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Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0952/18.4BEPRT
Data do Acordão:01/08/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ
Sumário:I - Não nos dá o ordenamento jurídico-tributário a noção de litigância de má-fé, devendo ir buscar-se ao C.P.Civil, o qual se aplica supletivamente (cfr.artº.2, al.e), do C.P.P. Tributário; artº.104, da L.G.Tributária). Neste campo, o princípio geral a observar, decorrente do próprio direito de acção, consagrado no artº.20, da C.R.P., é o de que o processo deve proporcionar às partes a ampla e incondicionada possibilidade de dirimir, com intensidade, liberdade e abrangência, as suas razões de facto e de direito, segundo um espírito de razoabilidade e equilíbrio, mas igualmente sem inibições ou constrangimentos, que possam eventualmente advir do receio de futuras penalizações, assentes no entendimento que o Tribunal vier a adoptar sobre os temas em discussão. Em consonância com o disposto no artº.266-A, do C.P.Civil (cfr. artº.8, do actual C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), o qual impõe às partes o dever geral de probidade, estatui o artº.456, nº.1, do mesmo diploma legal (cfr.artº.542, nº.1, do actual C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) que será condenado em multa e indemnização à parte contrária, se esta a pedir, o litigante de má-fé.
II - Na descrição da figura do litigante de má-fé, o texto legal diz-nos que se deve considerar como tal aquele que actuando com dolo ou negligência grave (cfr.artº.542, nº.2, do C.P.Civil):
a-Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar (modalidade de dolo ou negligência grosseira substancial);
b-Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factualidade relevante para a decisão da causa (modalidade de dolo ou negligência grosseira substancial);
c-Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação ou use o processo ou os meios processuais de forma manifestamente reprovável (modalidades de dolo ou negligência grosseira instrumental).
III - O dolo ou negligência grosseira substancial dizem respeito à relação material ou de direito substantivo, enquanto o dolo ou negligência grosseira instrumental dizem respeito à relação jurídico-processual. No primeiro caso o litigante visa a obtenção de decisão de mérito que não corresponda à verdade e à justiça. No segundo a parte procura cansar o seu adversário, somente pelo espírito de fazer mal, ou na expectativa condenável de o desmoralizar, de o enfraquecer, de o levar a uma transacção injusta.
IV - Na base da má-fé encontra-se o seguinte vector essencial: consciência de não ter razão. É necessário que as circunstâncias do caso induzam o Tribunal a concluir que o litigante deduziu pretensão ou oposição conscientemente infundada. Com o instituto da litigância da má-fé pretende-se, pois, acautelar um interesse público de respeito pelo processo, pelo Tribunal e pela própria Justiça.
V - No caso “sub judice”, a sociedade recorrente não só deu azo a que o processo judicial de execução fiscal se prolongasse por mais de duas dezenas de anos, quando a dívida já se encontrava paga desde 13/05/1993 (informação que se impunha em face do dever de cooperação previsto no artº.542, nº.2, al.c), do C.P.Civil, ao Serviço de Finanças da Maia de que tinha ocorrido o pagamento voluntário da dívida exequenda), como ainda, sendo instada a pronunciar-se sobre a pretensão e sobre o alegado pagamento, se posicionou contra a pretensão da reclamante, mais tendo demorado a responder e a juntar os documentos comprovativos de tal pagamento voluntário, motivo da extinção da execução fiscal em causa (cfr.artº.264, nº.1, do C.P.P.T.; artº.343, nº.1, do C.P.T.). (sumário da exclusiva responsabilidade do relator)
Nº Convencional:JSTA000P25389
Nº do Documento:SA2202001080952/18
Data de Entrada:12/10/2019
Recorrente:A.... SA
Recorrido 1:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento: