-Lei nº 423/83.
IX - Este resultado interpretativo é o que resulta do elemento histórico, racional/teleológico e também literal das normas jurídicas em causa.
X - “Os benefícios fiscais são medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes e que sejam superiores aos da própria tributação que impedem (artigo 2.°/1 do EBF) (…)” e embora admitindo a interpretação extensiva (artigo 10.º do EBF), não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência, ainda que imperfeitamente expresso (artigo 9.°/2 do C. Civil), para além de que porque representam uma derrogação da regra da igualdade e do princípio da capacidade contributiva que fundamenta materialmente os impostos, os benefícios fiscais devem ser justificados por um interesse público relevante.
Nº Convencional:JSTA00068057
Nº do Documento:SA22013012301069
Data de Entrada:10/16/2012
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...... E B......
Votação:UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF LOULÉ
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICAL - SELO
Legislação Nacional:DL 423/83 DE 1983/12/05 ART20 N1 N2 ART12 N2
LGT98 ART11 N2
DL 167/97 DE 1997/07/04 ART9
DL 55/2002 DE 2002/03/11 ART9
DL 49399 DE 1969/11/24 ART21 ART22 ART39
DL 328/86 DE 1986
DL 39/2008 DE 2008/03/07 ART5 ART6 ART44 N1 N2 N4 ART45 ART23 ART40 ART52 ART54 ART55 ART30 N8
L 2073 DE 1954/12/23 ART12 ART13
L 2081 DE 1956/06/04 ART12
EBFISC01 ART2 N1 ART10
CIMSISD91 ART13 N8
CCIV66 ART9 N2
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC314/12 DE 2012/09/05; AC TC PROC188/2003 DE 2003/04/08
Referência a Doutrina:SALDANHA SANCHES MANUAL DE DIREITO FISCAL 3ED PAG147
PIRES DE LIMA ANTUNES VARELA NOÇÕES FUNDAMENTAIS DE DIREITO CIVIL 6ED VOLI PAG145 CÓDIGO CIVIL ANOTADO 4ED VOLI PAG145 INTRODUÇÃO AO DIREITO E AO DISCURSO LEGITIMADOR PAG187
OLIVEIRA ASCENSÃO O DIREITO INTRODUÇÃO E TEORIA GERAL 1978 PAG350
LICINIO MARTINS O PROCEDIMENTO DE INSTALAÇÃO DE EMPREENDIMENTOS TURÍSTICOS EMPREENDIMENTOS TURÍSTICOS PAG121
DULCE LOPES ASPECTOS JURÍDICOS DA INSTALAÇÃO DE EMPREENDIMENTOS TURÍSTICOS PAG225/227
CRISTINA SIZA VIEIRA PROPRIEDADE PLURAL E GESTÃO DE EMPREENDIMENTOS TURÍSTICOS PAG172/188
DULCE LOPES CONCRETIZAÇÃO DE EMPREENDIMENTOS TURÍSTICOS LEGISLAÇÃO E APLICAÇÃO PAG152/154 PAG170
REAVALIAÇÃO DOS BENEFÍCIOS FISCAIS CADERNOS DE CIÊNCIAS E TÉCNICA FISCAL N187 PAG294
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


I- RELATÓRIO

1. A……… e B………, identificados nos autos, impugnaram judicialmente, no TAF de Loulé, as liquidações de IMT e de Imposto de Selo, invocando, em síntese, que a aquisição de prédios ou fracções autónomas destinadas a instalar empreendimentos qualificados de utilidade turística, se encontra isenta de IMT, sendo o Imposto de Selo reduzido a 1/5 do que fosse devido.

2. Inconformada, a representante da Fazenda Pública veio interpor recurso para este STA, formulando as seguintes conclusões das suas alegações:
“a) A questão decidenda é saber se a aquisição dos imóveis se destinou à instalação do empreendimento ou se este já se encontrava instalado;
b) In casu, não existindo ampliação ou melhoramento em mais de 50%, o reconhecimento dos benefícios respeitantes à isenção de IMT e redução de Imposto de Selo dependem de se considerar que a aquisição do impugnante se destinou a instalar um empreendimento qualificado de utilidade turística como o exige o art.° 20° n.° 1 do Decreto-Lei n.° 423/83 de 05/12;
c) O DL n.° 423/83 de 5/12 reestruturou profundamente o instituto de utilidade turística e previu, no seu art.° 7º, a concessão da utilidade turística a título prévio caso fosse atribuída antes da entrada em funcionamento dos empreendimentos:
i) novos;
ii) já existentes que fossem objecto de remodelação, beneficiação ou de reequipamento totais ou parciais;
iii) já existentes que aumentassem a sua capacidade em, pelo menos, 50%;
d) E previu a concessão da utilidade turística a título definitivo, caso fosse atribuída a empreendimentos já em funcionamento ou quando resultasse da confirmação da utilização turística a título prévio:
e) E foi precisamente ao abrigo destes normativos que, em 2011/02/25, foi publicado no Diário da República a atribuição da utilidade turística a título definitivo ao C………, de 5 estrelas, cujo funcionamento já iniciara em 2008/09/04;
f) Assim, não faz sentido, e carece de apoio legal, sustentar, como se faz na sentença recorrida, que a aquisição das fracções identificadas nos autos, integra a fase de instalação do empreendimento turístico, pois este não só já se encontrava instalado, como também já se encontrava em funcionamento;
g) A interpretação que a Fazenda Pública faz da norma em questão, é a de que esta apenas reconhece a possibilidade de ser atribuída a utilidade turística a empreendimentos que resultem de um directo investimento, traduzido quer na construção de empreendimentos novos, quer na remodelação, beneficiação ou reequipamento totais ou parciais, quer 92 realização de obras conducentes ao aumento da capacidade em, pelo menos, 50%;
h) Por esse motivo, o legislador entendeu atribuir benefícios fiscais em sede de Imposto de Sisa (IMT) e do Selo, às empresas proprietárias que realizam o esforço do investimento. Pretendeu o legislador impulsionar este sector de actividade, prevendo isenção/redução de pagamento de Sisa/Selo, mediante determinadas condições, a quem vai criar estabelecimentos turísticos, e não a quem se limita a adquirir fracções pertencentes a empreendimentos já instalados;
l) Na verdade, quando o legislador diz, no n° 1 do artigo 20°, “destino à instalação”, tal significa que se trata apenas de aquisições de prédios efectuadas com o intuito de neles construir/melhorar empreendimentos turísticos, e não da mera aquisição de prédios/fracções integradas em empreendimentos já construídos e instalados, como sucedeu no caso concreto;
m) Este é o entendimento e interpretação perfilhados pela Administração Tributária, e que decorre do elemento histórico, racional/teleológico, mas também literal das normas jurídicas em apreço;
n) Entendimento também perfilhado pelo TCA do Sul, acórdão n.° 4424/10, de 2011/10/18, proferido na Impugnação Judicial que correu termos, no TAF de Loulé, sob o n.°78/10.9BELLE;
o) Ao julgar que a aquisição da fracção se destinou à instalação do empreendimento turístico, a decisão contida no aresto ora recorrido viola o disposto naquela norma legal, incorrendo em erro de julgamento, porque não esta preenchido um dos condicionalismos que a lei impõe para que se verifique a isenção prevista no n.° 1 do Art.° 20.° do DL n.° 423/83, nomeadamente, que o imóvel adquirido se destine à instalação do empreendimento turístico.
Face ao exposto, deve ser dado provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogada a sentença recorrida, só assim se fazendo JUSTIÇA”.

3. Os então impugnantes, ora recorridos, A……… e B……… vieram apresentar Contra-alegações, das quais concluíram o seguinte:
“1ª
Ao contrário do alegado pela recorrente, a sentença recorrida não padece de qualquer erro de julgamento nem fez uma errada interpretação do artigo 20º do Decreto-lei 423/83, de 5 de Dezembro.
Da jurisprudência do STA resulta que sempre foi tido como suficiente, para o reconhecimento dos benefícios fiscais nele previstos, que o imóvel adquirido, em empreendimento turístico declarado como de utilidade turística, fosse destinado a exploração turística e não, como pretende recorrente, que se trate da primeira aquisição de um prédio onde venha a ser construído um empreendimento turístico novo ou, tratando-se de um já existente, que venha a sofrer obras de melhoria.
O que resulta do artigo 20º, n.º 1 do mencionado DL 423/83, de 5 de Dezembro como condição para que os benefícios fiscais de isenção de IMT e de redução de imposto de selo sejam concedidos é que o uso ou fim a que se destine o imóvel não possa ser outro senão a exploração turística do mesmo.
O conceito de instalação apresentado pela recorrente reduz inaceitavelmente o âmbito de aplicação do preceito.
O entendimento do Tribunal a quo, ao decidir que o empreendimento apenas estará definitivamente instalado quando todas as unidades de alojamento iniciarem o seu funcionamento, estando a primeira aquisição de cada fracção integrada nesse processo de instalação é o que se mostra mais consentâneo quer com a letra quer com espírito da lei, quer, ainda, com a interpretação sistemática da norma nele contida.
Entendimento este que já o Ministério Público tinha adoptado no parecer que precedeu a sentença.
A posição da recorrente é diametralmente oposta, fazendo com que o Estado, representado pelo Ministério Público e pela Fazenda Pública assuma, em relação ao mesmo assunto, duas posições antagónicas, situação que inadmissível num Estado de Direito em que a lei é única e se aplica a todas as entidades.
A interpretação do artigo 20º do DL 423/83, de 5 de Dezembro deve tomar em consideração o que actualmente se encontra previsto em matéria de instalação, exploração e funcionamento de empreendimentos turísticos consagrado no decreto-lei 39/2008, de 7 de Março, com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei n.º 228/2009, de 14 de setembro.
Este diploma consagra um novo paradigma em termos de exploração e funcionamento, encontrando-se as unidades de alojamento permanentemente em regime de exploração turística (artigo 45º).
10ª
Quem adquire uma unidade de alojamento num empreendimento turístico constituído ao abrigo do regime previsto no Decreto-lei n.º 39/2008, de 7 de Março, não pode dar-lhe outro destino senão a exploração para fins turísticos, sendo inclusivamente obrigado a mantê-lo equipado e pronto para ser locado para essa finalidade.
11ª
Pelo que, tal aquisição não constitui um negócio imobiliário, mas sim um investimento turístico, encontrando-se a propriedade, embora plena, limitada quanto ao uso a dar ao imóvel e quanto à possibilidade de a explorar, já que não pode ser o adquirente a fazê-lo, mas sim a entidade exploradora do aldeamento.
12ª
Além do mais, estando o empreendimento constituído em propriedade plural, o mesmo é composto, incindivelmente por cada uma das fracções autónomas que o integram, chamadas unidades de alojamento, de tal forma que cada uma delas constitui, em si, uma parte do empreendimento e sem cada uma delas o empreendimento não existe como tal.
13ª
Se cada unidade de alojamento tem obrigatoriamente de ser afecta à exploração turística - como foi, de facto, a dos recorridos - e se cada uma dessas unidades constitui ela própria uma parte do empreendimento, significa isso que quem adquire uma dessas unidades de alojamento, o faz para nela instalar (parte indivisível) de um empreendimento turístico.
14ª
De forma que não corresponde à realidade que só o promotor que adquire um imóvel para nele construir um empreendimento turístico ou para nele realizar obras de melhoria realiza investimentos turísticos.
15ª
Ate porque, na realidade, quem realiza o investimento logo na fase de licenciamento e construção do empreendimento (dita de “instalação” pela recorrente) são os adquirentes das fracções, através do pagamento do sinal e dos reforços de sinal por força dos contratos promessa.
16ª
O promotor é que só realiza um investimento imobiliário, porque constrói e vende as unidades de alojamento.
17ª
Além do mais, são os proprietários das unidades de alojamento que garantem o nível de serviços do aldeamento, e não o promotor, ao pagarem uma prestação periódica mensal, cujo valor para o primeiro ano tem que ficar inscrito no contrato promessa e na escritura de compra e venda sob pena de nulidade dos mesmos, nos termos do disposto 54º, n.º 7 do DL 39/2008, de 7 de Março.
18ª
Mesmo antes da entrada em vigor do DL 39/2008, de 7 de Março, sempre foi pacificamente admitido que basta que o imóvel adquirido em empreendimento classificado de utilidade turística venha a ser explorado turisticamente para que possa haver lugar aos benefícios fiscais de isenção de IMT e de redução de imposto de selo, não tendo de se tratar da primeira aquisição do imóvel para nele construir o próprio empreendimento (cfr. Acórdão do STA de 12 de Janeiro de 1999, disponível em www.dgsi.pt).
19ª
A data de abertura 04.09.2008 não significa o funcionamento do empreendimento nem a sua instalação, tanto assim que essa abertura (através de titulo válido de abertura) também é anterior à licença de utilização turística nº. 43/09 emitida em 05 de Março de 2009
20ª
O pleno funcionamento das 141 unidades de alojamento que compõem a totalidade do empreendimento só se conclui com a venda e concomitante cedência das mesmas à exploração por via de contratos de exploração turística celebrados cm simultâneo com a escritura pública, entrando a partir dai em funcionamento, como bem entende o tribunal recorrido, não padecendo, por isso, a sentença recorrida de qualquer erro ou vício.
TERMOS EM QUE DEVE SER NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO MANTENDO-SE A DOUTA DECISÃO RECORRIDA, DESSA FORMA FAZENDO V/ EXAS. A COSTUMADA JUSTIÇA.

4. O Magistrado do Ministério Público, junto deste Supremo Tribunal, pronunciou-se no sentido de ser dado provimento ao recurso, concluindo do seguinte modo:
“(…)
“Entende a Fazenda Pública que a aquisição da fracção não se destinou à instalação do empreendimento, uma vez que tal instalação já havia sido feita pela outorgante vendedora e proprietária/exploradora do empreendimento, “D………, Limitada.”
Por sua vez o tribunal recorrido, o MP junto da 1ª instância e a recorrida entendem, exactamente, o contrário, ou seja que a aquisição da fracção se destinou à instalação do empreendimento para os devidos e efeitos legais.
A nosso ver e ressalvado melhor juízo, a razão está do lado da recorrente, cujo discurso fundamentador se subscreve por inteiro.
Na verdade, nos termos do estatuído no artigo 20.°/l do DL 423/83, de 5/12, é condição para que seja concedida a redução do imposto de selo que a aquisição se destine à instalação de empreendimento turístico.
Ora, resulta, claramente, do probatório que à data da aquisição da fracção em causa (2009.10.14), o empreendimento turístico “C………” já se encontrava, absolutamente, instalado e em funcionamento desde 2008.09.04, por promoção da entidade proprietária/exploradora “D………, Limitada”.
De facto, os recorridos não adquiriram a unidade de alojamento (fracção autónoma) para instalação de empreendimento turístico, uma vez que o mesmo já estava instalado, embora seja certo que o mesmo ficou afecto à exploração turística do empreendimento e do qual faz parte integrante.
Apenas a transmissão inicial beneficia de isenção de IMT e redução de IS a 1/5 e já não as transmissões subsequentes, como é o caso da aquisição, ora, em apreciação.
A redução do imposto de selo em 1/5 e a isenção de IMT consubstanciam um beneficio fiscal (artigo 2.°/2 do EBF).
Os benefícios fiscais são medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes e que sejam superiores aos da própria tributação que impedem (artigo 2.°/1 do EBF).
As normas que estabelecem benefícios fiscais não são susceptíveis de integração analógica, embora admitam interpretação extensiva (artigo 10.º do EBF).
De qualquer modo, não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência, ainda que imperfeitamente expresso (artigo 9.°/2 do C. Civil).
A interpretação da sentença recorrida de que a isenção e redução de impostos se aplica, também, às transmissões subsequentes à inicial, ou seja, a respeitante à aquisição do imóvel por parte da entidade promotora do investimento, (ressalvada a situação, expressamente, prevista no n.° 2 do artigo 20.° do DL 423/83), a nosso ver, não tem na letra da lei a menor correspondência verbal, sendo, pois, ilegal.
A sentença recorrida, merece, pois, censura.
Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso jurisdicional, revogando-se a sentença recorrida e mantendo-se, consequentemente, na ordem jurídica as liquidações impugnadas”.

5. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.


II- FUNDAMENTOS

1-DE FACTO

“A) Em 14 de Outubro de 2009, entre os Impugnantes, na qualidade de segundo outorgante e “D………, LIMITADA”, com sede nas ………, ………, freguesia de Almancil, concelho de Loulé, pessoa colectiva ………, na qualidade de primeiro outorgante e outros, foi celebrada a escritura publica de compra e venda, mútuo com hipoteca de fls. 66 a 74 que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os legais efeitos. B) Declarou o Primeiro Outorgante (fls 39);
«_____Que vende aos representados da segunda outorgante, pelo preço global de UM MILHÃO SEISCENTOS E VINTE MIL EUROS, do qual apenas foi recebido o montante de UM MILHÃO QUATROCENTOS E SETENTA MIL SEISCENTOS E OITENTA E TRÊS EUROS E VINTE E OITO CÊNTIMOS, sendo que o remanescente do preço no montante de CENTO E QUARENTA E NOVE MIL TREZENTOS E DEZASSEIS EUROS E SETENTA E DOIS CÊNTIMOS será liquidado nos termos do acordo particular celebrado na presente data, o seguinte: ________________________
_____ a) Pelo preço de Oitocentos Mil Euros, a fracção autónoma designada pelas letras “CC”, B15, Zona Vista, fracção V21, rés-do-chão, tipo T-Três, destinada a habitação, no âmbito de serviços de exploração turística, com o uso exclusivo de um compartimento para arrumos na cave com a área de 13,12 m2 e uma zona de terraços com a área de 124,14 m2, com o valor patrimonial tributável correspondente de €210.830,00; e ________________________
_____b) Pelo preço de Oitocentos e Vinte Mil Euros, a fracção autónoma designada pela letra “N”, Bloco B03, Zona da Lagoa, fracção L17, rés-do-chão, tipo T-Três, destinada a habitação, no âmbito de serviços de exploração turística, com o uso exclusivo de um compartimento para arrumos na cave com a área de 13,12 m2 e uma zona de terraços com a área de 131,07 m3, com o valor patrimonial tributável correspondente de €210.880,00___________________________
ambas do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito no Garrão, denominado D………………. ou C……………….., freguesia de Almancil, concelho de Loulé, inscrito na respectiva matriz sob o artigo 12 988, descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob o número dez mil duzentos e oitenta e dois, da referida freguesia, registada a aquisição a favor da sociedade vendedora pela apresentações quarenta e seis, quarenta e sete e quarenta e oito, todas de onze de Março de dois mil e três, a constituição de empreendimento turístico com propriedade horizontal pela apresentação cinco mil duzentos e doze de dezasseis de Março de dois mil e nove; _
____ conforme certidões prediais permanentes consultadas nos respectivos endereços electrónicos com os códigos de acesso GP-0047-28173-080801-010282 e GP-0047- 28688-080801-010282, pelas quais verifiquei que para o prédio de que fazem parte as fracções autónomas ora alienadas foi atribuído o alvará de licença de utilização turística n.° 43, emitida pela Câmara Municipal de Loulé em 05/03/2009. ___
C) Em 14/10/2009, os Impugnantes efectuaram o pagamento do IMT e do IS a que se refere a liquidações de fls. 101 e segs. 83 destes autos e 49 a 52 do processo de impugnação em apenso.
D) Em 14/10/2009, entre os Impugnantes e E……… S.A., foi celebrado um contrato de exploração turística relativo a cada fracção a que se refere a alínea B), cfr. fls. 75 e segs..
E) Resulta dos contratos a que se refere a alínea anterior:
«É celebrado o presente contrato, em conformidade com o disposto o artigo 45, número 3 do Decreto-Lei n.° 39/2008 de 7 de Março, através do qual o signatário, na qualidade de proprietário de uma fracção considerada unidade de alojamento do C………, habilita a entidade exploradora à exploração da sua fracção, nos termos e condições constantes do clausulado que se anexa, rubricado pelas partes. »
F) As fracções autónomas a que se refere a alínea B), sitas no Aldeamento Turístico denominado C………, composto por 141 fracções, nomeadamente um CIub House e 140 unidades de alojamento que fazem parte integrante do mesmo, com a classificação definitiva de cinco estrelas, cfr. fls. 109 e segs..
G) Resulta do despacho n.° 3716/2011, publicado na II Série n.° 40, de 25/02/2011:

«Atento o pedido de atribuição da utilidade turística a título definitivo ao C…………………, de 5 estrelas, sito no concelho de Loulé, de que é requerente a sociedade D…………………., Lda.; e

Tendo presentes os critérios legais aplicáveis e o parecer do Turismo de Portugal, I.P., que considera estarem reunidas as condições para a atribuição da utilidade turística a título definitivo ao empreendimento, decido:

1 - Atribuir utilidade turística a título definitivo ao C……………………., de 5 estrelas, nos termos do disposto no n.° 1 do artigo 2.° e no n.° 3 do artigo 7.° do Decreto-Lei n.° 423/83, de 5 de Dezembro.

2 - Fixar a validade da utilidade turística em sete anos contados da data do título (comunicação de abertura) ao abrigo do qual o empreendimento iniciou o seu funcionamento (4 de Setembro de 2008), ou seja, até 4 de Setembro de 2015.

3 - Determinar que, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.° 1 e no n.° 4 do artigo 16.° do Decreto-Lei n.° 423/83, de 5 de Dezembro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.° 38/94, de 8 de Fevereiro, a proprietária e exploradora do empreendimento fique isenta das taxas devidas à Inspecção Geral das Actividades Culturais, pelo mesmo prazo fixado para a utilidade turística, caso as mesmas sejam ou venham a ser devidas.

4 - Nos termos do disposto no artigo 8.º do Decreto-Lei n° 423/83, de 5 de Dezembro, a utilidade turística fica sujeita ao cumprimento dos seguintes condicionamentos:

a) O empreendimento não poderá ser desclassificado;

b) A requerente deverá promover, até ao termo do segundo ano após a publicação do presente despacho, a realização de uma auditoria de qualidade de serviço, por uma entidade independente, cujo relatório deve remeter ao Turismo de Portugal, I.P.
Caso a requerente disponha de um sistema de gestão de qualidade implementado no empreendimento, o relatório de auditoria pode ser substituído pela descrição detalhada do referido sistema, evidenciando, nomeadamente, a política de qualidade prosseguida, a monitorização e medição da satisfação do cliente e o tratamento das reclamações, a frequência e metodologia das auditorias internas e o envolvimento da gestão de topo;

c) Não poderão ser realizadas quaisquer obras que impliquem a alteração do empreendimento sem prévia comunicação ao Turismo de Portugal I.P., para efeitos da verificação da manutenção da utilidade turística que agora se atribui, sem prejuízo de outros pareceres ou autorizações legalmente devidos por parte daquele organismo.

4 de Fevereiro de 2011. - O Secretário de Estado do Turismo, ……………….»


I) Na reclamação graciosa 1082201104002873, apresentada por B………, contra a liquidação do IS, relativo à fracção “CC” foi indeferida pelo despacho de 12/09/2011, do seguinte teor:

«De folhas 47 a 51 vem o reclamante, na pessoa do seu mandatário, exercer o direito de audição relativamente ao projecto de despacho constante de fls. 42 a 44, alegando, em resumo, que não pode concordar com a interpretação do art.° 20º do Dec. Lei nº. 483/83, de 5 de Dezembro, que só a aquisição do prédio/fracção autónoma destinado a implementar um empreendimento turístico é que pode usufruir dos benefícios fiscais de isenção de IMT e da redução do imposto do selo, e não já de transmissões posteriores, acabando assim por concluir que por tal entendimento os referidos benefícios não passam de letra morta, e não poderiam aliviar a carga fiscal, com vista a incentivar a elevação da qualidade da oferta turística.

Na defesa do seu ponto de vista, refere ainda, que os benefícios fiscais de IMT e de Imposto do Selo acabariam por nunca ser reconhecidos pelo que a finalidade do incentivo ficaria totalmente coarctada, acabando por concluir com interpretações que em nada contrariam a fundamentação da Administração Fiscal pedindo a final que devera ser concedido provimento à reclamação graciosa decidindo conforme nela peticionado.

Para além da fundamentação já explanada, referiremos ainda que se interpretarmos o pensamento legislativo nesta matéria, tudo aponta no sentido de que os referidos benefícios só poderão ser concedidos aos empreendimentos com cariz turística, concretizados no citado Decreto Lei 423/83.

A usufruição destes benefícios, nunca poderá ocorrer por força de um mero contrato de exploração turística, que como se refere neste despacho, não tem relevância para efeitos fiscais, dado que por força deste, os deveres e obrigações decorrentes da exploração turística, com vista à usufruição dos referidos benefícios, não pode ser vinculativa a terceiras pessoas estranhas ao empreendimento.

Nesta linha de interpretação das normas legais chegaríamos à conclusão que existiam tantas pessoas a usufruir dos benefícios, quantas as transmissões das suas fracções autónomas.

Ora estabelece o art.°. 1° do Dec. Lei n°. 423/83, de 5 de Dezembro ao definir o conceito de “Utilidade turística”, visando o fomento e melhoria qualitativa do sector turístico, impõe que esta qualificação será atribuída aos empreendimentos de carácter turístico que satisfaçam os princípios e requisitos definidos no presente diploma..., prevendo o seu artigo 3°., que a utilidade turística “só” poderá ser atribuída aos empreendimentos que sejam estabelecimentos hoteleiros e similares, conjuntos turísticos, parques de campismo, de interesse para o turismo, devidamente apreciados pelas autoridades competentes. Por sua vez o n°. 1 do art.º. 20º, isenta de sisa ou actualmente de Imposto Sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) as aquisições de prédios ou de fracções autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística, pronunciando-se no mesmo sentido o art.° 47°. do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF).

Parece óbvio, que daquele preceito ressalta como integrado no conceito de “utilidade turística”, o estabelecimento no seu todo.

A alienação de uma parte, provoca a sua descaracterização como empreendimento turístico, e em nada visa o fomento e melhoria do sector.

Assim, em nenhuma situação, a propriedade de parte do empreendimento, poderá estar sujeita ao princípio da liberdade contratual de alienação, e gozar deste benefício fiscal, porque seria desvirtuar todos os conceitos que vêm transcritos no citado DL 423/83. Não é possível vincular o comprador às obrigações legais exigidas para o estabelecimento no seu todo, dado que este não efectuou qualquer pedido nesse sentido, limitando-se a comprar uma fracção autónoma de empreendimento, e como tal, não poderá ter qualquer benefício em termos de IMT e Imposto do Selo, relacionado com a utilidade turística.

O contrato de exploração turística celebrado entre a reclamante e a sociedade E……………….. SA, não tem enquadramento na aplicação dos benefícios fiscais, só vigorando em termos civis. O art.°. 47° do EBE é claro ao atribuir a isenção de IMT, aos prédios integrados em empreendimentos a que tenha sido atribuída a utilidade turística, o que significa que só o “todo” é que está em causa.

Do mesmo modo, referiremos, que a reclamação graciosa apresentada com referência à liquidação de IMT a que foi atribuído o n°. 286/2011 já foi objecto de despacho de indeferimento, e sendo a liquidação de Imposto do Selo (Verba 1.1) consequência daquela, mantenho e torno definitivo o referido despacho, indeferindo o pedido.

Notifique-se a reclamante nos termos do art°. 36° do CPPT, através de carta registada com aviso de recepção, enviando-lhe cópia da decisão, e comunicando-lhe que o presente acto é susceptível de impugnação judicial, a interpor no prazo de quinze dias (quinze) dias (n°. 2 do art.°. 102° do CPPT) ou de recurso hierárquico a interpor no prazo de 30 (trinta) dias (n°. 1 do artigo 76°. do CPPT).

Cumpra-se,

Serviço de Finanças de Loulé 1, 12 de Setembro de 2011

A Chefe de Finanças»


J) O despacho a que se refere a alínea anterior foi notificado à Impugnante em 16/09/2011, cfr. reclamação graciosa em apenso.
K) Na reclamação graciosa 1082201104002830, apresentada por B………, contra a liquidação do IS, relativo à fracção “N” foi indeferida pelo despacho de 12/09/2011, do seguinte teor:

De folhas 26 a 30 vem o reclamante, na pessoa do seu mandatário, exercer o direito de audição relativamente ao projecto de despacho constante de fls. 21 a 23, alegando em resumo, que não pode concordar com a interpretação do art.°. 20° do Dec. Lei n°. 483/83, de 5 de Dezembro, que só a aquisição do prédio/fracção autónoma destinado a implementar um empreendimento turístico é que pode usufruir dos benefícios fiscais de isenção de IMT e da redução do imposto do selo, e não já de transmissões posteriores, acabando assim por concluir que por tal entendimento os referi dos benefícios não passam de letra morta, e não poderiam aliviar a carga fiscal, com vista a incentivar a elevação da qualidade da oferta turística.

Na defesa do seu ponto de vista, refere ainda, que os benefícios fiscais de IMT e de Imposto do Selo, acabariam por nunca ser reconhecidos pelo que a finalidade do incentivo ficaria totalmente coarctada acabando por concluir com interpretações que em nada contrariam a fundamentação da Administração Fiscal pedindo a final que devera ser concedido provimento à reclamação graciosa decidindo conforme nela peticionado.

Para além da fundamentação já explanada, referiremos ainda que se interpretarmos o pensamento legislativo nesta matéria, tudo aponta no sentido de que os referidos benefícios só poderão ser concedidos aos empreendimentos com cariz turística, concretizados no citado Decreto Lei 423/83.

A usufruição destes benefícios, nunca poderá ocorrer por força de um mero contrato de exploração turística, que como se refere neste despacho, não tem relevância para efeitos fiscais, dado que por força deste, os deveres e obrigações decorrentes da exploração turística, com vista à usufruição dos referidos benefícios, não pode ser vinculativa a terceiras pessoas estranhas ao empreendimento.

Nesta linha de interpretação das normas legais chegaríamos à conclusão que existiam tantas pessoas a usufruir dos benefícios, quantas as transmissões das suas fracções autónomas.

Ora estabelece o art.º. 1º do Dec. Lei n°. 423/83, de 5 de Dezembro ao definir o conceito de “Utilidade turística”, visando o fomento e melhoria qualitativa do sector turístico, impõe que esta qualificação será atribuída aos empreendimentos de carácter turístico que satisfaçam os princípios e requisitos definidos no presente diploma..., prevendo o seu artigo 3.° que a utilidade turística “só” poderá ser atribuída aos empreendimentos que sejam estabelecimentos hoteleiros e similares, conjuntos turísticos, parques de campismo, de interesse para o turismo, devidamente apreciados pelas autoridades competentes. Por sua vez o n°. 1 do art.º. 20°, isenta de sisa ou actualmente de Imposto Sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) as aquisições de prédios ou de fracções autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística, pronunciando-se no mesmo sentido o art.° 47º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF).

Parece óbvio, que daquele preceito ressalta como integrado no conceito de “utilidade turística”, o estabelecimento no seu todo.

A alienação de uma parte, provoca a sua descaracterização como empreendimento turístico, e em nada visa o fomento e melhoria do sector.

Assim, em nenhuma situação, a propriedade de parte do empreendimento, poderá estar sujeita ao princípio da liberdade contratual de alienação, e gozar deste benefício fiscal, porque seria desvirtuar todos os conceitos que vêm transcritos no citado DL 423/83. Não é possível vincular o comprador às obrigações legais exigidas para o estabelecimento no seu todo, dado que este não efectuou qualquer pedido nesse sentido, limitando-se a comprar uma fracção autónoma de empreendimento, e como tal, não poderá ter qualquer benefício em termos de IMT e Imposto do Selo, relacionado com a utilidade turística.

O contrato de exploração turística celebrado entre a reclamante e a sociedade E…………………. SA, não tem enquadramento na aplicação dos benefícios fiscais, só vigorando em termos civis, O art.º. 47° do EBF é claro ao atribuir a isenção de IMT aos prédios integrados em empreendimentos a que tenha sido atribuída a utilidade turística, o que significa que só o ‘todo’ é que está em causa.

Do mesmo modo, referiremos, que a reclamação graciosa apresentada com referência à liquidação de IMT a que foi atribuído o n°. 282/2011 já foi objecto de despacho de indeferimento, e sendo a liquidação de Imposto do Selo (Verba 1.1) consequência daquela, mantenho e torno definitivo o referido despacho, indeferindo o pedido.

Notifique-se a reclamante nos termos do art.° 36° do CPPT, através de carta registada com aviso de recepção, enviando-lhe cópia da decisão, e comunicando-lhe que o presente acto é susceptível de impugnação judicial, a interpor no prazo de quinze dias (quinze) dias (n°. 2 do art°. 102° do CPPT) ou de recurso hierárquico a interpor no prazo de 30 (trinta) dias (n°. 1 do artigo 76°. do CPPT)

Cumpra-se.

Serviço de Finanças de Loulé 1, 12 de Setembro de 2011

A Chefe de Finanças»

L) O despacho a que se refere a alínea anterior foi notificado à Impugnante em 16/09/2011, cfr. reclamação graciosa em apenso.
M) Na reclamação graciosa n.° 1082201104002822 foi prestada a informação de fls. 39 e segs., que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os legais efeitos.
N) Na Direcção de Finanças de Faro, foi proferida a informação de fis. 42 e segs., que aqui se dá por integralmente reproduzida e donde resulta com interesse para a decisão:

«(…)

Para uma boa apreciação e decisão da causa decidenda, que se resume à questão de saber se a transmissão da fracção em causa está ou não isenta de IMT, importa fazer um breve percurso pelos principais e mais pertinentes diplomas legais que estabeleceram a disciplina jurídica relativamente à actividade da indústria hoteleira e similar, com especial enfoque nas normas que incidem sobre matéria fiscal.

A Lei n° 2073, de 23 de Dezembro de 1954, constituiu o quadro legal regulador da actividade da indústria hoteleira e similar e dividiu os estabelecimentos “de interesse para o turismo” e “sem interesse para o turismo”. A declaração de utilidade turística assumia relevância, desde logo ao nível fiscal.

Dispunha o artigo 12° da Lei 2073,de 23 de Dezembro de 1954:

“As empresas proprietárias e as que venham a explorar os estabelecimentos hoteleiros ou similares classificados de utilidade turística são isentas, relativamente à propriedade e exploração dos mesmos, de contribuição predial e de contribuição industrial, e bem assim de quaisquer impostos e taxas para os corpos administrativos, durante o prazo de 10 anos, contado a partir do primeiro ano de exploração dos estabelecimentos; e beneficiarão, nos quinze anos seguintes, de uma redução de 50 por cento nas mesmas contribuições, impostos e taxas.

§ 1º Os estabelecimentos hoteleiros abertos nos últimos cinco anos e classificados de utilidade turística terão, a partir da entrada em vigor desta lei, o tratamento tributário previsto no corpo deste artigo.

§ 2º Aos estabelecimentos não compreendidos no parágrafo anterior, mas que realizem nos cinco anos, contados da entrada em vigor desta lei, obras e melhoramentos que lhes permitam obter a classificação de utilidade turística, aplicar-se-á a redução de impostos referida na última parte do corpo deste artigo, pelo prazo e nos termos aí definidos.”

E continuava o artigo 13°:

“São isentas de sisa e de imposto de sucessões e doações, ficando sujeitas apenas a um quinto do imposto do selo devido, as aquisições de prédios com destino à construção e instalação de estabelecimentos hoteleiros ou similares previamente declarados de utilidade turística, cujas empresas beneficiarão também das isenções estabelecidas no corpo do artigo anterior, desde a aquisição dos prédios até à abertura dos estabelecimentos à exploração, se for observado para esta o prazo fixado pelo Presidente do Conselho.”

Em primeiro lugar, importa realçar que estes dois normativos reconhecem, mediante as circunstâncias ali descritas, uma série de benefícios fiscais às empresas proprietárias e às empresas exploradoras do estabelecimento hoteleiro. Tal está taxativamente previsto no artigo 12°, mas também no artigo 130 quando, na sua segunda metade refere “(...), cujas empresas beneficiarão também (...)”.

Assim, conclui-se que apenas estavam isentos de sisa (actual IMT) as aquisições, por parte das empresas, de prédios com destino à construção e instalação de estabelecimentos hoteleiros.

Aliás, todos os beneficias referidos nestes artigos 12°, 13° e 14° desta Lei, são reconhecidos às empresas referidas naquele artigo 12° (i.é. as empresas proprietárias e as empresas que venham a explorar os estabelecimentos hoteleiros ou similares classificados de utilidade turística).

Posteriormente, em 04 de Junho de 1956, foi publicada a Lei n° 2081, que veio inserir disposições de interpretação e aplicação da Lei n° 2073. Com relevância para o caso em apreço, temos o artigo 12° (o único que faz referência ao imposto de sisa), segundo o qual “Poderão ser restituídas as importâncias correspondentes à sisa e ao imposto sobre as sucessões e doações e aos quatro quintos do imposto do selo pagos pela aquisição de prédios com destino à construção de estabelecimentos hoteleiros e similares, feita posteriormente à entrada em vigor da Lei n° 2073, desde que esses estabelecimentos venham a ser declarados de utilidade turística e sejam abertos à exploração no prazo fixado para o efeito pelo Presidente do Conselho.”

Note-se que este dispositivo legal impõe como uma das condições para a devolução da sisa paga, que a aquisição do prédio tenha sido efectuada com destino à construção de estabelecimentos hoteleiros e similares. Por conseguinte, trata-se da restituição da sisa a efectuar à empresa que adquiriu um prédio para nele construir e instalar um estabelecimento hoteleiro.

Com a entrada em vigor do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações (CIMSISD), através da publicação do DL 41969 de 24 de Novembro de 1958, a isenção de sisa passou a estar prevista no seu artigo 13°, sendo que o nº 8 dispunha que ficavam isentos da sisa, as aquisições de prédios com destino à construção e instalação de estabelecimentos hoteleiros ou similares, previamente declarados de utilidade turística, nos termos do artigo 13° da Lei n° 2073, de 23 de Dezembro de 1954.

Ou seja, este normativo praticamente reproduz o já referido artigo 12° da Lei n° 2081.

Foram vários os despachos ministeriais que vieram esclarecer/clarificar as situações fácticas subsumíveis à previsão normativa do artigo 13°, n° 8 do CIMSISD. Todos eles convergem no sentido de reconhecer que apenas estão abrangidos pela isenção deste normativo legal as aquisições de prédios com o fim de nele construir e instalar estabelecimentos hoteleiros, considerados de utilidade turística, deixando de fora a aquisição de prédios quando nele já estejam construídos e instalados os referidos estabelecimentos hoteleiros.

