Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02034/13.6BELRS
Data do Acordão:10/23/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:EXTINÇÃO DO PROCEDIMENTO POR CONTRA-ORDENAÇÃO
SOCIEDADE
INSOLVÊNCIA
Sumário: A declaração de insolvência constitui um dos fundamentos de dissolução das sociedades e essa dissolução equivale à morte do infractor, em harmonia com o disposto nos artigos 61.° e 62.° do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT) e no artigo 176.°, n° 2, alínea a) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, daí decorrendo a extinção do procedimento contra-ordenacional.
Nº Convencional:JSTA000P25055
Nº do Documento:SA22019102302034/13
Data de Entrada:11/27/2018
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A..........................., SA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1. Relatório

A Autoridade Tributária e Aduaneira interpõe recurso da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada em 30/11/2017, que declarou extinto o procedimento contraordenacional exercido contra A…………………, S.A., sinalizada nos autos, e que lhe havia sido aplicado por violação do artigo 98.º do CIRS – entrega do imposto retido na fonte fora do prazo.

1.1. Apresentou alegações que concluiu nos seguintes termos:

“I. À Recorrente, A…………………, SA., com o NIPC ……………., foi aplicada uma coima de € 9.588,64, acrescida de custas processuais, pela entrega fora de prazo de imposto retido na fonte no valor de €83.018,51, com referência ao período de 2003/02, em incumprimento do disposto no artigo 98.º do CIRS, infracção prevista e punida pelos n.° 2 do artigo 114.° e n.° 4 do artigo 26.° do RGIT.
II. Sendo que a recorrente foi declarada insolvente, no processo n° 1772/14.0TYLSB, que corre termos no Tribunal de Comércio de Lisboa, por sentença proferida em 18/11/2014, transitada em julgado em 16-12-2014.
III. Questão pertinente na presente sede é proceder ao preenchimento do conceito a atribuir à “morte do arguido” a que apela a norma contida na alínea a) do artigo 61.° do RGIT, de acordo com o qual o procedimento de contraordenação se extingue com a morte do arguido, uma vez que tal extinção impõe, pela via do artigo 62.° do RGIT, a extinção da obrigação de pagamento da coima e de cumprimento das sanções acessórias.
IV. Se o procedimento contraordenacional se extingue com a morte do arguido, e portanto com a extinção da pessoa colectiva, é seguro afirmar que, de acordo com o artigo 160.°, n.° 2. do CSC e a alínea t) do n.° 1 do artigo 3.° do Código do Registo Comercial, a extinção da pessoa colectiva se efectiva apenas com o registo comercial do encerramento da liquidação da pessoa colectiva.
V. Da declaração de insolvência da pessoa colectiva decorre a sua dissolução (alínea e) do n.° 1 do artigo 141.° do CSC), o que determina que a sociedade entre em liquidação (cf. n.° 1 do artigo 146.° do CSC), porém, sucede que o n.° 2 do artigo 146.° do CSC determina expressamente que a sociedade em liquidação mantém a personalidade jurídica, sendo-lhe aplicáveis, com as necessárias adaptações, as disposições que regem as sociedades não dissolvidas, daí decorrendo uma clara e inequívoca comparação entre a sociedade que exerce em condições normais a sua actividade e a sociedade que inicia processo de dissolução e liquidação.
VI. Ademais, a declaração de insolvência, pela verificada impossibilidade de cumprimento pontual das obrigações por parte do devedor (artigo 3.°, n.° 1, do CIRE), não acarreta uma imediata cessação da actividade da empresa, e veja-se neste sentido o n.º 1 do artigo 82.° do CIRE que afirma que os órgãos sociais do devedor se mantêm em funcionamento após a declaração de insolvência, indiciando a continuidade, ainda que em moldes necessariamente diferentes face ao constrangimento provocado pela insolvência, da actividade da empresa.
