Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01684/13
Data do Acordão:01/14/2015
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:IVA
PRESCRIÇÃO
INÍCIO DO PRAZO
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
Sumário:Estando em causa dívidas de IVA referentes ao ano de 2002 e sendo este imposto de obrigação única (e não um imposto periódico) o termo inicial do prazo de prescrição (de 8 anos) que se contava, à luz da inicial redacção do nº 1 do art. 48º da LGT, a partir da data da ocorrência dos respectivos factos tributários e não a partir do início do ano civil seguinte, passou a contar-se, por via da alteração que o art. 40º da Lei nº 55-B/2004 introduziu neste nº 1, a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do imposto, ou seja, no caso, a partir de 1/1/2003.
Nº Convencional:JSTA000P18456
Nº do Documento:SA22015011401684
Data de Entrada:11/01/2013
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A... E MULHER B...
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A Fazenda Pública recorre da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, na parte em que se julgou parcialmente procedente a oposição à execução fiscal deduzida por A…………. e B……………., ambos com os demais sinais dos autos, contra a execução fiscal nº 4219-2002/01002600 e apensos, instaurada para cobrança de dívidas de IVA, IRC, SISA, coimas e encargos, no montante global de € 101.255,86, inicialmente instaurada contra a sociedade C……………., Lda. e posteriormente revertida contra os oponentes.