Assim, o despacho ministerial de 12-07-1960, veio esclarecer que a aquisição de prédios urbanos onde se encontram instalados hotéis está sujeita ao pagamento da sisa, não lhes aproveitando a isenção da sisa prevista no n° 8 do art.° 13º do CIMSISD, que é restrita às aquisições de prédios destinados à construção e instalação de novos estabelecimentos hoteleiros ou similares, previamente declarados, de utilidade pública. Também o despacho ministerial de 23-11-1960 veio dizer que se o terreno foi adquirido para construção de um estabelecimento hoteleiro e vendido antes de concluída a construção e iniciada a exploração, não é de restituir a sisa paga pela primeira transmissão.

O despacho ministerial de 02-05-1966 veio dizer que a isenção em apreço, apenas é de aplicar no caso de criação de novas unidades hoteleiras, previamente consideradas de utilidade turística, e não da transmissão das já existentes (vide Código do Imposto Municipal da Sisa e do Imposto Sobre as Sucessões e Doações — Anotado e Comentado por F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes — 4ª ed., págs. 255 e 256).

Actualmente, o diploma legal que disciplina a atribuição da utilidade turística, está consagrado no Decreto-Lei nº 423/83 de 5 de Dezembro, que revogou a Lei nº 2073. O nº 1 do artigo 20° daquele diploma legal, reza assim:

“São isentas de sisa e do imposto sobre sucessões e doações, sendo o imposto do selo reduzido a um quinto, as aquisições de prédios ou de fracções autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística, ainda que tal qualificação seja atribuída a titulo prévio, desde que esta se mantenha válida e seja observado o prazo fixado para a abertura ao público do empreendimento.”

E acrescenta o nº 2: “A isenção e a redução estabelecidas no número anterior verificar-se-ão também na transmissão a favor da empresa exploradora, no caso de a proprietária ser uma sociedade de locação financeira e a transmissão se operar ao abrigo e nos termos do contrato de locação financeira que determinou a aquisição do empreendimento pela sociedade transmitente.”
A lei continua a referir-se a aquisições de prédios (ou fracções) com destino à instalação de empreendimentos de reconhecida utilidade turística. Ou seja, trata-se de isenção nas aquisições de prédios para construir/instalar e não dos já instalados, e que não sejam alvo de obras de remodelação, beneficiação, reequipamento ou ampliação. Aliás, na senda do que já vinha sendo estabelecido, com as necessárias adaptações, desde a Lei nº 2073 (artigo 13°, in fine).

O Decreto-Lei nº 423/83 constituiu um instrumento jurídico de fomento e incentivo ao investimento no sector do turismo, que se quer de qualidade. Este impulso que se pretendeu dar ao sector do turismo, está bem patente desde logo no artigo 5º. Com efeito, a lei apenas reconhece a possibilidade de ser atribuída a utilidade turística a empreendimentos que resultem de um directo investimento, traduzido quer na construção de empreendimentos novos, quer na remodelação, beneficiação ou reequipamento totais ou parciais, quer na realização de obras conducentes ao aumento da capacidade em, pelo menos, 50%.

Por esse motivo, o legislador entendeu atribuir benefícios fiscais em sede de imposto de sisa e do selo, às empresas proprietárias que realizam o esforço do investimento. Pretendeu o legislador impulsionar este sector de actividade, prevendo isenção/redução de pagamento de sisa/selo, mediante determinadas condições, a quem vai criar estabelecimentos turísticos, e não a quem se limita a vender fracções pertencentes a empreendimentos já instalados. Este é o entendimento e interpretação perfilhados pela DCCI, e que decorre do elemento histórico, racional/teleológico, mas também literal das normas jurídicas em apreço.

Na verdade, quando o legislador diz, no nº 1 do artigo 20°, “destino à instalação”, tal significa que se trata apenas de aquisições de prédios efectuadas com o intuito de neles construir/melhorar empreendimentos turísticos, e não, como pretende a reclamante, de aquisição de prédios/fracções integradas em empreendimentos já construídos e instalados.

Da mesma forma, quando o legislador utiliza a expressão “sela observado” o prazo fixado para a abertura ao público do empreendimento, sugere a ideia de mais uma condição que é imposta ao promotor do investimento (empresa proprietária), no sentido de que esta, para além de ter de ver reconhecida a utilidade turística ao empreendimento que construiu/ampliou/melhorou, terá ainda de cumprir o prazo que foi estipulado para a abertura do mesmo ao público.

O próprio artigo 20°, no seu n° 2, estabelece a única situação em que a isenção da sisa e a redução do imposto do selo, também ocorre, para além das situações já referidas: quando a empresa proprietária for uma sociedade de locação financeira e, no âmbito deste contrato de locação que previu a aquisição do empreendimento, vende à empresa exploradora os prédios/fracções.

Portanto, fora destes casos, não está prevista qualquer isenção da sisa (actual IMT). Assim, quando é efectuada a aquisição de uma fracção que integra um empreendimento turístico, já instalado, esta operação não está isenta de sisa/IMT, por inexistência de norma jurídica que a preveja.

Consequentemente, entendemos que se torna irrelevante o facto da fracção em causa continuar afecta à exploração turística, já que é a operação em si mesma (o facto tributário em causa) que cai fora da previsão estabelecida no artigo 20º do Decreto-Lei nº 423/83, que reconhece a isenção do pagamento do imposto da sisa/IMT (Neste sentido os pareceres emitidos pela DSIMT, de fls. 51 a 60 dos autos) Requer ainda a reclamante o reconhecimento da Isenção do IMI. Ora a reclamação graciosa visa atacar a ilegalidade da liquidação e a consequente anulação total ou parcial dos actos tributários (art.° 68° do Código de Procedimento e de Processo Tributário). Pelo que, este não é o meio procedimental próprio para apreciação do pedido de reconhecimento de Isenção do IMI.

Consequentemente, a pretensão da reclamante está votada ao insucesso.

III - PROPOSTA DE DECISÃO

Nos termos do presente Parecer, propõe-se que a reclamação seja:

(…)

X Indeferida

Devendo notificar-se a reclamante para o exercício do direito de audição, nos termos do artigo 60º da Lei Geral Tributária.

No entanto, submete-se à consideração de V Exa., que superiormente decidirá.

Direcção de Finanças de Faro, 29-08-2011»

O) Sobre a informação a que se refere a alínea anterior recaiu o seguinte projecto de despacho (fls. 42 da reclamação graciosa):

«Concordo

Indefiro nos termos propostos

2011/08/30»

P) A impugnante B…………, devidamente notificada, exerceu o direito de audição, cfr. fls. 51 da reclamação graciosa.

Q) Em apreciação do direito de audição foi elaborada a informação de fls. 56 e segs. da reclamação graciosa, que aqui se dá por integralmente reproduzida e donde resulta com interesse para a decisão:

«I — DIREITO DE AUDIÇÃO

(...)

Alega a reclamante que a interpretação que a Administração Fiscal faz do artigo 20º do Decreto-Lei n° 423/83 de 5 de Dezembro, não se mostra consentânea com a ratio legis da criação do instituto da utilidade turística pois, tal entendimento conduz a que os benefícios fiscais previstos naquele normativo legal não passem de letra morta, acabando por nunca ser aplicáveis na prática. Sustenta esta conclusão, com a argumentação de que, apesar da atribuição de utilidade turística a título prévio poder ser requerida com base em anteprojecto aprovado do empreendimento, na realidade e em regra, o que se passa é que quando o promotor do empreendimento adquire um prédio destinado a nele implantar um empreendimento turístico, inexiste qualquer projecto aprovado, pelo que inexiste a declaração de utilidade turística. E, desta forma, nunca pode beneficiar da isenção do IMT ou da redução do imposto do selo.

Alega ainda a reclamante que o conceito de instalação” de empreendimento turístico adoptado no projecto de despacho não se coaduna com o conceito de instalação previsto no Decreto-Lei nº 39/2008, de 7 de Março, que estabelece o regime jurídico da instalação, funcionamento e exploração de empreendimentos turísticos. Pois, a aprovação do projecto do empreendimento constitui a primeira etapa do processo de instalação, o que faz com que, em bom rigor, a declaração de utilidade turística ocorra sempre numa fase posterior à conclusão da primeira fase da instalação. Concluindo que, nessa medida, não se pode dizer que só se aplicam os benefícios fiscais em causa a empreendimentos declarados de utilidade turística antes da sua instalação. Por isso, a expressão com destino à instalação” contida no artigo 20º do Decreto-Lei nº 423/83, deve ser interpretada no sentido de que o que releva é a afectação do prédio (exploração turística), quer se trate da primeira transmissão onde há-de vir a ser implantado um empreendimento turístico ou a aquisições subsequentes.
II — ANÁLISE DO DIREITO DE AUDIÇÃO

Não faz sentido, nem corresponde à verdade, que o entendimento que a Administração Fiscal faz do artigo 20º do Decreto-Lei n° 423/83, de 5 de Dezembro conduz a que, na prática, os benefícios fiscais ali previstos não passem de letra morta, acabando por nunca serem aplicáveis.

Desde logo, e porque ao contrário do que afirma a reclamante, muitos promotores, antes de adquirem os prédios, elaboram o projecto e candidatam-se à atribuição de utilidade turística a título prévio que, uma vez reconhecida, lhes permite beneficiarem da isenção do IMT e redução do imposto do selo, relativamente à aquisição do imóvel onde futuramente será instalado o empreendimento turístico. Por vezes, pode não existir interesse nesse pedido, nomeadamente para efeitos fiscais. No caso concreto, o promotor não requereu o reconhecimento a título prévio. Mas também não houve pagamento de SISA pela aquisição do terreno. Pois, a aquisição do terreno que esteve na origem do prédio onde foi construído o empreendimento, pela sociedade D………… Lda., foi efectuada no âmbito de uma concentração de empresas, pelo que a isenção da SISA foi atribuída nos termos do Decreto-Lei n° 404/90, de 21 de Dezembro.

Acresce que, os promotores que pagaram o imposto municipal de sisa/IMT pela aquisição do imóvel destinado à instalação de estabelecimentos turísticos, sempre podem pedir a restituição, quando posteriormente seja reconhecida a utilidade turística, desde que observados determinados condicionalismos legalmente estabelecidos.

Quanto à interpretação do conceito de “instalação” que a reclamante entende ser a correcta, consideramos que é uma interpretação demasiado rebuscada e forçada. Com efeito, o capítulo IV do Decreto-Lei nº 39/2008, de 7 de Março intitulado “instalação dos empreendimentos turísticos” trata do procedimento respeitante à instalação, leia-se, tendente à instalação. Naturalmente que existem várias etapas ou procedimentos administrativos conducentes à instalação de um determinado empreendimento turístico, que pode ir, nomeadamente, desde o pedido de licenciamento ou comunicação prévia de operações urbanísticas, passando pelos pareceres e aprovação das várias entidades oficiais competentes, até à emissão dos títulos válidos de abertura do empreendimento. Se lermos o disposto nos artigos 5° e 6° deste diploma legal, teremos que concluir que o sentido da palavra “instalação” se refere a empreendimentos turísticos a criar/construir. E é a estes que também se refere a norma do artigo 20º do Decreto-Lei nº 423/83, como já explanámos no projecto de despacho, que aqui se dá por integralmente reproduzido.

Por fim, a propósito do Acórdão do STA referido na p.i, importa focar a questão que ali foi abordada. No Acórdão pode ler-se:
“(...) não prevendo o legislador que os benefícios em causa tenham que constar do despacho de atribuição de utilidade turística, ao contrário do que sucede nas situações do n.º 4 do artigo 16.º citado, declarada a utilidade turística e destinando-se o imóvel à instalação de um empreendimento turístico, é evidente que a isenção de IMT ou a redução do IS operam directa e automaticamente.

Ou seja, o juiz ad quo, considerou que, pelo facto de no despacho que reconheceu a utilidade turística não constarem os benefícios fiscais de isenção de IMT ou redução do imposto do selo, não poderia o impugnante gozar de tais benefícios. É contra esta interpretação que vai a decisão contida no Acórdão do STA, ao concluir que os benefícios previstos no artigo 20º do Decreto-Lei nº 423/83 operam automaticamente desde que verificados os pressupostos legalmente definidos. E neste ponto, também para a Administração Fiscal não restam dúvidas de que a atribuição dos benefícios fiscais decorre automaticamente da lei, não necessitando os mesmos de serem mencionados no despacho que atribui a utilidade turística.

É certo que o Acórdão afirma que a transmissão ali em causa também está abrangida pela isenção/redução estabelecida na lei. Salvo o devido respeito, tal conclusão assenta porventura numa apressada interpretação da norma em questão. O entendimento que a Administração Fiscal perfilha, explanada no projecto de relatório, assenta numa interpretação literal, sistemática e histórica do normativo contido no artigo 20º do Decreto-Lei n° 423/83, de 5 de Dezembro, que não contempla as situações como as que estão em causa nos presentes autos de reclamação graciosa.

III - PARECER

Perante os factos vertidos nos autos a lei aplicável, conclui-se que o pedido da reclamante não pode proceder.

III - PROPOSTA DE DECISÃO

Nos termos do presente Parecer, propõe-se que a reclamação seja:

(…)

X Indeferida

No entanto, submete-se à consideração de V. Exa., que superiormente decidirá, Direcção de Finanças de Faro, 05-09-2011»

R) Sobre a informação a que se refere a alínea anterior recaiu o seguinte despacho (fls. 56 da reclamação graciosa).