VII. Nem a declaração de insolvência implica a necessária dissolução e liquidação da empresa, porquanto da assembleia de credores na sequência da declaração de insolvência pode emergir a aprovação e homologação de um plano de insolvência (artigos 209.° a 216.° do CIRE) que preveja, como dispõe a alínea c) do n.° 2 do artigo 195.º do CIRE, a manutenção em actividade da empresa, podendo inclusive o plano de insolvência aprovado reconduzir-se a uma estratégia de recuperação da empresa, acaso tal objectivo se mostre exequível e conforme ao deliberado em assembleia de credores.
VIII. Para reforço do predito, veja-se o disposto na norma do n.° 3 do artigo 192.° do CIRE, aditada pela Lei n.° 16/2012, de 20/04, que se dispôs clarificar o conceito de plano de insolvência quando a finalidade subjacente é a da recuperação da empresa, atribuindo-lhe a denominação de Plano de Recuperação.
IX. Resulta do exposto que o regime plasmado no CIRE configura a declaração de insolvência como o primeiro estádio de um eventual processo de recuperação da empresa, compatível com a continuação do exercício da actividade da empresa ou com a recuperação da mesma.
X. Por outro lado, independentemente do destino seguido em processo de insolvência (recuperação ou liquidação da empresa ou mesmo alienação da mesma), sempre esta manterá a sua personalidade jurídica, mesmo que em liquidação, bem como mantém a sua personalidade tributária nos termos do artigo 15.° da Lei Geral Tributária, a qual não é afectada pela declaração de insolvência.
XI. Assim, mostra-se o entendimento de acordo com a qual só com o registo do encerramento da liquidação é que a pessoa colectiva se extingue, atento o prescrito no artigo 160.° do CSC, como aquele que permite acomodar o regime jurídico vertido no CIRE e que prefigura a possibilidade de recuperação da empresa, conformando-se ademais com o prescrito no artigo 160.° do CSC, não ocorrendo com a declaração de insolvência a extinção da pessoa colectiva.
XII. Nestes termos, constatamos, face à matéria de facto provada nos autos, que a arguida foi declarada insolvente, o que não permite consolidar e afirmar, conforme faz a douta sentença recorrida, o juízo de extinção da pessoa colectiva nos termos da alínea a) do artigo 61.° do RGIT, bem como não permite determinar a extinção do procedimento contraordenacional.
XIII. Concluímos, desta forma, que a declaração de insolvência da arguida não é determinante da extinção do procedimento contraordenacional por morte do infractor, por não enquadrável na alínea a) do artigo 61.º do RGIT, uma vez que não pode ser equiparada a insolvência declarada por sentença transitada em julgado à extinção da pessoa colectiva.
XIV. Pelo que é entendimento da Fazenda Pública que a douta sentença procedeu a errónea subsunção dos factos às normas jurídicas pertinentes, com violação das normas da alínea a) do artigo 61.° e do artigo 62.° do RGIT, e do artigo 160°, n.° 2, do CSC.
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso deve a decisão recorrida ser revogada e o recurso interposto da decisão de aplicação da coima ser julgado improcedente.
PORÉM V. EXAS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA.”

1.2. O Magistrado do Ministério Público, junto do Tribunal Tributário de Lisboa, veio juntar resposta que rematou com as seguintes conclusões:

“1. Alega o ora recorrente que a douta sentença recorrida procedeu a errónea subsunção dos factos às normas jurídicas, violando, designadamente, a alínea a), do artigo 61°, e o artigo 62°, do RGIT, porquanto uma sociedade declarada insolvente mantém a sua personalidade jurídica e a declaração de insolvência não acarreta a imediata extinção da pessoa colectiva.
2. Sucede, porém, que pese embora a sociedade insolvente mantenha a sua personalidade jurídica (artigo 146°, n° 2, do Código das Sociedades Comerciais) para efeitos de liquidação, tal não significa que seja susceptível de ser sujeito de responsabilidade contra-ordenacional o que, pela sua própria natureza, não se pode manter depois de decretada a insolvência.
3. A declaração de insolvência de uma pessoa colectiva, arguida em processo de contra-ordenação, equivale, assim, de facto, à morte da pessoa singular, dando lugar à extinção do procedimento contra-ordenacional, nos termos do disposto nos artigos 61°, alínea a), e 62°, do RGIT.
4. Neste mesmo sentido, aliás, tem decidido de forma pacífica e reiterada a jurisprudência da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo — cfr. Acórdãos de 22.03.2018, processo n° 076/18, de 28.02.2018, processo n° 01314/17, de 24.01.2018, processo n° 01311/17, de 20.12.2017, processo n° 0309/17, de 1.06.2016, processo n° 0515/16, de 1.06.2016, processo nº 0470/16 e de 2.7.2015, processo n° 0638/14, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
5. A douta sentença recorrida não violou, deste modo, qualquer disposição legal, motivo pelo qual deverá ser mantida na ordem jurídica.
V. Excelências farão, porém, a costumada justiça.”

1.3. O Magistrado do Ministério Público, junto deste Tribunal manifestou-se pela improcedência do recurso nos termos a que no discurso jurídico a que infra se fará alusão.

1.4. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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2. Fundamentação

2.1.- Dos Factos

A sentença recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:

A) Em 4 de Abril de 2009, foi levantado pelo Serviço de Finanças de Lisboa 1 auto de notícia, contra a recorrente, imputando-lhe a prática da contra-ordenação prevista e punida pelos artigos 114°, n° 2 e 26°, n° 4 do RGIT, por violação do disposto no artigo 98° do Código do IRS — entrega fora de prazo do imposto retido na fonte (cfr. auto de notícia, a fls. 2 dos autos);
B) Com base no referido auto de notícia foi, em 31 de Outubro de 2009, autuado no Serviço de Finanças de Lisboa 1 o processo de contra-ordenação n° 3069200906091911 (cfr. autuação, a fls. 1 dos autos);
C) Em 2 de Setembro de /2011 foi proferida decisão de aplicação de coima, no âmbito do processo de contra-ordenação identificado na alínea antecedente, fixando-se a coima especialmente atenuada no montante de €9.588,64 (cfr. decisão a fls. 98 a 101 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
D) Por ofício datado de 2 de Setembro de 2011 foi remetida à recorrente notificação da decisão mencionada na alínea antecedente (cfr. ofício, a fls. 102 dos autos);
E) Em 3 de Outubro de 2011, foi enviada ao Serviço de Finanças de Lisboa 1 a petição inicial do presente recurso (cfr. registo, a fls. 122 dos autos);
F) A recorrente, anteriormente denominada «A……………. SA», alterou, em 9 de Outubro de 2014, a sua denominação para «B…………. SA» (cfr. certidão permanente, a fls. 144 a 154 dos autos);
G) Por sentença proferida em 18 de Novembro de 2014, com trânsito em julgado em 16 de Dezembro de 2014, no âmbito do Processo n° 1772/14.0TYLSB, que corre termos no Juízo de Comércio de Lisboa — Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, foi a recorrente declarada insolvente (cfr. certidão, a fls. 159 a 172 dos autos).
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2.2.- Do Direito

