Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01444/13
Data do Acordão:04/13/2016
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:RETENÇÃO NA FONTE
IRC
SUJEITO PASSIVO NÃO RESIDENTE
Sumário:I - Nos termos dos artigos 7.º das Convenções sobre dupla tributação celebradas entre Portugal e França (aprovada para ratificação pelo DL 105/71, de 26 de Março) os lucros de uma empresa de um Estado contratante só podem ser tributados nesse Estado, a não ser que a empresa exerça a sua actividade no outro Estado contratante por meio de um estabelecimento estável aí situado.
II - Só que, nos termos do n.º 4 do artigo 90.º do CIRC, na redacção então em vigor (Lei 32-B/2002, de 30 de Dezembro), quando não fosse efectuada, até ao momento de entrega do imposto, a prova de que, por força de uma convenção destinada a eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal, a competência para a tributação dos rendimentos auferidos por um residente de outro Estado contratante não era atribuída ao Estado da fonte, ficava o substituto tributário obrigado a entregar a totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos da lei.
III - Tal interpretação não viola as referidas convenções internacionais, nem os artigos 8.º e 103.º da CRP, e muito menos os artigos 4.º e 11.º do EBF, pois as medidas para evitar a dupla tributação económica internacional e interna não são benefícios fiscais mas sim desagravamentos fiscais (exclusões fiscais ou situações de não sujeição tributária).
IV – Do mesmo modo, também não resultam violados os princípios da liberdade de estabelecimento, da liberdade de circulação e da não discriminação uma vez que, a mera imposição da prova da residência, instituída por forma a acautelar o direito do Estado a uma cobrança adequada dos impostos devidos, não corporiza qualquer regra de tributação diferenciada para residentes e não residentes.
V - Não tendo a ora recorrente logrado demonstrar os pressupostos de que dependia o afastamento da sua responsabilidade enquanto substituta tributária e não competindo à Administração Fiscal a tarefa de carrear a prova dos mesmos para os autos deve ser confirmada a sentença recorrida.
Nº Convencional:JSTA00069651
Nº do Documento:SA22016041301444
Data de Entrada:09/19/2013
Recorrente:A... SA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:MAIORIA COM 1 VOT VENC
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF SINTRA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL
Legislação Nacional:CIRC01 ART98.
L 32-B/2002 DE 12/30 ART90 N3 N4 ART90-A N2.
L 67-A/2007 DE 12/31 ART90-A.
DL 105/71 DE 03/26.
EBFISC01 ART4 ART11.
CONST76 ART8 ART103.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0888/07 DE 2008/01/31.; AC STA PROC0810/08 DE 2009/01/21.; AC STA PROC0732/09 DE 2010/02/24.; AC STA PROC0477/09 DE 2009/10/28.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do contencioso tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 - RELATÓRIO – Processo nº 1444/13-30

A…………….., S.A., melhor identificada nos autos, deduziu impugnação judicial do indeferimento do despacho da Direcção de Finanças de Lisboa, que por sua vez, indeferiu a reclamação graciosa por si apresentada contra o acto de liquidação adicional de IRC e juros compensatórios referente ao exercício de 2007, no montante de € 12.292.60.

Por decisão de 26 de setembro de 2012, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra julgou improcedente a presente impugnação.

Inconformada com o assim decidido, interpôs a recorrente, o presente recurso com as respectivas alegações que resumiu nas seguintes conclusões:
«i. Segundo o relatório de inspecção, A motivação da liquidação reside, sumariamente, no facto de os sujeitos passivos não residentes (beneficiários dos rendimentos) não terem não terem apresentado os formulários modelos 12-RFI para os rendimentos de serviços prestados.
ii. Analisada a CDT em causa, não se vislumbra uma única disposição que impusesse, aos não residentes, a exibição prévia, perante a Recorrente, de qualquer “meio de prova” para aplicação do regime legal previsto nessas CDT e, muito menos, que impusesse, aos não residentes, a exibição, perante as autoridades fiscais Portuguesas, de qualquer formulário “Modelo 12-RFI”.
iii. A propósito pode-se referir ainda o determinado no próprio art. 24.º do modelo das Convenção onde se refere “Os nacionais de um Estado contratante não ficarão sujeitos no outro Estado contratante a nenhuma tributação ou obrigação com ela conexa diferente ou mais gravosa do Que aquela a que estejam ou possam estar sujeitos os nacionais desse outro Estado que se encontrem na mesma situação, em especial no que refere à residência.”
iv. Quanto à certificação a efectuar às entidades pagadoras francesas, o procedimento previsto passa pela entrega de um documento sem exigências formais (établi sur papier libré) que ateste o conjunto das condições requeridas para a aplicação das disposições previstas na convenção.
v. Não pode o legislador ordinário nacional impor obrigações legais declarativas a não residentes em território nacional, nem impor às autoridades fiscais de outros países a certificação de formulários não aprovados por aquelas muito menos em violação das normas de direito internacional convencional, acordadas entre as competentes autoridades dos países em confronto — pelo que o artigo 90.º do CIRC, na interpretação que aqui lhe é conferida pelo Tribunal a quo, padece de inconstitucionalidade material designadamente por violação do disposto naquele artigo 8.º n.º 2 da CRP.
vi. O TJCE tem invariavelmente considerado:
- QUE (Como se verifica, por Exemplo, nos Acórdãos 107/94 Asscher; 118/96 Safir; 264/96 ci; 294/97 Eurowings; 307/97 Saint Gobain; 35/98 Verkooijen; 55/98 Vestergaard; 141/99 Amid; 136/00 Danner; 290/04; Fkp Scorpio; 345/04 Centro Equestre; 346/04 Conijn; 386/04 Stauffer; 471/04 Keller) embora a fiscalidade directa seja da competência dos Estados-Membros, não é menos verdade que estes últimos a devem exercer no respeito do direito comunitário (sic, processo C-264/96 ici, parágrafo 19);
- QUE”(…) não se pode justificar, a título da eficácia dos controlos fiscais, uma regulamentação nacional que, de forma absoluta, impede o contribuinte de apresentar tais provas” – (Sic. Processo C-386/04 Stauffer, parágrafo 49).
- QUE “os contribuintes residentes e não residentes estão em situações comparáveis, pelo que uma disposição que recusa a possibilidade dessa dedução aos não residentes constitui uma restrição proibida” – (Sic. Processo C-346/04 Conijn, parágrafo 24, destaque Nosso).
vii. No caso em apreço, a Recorrente vê-lhe ser imputado um ónus a que não consegue dar satisfação por motivos que lhe são alheios uma vez que as entidades com quem se relaciona, sedeadas em outros Estados Membros, naturalmente não se acham vinculadas ao preenchimento de formulários previstos apenas na lei portuguesa.
viii. Como refere a nossa doutrina “Trata-se inegavelmente, de aberrante e perverso mecanismo, que consagra o triunfo da burocracia cega sobre a racionalidade jurídica (...) a imposição de um (inconstitucional) empréstimo forçado. A irracionalidade e o carácter caprichoso do mecanismo em causa mais se acentua (...) o substituto tributário, fica na dependência da vontade de uma autoridade pública estrangeira, que pode recusar-se a pratica tal acto, alegando incompetência ou falta de previsão na lei interna (...) – (Alberto Xavier, 2007, Direito tributário internacional, Almedina, p.541, destaque nosso).
ix. «O sistema consagrado no art.º 90.º do CIRC parte de uma desarrazoada suspeição e desconfiança quanto aos meios de prova da residência (...) usuais no comércio jurídico entre partes de boa-fé, para — quase num delírio de burocracia perfeccionista — chegarem a exigirem uma manifestação de uma autoridade pública estrangeira, tornando a prova para o cidadão comum uma kafkiana probatio diabólico (idem).
x. O artigo 90.º do CIRC é materialmente inconstitucional por violação do princípio da proporcionalidade, se interpretado no sentido de que impõe ao sujeito passivo o cumprimento de uma obrigação que, em rigor, depende da vinculação de uma entidade terceira — corporizando, em determinadas situações, uma obrigação impossível de ser cumprida.
xi. O TJCE tem vindo a considerar, de uma forma bastante abrangente e sucessivamente reiterada, que “Segundo jurisprudência constante, a livre prestação de serviços, enquanto princípio fundamental do Tratado, só pode ser limitada por disposições justificadas por razões imperiosas de interesse geral aplicáveis a qualquer pessoa ou empresa que exerça uma actividade no território do Estado-Membro destinatário Essas restrições devem designadamente ser adequadas para garantir a realização do objectivo que prosseguem e não devem ir além do necessário para o atingir. – (“Sic, Processo C-398/95 Ergasias, parágrafo 21, destaque nosso, e, no mesmo sentido, acórdãos de 25 de Julho de 1991, Ságer, n.º 15; Gouda e o., C-288/89, Colect., p. -4007, nºs 13 a 15; de 31 de Março de 1993, Kraus, C-19/92, Colect., p. I- 1663, n.º32, e de 30 de Novembro de 1995, Gebhard, c-55/94, Colect., p. -4165, n.º 37)”. sendo “um tratamento fiscal desfavorável contrário a uma liberdade fundamental não pode justificar-se pela existência de outras vantagens fiscais” – (sic.processo C- 35/98 verkooijen, parágrafo 61, destaque nosso).
xii. A imposição de cumprimento de formalidades administrativas - mormente o preenchimento de “formulários” a empresas sedeadas em países estrangeiros — como condição para a não imposição de dupla tributação, viola, de forma crassa os princípios da liberdade de estabelecimento, da liberdade de circulação e da não descriminação — estabelecidos no Tratado da União Europeia (C 83/54) na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (2007/C 303/01) e na Directiva 2006 do Parlamento Europeu e do Conselho (Relativa aos serviços no mercado interno – jornal oficial L 376 de 27.12.2006).
xiii. Ficou decidido pelo TJCE que “aplicação das regulamentações nacionais do Estado-Membro de acolhimento aos prestadores de serviços é susceptível de proibir, perturbar ou tornar menos atractivas as prestações de serviços, na medida em que implique despesas, bem como encargos administrativos e económicos suplementares.” (Sic, Processo C-290/04, FKP Scorpio Konzertproduktionen GmbH, parágrafo 46, 47 e 49, destaque nosso, e no mesmo sentido acórdãos de 15 de Março de 2001, Mazzoleni e ISA, c-165/98, colect., p. 1-2189, n.º 24, e de 25 de Outubro de 2001, Finalarte e o., processos apensos c-49/98, C-50/98, c-52/98 a c-54/98 e c-68/98 a c-71/98, colect., p. 1-7831, nº 30).
xiv. E que “(...) o facto de, mesmo quando o prestador de serviços não residente tenha informado o devedor da remuneração do montante das suas despesas profissionais directamente relacionadas com as suas actividades, ter de se dar início a um procedimento de reembolso a posteriori das referidas despesas é susceptível de prejudicar a realização de prestações de serviços Com efeito, na medida em que tal procedimento acarreta encargos administrativos e económicos suplementares e se impõe inevitavelmente ao prestador de serviços, a legislação fiscal em causa constitui um entrave à livre prestação de serviços, proibido, e princípio, pelos artigos 59° e 60° do Tratado CEE” (idem).
xv. Se a Administração Fiscal duvidava do facto de os prestadores serem efectivamente residentes e estarem sujeitos a tributação em França, cabia-lhe solicitar as competentes informações junto das entidades congéneres — na medida em que a CDT em questão contém uma disposição legal específica, relativa a “troca de informações”.
xvi. Ao invés do referido pelo Tribunal a quo, em lado algum da CDT em causa se retira que os mecanismos de cooperação apenas serão colocados em marcha em caso de dúvida quanto aos certificados apresentados - outrossim, a cooperação justificar-se-á em todos os casos em que se obtenham “ úteis para assegurar o lançamento e cobrança regulares dos impostos abrangidos por esta Convenção — mormente quando o sujeito passivo não logre a obtenção desses certificados, por recusa do respectivo operador.
xvii. Com efeito, a preocupação do legislador nacional foi evitar a dupla tributação internacional dos mesmos rendimentos; é essa a ratio das CDT, acordos internacionais celebrados entre países — pelo que não pode a preocupação da Administração Fiscal Portuguesa residir em salvaguardar, exclusivamente, a tributação do lado de Portugal, abstraindo-se da dupla tributação internacional Que dessa actuação advém.
xviii. Existem vários diplomas que visam criar e aprofundar os mecanismos de cooperação fiscal ao nível da comunidade podendo destacar-se como exemplo, a Directiva 77/799/CEE do Conselho, de 19 de Dezembro de 1977, relativa à assistência mútua das autoridades competentes dos Estados-Membros no domínio dos impostos directos e dos impostos sobre os prémios de seguro (com as alterações dadas pelas Directivas 79/1070/CEE; 92/12/CEE; 2003/93/CE; 2004/56/CE; 2004/106/CE; 2006/98/CE.) a Directiva 92/12/CEE do Conselho, de 25 de Fevereiro de 1992, relativa ao regime geral, à detenção, à circulação e aos controlos dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo (com as alterações dadas pelas Directivas 92/108/CEE; 94/74/CE; 96/99/CE; 2000/44/CE; 2000/47/CE; 2004/106/CE e Regulamento (CE) n 807/2003) ou; a Directiva 2003/48/CE do Conselho, de 3 de Junho de 2003, relativa à tributação dos rendimentos da poupança sob a forma de juros (Com as alterações dadas pelas Directivas 2004/66/CE e 2006/98/CE.)
xix. É aqui indispensável, também, a referência a um instrumento criado na sequência da já citada Directiva 77/799/CEE e do Regulamento 218/92, actualmente a funcionar ao nível comunitário com o nome “Sistema de Intercâmbio de Informações sobre o IVA” (VIES).
xx. Afigura-se que, do mesmo modo - e com base nos mesmos princípios da cooperação e controlo oficiosos - a Administração Fiscal não se poderia simplesmente demitir de diligenciar pela obtenção de informação sobre a efectiva residência fiscal das entidades em causa, não só atendendo ao princípio de colaboração com o contribuinte, ou em cumprimento do princípio do inquisitório, mas, sobretudo, de modo a honrar o compromisso assumido pelo Estado na CDT evitando ou mitigando a dupla tributação económica.
xxi. Na verdade, “sujeito passivo assiste o direito de solicitar que seja a administração a obter tal informação junto da sua congénere do outro Estado o que, por regra, não poderá ser recusado, atento ao princípio da investigação (da procura da verdade material) que preside ao procedimento e ao processo tributários – (Rui Duarte Morais, Apontamento ao IRC, Almedina, 2007, p. 213)” sendo que “Quer o sistema comunitário quer as convenções prevêem mecanismos de troca de informações entre as administrações dos Estados, os quais não visam apenas proteger os seus interesses fazendários mas, também assegurar a efectivação dos direitos que para os neles residentes resultam dos textos convencionais Estamos perante o chamado efeito “escudo” (shield) amplamente reconhecido” – (idem).
xxii. Efectivamente, “é necessário acautelar que os formalismos, por mais legítimos que sejam os objectivos que presidem à sua instituição, não se sobreponham aos objectivos e superiores interesses que presidiram à assinatura dos ADT e ao fim útil que lhes é inerente – (Carlos Loureiro e Paulo Rodrigues, op. Cit., p. 187).
xxiii. Ao não efectuar quaisquer diligências oficiosas para aferir da efectiva aplicação das CDT nos casos vertentes, a AF não actuou segundo os princípios do inquisitório e da verdade material, que deveriam nortear a sua actuação – (Artigos 58º e 59º nº1 da LGT, e 6ºA do CPA) sobretudo em circunstâncias em que o Contribuinte se viu perante uma verdadeira diabólica probatio.
Nestes termos e nos melhores de direito, deve conceder-se provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, o que se faz por obediência à Lei e por imperativo de JUSTIÇA!»