«Concordo.

Torno definitivo o projecto de despacho de indeferimento de 2011/08/08

Faro, 06 de Setembro de 2011»

S) O Impugnante B………… foi notificado do despacho a que se refere a alínea anterior em 09/09/2011, cfr. reclamação graciosa em apenso.

T) Na reclamação graciosa n.° 1082201104002865 foi prestada a informação de fls. 69 e segs., que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os legais efeitos e donde resulta com interesse para a decisão:

«I — DIREITO DE AUDIÇÃO

(…)

Alega a reclamante que a interpretação que a Administração Fiscal faz do artigo 20° do Decreto-Lei n° 423/83 de 5 de Dezembro, não se mostra consentânea com a ratio legis da criação do instituto da utilidade turística pois, tal entendimento conduz a que os benefícios fiscais previstos naquele normativo legal não passem de letra morta, acabando por nunca ser aplicáveis na prática. Sustenta esta conclusão, com a argumentação de que, apesar da atribuição de utilidade turística a título prévio poder ser requerida com base em anteprojecto aprovado do empreendimento, na realidade e em regra, o que se passa é que quando o promotor do empreendimento adquire um prédio destinado a nele implantar um empreendimento turístico, inexiste qualquer projecto aprovado, pelo que inexiste a declaração de utilidade turística. E, desta forma, nunca pode beneficiar da isenção do IMT ou da redução do imposto do selo.

Alega ainda a reclamante que o conceito de instalação” de empreendimento turístico adoptado no projecto de despacho não se coaduna com o conceito de instalação previsto no Decreto-Lei nº 39/2008, de 7 de Março, que estabelece o regime jurídico da instalação, funcionamento e exploração de empreendimentos turísticos. Pois, a aprovação do projecto do empreendimento constitui a primeira etapa do processo de instalação, o que faz com que, em bom rigor, a declaração de utilidade turística ocorra sempre numa fase posterior à conclusão da primeira fase da instalação. Concluindo que, nessa medida, não se pode dizer que só se aplicam os benefícios fiscais em causa a empreendimentos declarados de utilidade turística antes da sua instalação. Por isso, a expressão com destino à instalação” contida no artigo 20º do Decreto-Lei nº 423/83, deve ser interpretada no sentido de que o que releva é a afectação do prédio (exploração turística), quer se trate da primeira transmissão onde há-de vir a ser implantado um empreendimento turístico ou a aquisições subsequentes.

II — ANÁLISE DO DIREITO DE AUDIÇÃO

Não faz sentido, nem corresponde à verdade, que o entendimento que a Administração Fiscal faz do artigo 20° do Decreto-Lei nº 423/83, de 5 de Dezembro conduz a que, na prática, os benefícios fiscais ali previstos não passem de letra morta, acabando por nunca serem aplicáveis.

Desde logo, e porque ao contrário do que afirma a reclamante, muitos promotores, antes de adquirem os prédios, elaboram o projecto e candidatam-se à atribuição de utilidade turística a título prévio que, uma vez reconhecida, lhes permite beneficiarem da isenção do IMT e redução do imposto do selo, relativamente à aquisição do imóvel onde futuramente será instalado o empreendimento turístico. Por vezes, pode não existir interesse nesse pedido, nomeadamente para efeitos fiscais. No caso concreto, o promotor não requereu o reconhecimento a título prévio. Mas também não houve pagamento de SISA pela aquisição do terreno. Pois, a aquisição do terreno que esteve na origem do prédio onde foi construído o empreendimento, pela sociedade D………… Lda., foi efectuada no âmbito de uma concentração de empresas, pelo que a isenção da SISA foi atribuída nos termos do Decreto-Lei nº 404/90, de 21 de Dezembro.

Acresce que, os promotores que pagaram o imposto municipal de sisa/IMT pela aquisição do imóvel destinado à instalação de estabelecimentos turísticos, sempre podem pedir a restituição, quando posteriormente seja reconhecida a utilidade turística, desde que observados determinados condicionalismos legalmente estabelecidos.

Quanto à interpretação do conceito de “instalação” que a reclamante entende ser a correcta, consideramos que é uma interpretação demasiado rebuscada e forçada. Com efeito, o capítulo IV do Decreto-Lei nº 39/2008, de 7 de Março intitulado “instalação dos empreendimentos turísticos” trata do procedimento respeitante à instalação, leia-se, tendente à instalação. Naturalmente que existem várias etapas ou procedimentos administrativos conducentes à instalação de um







2- DE DIREITO

2.1. Das questões a apreciar e decidir

Resulta do probatório que os ora recorridos adquiriram, por escritura pública de 14 de Outubro de 2009, em compropriedade, as fracções autónomas designadas pelas letras “CC” e “N”, integradas no prédio urbano em regime de propriedade horizontal denominado “D……… ou C……… de cinco estrelas, sito em ………, freguesia de Almancil, Concelho de Loulé.
Pela aquisição das referidas fracções foi naquela data liquidado Imposto de Selo e de IMT, porquanto ainda não haviam sido atribuídos os benefícios fiscais decorrentes da utilidade turística.
Pelo Despacho nº 3716/2011, publicado no Diário da República 2ª Série, nº 40, de 25 de Fevereiro, foi concedido, ao abrigo do disposto no art. 2º, nº 1, e 7º, nº 3, do Decreto-Lei nº 423/83, de 5 de Dezembro, o Estatuto de “Utilidade Turística” a título definitivo ao empreendimento turístico, tendo sido fixada a respectiva validade em sete anos a contar da data do título de comunicação de abertura ao abrigo do qual o empreendimento iniciou o seu funcionamento (4 de Setembro de 2008), ou seja, até 4 de Setembro de 2015).
Em 24 de Junho de 2011 os ora recorridos deduziram reclamação contra as liquidações de IMT e de Imposto de Selo, que foram indeferidas.
Contra o indeferimento foi deduzida impugnação judicial no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, que foi julgada procedente.
Para tanto ponderou, entre o mais, o Mmº Juiz “a quo” que deviam ser restituídos aos impugnantes os montantes de impostos referentes a IMT e 4/5 do IS liquidados e pagos, uma vez que a primeira aquisição de cada fracção está integrada no processo de instalação do empreendimento e, no caso dos autos, a impugnante realizou a primeira aquisição da fracção, beneficiando da isenção de IMT e da redução de 1/5 do Imposto de Selo, por se tratar de aquisição com destino à instalação do empreendimento para exploração turística.
Inconformada com esta sentença vem a Fazenda Pública com o presente recurso, argumentando, em síntese, que:
· “(…) carece de apoio legal, sustentar, como se faz na sentença recorrida, que a aquisição da fracção identificada nos autos integra a fase de instalação do empreendimento turístico, pois este não só já se encontrava instalado, como também já se encontrava em funcionamento desde 2008/09/04;
· “(…) o legislador entendeu atribuir benefícios fiscais em sede de Imposto de Sisa (IMT) e do Selo, às empresas proprietárias que realizam o esforço do investimento. Pretendeu o legislador impulsionar este sector de actividade, prevendo isenção/redução de pagamento de Sisa/Selo, mediante determinadas condições, a quem vai criar estabelecimentos turísticos, e não a quem se limita a adquirir fracções pertencentes a empreendimentos já instalados” [Conclusão h)];
· “Na verdade, quando o legislador diz, no n° 1 do artigo 20°, “destino à instalação”, tal significa que se trata apenas de aquisições de prédios efectuadas com o intuito de neles construir/melhorar empreendimentos turísticos, e não da mera aquisição de prédios/fracções integradas em empreendimentos já construídos e instalados, como sucedeu no caso concreto” [Conclusão l)];
· “Este é o entendimento e interpretação perfilhados pela Administração Tributária, e que decorre do elemento histórico, racional/teleológico, mas também literal das normas jurídicas em apreço” [Conclusão m)].
Em face das conclusões, que delimitam o âmbito e objecto do presente recurso, a questão central a apreciar e decidir traduz-se em saber se o Mmº Juiz “a quo” incorreu em erro de julgamento ao concluir que a aquisição das fracções em causa, por estarem integradas no processo de instalação do empreendimento turístico, beneficiam da isenção de IMT e da redução de 1/5 do Imposto de Selo, nos termos do nº 1 do art. 20º do Decreto-Lei nº 423/83, de 5 de Dezembro.

3. Determinação do sentido e alcance do art. 20º, nº 1, do Decreto-Lei nº 423/83, de 5 de Dezembro

A resposta à questão de mérito suscitada no presente recurso impõe que se comece por determinar o sentido e o alcance do mencionado preceito, no que se refere ao inciso “aquisições de prédios ou fracções autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística”.

Vejamos.

1. O art. 20º, nº 1, do Decreto-Lei nº 423/83, de 5 de Dezembro, dispõe:
“1- São isentas de sisa e do imposto sobre sucessões e doações, sendo o imposto do selo reduzido a um quinto, as aquisições de prédios ou de fracções autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística ainda que tal qualificação seja atribuída a título prévio, desde que esta se mantenha válida e seja observado o prazo fixado para a abertura ao público do empreendimento.
2- A isenção e a redução estabelecidas no número anterior verificar-se-ão também na transmissão a favor da empresa exploradora, no caso de a proprietária ser uma sociedade de locação financeira e a transmissão se operar ao abrigo e nos termos do contrato de locação financeira que determinou a aquisição do empreendimento pela sociedade transmitente.”
O preceito consagra, desta forma, isenção de sisa e do imposto de selo (reduzido a um quinto), nas aquisições de prédios ou de fracções autónomas com destino à «instalação» de empreendimentos qualificados de utilidade turística.
Assim sendo, a questão que se coloca traduz-se em saber que aquisições devem beneficiar das isenções de IMT e de Imposto de Selo ali consagradas: as aquisições de prédios ou de fracções autónomas por promotores com vista a construir e instalar os empreendimentos turísticos, ou as aquisições de fracções autónomas (unidades de alojamento) pertencentes ou integradas em empreendimentos já construídos e instalados, com vista à sua exploração?
A resposta a esta pergunta remete-nos para o problema de saber o que deve entender-se por «instalação» de empreendimentos turísticos.
Sobre a interpretação das leis fiscais rege a LGT que, no art. 11º, sob a epígrafe “Interpretação”, estabelece que “Na determinação do sentido e alcance das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis” (nº1). Logo a seguir, no seu nº 2 determina-se que “Sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer directamente da lei”. Finalmente, no nº 3 dispõe-se que “Persistindo dúvida sobre o sentido das normas de incidência a aplicar, deve atender-se à substância económica dos factos tributários.”
Assim sendo, também no direito fiscal, o preceito fundamental da hermenêutica jurídica radica no art. 9º do Código Civil (Assim, também no Direito Fiscal podem ser usadas as demais técnicas ou cânones interpretativos há muito usados no direito civil. Neste sentido, ver J.L.SALDANHA SANCHES, Manual de Direito Fiscal, 3ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, p. 147.) que prescreve, sobre interpretação da lei:
“1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.
2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.
3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”.

Como ficou dito, no Acórdão deste Supremo Tribunal, de 5 de Setembro de 2012, proc. nº 314/12, “Interpretar em matéria de leis, quer dizer não só descobrir o sentido que está por detrás da expressão, como também, dentro das várias significações que estão cobertas pela expressão, eleger a verdadeira e decisiva (Neste sentido, cfr. PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, Noções Fundamentais de Direito Civil, 6ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 1965, Vol. I., p. 145.).
PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA (Cfr. Código Civil Anotado, 4ª ed., vol. I., pp.58/59.) referem que o sentido decisivo da lei coincidirá com a vontade real do legislador, sempre que esta seja clara e inequivocamente demonstrada através do texto legal, do relatório de diplomas ou dos próprios trabalhos preparatórios da lei.
Assim a letra assume-se, naturalmente, como o ponto de partida da interpretação, cabendo-lhe, desde logo, uma função negativa, qual seja, “a de eliminar aqueles sentidos que não tenham qualquer apoio, ou, pelo menos, qualquer correspondência ou ressonância nas palavras da lei” (Cfr. Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 2ª reimpressão, Coimbra, 1987, pp. 187 ss.). Também como refere OLIVEIRA ASCENSÃO (Cfr. O Direito, Introdução e Teoria Geral, Lisboa, 1978, p. 350.), “a letra não é só o ponto de partida, é também um elemento irremovível de toda a interpretação. Quer dizer que o texto funciona também como limite de busca do espírito”.
É também comummente aceite que para apreender o sentido da lei, a interpretação socorre-se de vários meios:
“Em primeiro lugar busca reconstruir o pensamento legislativo através das palavras da lei, na sua conexão linguística e estilística, procura o sentido literal. Mas este é o grau mais baixo, a forma inicial da actividade interpretativa. As palavras podem ser vagas, equívocas ou deficientes e não oferecerem nenhuma garantia de espelharem com fidelidade e inteireza o pensamento: o sentido literal é apenas o conteúdo possível da lei: para se poder dizer que ele corresponde à mens legis, é preciso sujeitá-lo a crítica e a controlo.”
Ora, nesta tarefa de interligação e valoração que acompanha a apreensão do sentido literal, intervêm elementos lógicos, apontando a doutrina elementos de ordem sistemática, histórica e racional ou teleológica”.