Patenteiam as conclusões alegatórias que a AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA vem interpor recurso da decisão na qual foi julgado extinto o procedimento contra-ordenacional, nos termos do disposto no artigo 61º, al. a) do RGIT, determinando o arquivamento dos presentes autos de contra-ordenação, nos termos do disposto no artigo 77° n° 1, do mesmo diploma legal, para o que imputa à sentença a errónea subsunção dos factos às normas jurídicas pertinentes com violação das normas da al. a) do artigo 61° e 62° do RGIT e 160º, n° 2, do CSC, pedindo, a final a revogação da decisão recorrida, devendo o recurso de aplicação da coima ser julgado improcedente.
Respondendo, o M° P° junto do tribunal a quo pugna pela manutenção do julgado, posição inteiramente acolhida pelo EPGA e que aponta para ser jurisprudência pacífica deste STA que a declaração de insolvência de uma sociedade constitui um dos fundamentos de dissolução das sociedades e tal equivale à morte do infractor em sintonia com o disposto nos artigos 61º e 62° do RGIT e artigo 176°, n° 2, al. a) do CPPT, daí decorrendo a extinção do procedimento contra-ordenacional — ver acórdãos deste STA de 12.12.2018, 2ª sec, in proc. n° 0667/17.0BEAVR 0528/18 e de 12.09.2018, 2ª sec., in proc. n° 0505/18, entre outros e além dos citados nos doutos Parecer e resposta.
A questão decidenda é, pois, a de saber se a declaração de insolvência da arguida é, ou não, determinante da extinção do procedimento contra-ordenacional por morte do infractor, por enquadrável (ou não) no normativo do artº 61º, al. a) do RGIT, uma vez que pode (ou não) ser equiparada a insolvência declarada por sentença transitada em julgado à extinção da pessoa colectiva.
E sobre o tema controvertido aderimos, de pleno, à jurisprudência unânime deste STA, de resto, seguida na sentença e na resposta e no Parecer do Ministério Público.
Assim, como bem se delimita na sentença recorrida, em causa no recurso de contra-ordenação interposto está a decisão de aplicação de coima proferida no âmbito do processo n° 3069200906091911, do Serviço de Finanças de Lisboa 1, autuado na sequência da imputação ao arguido da violação do artigo 98° do Código do IRS, punida pelo artigo 114°, n° 2 do RGIT, norma na qual se prevê a contra-ordenação por falta de entrega da prestação tributária.
Decorre do probatório fixado, sob a sua alínea G), que a arguida, ora recorrente, foi declarada insolvente por sentença transitada em julgado em 16 de Dezembro de 2014, impondo-se, nessa medida, apreciar quais os efeitos que tal declaração produz no procedimento contra-ordenacional objecto dos presentes autos.
Estabelece o artigo 61°, alínea a) do RGIT que o procedimento por contra-ordenação extingue-se, designadamente, por morte do arguido.
Em conformidade, decreta o artigo 62° daquele diploma que a obrigação de pagamento da coima e de cumprimento das sanções acessórias se extingue com a morte do infractor, razão pela qual se prevê que, tal circunstância, constitui, igualmente, uma das causas de extinção do processo executivo, nas execuções por coimas ou outras sanções pecuniárias, nos termos do disposto no artigo 176°, n° 2, alínea a) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
Acresce que a declaração de insolvência acarreta a dissolução da sociedade, por força do disposto no artigo 141°, n° 1, alínea e) do Código das Sociedades Comerciais (CSC), e, com a dissolução, a sociedade entra em liquidação, muito conquanto conserve a sua personalidade jurídica, isso por ressalva expressa ínsita no artigo 146°, n° 2 do referido Código.
Por assim ser e como bem se salienta na sentença recorrida, a declaração de insolvência de uma sociedade comercial, embora determine a sua dissolução, em rigor, não provoca a sua imediata extinção, na medida em que, nos termos do artigo 160° do CSC, a sociedade só se pode considerar extinta quando se mostrar efectuado o registo do encerramento da liquidação.
É nesse conspecto que pontifica o entendimento jurisprudencial pacífico do contencioso tributário de que a dissolução da sociedade equivale à morte do infractor, nos termos e para os efeitos previstos, designadamente, no artigo 61° do RGIT, daí decorrendo a extinção do procedimento contra-ordenacional.