1.2. Alega e termina com a formulação das conclusões seguintes:
A. Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou procedente a oposição deduzida contra o processo de execução fiscal instaurado para a cobrança coerciva de dívidas de IVA, IRC, Sisa e derivadas de coimas aplicadas em processos de contraordenação tributária e respetivos encargos, revertido contra os oponentes.
B. Decidiu a final o Meritíssimo Juiz a quo, conhecendo, das questões em causa no processo sub judice, entre outras, da prescrição das dívidas exequendas, declarando a prescrição das dívidas exequendas relativas ao IVA de janeiro, fevereiro e março de 2002.
C. Para assim decidir a douta sentença recorrida refere que, “(...) o IVA, enquanto imposto de obrigação única, prescreve no prazo de 8 anos a contar da data em que o facto tributário ocorreu”, e, quanto às dívidas a cuja declaração de prescrição se refere este recurso, que “resulta das certidões de dívida que os impostos em falta tinham como data limite de pagamento voluntário 11.03.2002, 10.04.2002, 10.07.2002 (...), pelo que as respetivas liquidações ocorreram necessariamente em datas anteriores”.
D. A sentença recorrida salienta, a propósito do conjunto das dívidas de IVA e de IRC, que a única causa de suspensão do prazo prescricional foi determinada pela instauração do processo de insolvência da executada originária, nos termos do art. 100º do Código de Insolvência e Recuperação de Empresas (CIRE), suspensão que baliza entre as datas de 27.07.2006 e 20.11.2006, i.e., durante 3 meses e 27 dias,
E. e assinala que “(...) as dívidas de IVA de janeiro, fevereiro e maio de 2002 estão prescritas, porquanto a sua prescrição ocorreria, respetivamente, em 27.05.2010, 27.06.2010 e 27.08.2010, datas anteriores à única causa de interrupção da prescrição dos oponentes: a sua citação ocorrida em 21.02.2011 (...)”, concluindo que “nesta parte, a oposição tem de proceder (art. 204º, nº1, al.d), do CPPT), e o PEF ser extinto quanto aos oponentes”.
F. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim doutamente decidido, pelas razões que passa a enunciar.
G. Cumpre objetar em primeiro que, ao contrário do que a sentença recorrida afirma, a regra a considerar não é de que o IVA, enquanto imposto de obrigação única, prescreve no prazo de oito anos a contar da data em que o facto tributário ocorreu.
H. Impunha-se que a sentença ponderasse a aplicabilidade da redação entretanto dada pelo art. 40º da L. nº 55-B/2004, de 30.12, que veio determinar que “as dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, exceto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efetuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário” (sublinhado da Fazenda Pública).
I. A alteração da redação do art. 48º, nº 1, da LGT, configura a alteração de uma lei que rege a extinção de situações jurídicas, colocando-se o problema de qual seja a redação do art. 48º, nº 1, da LGT, a aplicar, a redação inicial ou a redação dada pela L. nº 55-B/2004.
J. Com a alteração que a Lei nº 55-B/2004 introduziu no nº 1 do art. 48º da LGT, o prazo de prescrição das dívidas relativas a IVA e, em certos casos, a impostos sobre o rendimento, passou a contar-se a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se tenha verificado, respetivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário.
K. Ora, este novo termo inicial na contagem do prazo de prescrição das dívidas de IVA é já aplicável, no caso, a estas dívidas, relativas a períodos de tributação do ano de 2002, dado que se os correspondentes prazos de prescrição estavam em curso no início da vigência da L. nº 55-B/2004, que introduziu tal alteração,
L. não havendo aí qualquer aplicação retroativa da nova disposição legal, uma vez que o facto extintivo do direito à cobrança coerciva da dívida tributária é duradouro (o decurso do prazo) e não instantâneo (o início do prazo em momento temporal determinado): cfr. acórdão do STA de 30.05.2012, proc. 0504/12, relatado pelo Conselheiro Casimiro Gonçalves, notando esse acórdão que entendimento idêntico tem vindo a ser afirmado pela jurisprudência da secção do Contencioso Tributário do STA.
M. Sendo assim, afigura-se inquestionável que o termo inicial de contagem do prazo de prescrição das dívidas de IVA a que se refere o presente recurso é o início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do imposto, quanto ao IVA, segundo a redação do art. 48º, nº 1, da LGT, dada pela L. nº 55-B/2004.
N. O prazo de prescrição destas dívidas exequendas tem como termo inicial, então, 01.01.2003, e esgotar-se-ia, em princípio, em 01.01.2011. que, acrescido da suspensão por força da insolvência da devedora originária, nos termos do art. 100º do CIRE, de 3 meses e 27 dias, vê o seu termo final diferido para além da data de citação dos oponentes.
O. Aqui chegados, computando na contagem do prazo de prescrição das dívidas de IVA de 2002 o período de suspensão imposto pelo art. 100º do CIRE, e tendo em conta a citação dos revertidos aqui oponentes em 21.02.2011,
P. a questão objeto do presente recurso tem, salvo melhor opinião, o mesmo tratamento dado às demais dívidas de IVA e de IRC em relação às quais se decidiu pela improcedência da oposição: à data da citação dos executados agora oponentes, 21.02.2011, não tinha esgotado o prazo de prescrição daquelas dívidas, nos termos do nº1 do art. 49º da LGT, ressaltando que a citação dos oponentes foi oportuna, no que toca à exigibilidade da dívida.
Q. Em conclusão, sempre com o respeito devido, e salvo melhor opinião, no que concerne às dívidas exequendas de cuja prescrição se trata aqui, estas não se mostram prescritas, encontrando-se a sentença recorrida afetada de erro de julgamento de facto e de direito, devendo, em consequência, ser revogada.
Termina pedindo o provimento do recurso e a revogação da decisão recorrida.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. O recurso foi interposto para o TCA Norte, tendo esse Tribunal proferido acórdão (em 28/6/2013 - fls. 263-269), declarando a respectiva incompetência, em razão da hierarquia, para conhecer do recurso, por este apenas versar matéria de direito.
Declarando, consequentemente, competente o STA, para dele conhecer.

1.5. O MP não emitiu Parecer.

1.6. Corridos os vistos legais, cabe decidir.


FUNDAMENTOS
2. Na sentença recorrida julgaram-se provados os factos seguintes:
A) O Serviço de Finanças da Trofa instaurou contra a executada originária, entre outros, os PEF identificados a fls. 63 e 64, cujo teor aqui se dá por reproduzido, respeitantes às dívidas constantes das certidões de fls. 69 a 95, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
B) Os PEF referidos em A) foram revertidos contra os oponentes pelo despacho de reversão de 7/2/2011 de fls. 127 e 127 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
C) Os PEF foram revertidos contra os oponentes pelo montante global de € 101.255,86 (fls. 135 e 138).
D) Os oponentes foram citados para o PEF em 21/2/2011, datas em que foram assinados os avisos de recepção das respectivas citações realizadas pelas notas de citação de fls. 135 e 138, cujo teor aqui se dá por reproduzido (fls. 135 a 139).
E) As dívidas de IVA de 2002 revertidas contra os oponentes constam das certidões de fls. 69 a 73, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
F) A dívida de IRC de 2002 revertida contra os oponentes consta da certidão de fls. 74, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
G) A dívida de SISA revertida contra os oponentes consta da certidão de fls. 76, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
H) A dívida da coima aplicada em 2005 revertida contra os oponentes consta da certidão de fls. 76, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
I) A oponente foi sócia gerente da executada originária desde 21/4/1982 (fls. 96 e 97).
J) A oponente fez descontos para a Segurança Social como membro de órgão estatutário da executada originária de 1/3/1992 a 31/1/2002 (fls. 111).
K) A oponente assinou uma acta da executada originária em 25/3/1996 (fls. 127).
L) Em 25/7/2006 foi instaurado contra a executada originária o processo de insolvência n.º 3795/06.4 TBSTS, do 2.º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Santo Tirso (fls. 191 e seguintes).
M) A executada originária foi declarada insolvente por sentença de 22/8/2006, junta de fls. 193 a 196, cujo teor aqui se dá por reproduzido, transitada em julgado em 2/10/2006 (fls. 191 e seguintes).
N) O processo foi declarado findo por despacho de 30/10/2006, transitado em julgado em 20/11/2006 (fls. 191 e seguintes e 146).
O) O processo de insolvência não solicitou a avocação dos PEF (fls. 191).
P) Em 24/8/2006 o Tribunal Judicial da Comarca de Santo Tirso comunicou ao Serviço de Finanças de Trofa a insolvência da executada originária (fls. 147).
Q) Em 16/12/2006 o Tribunal Judicial da Comarca de Santo Tirso comunicou ao Serviço de Finanças de Trofa que o processo de insolvência foi declarado findo por decisão de 30/10/2006 (fls. 146).
R) O PEF n.ºs 42192002010129886, por dívidas de IVA de Janeiro de 2002, esteve parado, por motivo imputável ao Serviço de Finanças, entre 21/8/2003 e 29/3/2005; e 30/10/2006 e 14/1/2011 (fls. 209).
S) O PEF n.ºs 4219200201501224, por dívidas de IVA de Fevereiro de 2002, esteve parado, por motivo imputável ao Serviço de Finanças, entre 11/11/2002 e 3/2/2005; e 30/10/2006 e 14/1/2011 (fls. 209).
T) O PEF n.ºs 4219200201517120, por dívidas de IVA de Maio de 2002, esteve parado, por motivo imputável ao Serviço de Finanças, entre 12/3/2003 e 3/2/2005; e 30/10/2006 e 14/1/2011 (fls. 209).
U) O PEF n.ºs 4219200401023195, por dívidas de IVA de 2002, esteve parado, por motivo imputável ao Serviço de Finanças, entre 30/10/2006 e 14/1/2011 (fls. 209).
V) O PEF n.ºs 4219200401023870, por dívidas de juros de IVA de Fevereiro de 2002, esteve parado, por motivo imputável ao Serviço de Finanças, entre 20/12/2004 e 22/8/2005; e 30/10/2006 e 14/1/2011 (fls. 209).
W) Os PEF n.ºs 4219200501044575; 4219200601005375; e 4219200601029622, instaurados por dívidas de coimas das certidões de fls. 78 a 80, foram declarados extintos quanto aos oponentes pelo órgão de execução fiscal, que declarou as respectivas dívidas prescritas (fls. 201 e 209).

3.1. Como acima se disse, o recurso foi inicialmente interposto para o TCA Norte, tendo ali sido proferido acórdão declarando a incompetência, em razão da hierarquia, desse Tribunal, para conhecer do recurso, por o recurso versar apenas matéria de direito.
Ora, porque, na verdade, as partes divergem apenas quanto à interpretação das regras jurídicas aplicáveis, não havendo, além disso, controvérsia a este propósito, também aqui se entende, na perspectiva considerada pelo TCAN, que o recurso tem por exclusivo objecto matéria de direito (nº 1 do art. 280º do CPPT) e que, assim, o STA é competente para dele conhecer.
Há, portanto, que apreciar a questão de fundo: o invocado erro de julgamento da sentença quando à questão da prescrição das dívidas relativas ao IVA dos meses de Janeiro, Fevereiro e Maio de 2002.
Vejamos, pois.