2. Começando pelo teor literal do art. 20º, nº 1, do Decreto-Lei nº 423/83, importa realçar que o legislador refere claramente que apenas se encontram isentas de sisa e de imposto de selo “as aquisições de prédios ou de fracções autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística”.
O que quer dizer que não se trata de uma isenção subjectiva dirigida a beneficiar as empresas, quer sejam proprietárias quer exploradoras dos empreendimentos, mas sim objectiva, uma vez que visa beneficiar a actividade de instalação, podendo apenas requerer e beneficiar da isenção as empresas que se dediquem a «instalar» empreendimentos turísticos e não também as que pretendam dedicar-se à actividade de exploração dos mesmos.
Na verdade, o legislador é muito claro quando pretende beneficiar as empresas proprietárias e ou exploradoras dos empreendimentos. É o que acontece quando no art. 16º do mesmo diploma refere que as empresas proprietárias e ou exploradoras dos empreendimentos gozarão relativamente à propriedade e exploração dos benefícios indicados nas alíneas a) a c) do nº 1 do preceito. Ou quando no nº 2 do art. 20º do Decreto-Lei nº 423/83 alarga a isenção estabelecida no nº 1 do preceito na “transmissão a favor da empresa exploradora, no caso da proprietária ser uma sociedade de locação financeira e a transmissão se operar ao abrigo e nos termos do contrato de locação”.
O acabado de expor serve para demonstrar que não oferece dúvida que, ao contrário do exposto, no caso da isenção do nº 1 do art. 20º do Decreto-Lei nº 423/83, o legislador quis abranger apenas as aquisições destinadas à «instalação» de empreendimentos.
Como o Decreto-Lei nº 423/83 não contém uma definição para o conceito de «instalação», manda o art. 11º, nº 2, da LGT, que nos socorramos do significado técnico jurídico que nos é dado pelo regime jurídico dos empreendimentos turísticos.
Análise atenta da referida legislação mostra-nos que só os Decretos-Lei nºs 167/97, de 4 de Julho, e 55/2002, de 11 de Março, nos dão uma noção para o conceito de «instalação».
Assim, no art. 9º do Decreto-Lei nº 167/97, sob a epígrafe “Instalação”, pode ler-se que “Para efeitos do presente diploma, considera-se instalação de empreendimentos turísticos o licenciamento da construção e ou da utilização de edifícios destinados ao funcionamento daqueles empreendimentos.”
As regras respeitantes à exploração e funcionamento dos empreendimentos já instalados constam do capítulo IV.
Por sua vez, o art. 9º do Decreto-Lei nº 55/2002 define instalação da seguinte forma: “(…) Considera-se instalação de empreendimentos turísticos o processo de licenciamento, ou de autorização para a realização de operações urbanísticas relativas à construção de edifícios ou suas fracções destinados ao funcionamento daqueles empreendimentos”.
E embora os diplomas anteriores sejam omissos quanto à inserção de uma norma com uma noção sobre o conceito de instalação, a verdade é que a mesma coincide com a que decorre da leitura do regime neles consagrado.
Outro dado que importa realçar e que se extrai dos mencionados diplomas é que as operações que fazem parte do conceito de «instalação» não se confundem com as que correspondem ao conceito de «funcionamento» e «exploração».
Começando com a análise dos diplomas que regularam anteriormente a matéria, temos o Decreto-Lei nº 49399, de 24 de Novembro de 1969, que, no seu capítulo IV, sobre a epígrafe “Da instalação dos estabelecimentos de interesse para o turismo”, dispõe o art. 21º que “Para poder instalar-se qualquer estabelecimento hoteleiro ou similar deverá, em primeiro lugar, ser requerido à Direcção-Geral do Turismo que o empreendimento seja declarado de interesse para o turismo ou sem interesse para o turismo, no prazo e sob a cominação que forem fixados em regulamento”.
E no art. 22º diz-se que “Serão organizados pela Direcção-Geral do Turismo os processos respeitantes à aprovação da localização e à aprovação do anteprojecto e projecto dos estabelecimentos hoteleiros e similares de interesse para o turismo, ainda que haja lugar à intervenção de outras entidades ou serviços”.
Por sua vez, no Capítulo V, sob a epígrafe, “Das vistorias e da inspecção dos estabelecimentos de interesse para o turismo”, dispõe o art. 39º que “nenhum estabelecimento hoteleiro ou similar de interesse para o turismo poderá iniciar a sua exploração sem prévia autorização da Direcção-Geral do Turismo ou das delegações da Secretaria de Estado, precedida de vistoria.”
Do preceito decorre que, no âmbito do regime consagrado no referido diploma, uma vez construído/instalado o empreendimento turístico ele só podia começar a funcionar e a ser explorado depois de devidamente autorizado pela Direcção-Geral do Turismo.
De seguida, o Decreto-Lei nº 328/86, de 30 de Setembro, que veio proceder à revisão do Decreto-Lei nº 49399, de 24 de Novembro, continua a distinguir entre actos e procedimentos tendentes à construção e instalação dos empreendimentos (Capítulo III), e funcionamento e exploração (Capítulo IV).
Por fim, o diploma mais recente, o Decreto-Lei nº 39/2008, de 7 de Março, que veio consagrar o novo regime jurídico da instalação, exploração e funcionamento dos empreendimentos turísticos, “procedendo à revogação dos diversos diplomas que actualmente regulam esta matéria e reunindo num único decreto-lei as disposições comuns a todos os empreendimentos”, também não contém uma noção de «instalação», mas distingue claramente entre o procedimento respeitante à instalação dos empreendimentos turísticos (arts. 5º e 6º e o Capítulo IV) e o funcionamento e a exploração dos mesmos (Capítulo VII).
Em especial, o art. 5º, sob a epígrafe “Requisitos gerais de instalação” (O procedimento de instalação dos empreendimentos turísticos encontra-se sujeito a um regime comum, ou seja, a um conjunto de requisitos comuns, tal como resulta deste art. 5º, nº1, e art. 23º do Decreto-Lei nº 39/2008, por conseguinte, na instalação dos empreendimentos turísticos destaca-se um regime procedimental comum que é o definido no Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, com as particularidades ou especificidades que resultem do Decreto-Lei nº 39/2008.Para análise desenvolvida dos requisitos gerais da instrução dos pedidos informação prévia, de licenciamento e da apresentação da comunicação prévia e dos requisitos específicos da instalação de empreendimentos turísticos, cfr. LICÍNIO LOPES MARTINS, “O procedimento de instalação de empreendimentos turísticos”, Empreendimentos Turísticos, CEDOUA/FDUC, Almedina, 2010, pp.121 ss.) , estabelece:
“1- A instalação de empreendimentos turísticos que envolvam a realização de operações urbanísticas conforme definidas no regime jurídico da urbanização e da edificação devem cumprir as normas constantes daquele regime, bem como as normas técnicas de construção aplicáveis às edificações em geral, designadamente em matéria de segurança contra incêndio, saúde, higiene, ruído e eficiência energética, sem prejuízo do disposto no presente decreto-lei e respectiva regulamentação.
2- O local escolhido para a instalação de empreendimentos turísticos deve obrigatoriamente ter em conta as restrições de localização legalmente definidas, com vista a acautelar a segurança de pessoas e bens face a possíveis riscos naturais e tecnológicos”.
(…)”.
O significado técnico jurídico que se extrai da legislação é que o conceito de instalação compreende todas as operações e procedimentos que vão desde o pedido de licenciamento ou de comunicação prévia de operações urbanísticas, passando pelos pareceres e aprovações das várias entidades oficiais competentes, pedido de autorização ou comunicação de utilização para fins turísticos, e obtenção do respectivo alvará (art. 30º) ou título de abertura ao público (art. 32º). Nesta sequência, refere o nº 2 do art. 12º do Decreto-Lei nº 423/83 que “a data de abertura ou reabertura ao público é aquela em que o empreendimento foi autorizado a funcionar pela autoridade competente”. Sendo que a data de comunicação do título de abertura e funcionamento é a relevante para marcar o início do prazo de validade do estatuto de utilidade turística do empreendimento turístico em causa, tal como resulta no caso em apreço (cfr. o despacho nº 3716/2011).
Dito por outras palavras, a «instalação» emerge como um procedimento que compreende os actos jurídicos e os trâmites tendentes ao licenciamento (em sentido amplo, compreendendo comunicações prévias ou autorizações, conforme o caso) das operações urbanísticas necessárias à construção de um empreendimento turístico, bem como a obtenção dos títulos que o tornem apto a funcionar e a ser explorado para finalidade turística.
Depois de construído e obtidas pelos promotores do investimento as licenças necessárias a tornarem o empreendimento apto ao exercício da actividade turística, cada empreendimento turístico “deve ser explorado por uma única entidade, responsável pelo seu integral funcionamento e nível de serviço e pelo cumprimento das disposições legais e regulamentares aplicáveis” (nº 1 do art. 44º do Decreto-Lei nº 39/2008), sendo tal entidade designada pelo titular do respectivo alvará de autorização de utilização para fins turísticos (nº 2 do art. 44º), ou seja, pelo promotor (cfr. o Capítulo VII e arts. 41º e ss. do Decreto-Lei nº 39/2008, que estabelece as regras relativas à exploração e funcionamento).
E ainda que as unidades de alojamento estejam ocupadas pelos respectivos proprietários, cabe à entidade exploradora assumir a exploração continuada das mesmas, devendo mantê-las permanentemente em regime de exploração turística (art. 45º do Decreto-Lei nº 39/2008).
Esta distinção entre os conceitos de «instalação», por um lado, e de «funcionamento» e «exploração», por outro, está bem patente no próprio preâmbulo do Decreto-Lei nº 39/2008, onde se podem ler, em primeiro lugar, as preocupações e inovações quanto aos aspectos relacionados com o licenciamento dos empreendimentos, no sentido da sua simplificação. No mesmo sentido, DULCE LOPES (Cfr. “Aspectos jurídicos da instalação de empreendimentos turísticos”, I Jornadas Luso –Espanholas de Urbanismo, Almedina, Coimbra, 2009, pp. 225 e ss., em especial, p. 227.), ao caracterizar o procedimento de instalação de empreendimentos turísticos, ao abrigo do Decreto-Lei nº 39/2008 e legislação complementar, diz expressamente que com o mencionado diploma se pretendeu “(…) um ajustamento do procedimento de instalação de empreendimentos turísticos às exigências de simplificação e desburocratização procedimental que anima o pacote legislativo do Programa de Simplificação Administrativa e Legislativa (SIMPLEX)”. E a referida Autora continua dizendo que “Nestes moldes, compete ao município licenciar ou admitir as comunicações prévias das operações necessárias para a instalação de estabelecimentos hoteleiros, aldeamentos turísticos, apartamentos turísticos e conjuntos turísticos, devendo, para o efeito, solicitar parecer do turismo de Portugal I.P. sobre a arquitectura e a localização de empreendimentos turísticos não precedidos de plano de pormenor”.
Regressando à análise do preâmbulo do Decreto-Lei nº 39/2008, verifica-se que de seguida são realçadas as inovações no que se refere à exploração e funcionamento, podendo ler-se, a este propósito, a dado passo, que “No capítulo das exploração e funcionamento, consagra-se um novo paradigma de exploração dos empreendimentos turísticos, assente na unidade de exploração e continuidade da exploração por parte da entidade exploradora e na permanente afectação à exploração turística de todas as unidades de alojamento que compõem o empreendimento, independentemente do regime de propriedade em que assenta e da possibilidade de utilização das mesmas pelos respectivos proprietários”.
Como assinala CRISTINA SIZA VIEIRA (Cfr. Propriedade Plural e Gestão de Empreendimentos Turísticos”, Empreendimentos Turísticos, CEDOUA-FDUC, Almedina, Coimbra, pp. 180 ss.), a verdadeira alteração de fundo introduzida pelo diploma em causa respeita à exploração dos empreendimentos turísticos em propriedade plural, com consagração expressa no art. 45º do Decreto-Lei nº 39/2008.
Já em diplomas anteriores, tal como o Decreto-Lei nº 167/97, se admitia a aquisição de fracções autónomas, o que implicava que tais unidades de alojamento fossem retiradas da exploração dos empreendimentos turísticos, estando fixada a percentagem máxima de unidades de alojamento que poderiam ser desafectadas da exploração.
O que muda com o Decreto-Lei nº 39/2008 é o facto de as unidades de alojamento se considerarem sempre em exploração turística, aplicando-se a regra do art. 45º a todos os empreendimentos, incluindo os constituídos em propriedade plural, ou seja, em que as unidades de alojamento se possam constituir como fracções autónomas, uma vez que a exploração turística ocorre ainda que tais fracções estejam ocupadas e ainda que tal ocupação seja permanente. Segundo a mencionada Autora, são duas as principais novidades em relação ao regime anterior: cai por terra “a percentagem e o limite temporal de uso pelos proprietários das unidades de alojamento que estivessem afectas à exploração turística” (Cfr. ob. cit., p. 184.).
Do exposto resulta claro que as alterações relevantes introduzidas pelo diploma em causa prendem-se sobretudo com um novo conceito de «exploração», em nada se alterando quanto ao conceito de «instalação». Em relação a este conceito, como vimos, o legislador limitou-se a simplificar o seu procedimento.
Em suma, da leitura do regime constante dos arts. 5º a 6º e 23º a 40º do Decreto-Lei nº 39/2008 verifica-se que o conceito de «instalação» nada tem que ver com o «funcionamento» e a «exploração» e que naquele cabem apenas, como refere a Fazenda Pública, os actos, as operações e os procedimentos tendentes à construção/criação de empreendimentos turísticos.