Chamam-se a terreiro, como se fez na sentença recorrida, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 1 de Junho de 2016, proferido no Processo n° 515/16, publicado em www.dgsi.pt e relatado pela Exmª Juíza Conselheira Adjunta desta formação, no qual se modelou o entendimento de que “a declaração de insolvência constitui um dos fundamentos de dissolução das sociedades e essa dissolução equivale à morte do infractor, em harmonia com o disposto nos artigos 61° e 62° do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT) e no artigo 176°, nº 2, alínea a) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, daí decorrendo a extinção do procedimento contra-ordenacional, da obrigação do pagamento de coimas e da execução fiscal instaurada tendente à sua cobrança coerciva (…). Acresce que, como ficou dito no Acórdão 638/14 de 02.07.2015, «pese embora o diverso enquadramento que sobre esta matéria os tribunais da jurisdição comum têm vindo a adoptar, em face do disposto nos arts. 141°, 146°, n° 2 e 160º, n° 2, todos do Código das Sociedades Comerciais, (...) crê-se que a especificidade das relações jurídico-tributárias continua a justificar um diverso enquadramento jurídico quanto ao momento em que se deverá ficcionar «a morte da pessoa colectiva»”.
Assinala a sentença recorrida, de forma assertiva, que é esta compreensão aceite também pela melhor doutrina tributária, sustentada, acima de todos, por Jorge Lopes de Sousa, no seu “Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado”, volume III, 6ª edição, 2011, Áreas Editora, p. 307, ao ensinar que “Relativamente às situações de falência ou insolvência, o STA vem entendendo que, «mantendo embora a sociedade dissolvida, em liquidação, a sua personalidade jurídica — art. 146°, n° 2 do CSC — são, com a declaração de falência, apreendidos todos os seus bens, passando a constituir um novo património, a chamada “massa falida”: um acervo de bens e direitos retirados da disponibilidade da sociedade e que serve exclusivamente, depois de liquidado, para pagar, em primeiro lugar, as custas processuais e as despesas de administração e, depois, os créditos reconhecidos». Pelo que, então, já não encontrará razão de ser a aplicação de qualquer coima”.
Assim e como bem adverte o julgador, uma coisa é a personalidade jurídica que a sociedade mantém, designadamente, para efeitos de liquidação, mesmo depois de declarada a falência, outra, diferente, é a susceptibilidade de ser sujeito de responsabilidade contra-ordenacional, que, pela sua própria natureza, não se pode manter depois de decretada a insolvência.
Lapidar sobre a ajuizada questão é, também, o discurso jurídico do Acórdão deste Supremo Tribunal prolatado em 12-12-2018, no Recurso nº 0667/17.0BEAVR, disponível em www.dgsi.pt do qual se extracta o seguinte bloco fundamentador:
“(…)
Este Supremo Tribunal Administrativo já se pronunciou por diversas vezes sobre questão similar à ora suscitada e no sentido de que a declaração de insolvência constitui um dos fundamentos de dissolução das sociedades sendo que essa dissolução equivale à morte do infractor, em harmonia com o disposto nos artigos 61.º e 62.º do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT) e no artigo 176.º, nº 2, alínea a) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, daí decorrendo a extinção do procedimento contra-ordenacional, da obrigação do pagamento de coimas e da execução fiscal instaurada tendente à sua cobrança coerciva - cf., neste sentido, Acórdãos 617/10, 1107/12 e 638/14 e, por mais recentes, os Acórdãos de 21.10.2015, recurso 610/15, de 04.11.2015, recurso 834/15, de 1.06.2016, recurso 515/16, de 20.12.2017, recurso 309/17, de 24.01.2018, recurso 1311/17, de 28.02.2018, recurso 314/17 e de 12.09.2018, recurso 505/18, todos in www.dgsi.pt.