Não foram apresentadas contra alegações.

O Ministério Público, neste STA, emitiu parecer pronunciando-se pela total improcedência do presente recurso e, consequentemente, pela manutenção do julgado.
2 - Fundamentação
O Tribunal “a quo” deu como provada a seguinte matéria de facto:
A) A Impugnante desenvolve a título principal, a actividade de construção, administração e exploração de centros comerciais, de hipermercados e de outros estabelecimentos congéneres, nos quais são comercializados bens tanto do sector alimentar (produtos de grande consumo e produtos frescos) como do setor não alimentar (bazar, têxtil e electrodomésticos) enquadrando-se no CAE 05.2111. (Doc. fls.52/85 do processo administrativo tributário apenso)
B) A Impugnante encontra-se enquadrada em sede de IRC pelo regime geral da tributação. (Doc.fls.52/85 do processo administrativo tributário apenso)
C) No cumprimento da Ordem de Serviço n.º 200900233 foi levada a efeito o procedimento de inspeção externa aos elementos contabilísticos da Impugnante, relativo ao exercício de 2007. (Doc. fls. 52/85 do processo administrativo tributário apenso)
D) Na sequência do procedimento de inspeção a que alude a aI. C) do probatório, foi elaborado o Relatório de Inspeção Tributário (RIT) do qual se transcrevem as seguintes passagens:
«111.2 Imposto em Falta
111.2.1 Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas — IRC
111.2.1.2 Retenções na Fonte de IRC — Rendimentos pagos a entidades não residentes
A empresa A……………., S.A. efectuou pagamentos a entidades sem sede ou direcção efectiva em território português relativos a prestações de serviços realizados ou utilizados em território português.
(...)
Neste âmbito, solicitou-se à empresa as contas correntes de todas as entidades não residentes, referentes a serviços realizados/ou utilizados em território nacional; bem como também os formulários RFI preenchidos.
Face ao previsto no nº. 5 do artigo 90°-A do CIRC quando não seja efectuada a prova até à data em que deve ser efectuada a retenção na fonte, fica o substituto, neste caso, a sociedade inspeccionada, obrigada a entregar a totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos da lei.
Ora, uma vez que em relação aos pagamentos efectuados às entidades não residentes referidas no Anexo IV — Folha 65; não foram cumpridos os preceitos legais, nomeadamente a prova exigida nos termos do n.º 5 do artigo 90°-A do CIRC, encontra-se preenchido o pressuposto de facto e de direito da obrigação da empresa em analise de entregar o valor da retenção na fonte sobre os montantes pagos, à taxa de 15% prevista na alínea e) do n.º 2 do artigo 80° do CIRC, conforme cálculos constantes do referido anexo.
Assim sendo, considera-se que existe imposto em falta, no montante de 11.856,80 Euros, e que são devidos juros compensatórios, nos termos do artigo 35° da LGT do artigo 94° e n.º2 do artigo 106º ambos do CIRC, desde o dia imediato aquele em que as retenções deveriam ter sido entregues até à data do pagamento ou liquidação, sendo responsável; a A……………., S.A.». (Doc. fls. 52/85 do processo administrativo tributário apenso).
E) Em 27.10.2009, com base nas correcções efectuadas foi emitida a liquidação adicional de IRC n.º 2009 6420000854, no montante de € 11.356.80. (Doc. fls. 38 do processo administrativo tributário apenso).
F) Em 30.03.2012, a Impugnante deduziu reclamação graciosa contra o ato de liquidação tributário a que alude a al. E) do probatório. (Doc. fls. 49/58 dos autos)
G) Mediante despacho proferido a 21.10.2010, o Chefe de Divisão da Direção de Finanças de Lisboa indeferiu a reclamação graciosa a que alude a al. F) do probatório. (Doc. fls. 49/58 dos autos)
H) Com vista à cobrança coerciva da liquidação impugnada, foi instaurado o processo de execução fiscal n.º 3522201184164. (Doc. fls. 37 do processo administrativo tributário apenso)
I) Consta a fls. 41 do processo administrativo tributário um print informático extraído pela Gestão de Fluxos Financeiros da qual consta designadamente o seguinte:
«2010-05-21 — GARI Associação de Garantia N.° 126 de 2010»; « 2010-05-21F100 Suspensão do Processo»
J) Em 12.11.2012, deu entrada em juízo a petição inicial que originou os presentes autos. (Cfr. carimbo aposto a fls. 3 dos autos)
3- DO DIREITO:
Segmento da sentença do TAF de Sintra fls. 127
(…)
A Impugnante contesta a legalidade do apuramento da liquidação de imposto no montante de € 11.356,80 respetivos juros compensatórios de €935,80, refletivos na liquidação adicional de IRC em crise em consequência de correções efetuadas por falta de retenção na fonte de IRC ocorrida aquando o pagamento de prestações de serviço efetuadas no montante de € 75.712,00 às entidades “………… SARL” E ……….. — HEAD Office” considerados como rendimentos obtidos em território nacional e sujeitos à taxa de tributação de 15% prevista na al. e) do n°2 do artigo 80° do CIRC. Alega, em síntese, que da sua parte fez todas as diligências a seu alcance, junto dos prestadores de serviços, mas estes recusaram-se a preencher formulários que nem sequer reconheciam e eram inteiramente estranhos nas respectivas legislações internas. E, se a Administração Tributária, tendo ao seu dispor canais privilegiados de obtenção de informações com as suas congéneres estrangeiras, não pode imputar aos contribuintes nacionais a execução de tarefas probatórias onerosas e desproporcionais com os objectivos pretendidos.
A primeira questão que se coloca nestes autos é a de saber se o artigo 90° do CIRC e o Despacho Ministerial n.º 11701/2003, de 28.5., publicado no DR. n.º 138, II Série de 17.6.2003, se mostram desconforme com a Convenção para Evitar a Dupla Tributação, entre Portugal e França (aprovado pelo DL n.º 105/71, 26.08, tendo a troca de instrumentos de ratificação ocorrido em 18.10.1972) Vejamos.
É sabido que as Convenções sobre dupla tributação constituem um complexo de normas convencionais que atribuem a competência tributária ao Estado da residência fiscal dos beneficiários dos rendimentos em prejuízo do Estado da fonte.
Prevê o artigo 4.° da Convenção para Evitar a Dupla Tributação, entre Portugal e França (aprovado pelo DL n.º 105/71, 26.08, tendo a troca de instrumentos de ratificação ocorrido em 18.10.1972) que residente de um país “… significa qualquer pessoa que, por virtude da legislação desse Estado, está aí sujeita a imposto devido ao seu domicílio, à sua residência, ao local de direcção, ao local de constituição ou qualquer outro critério de natureza similar....”