3. O conceito de instalação a que se chegou é o que se mostra adequado a todo o tipo de empreendimentos turísticos e não é posto em causa pelo facto de os empreendimentos poderem ser construídos/instalados em regime de propriedade plural.
Com efeito, consideram-se empreendimentos turísticos em propriedade plural, nos termos do art. 52º do Decreto-Lei nº 39/2008, aqueles que “compreendem lotes e ou fracções autónomas de um ou mais edifícios”.
Ao explicar o que está em causa quando falamos de empreendimentos turísticos em propriedade plural, CRISTINA SIZA VIEIRA (Cfr., ob. cit., pp. 188 ss.) mostra-nos que a propriedade plural já tem a ver com a exploração e não com a instalação dos empreendimentos.
Assim, para aquela Autora, empreendimentos turísticos em propriedade plural “são empreendimentos turísticos a constituir ou a instalar sob forma fraccionada e onde se pretende, desde logo, alienar ou vir a alienar as fracções autónomas ou lotes destinados a unidades de alojamento”, apontando como uma das importantes consequências da instalação de um empreendimento em propriedade plural, a consagração de um conjunto de deveres a que quer o promotor quer a entidade administradora ficam vinculados.
Nas palavras da Autora, “O promotor é a entidade que promove a “instalação” (conceito usado pela lei) do empreendimento, e por conta de quem o mesmo é licenciado e construído; é ele também que coloca no mercado as fracções autónomas ou lotes para a venda. O promotor pode vir a manter-se ligado ao empreendimento, quer enquanto proprietário de algumas fracções, quer, no caso de alienação total, enquanto responsável pela sua exploração; mas também pode ceder a sua exploração (e portanto a sua administração) a outrem”.
E a Autora passa a enumerar as várias obrigações do promotor, que têm de ser cumpridas mesmo antes de serem colocadas no mercado as unidades de alojamento ou lotes, isto é, antes de serem celebrados contratos, ainda que meras promessas de compra e venda, destacando-se: a elaboração do título constitutivo previsto nos arts. 54º e 55º do Decreto-Lei nº 39/2008 e o contrato de exploração turística”, que deve regular os termos da exploração da unidade de alojamento, a participação do proprietário nos resultados e os termos e condições em que pode usar a referida unidade (nº 4 do art. 44º).
Resulta, desta forma, patente que eventuais vendas das unidades de alojamento realizadas ainda durante a fase de construção/instalação do empreendimento já fazem parte da exploração do mesmo. Destacam-se, assim dois procedimentos distintos, ainda que possam ocorrer em simultâneo: um relativo à prática das operações necessárias a instalar o empreendimento; outro, relativo às operações necessárias a pô-lo em funcionamento e a explorá-lo, sendo que a venda das unidades projectadas ou construídas faz necessariamente parte do segundo momento.
Embora se reconheça que há no caso dos empreendimentos turísticos em propriedade plural uma evidente compressão do conteúdo do direito de propriedade (uma vez que ainda que a habitem a título permanente a unidade de alojamento não se destina a habitação), a verdade é que tais restrições são estabelecidas em função da forma de exploração e funcionamento do empreendimento e não em virtude da sua instalação.
O acabado de expor leva-nos a concluir que quando o legislador, no nº 1 do art. 20º, utiliza a expressão aquisições de prédios ou de fracções autónomas com destino à «instalação» (Quer sejam novos, quer existentes, mas que sejam objecto de remodelação, beneficiação ou reequipamento, ou que aumentem a sua capacidade (art. 5º do Decreto-Lei nº 423/83).), este conceito não pode deixar de ser entendido como referindo-se precisamente à aquisição de prédios (ou de fracções autónomas) para construção (quando se trate de novos empreendimentos (A lei abrange também, como ficou dito, a aquisição de meras fracções autónomas com vista à remodelação/instalação de empreendimentos turísticos.) ) de empreendimentos turísticos, depois de devidamente licenciadas as respectivas operações urbanísticas, visando beneficiar as empresas que se dedicam à actividade de promoção/criação dos mesmos.

4. Esta conclusão é, aliás, confirmada, pela evolução histórica das isenções consagradas no nº 1 do art. 20º do Decreto-Lei nº 423/83 e a razão de ser das mesmas.

1. Começando pela evolução histórica, a Lei nº 2073, de 23 de Dezembro de 1954, dispunha no artigo 12° o seguinte:
“As empresas proprietárias e as que venham a explorar os estabelecimentos hoteleiros ou similares classificados de utilidade turística são isentas, relativamente à propriedade e exploração dos mesmos, de contribuição predial e de contribuição industrial, e bem assim de quaisquer impostos e taxas para os corpos administrativos, durante o prazo de 10 anos, contado a partir do primeiro ano de exploração dos estabelecimentos; e beneficiarão, nos quinze anos seguintes, de uma redução de 50 por cento nas mesmas contribuições, impostos e taxas.
E o artigo 13° do mesmo diploma concedia ainda outros benefícios fiscais, nos seguintes termos:
São isentas de sisa e de imposto de sucessões e doações, ficando sujeitas apenas a um quinto do imposto do selo devido, as aquisições de prédios com destino à construção e instalação de estabelecimentos hoteleiros ou similares previamente declarados de utilidade turística, cujas empresas beneficiarão também das isenções estabelecidas no corpo do artigo anterior, desde a aquisição dos prédios até à abertura dos estabelecimentos à exploração, se for observado para esta o prazo fixado pelo Presidente do Conselho.”
Resulta dos normativos mencionados que também aqui apenas estavam isentas de sisa (actual IMT) as aquisições, por parte das empresas, de prédios com destino à construção e instalação de estabelecimentos hoteleiros.
Por sua vez, a Lei nº 2081, de 04 de Junho de 1956, veio inserir disposições de interpretação e aplicação da Lei nº 2073, tendo o art. 12º vindo estipular que “Poderão ser restituídas as importâncias correspondentes à sisa e ao imposto sobre as sucessões e doações e aos quatro quintos do imposto do selo pagos pela aquisição de prédios com destino à construção de estabelecimentos hoteleiros e similares, feita posteriormente à entrada em vigor da Lei n ° 2073, desde que esses estabelecimentos venham a ser declarados de utilidade turística e sejam abertos à exploração no prazo fixado para o efeito pelo Presidente do Conselho.”
Decorre também daqui com toda a clareza que a restituição da sisa poderia ser feita à empresa que adquiriu um prédio para nele construir e instalar um estabelecimento hoteleiro.
A seguir, o Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações (CIMSISD), através da publicação do Decreto-Lei nº 41969, de 24 de Novembro de 1958, veio dispor, no seu artigo 13°, nº 8, que ficavam isentos da sisa, as aquisições de prédios com destino à construção e instalação de estabelecimentos hoteleiros ou similares, previamente declarados de utilidade turística, nos termos do artigo 13° da Lei nº 2073, de 23 de Dezembro de 1964.
Também esta isenção abrangia apenas as aquisições de prédios com o fim de neles construir e instalar estabelecimentos hoteleiros, considerados de utilidade turística, deixando de fora a aquisição de fracções que integravam os estabelecimentos hoteleiros.

2. A apontada evolução histórica do conceito de «instalação» é também a que corresponde e se adequa à razão de ser e finalidade das isenções consagradas no art. 20º, nº 1, do Decreto-Lei nº 423/83.
Na verdade, conforme se salienta no Preâmbulo do citado Decreto-Lei “O instituto de utilidade pública tem-se revelado sem dúvida, um dos instrumentos mais eficazes para o desenvolvimento do sector, em particular no que respeita a equipamento hoteleiro e similar, a que foi inicialmente dirigido”.
E, mais adiante, pode ainda ler-se que “De igual modo, é agora a ocasião oportuna de fazer estender os benefícios a investimentos no campo da remodelação, beneficiação, reequipamento, e ampliação, iniciativas muitas vezes mais úteis e merecedoras de estímulo que as dirigidas a empreendimentos novos”.
Ora, resulta do diploma que o que se pretende beneficiar é o investimento em empreendimentos turísticos a que venha a ser reconhecida utilidade turística, quer estes sejam novos (a criar), quer existentes, mas que sejam objecto de remodelação, beneficiação ou reequipamento, ou que aumentem a sua capacidade (artº 5º).
Esta mesma conclusão é a que resulta da leitura do consignado pelo Grupo de Trabalho criado para reavaliar os benefícios fiscais que, a propósito dos benefícios fiscais à utilidade turística em sede de IMT, Imposto do Selo e IMI, recomendam a sua supressão, porquanto, entre o mais, “os promotores de investimentos no sector do turismo mantêm, para além dos apoios financeiros enquadrados nas políticas económicas do Estado Português e da União Europeia, o acesso aos incentivos gerais ao investimento e aos benefícios à interioridade. Por outro lado, minimizando o impacto da medida em sede de IRC, directamente ou através do aumento das reintegrações e amortizações, os custos decorrentes do IMT e IMI sobre os investimentos que ficam sujeitos a estes tributos” (Cfr. Reavaliação dos Benefícios Fiscais, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, nº 198, p.294.) .
Resulta patente das considerações do Grupo de Trabalho que o legislador pretendeu impulsionar a actividade turística prevendo a isenção /redução de pagamento de Sisa /Selo, para os promotores que pretendam construir/criar estabelecimentos (Muitos promotores antes de adquirirem os prédios onde futuramente será instalado o empreendimento turístico, elaboram o projecto e candidatam-se à atribuição da utilidade turística a título prévio (art. 7º do Decreto-Lei nº 423/83), que lhes permitirá beneficiar da isenção do IMT e redução do imposto do Selo relativamente à aquisição do imóvel. Por outro lado, os promotores que paguem imposto pela aquisição dos imóveis destinados à instalação de estabelecimentos turísticos podem, posteriormente, pedir a restituição quando lhes for reconhecida a utilidade turística.) (ou readaptar e remodelar fracções existentes) e não quando se trate da mera a aquisição de fracções (ou unidades de alojamento) integradas nos empreendimentos e destinadas à exploração, ainda que sejam adquiridas em data anterior à própria instalação/licenciamento do empreendimento (Como vimos, na verdade, nada impede que o promotor do investimento comece por vender as futuras fracções ou unidades antes mesmo da construção do empreendimento e da sua instalação.) .
Alegam os recorridos, nas suas Contra-Alegações, que “(…) na realidade, quem realiza o investimento logo na fase de licenciamento e construção do empreendimento (dita de “instalação” pela recorrente) são os adquirentes das fracções, através do pagamento do sinal e dos reforços de sinal por força dos contratos promessa”(art. 15º das Contra-Alegações).
Ora, salvo o devido respeito, tal argumento não tem qualquer fundamento.
Em primeiro lugar, quando o legislador estabelece a isenção no nº 1 do art. 20º do Decreto-Lei nº 423/83 abstrai, como não pode deixar de ser, das modalidades de financiamento adoptadas pelos promotores, já que para a construção dos empreendimentos eles tanto podem utilizar apenas capitais próprios ou socorrer-se do produto da venda das futuras fracções, através da celebração de contratos promessa de compra e venda (No entanto, como salienta CRISTINA SIZA VIEIRA, a possibilidade de alienar a propriedade do activo imobiliário permite ao promotor aliviar o investimento realizado à cabeça, diminuindo a imobilização do capital e os encargos financeiros a este associados (cfr. ob. cit., p. 172).) .
Em segundo lugar, afigura-se evidente que o adquirente das fracções (No caso de empreendimentos turísticos em propriedade plural (cfr. art. 52º ss. do Decreto-Lei nº 39/2008.) não se torna, por tal facto, um co-financiador do empreendimento, com a responsabilidade da instalação, uma vez que está a investir em produtos imobiliários no âmbito do denominado turismo residencial (Sobre a noção, cfr. CRISTINA SIZA VIEIRA, ob. cit., pp. 173 e 178.), como qualquer consumidor final, quer a aquisição seja concretizada em planta quer depois de instalado/construído o empreendimento.
Na verdade, quando os particulares adquirem as fracções fazem-no, como se afigura óbvio, como consumidores de um produto turístico que foi posto no mercado pelo promotor tendo em vista a exploração, pois, como vimos, a celebração dos contratos promessa de compra e venda é acompanhada da celebração do contrato de exploração. O objectivo que move os particulares é a realização do seu próprio investimento, podendo ainda optar por serem utentes do empreendimento ou cederem a exploração, participando nos resultados da mesma (cfr. o nº 4 do art. 45º do Decreto-Lei nº 39/2008). Pois embora se considere que as fracções ficam afectas à exploração, nada impede que as mesmas sejam ocupadas exclusivamente pelos respectivos proprietários e por tempo indeterminado, como deriva, de forma clara, de disposições legais, tais como, as constantes dos arts. 45º, nº 1, do Decreto-Lei nº 39/2008, quando refere expressamente “(…) devendo a entidade exploradora assumir a exploração continuada da totalidade das “(…)” unidades de alojamento “(…) ainda que ocupadas pelos respectivos proprietários”, e no nº 4 do mesmo preceito, quando se refere às condições de utilização das unidades de alojamento pelos respectivos proprietários. Nas palavras de DULCE LOPES (Cfr. “A Concretização de Empreendimentos”…cit., p. 170.), o diploma parece, assim, “acolher o conceito do turismo residencial, já que expressamente admite que os proprietários das unidades de alojamento possam ocupar as mesmas ou celebrar contratos sobre elas, desde que não comprometam o seu uso turístico, usufruam dos serviços obrigatórios do empreendimento e paguem a prestação periódica a que estão vinculados.
Em suma, os promotores dos empreendimentos são únicos responsáveis pelo investimento imobiliário, impendendo sobre eles o risco do mesmo, bem como pela obtenção das licenças necessárias a torná-lo apto ao funcionamento e exploração.
Afigura-se, desta forma, que a argumentação dos recorridos no sentido de que o benefício consagrado no nº 1 do art. 20º do Decreto-Lei nº 423/83 tem em vista a exploração turística e que os beneficiários são os adquirentes das fracções ou unidades de alojamento, não tem o mínimo de cabimento nem na letra nem na razão de ser do preceito.
O benefício só tem justificação relativamente a quem procede à instalação do empreendimento e o coloca no mercado e não em relação a todos os que o utilizam e exploram, ainda que através da compra das suas unidades.
Não podemos, desta forma, deixar de concluir que assiste razão à recorrente quando defende que “(…) Pretendeu o legislador impulsionar este sector de actividade, prevendo isenção/redução de pagamento de Sisa/Selo, mediante determinadas condições, a quem vai criar estabelecimentos turísticos, e não a quem se limita a adquirir fracções pertencentes a empreendimentos já instalados”, e que este entendimento ou interpretação é o que decorre “do elemento histórico, racional /teleológico, mas também literal das normas jurídicas em apreço”.