Concordamos com esta jurisprudência cuja fundamentação jurídica tem plena aplicação também no caso vertente, e que aliás, colhe apoio da doutrina, nomeadamente de Alfredo José de Sousa e Silva Paixão (Código de Processo Tributário, 4ª ed., p. 425.), António Tolda Pinto e Jorge Manuel dos Reis Bravo (Regime Geral das Infracções Tributárias, Coimbra Editora, pág. 195) e de Jorge Lopes de Sousa, (Código de Procedimento e Processo Tributário, Anotado e Comentado, Vol. III, 6ª ed., Anotações 6 a 8 ao art. 176º, pp. 306 a 308.), obra esta em que salienta que «…é essa a única solução que se harmoniza com os fins específicos que justificam a aplicação de sanções, que são de repressão e prevenção e não de obtenção de receitas para a administração tributária».
Efectivamente de acordo com o disposto nos arts. 61º e 62º do RGIT, o procedimento por contra-ordenação extingue-se com a morte do arguido, sendo que também a obrigação de pagamento da coima e de cumprimento das sanções acessórias se extingue com a morte do infractor.
Ora à morte do infractor deve ser equiparada a extinção da pessoa colectiva arguida no processo de contra-ordenação, sendo que a sociedade se considera extinta pelo encerramento da liquidação (artº 160º do CSC).
Como sublinha Jorge Lopes de Sousa, no seu Código de Procedimento e Processo Tributário, Áreas Edit., 6ª edição, Volume 3º, pag. 307, «mantendo embora a sociedade dissolvida, em liquidação, a sua personalidade jurídica - art. 146°, n.º 2 do CSC - são, com a declaração de falência, apreendidos todos os seus bens, passando a constituir um novo património, a chamada "massa falida": um acervo de bens e direitos retirados da disponibilidade da sociedade e que serve exclusivamente, depois de liquidado, para pagar, em primeiro lugar, as custas processuais e as despesas de administração e, depois, os créditos reconhecidos.
Pelo que, então, já não encontrará razão de ser a aplicação de qualquer coima.»
Acresce que, como ficou dito nos Acórdãos desta secção de 24.01.2018 e de 12.09.2018, proferidos nos recursos 1311/17 e 505/18, respectivamente, «Também o CIRE, referindo-se ao momento da extinção das obrigações fiscais de sociedade insolvente, estabelece neste art. 65º que as mesmas (obrigações declarativas e fiscais) necessariamente se extinguem com a deliberação de encerramento da actividade do estabelecimento (nos termos do nº 2 do art. 156º), o que deve ser comunicado oficiosamente pelo Tribunal à AT para efeitos de cessação da actividade; sendo que, na falta daquela deliberação, as ditas obrigações fiscais passam a ser da responsabilidade daquele a quem a administração do insolvente tenha sido cometida e enquanto esta durar. Ou seja, em termos estritamente fiscais e, consequentemente, para aplicação de coimas por incumprimento de obrigações fiscais, também no âmbito do CIRE (e tal como já se entendia no âmbito do CPEREF e do C.S.Comerciais) não há que remeter para o encerramento da fase de liquidação e partilha da sociedade insolvente, a libertação da respectiva responsabilidade».
Nesta conformidade, resultando provado nos autos que a sociedade arguida foi declarada insolvente por sentença proferida em 18 de Novembro de 2014, transitada em julgado, e aderindo ao entendimento jurisprudencial supra exposto, tendo ocorrido a dissolução da recorrente, por declaração de insolvência, tal equivale à morte do arguido, o que determina a extinção do procedimento por contra-ordenação, nos termos do artigo 61º, alínea a) do RGIT.
A verificação de causa extintiva do procedimento de contra-ordenação tem, por sua vez, como consequência, o arquivamento do processo de contra-ordenação, nos termos do artigo 77°, n° 1 do RGIT, com a consequente extinção da responsabilidade contra-ordenacional do arguido.
Do que vem dito, deve o recurso improceder e, consequentemente, manter-se o julgado por ter sido feita uma correcta subsunção jurídica.

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3. Decisão:

Face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso e em confirmar a sentença recorrida.

Sem custas (inexistência de norma legal que preveja a condenação da entidade recorrente em custas).

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Lisboa, 23 de Outubro de 2019. - José Gomes Correia (relator) - Joaquim Manuel Charneca Condesso - Isabel Marques da Silva.