3.2. A presente oposição foi deduzida contra a execução fiscal nº 4219-2002/01002600 (e apensas) originariamente instauradas contra a sociedade C……………., Ld.ª, mas que foram, entretanto, revertidas contra os oponentes/recorrentes, com vista à cobrança executiva de dívidas de IVA, IRC, sisa, coimas e encargos, no montante global de € 101.255,86.
Os oponentes invocaram a ilegitimidade (por inexistência de culpa na insuficiência patrimonial da executada originária), a prescrição das dívidas de IVA, do IRC de 2002, da sisa e da coima aplicada em 2005, bem como a inconstitucionalidade da reversão das dívidas de coimas.
Apreciando tais questões, a sentença julgou:
- extinta a oposição, por impossibilidade superveniente da lide, quanto aos PEF n.ºs 4219200501044575, 4219200601005375 e 4219200601029622, dado terem sido já declaradas prescritas as dívidas ali em execução (as dívidas das coimas e encargos de contra-ordenações, constantes das certidões de fls. 78 a 80);
- procedente a oposição, quanto aos PEF das dívidas de sisa e IVA de Janeiro, Fevereiro e Maio de 2002, constantes das certidões de fls. 69 a 71, 73 e 76, por prescrição.
- procedente a oposição, quanto à oponente, B…………, por ser parte ilegítima.
- improcedente a oposição, quanto ao oponente A……………, com referência às restantes dívidas.

3.3. E, no que ora releva, para julgar procedente a oposição, no que respeita às dívidas emergentes de sisa e do IVA de Janeiro, Fevereiro e Maio de 2002, a sentença considerou, em síntese o seguinte:
1). De acordo com o disposto (à data – em 2002) no nº 1 do art. 48º da LGT, o prazo de prescrição das dívidas tributárias era o de 8 anos «contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu».
- O IVA, enquanto imposto de obrigação única, prescreve no prazo de 8 anos a contar da data em que o facto tributário ocorreu.
O IRC, como imposto periódico, prescreve no prazo de 8 anos a contar do termo do ano em que se verificou o facto tributário.
- No caso, os impostos em falta tinham como data limite de pagamento voluntário 11/3/2002; 1014/2002; 10/7/2002; 21/7/2004; e 31/8/2004, pelo que as respectivas liquidações ocorreram necessariamente em datas anteriores.
- Atendendo que os oponentes foram citados para a execução em 21/2/2011, a sua citação foi efectuada após o 5° ano posterior ao da liquidação, pelo que as causas de interrupção da prescrição da executada originária não produzem efeitos quanto a eles (art. 48º, n° 3, da LGT).
- O prazo de prescrição de oito anos apenas pode ser interrompido pelas causas de interrupção ocorridas nos próprios oponentes e pelas causas de suspensão.
A única causa de suspensão do prazo de prescrição dos referidos tributos foi a instauração do processo de insolvência da executada originária (art. 100º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE)).
- O processo foi instaurado em 25/7/2006, a executada originária foi declarada insolvente por sentença de 22/8/2006, transitada em julgado em 2/10/2006, e a decisão de 30/10/2006, que declarou findo o processo, transitou em julgado em 20/11/2006, pelo que o prazo de prescrição esteve suspenso entre 25/7/2006 e 20/11/2006 (art. 100º do CIRE), isto é, durante 3 meses e 27 dias.
- Para efeitos de prescrição a data mais recente do termo inicial é 1/1/2003, referente ao IRC de 2002. Se a essa data somarmos o período de suspensão do prazo de prescrição do processo de insolvência da executada originária, de 3 meses e 27 dias, verificamos que a dívida mais recente prescreveria em 27/3/2011.
- Atendendo que os oponentes foram citados para o PEF em 21/2/2011, a sua citação interrompeu nessa data o prazo de prescrição, nos termos do art. 49° n° 1, da LGT.
O prazo decorrido até aí fica inutilizado e o novo prazo de prescrição só começa a correr a contar do trânsito em julgado da decisão que puser termo ao processo (arts. 326° e 327° do CCivil).
- Donde ter de concluir-se que a dívida exequenda de IRC de 2002 não está prescrita.
- O mesmo raciocínio é válido para o IVA do ano de 2002 (PEF n° 4219-2004/01023195), porquanto o facto tributário ocorreu em 31/12/2002, pelo que a sua prescrição ocorreria em 26/3/2011, data posterior à da citação dos oponentes.

2). Mas já quanto às dívidas de IVA de Janeiro, Fevereiro e Maio de 2002, estão prescritas, porquanto a sua prescrição ocorreria, respectivamente em 27/5/2010, 27/6/2010 e 27/8/2010, datas anteriores à única causa de interrupção da prescrição dos oponentes: a sua citação ocorrida em 21/2/2011. Pelo que, nesta parte, a oposição tem de proceder (art. 204°, n.° 1, alínea d), do CPPT).
Bem como relativamente à dívida de sisa, pois que constando como data limite de pagamento voluntário a de 17/8/1996 e tendo a citação dos oponentes ocorrido depois do 5° ano posterior ao da liquidação, as causas de interrupção da executada originária não produzem efeitos quanto a eles, sendo que também a única causa de suspensão do prazo é a decorrente do processo de insolvência da executada originária, com a duração de 3 meses e 27 dias (art. l00° do CIRE) e a única causa de interrupção é a que decorre da citação, em 21/2/2011.
E assim, atendendo a que a sisa era devida desde 18/8/1996, somando o prazo de suspensão de 3 meses e 27 dias, a prescrição iniciar-se-ia em 15/12/1996, pelo que quer o prazo de prescrição fosse o de 10 anos (do art. 34° da LGT - art. 180° do CIMSISA), quer fosse o de 8 anos (art. 48°, n° 1, da LGT), a dívida prescreveu.