4. Aplicação do exposto ao caso em apreço.

No caso em apreço, como vimos, a Sociedade Comercial “D………, Limitada”, vendeu, na qualidade de proprietária/promotora do empreendimento turístico “C………”, as fracções autónomas designadas pelas letras “CC” e “N”, destinadas a habitação, no âmbito dos serviços de exploração turística (cfr. escritura de compra e venda – fls. 65 a 74 v do PA).
Para além de ser a responsável pela construção/criação do empreendimento em causa, pode ler-se a dado passo na sentença recorrida que “(…) a “LICENÇA DE UTILIZAÇÃO TURISTICA Nº 43/09”, foi emitida pela Câmara Municipal de Loulé, em 05/03/2009”, igualmente a favor da referida sociedade.
Na sentença recorrida, como vimos, conclui-se que a aquisição das fracções em causa, sendo as mesmas destinadas à exploração turística, cabem na isenção prevista no art. 20º, nº 1, do Decreto-Lei nº 423/83.
Para tanto, ponderou-se na referida sentença que “(…) O empreendimento estará definitivamente instalado quando todas as unidades de alojamento iniciarem o funcionamento.
E permitindo-se a instalação dos empreendimentos por fases, só à medida que cada uma das fases inicie o funcionamento é que se considera que essa fase se considera instalada.(…).
A venda das fracções foi concretizada em diferentes datas.
Assim, a primeira aquisição de cada fracção está integrada no processo de instalação do empreendimento”, pelo que tendo os ora recorridos “adquirido as fracções, em 14 de Outubro de 2009, à vendedora D……… LDA, e tendo as mesmas sido destinadas à exploração turística, tais aquisições configuram uma “aquisição inicial e não subsequente, isto é, constituem a primeira venda de cada fracção, efectuada pela proprietária do empreendimento, estando assim integradas no âmbito do processo de instalação da totalidade do conjunto turístico, processo que é complexo e prolongado no tempo”.
“(…) no caso dos autos a impugnante realizou a primeira aquisição da fracção, beneficiando assim do disposto no art. 20º, nº 1, do Decreto-Lei nº 423/83, por se tratar de aquisição com destino à instalação turística do empreendimento”.
Atendendo ao exposto, se bem se compreende a sentença recorrida, partindo-se do entendimento de que o empreendimento se considera instalado quando todas as unidades de alojamento iniciarem o funcionamento e que a primeira aquisição de cada fracção está ainda integrada naquele processo, as isenções consagradas no art. 20º, nº 1, do Decreto-Lei nº 423/83 beneficiam apenas as aquisições iniciais, isto é, as que constituam a primeira venda efectuada pela proprietária do empreendimento, desde que destinada à exploração turística.
Em primeiro lugar, a interpretação a que se chegou na sentença recorrida não tem o mínimo apoio nem na letra nem na razão de ser do referido preceito, como ficou demonstrado.
Com efeito, em lado nenhum o legislador refere que pretende aplicar as isenções referidas naquele preceito à venda das fracções pelos promotores do empreendimento e ainda que destinadas à exploração turística.
Recorde-se que o nº 2 do art. 20º nos dá um argumento decisivo nesse sentido, ao alargar a isenção prevista no nº 1 na transmissão a favor da empresa exploradora, mas apenas no caso de a proprietária ser uma sociedade de locação financeira.
Como ficou demonstrado, no conceito de instalação não pode estar incluída a aquisição de unidades de alojamento que fazem parte do empreendimento, porque essa aquisição é feita tendo em vista a sua exploração a qual só pode ocorrer após o acto final do procedimento de instalação, que coincide normalmente, como vimos, com a abertura ao público.
Ora, no caso em apreço, resulta do probatório que o empreendimento iniciou o funcionamento em 4 de Setembro de 2008 e a venda da fracção em causa apenas ocorreu em 14 de Outubro de 2009, ou seja, quando o empreendimento já se encontrava sem qualquer dúvida em funcionamento e exploração.
De qualquer modo, não tem qualquer apoio legal a afirmação segundo a qual “o estabelecimento vai-se progressivamente instalando à medida que as unidades de alojamento vão sendo vendidas”.
É verdade que pode ser autorizada a instalação dos empreendimentos turístico por fases à semelhança do que pode suceder com outras operações urbanísticas (art. 30º, nº 8, do Decreto-Lei nº 39/2008), mas “A delimitação do termo cada fase da obra” deve fazer-se corresponder a uma parte da obra com capacidade para funcionar autonomamente”, nos termos do regime jurídico da Urbanização e da Edificação (Cfr. LICÍNIO LOPES, ob. cit., p. 137/8.).
Ficou claramente demonstrado que a venda das unidades de alojamento ainda que adquiridas durante a construção/instalação consubstanciam já o interesse da exploração do empreendimento turístico.
Para uma compreensão cabal dos momentos significativos e principais temáticas que antecedem e seguem a instalação dos empreendimentos turísticos, DULCE LOPES (Cfr. “Concretização de Empreendimentos Turísticos Legislação e Aplicação”, Empreendimentos Turísticos, cit., pp. 152 a 154.) autonomiza os seguintes momentos: “A montante da instalação”, onde destaca problemáticas ligadas, por exemplo, ao planeamento e a definição de opções estratégicas; “instalação” (onde destaca a existência de um especial procedimento para o licenciamento); e a “jusante da instalação”, onde realça as questões relativas à “propriedade”, “administração” e “exploração”.
Acresce que muito menos resulta do mencionado preceito que tal isenção se aplique à primeira transmissão. Se bem se percebe a sentença recorrida, o critério de beneficiar a primeira transmissão derivaria do facto de só a primeira aquisição de cada fracção estar integrada no processo de instalação.
Para além de a sentença recorrida partir de um conceito de instalação que não tem correspondência com o regime legal, esta interpretação deixaria de fora precisamente as aquisições visadas pelo legislador, a saber, as efectivadas pelos promotores e destinadas à construção/criação/remodelação de empreendimentos turísticos.
Por outro lado, se o preceito visasse, como pretende a sentença recorrida, beneficiar a aquisição das fracções para exploração turística, não fazia sentido estar a discriminar entre as primeiras aquisições e as subsequentes, tanto mais que quem adquire uma unidade de alojamento num empreendimento turístico, constituído ao abrigo do Decreto-Lei nº 39/2008, não pode dar-lhe, como vimos, outro destino senão a exploração para fins turísticos. Daí que, no caso em apreço, a fracção tenha sido adquirida para habitação mas no âmbito da celebração de um Contrato de Exploração Turística, através do qual foi habilitada a entidade exploradora a realizar a exploração do mesmo, nos termos do disposto o art. 45º do Decreto-Lei nº 39/2008.
Finalmente, realce-se que se o legislador quisesse beneficiar pura e simplesmente o «investimento» em empreendimentos turísticos, através da sua afectação à exploração, então justificar-se-ia que a isenção fosse reconhecida indefinidamente e não apenas ao primeiro adquirente de cada fracção. A proceder a interpretação sufragada na sentença recorrida, pode suscitar-se a questão da eventual violação do princípio da igualdade por não se compreender a razão para discriminar os investidores consoantes fossem os primeiros ou segundos adquirentes.
Acresce que se fica sem se perceber o que acontece às aquisições efectivadas em planta que venham a ser objecto de transmissão em momento posterior, mas ainda antes de terminada a instalação no sentido adoptado pela sentença recorrida.
Como bem pondera o Ministério Público, no seu douto Parecer, “Os benefícios fiscais são medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes e que sejam superiores aos da própria tributação que impedem (artigo 2.°/1 do EBF) (…)” e embora não sejam susceptíveis de integração analógica admitem interpretação extensiva (artigo 10.º do EBF).
A verdade é que, como se conclui naquele Parecer “não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência, ainda que imperfeitamente expresso (artigo 9.°/2 do C. Civil)”, como é patente no caso em apreço no que se refere à interpretação seguida na sentença recorrida, sobre o conceito de instalação consignado no nº 1 do art. 20º do Decreto-Lei nº 423/83.
Finalmente, cumpre realçar que os benefícios fiscais “são medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesse públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem” (art. 2º do EBF).
E porque representam uma “derrogação da regra de igualdade” (Cfr. SÉRGIO VASQUES, ob. cit., p 311.) e do princípio da capacidade contributiva que fundamenta materialmente os impostos, os benefícios fiscais devem ser justificados por um interesse público relevante. Neste sentido, concluiu-se no Acórdão do Tribunal Constitucional nº 188/2003, de 8/4/2003, “que as isenções tributárias, traduzindo uma excepção à regra da incidência dos impostos, introduzem nestes um elemento de desigualdade e de privilégio que exige que elas sejam justificadas por um motivo ou interesse público “relevante”, capaz de lhe dar fundamento” (Cfr. SÉRGIO VASQUES, ob. cit., p. 311, nota (499).) .
Ora, a entender-se como o faz a sentença recorrida, que o objectivo das isenções consagradas no nº 1 do art. 20º do Decreto-Lei nº 423/83 visam premiar o investimento em empreendimentos turísticos, beneficiando os adquirentes de fracções ou unidades em empreendimentos já construídos/instalados, não vemos que interesses extrafiscais relevantes ou superiores poderiam justificar a opção do legislador, quando, como acontece no caso em apreço, as fracções foram adquiridas para uso exclusivo dos recorridos, sem qualquer limite temporal.
Por outro lado, considerando que os benefícios fiscais se apresentam, como ficou dito, como uma “excepção à regra da igualdade” (Cfr. SÉRGIO VASQUES, ibidem.) e da capacidade contributiva, não vemos motivo relevante para se discriminar quem compra prédios em empreendimentos turísticos relativamente aos demais consumidores.
Em suma, não estando em causa a aquisição de prédios ou de fracções autónomas destinados à construção/instalação de empreendimentos turísticos, mas sim a aquisição de unidades de alojamento por consumidores finais, ainda que porque integradas no empreendimento em causa se encontrem afectas à exploração turística, a mesma não pode beneficiar das isenções consagradas no art. 20º, nº 1, do Decreto-Lei nº 423/83.
Em face do exposto, assiste razão à recorrente pelo que a sentença recorrida não pode manter-se, devendo ser revogada.
Deve, desta forma, ser dado provimento ao recurso, com a consequente improcedência das impugnações em causa e manutenção das liquidações referentes a IMT e IS.

III- DECISÃO

Termos em que acordam os Juízes Conselheiros da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em conferência, conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar improcedente as impugnações com a consequente manutenção das liquidações.

Custas pelos Recorrentes, por terem Contra-alegado.

Lisboa, 23 de Janeiro de 2013. - Fernanda Maçãs (relatora) - Casimiro Gonçalves - Francisco Rothes (nos termos do art. 8º, nº 3, do CC e atento o julgado no proc. 968/12).