Daí que resulte evidente que a certificação das residências para efeito do accionamento das Convenções terá de ser feito pelas Autoridades Fiscais do Estado do qual o beneficiário dos rendimentos se considera residente.
Por outra parte, não são as Convenções que regulamentam os procedimentos a adoptar para a comprovação dos pressupostos legais para a sua aplicação e de que depende a exclusão da incidência do imposto.
Pelo contrário, são as próprias Convenções que prevêem ser as autoridades competentes dos Estados contratantes que determinam as modalidades de aplicação da Convenção (artigo 30.° da Convenção citada) estabelecendo uma série de requisitos que devem ser comprovados pelos Estados contratantes.
E, como se expende no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 17.12.2009, proferido no rec. n.º 320/09: b «As convenções em causa, elas próprias; não regulam todos os aspectos para que veio contemplar a não retenção na fonte, dos rendimentos distribuídos entre a sociedade nacional e as entidades não residentes, desta forma carecendo de uma intervenção legislativa do legislador do Estado outorgante para colmatar as faltas e insuficiências das convenções; como seja a propósito do que entende por domicílio fiscal e o momento em que este e outros requisitos necessários à aplicação das convenções, devem ser apresentados.» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt) É neste contexto que surge a previsão normativa constante do n.º 4 do artigo 90.º do CIRC, na redacção então em vigor (Lei n.º 32-B/2002, de 30/12), ao estabelecer que: “Quando não seja efectuada a prova até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto, fica o substituto tributário obrigado a entregar a totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos da lei».
Complementarmente, em execução, explícita, do estatuído neste artigo 90.° CIRC, foi emitido, pela, então, Ministra das Finanças, o Despacho n.º 11701/2003, de 28.5., publicado no DR. nº 138, II Série de 17.6.2003, que aprovou “os formulários destinados a permitir a aplicação dos benefícios previstos nas convenções para evitar a dupla tributação internacional celebradas por Portugal”, sendo, de forma específica e privativa, criados os Modelos RFI, n.ºs 7 a 12, para permitir a dispensa, total ou parcial, de retenção na fonte do IRC.
O que significa que a apresentação no prazo estabelecido para a entrega do imposto cominado da prova da não residência configura um pressuposto essencial para a aplicação da aludida Convenção «(…) só então se podendo afirmar que o Estado português abdica do seu poder de tributação e, nessa medida, dispensa a retenção na fonte do IRC devido por parte da entidade que, em princípio, estava obrigada e efectua-la. Torna-se deste modo legítimo à AT exigir tal imposto ao substituto tributário, enquanto responsável pela retenção que não foi efectuada, sem que tal actuação viole as convenções internacionais e, muito menos; o disposto no artigo 8.º n.º 2 da CRP-cfr. acórdão de 81-01-08, no processo n.º 888/07.
Torna-se, deste modo, legítimo à AT exigir tal imposto ao substituto tributário, enquanto responsável pela retenção que não foi efectuada, sem que tal actuação viole as convenções internacionais e, muito menos, o disposto no artigo 8.º n.º 2 da CRP-cfr. acórdão de 31-01-08, no processo n.º 888/07.» (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 21.01.2009, proferido no rec. n.º 810/08, disponível em texto integral em www.dgsi.pt)
Assim sendo, não tendo a Impugnante comprovado os pressupostos de aplicação (residência fiscal dos prestadores de serviços em causa) neste caso, da dispensa de retenção na fonte, fica obrigada a entregar a totalidade do imposto que deveria ter deduzidos nos termos gerais. (neste sentido, vide o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 21.1.2009, rec. n.º 810/08-30).
Alega ainda, a Impugnante que efectuou «(...)todas as diligências ao seu alcance, pessoais e por escrito, junto dos ditos prestadores de serviços não residentes mas estes recusaram-se a preencher formulários que nem sequer reconheciam e eram inteiramente estranhos nas respectivas legislações internas.», considerando assim, que competia à Administração Tributária solicitar as informações tendentes a confirmar a residência fiscal das entidades em causa, o que poderia, e deveria fazer ao abrigo das CDT. Mais considera que o ónus da prova que sobre si impende é manifestamente desproporcional.
É, verdade que a Convenção entre Portugal e a França para evitar a dupla tributação prevê o mecanismo de troca de informações no seu artigo 26° mas este apenas aplicável no caso de resultarem dúvidas quanto aos certificados apresentados pelo contribuinte e nunca perante a falta total da respectiva apresentação. (neste sentido vide o Acórdão citado).
Defende ainda a Impugnante a aplicação ao caso em apreço do artigo 90°, n.º 4 do CIRC (redacção da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro).
Vejamos.
Estabelece o n.º 4 do artigo 48.° da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro:
«4 — O afastamento da responsabilidade prevista no n.º 4 do artigo 90.° e no n.º 6 do artigo 90°-A do Código do IRC na redacção que lhes foi dada pela presente lei, é aplicável às situações anteriores à entrada em vigor da mesma, independentemente de já ter sido efectuada a liquidação do imposto, excepto quando tenha havido lugar ao pagamento do imposto e não esteja pendente reclamação, recurso hierárquico ou impugnação.»
Esta norma, ao determinar a aplicação retroactiva do novo regime de limitação da responsabilidade do substituto, constitui um reconhecimento explícito de que era ilegal a imputação de responsabilidade ao substituto tributário quando comprovasse a verificação dos pressupostos para a dispensa total ou parcial de retenção
Todavia no caso trazido a juízo, a Impugnante não demonstrou a verificação de tais pressupostos, assim contrariamente ao que defende não reúne os requisitos previstos para afastar a sua responsabilidade, enquanto substituto tributário, pela entrega da totalidade do imposto que deveria ter deduzido nos termos legais.
DO PEDIDO DE ANULAÇÃO DOS JUROS COMPENSATÓRIOS
(…)
DO PEDIDO DE CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE INDEMNIZAÇÃO PELA PRESTAÇÃO INDEVIDA DE GARANTIA
(…)
V.SEGMENTO DECISÓRIO
Termos em que se decide julgar totalmente improcedente a presente impugnação, e em consequência:
i) mantêm-se na Ordem Jurídica o ato tributário sindicado;
ii) absolve-se a Administração Tributária quando ao pedido de condenação consubstanciado no pagamento de encargos incorridos com a prestação de garantia indevida.

DECIDINDO NESTE STA
Suscitam-se nos presentes autos questões de constitucionalidade, designadamente do artigo 90.º do CIRC, na interpretação que lhe é conferida pelo Tribunal a quo, que no dizer da recorrente padece de inconstitucionalidade material, designadamente por violação do disposto naquele artigo 8.º nº 2 da CRP e do princípio da proporcionalidade.
Suscita-se ainda a questão de saber se está correcta a exigência de imposto relativo a retenções na fonte quanto a rendimentos pagos a não residentes, discutindo-se a questão da aplicação das CDT’s celebradas por Portugal com os países da residência dos beneficiários dos rendimentos e, muito concretamente, a exigência da verificação do requisito formal da prévia apresentação de formulário certificado pelas autoridades fiscais do estado da residência do beneficiário dos rendimentos.
DA ALEGADA INCONSTITUCIONALIDADE

A legislação relativa à prova da verificação dos pressupostos que resultem de convenção destinada a eliminar a dupla tributação corporiza-se presentemente no art. 98.º do CIRC, que corresponde ao art. 90º-A do CIRC, em vigor antes do DL nº. 159/2009, de 13/07, que republicou esse complexo normativo.
O art. 90-A do CIRC só foi aditado pelo DL 211/05, de 7.12 e apenas entrou em vigor em 01/01/2006 sendo que a consagração legislativa dos requisitos formais para accionamento das CDT’s apenas ocorreu com a Lei n.º 32-B/2002, de 31.12.
No exercício em causa (2007) regiam os arts. 90.º e 90-A do CIRC, na redacção anterior à Lei n. 67-A/2007, de 31 de Dez.
E, nos termos do nº 4 do artº 90º do CIRC na redacção então em vigor (Lei 32/B/2002 de 30/12) quando não fosse efectuada a prova de que por força de uma convenção destinada a eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal, a competência para a tributação dos rendimentos auferidos por um residente de outro Estado contratante não era atribuída ao Estado da fonte, ficava o substituto tributário obrigado a entregar a totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos da lei.
A recorrente não apresentou documentos comprovativos da residência fiscal das empresas que lhe prestaram os serviços o que determinou a Administração Fiscal a exigir à recorrente o imposto não retido em discussão nos presentes autos.
Entendimento que a recorrente alega, então, violar as convenções internacionais em causa e o disposto nos artigos 8.º e 103.º da CRP além de outros princípios a que infra nos referiremos.
Mas não tem razão. Como se disse no acórdão deste STA de 31/01/2008 tirado no recurso nº 0888/07:
Sucede que não são as referidas convenções que regulamentam os procedimentos a observar para a comprovação dos pressupostos legais da sua aplicação e de que depende a exclusão de incidência do imposto.
Pelo contrário, são as próprias convenções que prevêem ser as autoridades competentes dos Estados contratantes que determinam as modalidades de aplicação da convenção (artigo 30.º da Convenção para evitar a Dupla Tributação entre Portugal e França - DL 105/71, de 26/3), estabelecendo uma série de requisitos que hão-de ser comprovados pelos Estados contratantes.
É, pois, assim a estes que incumbe verificar se o beneficiário da exclusão de incidência de imposto provou ou não estar em condições de beneficiar da aplicação da Convenção.
Ora, estabelecendo o n.º 4 do artigo 90.º do CIRC que essa prova tem de ser feita até ao momento de entrega do imposto, o que não sucedeu neste caso, é óbvio que é legítimo à AF exigir tal imposto ao substituto tributário, responsável pela retenção que não foi efectuada, sem que tal actuação viole de alguma forma as convenções internacionais que Portugal assinou e às quais está subordinado e, muito menos, a CRP, designadamente os artigos mencionados.
Como do mesmo modo a interpretação que a sentença recorrida fez do n.º 4 do artigo 90.º do CIRC não viola os artigos 4.º e 11.º do EBF, como pretende a recorrente, com o fundamento de que o reconhecimento dos benefícios fiscais tem natureza declarativa e não constitutiva do direito ao benefício fiscal, pelo que o nascimento desse direito se deve reportar sempre ao momento da verificação dos respectivos pressupostos legais e não ao momento da prática do próprio reconhecimento.
Só que esquece a recorrente que as medidas para evitar a dupla tributação económica internacional e interna não são benefícios fiscais mas sim desagravamentos fiscais (exclusões fiscais ou situações de não sujeição tributária – artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 do EBF) – v. também neste sentido Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, 1998, vol. 1, pág. 334.
Tratando-se, com efeito, de situações de exclusão de incidência de imposto destinadas a evitar ou minorar os efeitos do concurso real entre normas de vários ordenamentos jurídicos incidindo sobre as mesmas manifestações de riqueza, não lhes é, pois, aplicável o disposto nos citados normativos do EBF.
Improcede, por isso, toda a argumentação da recorrente quanto a esta questão(…)”.

Acresce referir que no seu n.º 2 estabelecia o art. 90.º - A do CIRC nomeadamente o seguinte:
« (…) os beneficiários dos rendimentos devem fazer a prova perante a entidade que se encontra obrigada a efectuar a retenção na fonte, até à data em que ocorre essa obrigação:
a) Da verificação dos pressupostos que resultem de convenção destinada a eliminar a dupla tributação ou de um outro acordo de direito internacional ou ainda da legislação interna aplicável, através da apresentação de formulário de modelo a aprovar por despacho do Ministro das Finanças certificado pelas autoridades competentes do respectivo Estado de residência;
b) Da verificação das condições e do cumprimento dos requisitos estabelecidos no artigo 89.º-A através de formulário de modelo a aprovar pelo Ministro das Finanças que contenha os seguintes elementos:
1) Residência fiscal da sociedade beneficiária dos rendimentos e, quando for o caso, da existência do estabelecimento estável, certificada pelas autoridades fiscais competentes do Estado membro da União Europeia de que a sociedade beneficiária é residente ou em que se situa o estabelecimento estável;
(…)»
Assim, sem qualquer dúvida, não sendo efectuada essa prova até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto, ficaria o substituto tributário obrigado a entregar a totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos da lei (nº 4 do mesmo art. 90º-A do CIRC).
E é inequívoco que a partir da redacção introduzida pela Lei 32-B/2002, de 30 de Dezembro à norma do n.º 3 do art. 90º do CIRC, passou a ser obrigatório que o devedor fizesse prova dos requisitos formais, sob pena da retenção ser feita à taxa normal (destaque nosso).
E, face a este quadro legislativo, não merece reparo a sentença recorrida que, acolhe a jurisprudência deste Supremo Tribunal sobre a matéria (cfr., designadamente, o supra referido acórdão de 31.08.2008, e ainda os de 21.01.2009 e 24.02.2010, in, recs. 810/08 e 732/09, respectivamente). Não opera, pois, ofensa do disposto no art. 8º nº 2 da CRP.
Acresce referir aqui, a título complementar/elucidativo, que a legislação sobre esta matéria dos ditos formulários teve algum desenvolvimento após a referida Lei 32-B/2002, de 30 de Dezembro designadamente com a entrada em vigor da Lei n.° 67-A/2007, de 31 de Dezembro, a qual no n.° 4 do seu art. 48.°, determina a aplicação retroactiva do regime por ela introduzido nos arts. 90.°, n.° 4, e 90.°-A n.° 6 do CIRC.
Daí que no acórdão deste STA de 22/06/2011 tirado no recurso 0283/11 se tenha afirmado que:
“I - Face à nova redacção dada pela Lei n.° 67-A/2007, de 31/12 (OE/2008), aos então art.°s 90.° e 90.°-A do CIRC, a prova da residência dos beneficiários de rendimentos auferidos em Portugal, para efeitos de dispensa de retenção na fonte, em conformidade com o disposto nos actuais art.ºs 97.° e 98.° do CIRC, pode ser efectuada a posteriori.”
E, este aresto surge na sequência do acórdão deste STA de 28/10/2009 tirado no recurso n° 0477/09 onde se expressara:
“Com a redacção de 2007, o art. 90°-A do CIRC, em cujos n.°s 1, 2, 3, 5 e 6 se passou a estabelecer o seguinte:
1 – Não existe obrigação de efectuar a retenção na fonte de IRC, no todo ou em parte, consoante os casos, relativamente aos rendimentos referidos no n.° 1 do artigo 88.º do Código do IRC quando, por força de uma convenção destinada a eliminar a dupla tributação ou de um outro acordo de direito internacional que vincule o Estado Português ou de legislação interna, a competência para a tributação dos rendimentos auferidos por uma entidade que não tenha a sede nem direcção efectiva em território português e aí não possua estabelecimento estável ao qual os mesmos sejam imputáveis não seja atribuída ao Estado da fonte ou o seja apenas de forma limitada.
2 – Nas situações referidas no número anterior, bem como na alínea g) do n.° 2 do artigo 80.°, os beneficiários dos rendimentos devem fazer prova perante a entidade que se encontra obrigada a efectuar a retenção na fonte, até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos das normas legais aplicáveis:
a) Da verificação dos pressupostos que resultem de convenção destinada a eliminar a dupla tributação ou de um outro acordo de direito internacional ou ainda da legislação interna aplicável, através da apresentação de formulário de modelo a aprovar por despacho do Ministro das Finanças certificado pelas autoridades competentes do respectivo Estado de residência;
(...)
3 – Os formulários a que se refere o número anterior, devidamente certificados, são válidos por um período máximo de:
5 – Sem prejuízo do disposto no número seguinte, quando não seja efectuada a prova até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto, e, bem assim, nos casos previstos nos n.°s 3 e seguintes do artigo 14.°, fica o substituto tributário obrigado a entregar a totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos da lei
6 – Sem prejuízo da responsabilidade contra-ordenacional, a responsabilidade estabelecida no número anterior pode ser afastada sempre que o substituto tributário comprove com o documento a que se refere o n.° 2 do presente artigo e os n.°s 3 e seguintes do artigo 14.°, consoante o caso, a verificação dos pressupostos para a dispensa total ou parcial de retenção.
Como resulta destas disposições, embora a não apresentação do formulário referido na alínea a) do n.° 2, pelos beneficiários dos rendimentos, até ao termo do prazo estabelecido para entrega do imposto gere as obrigações o substituto tributário efectuar a retenção de IRC e, quando não a tiver efectuado, entregar a totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido, admite-se, no n.° 6, que esta responsabilidade seja afastada sempre que o substituto tributário comprove com o documento referido no n.° 2 a verificação dos pressupostos para dispensa e retenção.
Por outro lado, o art. 48.°, n.° 4, da referida Lei n.° 67-A/2007, estabelece o seguinte:
4 – O afastamento da responsabilidade prevista no n.° 4 do artigo 90.º e no n.° 6 do artigo 90.°-A do Código do IRC, na redacção que lhes foi dada pela presente lei, é aplicável às situações anteriores à entrada em vigor da mesma, independentemente de já ter sido efectuada a liquidação do imposto, excepto quando tenha havido lugar ao pagamento do imposto e não esteja pendente reclamação, recurso hierárquico ou impugnação.
Assim, o afastamento da responsabilidade do substituto tributário previsto naquele n.° 6 do art. 90-A é de aplicação retroactiva, excepto se tiver havido lugar ao pagamento do imposto e não estiver pendente reclamação, recurso hierárquico ou impugnação.
A finalizar manifestamos, ainda, a nossa concordância com o parecer do Sr. Procurador Geral Adjunto neste STA quando expressa que não ocorre violação do princípio da proporcionalidade nos seguintes termos que fazemos nossos:
(...) Na verdade, como se refere no douto Acórdão deste Supremo Tribunal de 21.01.2009, in P. 0810/08 «(…) perante a necessidade de salvaguardar o direito do Estado a uma eficaz cobrança dos impostos, nada justificando, no caso, o incumprimento da obrigação de retenção na fonte do IRC devido pelos beneficiários dos rendimentos, posto que estes não tinham comprovado ser fiscalmente não residentes, a medida de responsabilização do substituto tributário perfilhado no n° 4 do artigo 90° do CIRC apresenta-se como adequada e ajustada.
Na verdade, a entidade obrigada a efectuar a retenção na fonte só deve eximir-se a tal obrigação no caso do beneficiário comprovar ser fiscalmente não residente, muito embora essa prova possa ser feita até ao termo do prazo do pagamento do imposto, daí se compreendendo a sua responsabilização pelo pagamento do imposto devido».
Não se vê, por outro lado, que a imposição do cumprimento de formalidades administrativas viole os princípios da liberdade de estabelecimento, da liberdade de circulação e da não discriminação uma vez que, salvo melhor entendimento, a mera imposição da prova da residência, instituída por forma a acautelar o direito do Estado a uma cobrança adequada dos impostos devidos, não corporiza qualquer regra de tributação diferenciada para residentes e não residentes ou tratamento fiscal desfavorável para os não residentes capaz de afrontar aqueles apontados princípios e, consequentemente, o ordenamento jurídico comunitário.
De resto, como se salienta no douto Acórdão deste Supremo Tribunal de 20.02.2013, in P. 01435/12, «(a) jurisprudência do Tribunal de Justiça revela, em termos genéricos, que o uso da residência como elemento de conexão, bem como a diferenciação fiscal entre sujeitos passivos residentes e não residentes, tanto na legislação interna dos Estados como nas Convenções sobre Dupla Tributação, é aceitável e não contraria as liberdades de circulação, nem consubstancia uma discriminação contrária aos Tratados Europeus, em virtude de os residentes e os não residentes não se encontrarem, em geral, em situações comparáveis, porque assentes numa diferença objectiva relevante entre os sujeitos passivos».
No que respeita à questão da troca de informações (Conclusões xv e xvi), de novo se remete para o douto Acórdão de 21.01.2009, in P. 0810/08, onde a esse propósito se refere que:
«Na verdade, pese embora o mecanismo de troca de informações previsto nos artigos 7.° e 26.° das referidas Convenções Internacionais, de resto apenas aplicável no caso de resultarem dúvidas quanto aos certificados apresentados pelo contribuinte e nunca à míngua total da respectiva apresentação, o certo é que o legislador interno se encontrava legitimado para exigir a certificação dos requisitos exigíveis à aplicação do regime aí previsto, mormente da residência do beneficiário, como decorre do Directiva n. 2003/49/CE, do Conselho, de 3 Junho (...)».
A concluir formulam-se as seguintes proposições:
1) Nos termos dos artigos 7.° das Convenções sobre dupla tributação celebradas entre Portugal e França (aprovada para ratificação pelo DL 105/71, de 26 de Março) os lucros de uma empresa de um Estado contratante só podem ser tributados nesse Estado, a não ser que a empresa exerça a sua actividade no outro Estado contratante por meio de um estabelecimento estável aí situado.
2) - Só que, nos termos do n.° 4 do artigo 90° do CIRC, na redacção então em vigor (Lei 32-B/2002, de 30 de Dezembro), quando não fosse efectuada, até ao momento de entrega do imposto, a prova de que, por força de uma convenção destinada a eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal, a competência para a tributação dos rendimentos auferidos por um residente de outro Estado contratante não era atribuída ao Estado da fonte, ficava o substituto tributário obrigado a entregar a totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos da lei.
3) - Tal interpretação não viola as referidas convenções internacionais, nem os artigos 8.° e 103.° da CRP, e muito menos os artigos 4.° e 11.° do EBF, pois as medidas para evitar a dupla tributação económica internacional e interna não são benefícios fiscais mas sim desagravamentos fiscais (exclusões fiscais ou situações de não sujeição tributária).
4) Do mesmo modo, também não resultam violados os princípios da liberdade de estabelecimento, da liberdade de circulação e da não discriminação uma vez que, a mera imposição da prova da residência, instituída por forma a acautelar o direito do Estado a uma cobrança adequada dos impostos devidos, não corporiza qualquer regra de tributação diferenciada para residentes e não residentes.