3.4. A recorrente Fazenda Pública discorda do assim decidido quanto à prescrição das dívidas de IVA de Janeiro, Fevereiro e Maio de 2002, alegando, em suma, como se viu, que a regra não é de que o IVA, enquanto imposto de obrigação única, prescreve no prazo de 8 anos a contar da data em que o facto tributário ocorreu, mas, ao invés, esse prazo se conta [por força da aplicabilidade da redacção entretanto dada ao art. 48º nº 1 da LGT, pelo art. 40º da Lei nº 55-B/2004, de 30/12 (Que veio determinar que «as dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, excepto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efectuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respectivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário». )], a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se tenha verificado, respectivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário.
E esta é, portanto, a única questão a decidir no recurso.
Mas, atalhando razões, adianta-se já que não é de aceitar o entendimento da sentença recorrida no sentido de que, por estarem em causa dívidas de IVA de Janeiro, Fevereiro e Maio do ano de 2002, o prazo de prescrição se conta, relativamente a cada período, desde a verificação do respectivo facto tributário.
Vejamos.
O nº 1 do art. 48º da LGT (entrada em vigor em 1/1/1999) dispunha, na sua redacção inicial, que «As dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu.»
Posteriormente, a Lei nº 55-B/2004, de 30/12, alterou este normativo, que ficou com a redacção seguinte: «As dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, excepto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efectuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respectivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário
Ora, como já se exarou no acórdão de 30/5/2012, no proc. nº 0504/12, citado, aliás, nas Conclusões do recurso, «com a alteração que o art. 40º da Lei nº 55-B/2004 introduziu no nº 1 do art. 48º da LGT, o prazo de prescrição das dívidas relativas a IVA e, em certos casos, a impostos sobre o rendimento, passou a contar-se a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se tenha verificado, respectivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário.
Ora, este novo modo de contagem do prazo de prescrição é já aplicável, no caso, a estas dívidas relativas ao IVA dos anos de 1999 e 2000, dado que se trata de prazos que estavam em curso no início da vigência da lei que introduziu tal alteração, não havendo aí qualquer aplicação retroactiva da nova disposição legal, uma vez que o facto extintivo do direito à cobrança coerciva da dívida tributária é duradouro (o decurso do prazo) e não instantâneo (o início do prazo em momento temporal determinado) - cfr. o segmento final do nº 2 do art. 12° do CCivil (entendimento idêntico tem, aliás, vindo a ser afirmado pela jurisprudência desta secção do STA - cfr., entre outros, os acs. de 26/11/08, no rec. n° 598/08; de 20/5/09, no rec. n° 293/09; de 25/6/09, no rec. n° 1109/08; de 3/3/10, no rec. n° 1076/09; de 30/6/10, nos recs. nºs. 0158/10 e 0201/10; de 17/3/2011, proc nº 177/11; e de 28/9/2011, proc nº 764/2011). (E também no acórdão de 8/2/2012, rec. nº 033/12, se chega à mesma conclusão, embora apelando à aplicação da regra contida no nº 2 do art. 297º e não à aplicação da regra do nº 2 do art. 12º, ambos do CCivil.)
Na verdade, como se refere no aresto de 3/3/10, citando a lição de Baptista Machado (Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 2002, pags. 235 e 242/243), «(…) nada impede que a lei nova se aplique a factos passados que ela assume como pressupostos impeditivos ou desimpeditivos (isto é, como pressupostos negativos ou positivos) relativamente à questão da validade ou admissibilidade da situação jurídica, questão essa que é da sua exclusiva competência» e «tendo o decurso global do prazo o valor de um facto constitutivo (ou extintivo) de um direito ou situação jurídica, se tal prazo ainda se encontrava em curso no momento do início de vigência da lei nova, é porque tal situação jurídica ainda não se encontrava constituída (ou extinta) neste momento.
Logo, cabe à lei nova a competência para determinar os requisitos da constituição da mesma situação jurídica. Achando-se uma situação jurídica em curso de constituição, passa o respectivo processo constitutivo a ficar imediatamente subordinado à lei nova».
Assim, não sendo o início do prazo de prescrição, mas o seu integral decurso, o facto extintivo do direito à cobrança da dívida por parte da AT, é de concluir que, por aplicação da regra contida no segmento final daquele nº 2 do art. 12° do CCivil e no nº 1 do art. 12º da LGT, a nova redacção do preceito é, no caso vertente, aplicável às dívidas exequendas…» (fim de citação).
Não havendo razões para afastar esta interpretação, conclui-se que, embora se trate, no caso, de dívidas de IVA dos meses de Janeiro, Fevereiro e Maio de 2002, os respectivos prazos de prescrição se iniciaram, não na data dos inerentes factos tributários, mas em 1/1/2003 e, deste modo, tais dívidas, atendendo a que não releva, no que respeita aos oponentes/revertidos, nenhuma causa interruptiva do prazo de prescrição, e a que a única causa de suspensão desse prazo foi a instauração do processo de insolvência da executada originária [como se refere na sentença, o processo foi instaurado em 25/7/2006, a executada originária foi declarada insolvente por sentença de 22/8/2006, transitada em julgado em 2/10/2006, e a decisão de 30/10/2006, que declarou findo o processo, transitou em julgado em 20/11/2006, pelo que o prazo de prescrição esteve suspenso entre 25/7/2006 e 20/11/2006 (art. 100º do CIRE), isto é, durante 3 meses e 27 dias], então, havemos de concluir que, contando-se o prazo a partir do termo inicial reportado a 1/1/2003, somando o período de suspensão (3 meses e 27 dias) as faladas dívidas não estão prescritas, face à citação dos oponentes ocorrida em 21/2/2011 (nº 1 do art. 49° da LGT).
Em suma, conclui-se que a sentença recorrida enferma do erro de julgamento que a Fazenda Pública lhe imputa, pelo que se impõe a procedência do recurso e a consequente revogação daquela, nesta medida (ou seja, na parte em que foram julgadas prescritas as dívidas relativas ao IVA de Janeiro, Fevereiro e Maio de 2002).

DECISÃO
Nestes termos acorda-se em, dando provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida na parte em que julgou procedente a oposição com fundamento na prescrição das dívidas de IVA dos meses de Janeiro, Fevereiro e Maio do ano de 2002.
Sem custas.

Lisboa, 14 de Janeiro de 2015. – Casimiro Gonçalves (relator) – Francisco Rothes – Isabel Marques da Silva.