Assim sendo, e não tendo a ora recorrente logrado demonstrar os pressupostos de que dependia o afastamento da sua responsabilidade enquanto substituta tributária e não competindo à Administração Fiscal a tarefa de carrear a prova dos mesmos para os autos deve ser confirmada a sentença recorrida.
4- DECISÃO:
Pelo exposto, acordam os Juízes deste STA em negar provimento ao recurso confirmando a sentença recorrida.
Custas a cargo da recorrente.

Lisboa, 13 de Abril de 2016. – Ascensão Lopes (relator) – Pedro DelgadoAna Paula Lobo, vencida nos termos do voto em anexo.

Voto de vencida

Não acompanho a decisão adoptada, pelas razões que passo a indicar:

O impugnante desde a petição inicial que alegou ter efectuado todas as diligências ao seu alcance com vista a obter do seu fornecedor o formulário previsto na lei portuguesa para certificar a sede deste, fora do território nacional, em concreto em França, documento que haveria de ser certificado pelas autoridades tributárias francesas.

Trata-se de documento, certificação, que o impugnante não pode obter por si próprio dado tratar-se de comprovação da sede de um terceiro a efectuar por autoridades administrativas não nacionais.

A sentença recorrida procedeu à selecção dos factos provados e dos factos não provados, neles devendo suportar-se a decisão jurídica do pleito, tanto mais que os poderes de cognição deste Supremo Tribunal Administrativo se cingem a questões de direito. A selecção da matéria de facto, sobretudo quando enuncie, em conformidade com a lei os factos provados e não provados implica que, sem sombra de dúvida apurou os factos tidos por relevantes para a decisão da causa.

Ora, na situação presente cremos não poder ser dito o direito sem se definir se verdadeiramente, como alegou a impugnante, tentou ela por todos os meios ao seu alcance obter a certificação dos ditos formulários, ou, se pelo contrário nada fez nesse sentido, ou, pelo menos nada provou ter feito.

Não porque de algum modo consideremos que o art.º 90-A do código do IRC, em abstracto, afronta os ditames constitucionais, ou se apresenta como violador do direito comunitário, muito menos que a Administração Tributária tenha o dever de em todas as circunstâncias se substituir aos contribuintes no cumprimento dos deveres que a lei a estes impõe, seja qual for a falta que estes cometa, e só possa liquidar os tributos depois de esgotar todas as possibilidades de reunir elementos que a levassem a considerar que estes não são devidos. Porém, no caso concreto, tendo em conta que se trata de obter um documento certificativo da sede para efeitos fiscais de um contribuinte não sediado em Portugal, a verificação pelo tribunal de que tal se apresentava como uma prova de difícil ou muito difícil obtenção, em obediência ao princípio constitucional da proporcionalidade poderia conduzir a que, nessa particular situação fosse exigível que a Administração Tributária solicitasse ao abrigo do art.º 26.º da Convenção celebrada entre Portugal e a França para evitar a dupla tributação, a confirmação da sede do dito fornecedor, por tal se apresentar como uma informação útil para a liquidação do tributo em causa.

A convenção foi celebrada por Portugal e França no interesse de ambos os países porque a dupla tributação é perniciosa para ambos os países e ambos se comprometeram a evitá-la, reunidos que sejam os pressupostos para tanto definidos na Convenção.

A Administração tributária sujeita ao princípio da legalidade, tem como missão cobrar de forma eficaz os tributos devidos e, apenas os que sejam devidos.

Há formalidades previstas na lei nacional para certificação dessa residência:

hão-de ser cumpridas pelos contribuintes, mas nos limites do possível.

Deste modo, creio que há insuficiente suporte fáctico para que seja dito o direito na presente situação, pelo que determinaria a ampliação da matéria de facto.

Lisboa, 2016-04-13

Ana Paula Lobo