Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0661/12
Data do Acordão:10/10/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:PRÉDIO OMISSO
IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
CONTRIBUIÇÃO AUTÁRQUICA
LIQUIDAÇÃO
Sumário:Para efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 32.º do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, são “prédios omissos” os prédios não inscritos nas matrizes (rústica ou urbana).
Nº Convencional:JSTA00067828
Nº do Documento:SA2201210100661
Data de Entrada:06/14/2012
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A..., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PORTO
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL.
Legislação Nacional:DL 287/2003 DE 2003/11/12 ART32 N2 ART31 N5 ART15 N1.
CIMI03 ART112 N1 C ART3 ART4 ART12 N1 N2.
CPPTRIB99 ART134 N1 N2.
LGT98 ART89 N1.
Referência a Doutrina:SILVÉRIO MATEUS E CORVELO DE FREITAS - OS IMPOSTOS SOBRE O PATRIMÓNIO O IMPOSTO DO SELO ED 2005 PAG84.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -

1 – A Fazenda Pública recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 27 de Fevereiro de 2012, que julgou procedente a impugnação deduzida por A……, S.A., contra liquidação de contribuição autárquica respeitante ao ano de 2001, no montante global de €32.157,73, anulando-a.
A recorrente conclui as suas alegações de recurso enunciando as seguintes conclusões:

A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a Impugnação Judicial intentada sobre o acto tributário consubstanciado na liquidação de contribuição autárquica respeitante ao ano de 2001, no montante global de €32.157,73.

B. Extrai-se da douta sentença, que o Tribunal “a quo” deu como provada a seguinte factologia:

“1) Por escritura pública de 13/04/2000, a impugnante, à data designada “B……, SA” declarou adquirir o prédio rústico denominado “……” composto de lavradio, situado no ……, freguesia de Beiriz, do concelho da Póvoa da Varzim, inscrito na matriz predial rústica sob o n.º 984 – Cfr. fls. 8 e ss do processo físico, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
2) Em 28/01/2004, a impugnante apresentou a declaração para inscrição ou actualização de prédios urbanos na matriz (mod. 1) com referência ao prédio inscrito na matriz rústica sob o n.º 984 da freguesia de Beiriz indicando como motivo da apresentação da declaração “prédio omisso” “prédio novo”. Cfr. fls. 21 e ss do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
3) Por ofício de 18/01/2005 foi a impugnante notificada da avaliação do prédio ao qual foi atribuído o n.º P 2159, terreno para construção, pelo valor patrimonial de €5.729.000,00. Cfr. fls. 16 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
4) Foi emitida liquidação de contribuição autárquica relativa aos anos de 2001 e 2002 do prédio urbano inscrito na matriz sob o n.º 02159 no valor de € 32.157,73 pagável em Dezembro de 2005 constando um valor patrimonial de € 5.728.999,50. Cfr. fls. 7 do processo físico, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
5) Por informação de 05/02/2009 “tendo a impugnante apresentado apenas em 28/01/2004 uma declaração (Mod. 1) para efeitos de inscrição/alteração de prédios na matriz, a que se refere o artigo 13.º do CIMI (cfr. doc. a fls. 21 dos autos), da qual consta expressamente tratar-se de um prédio omisso cuja passagem a urbano ocorreu em 13/04/2000 (cfr. consta do termo de avaliação a fls. 17 dos autos), a avaliação do prédio teria que, em face do disposto no n.º 2 do art.º 32.º do D.L. n.º 287/2003 ser efectuada por aplicação do regime de avaliações previsto no CIMI”. Cfr. fls. 39 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido. (…)”

C. Na sentença do tribunal “a quo”, após a devida fundamentação firmou-se, e bem, a asserção de que:
“(…) Atento o exposto, o fundamento invocado pela impugnante para atacar a legalidade da liquidação não se mostra consentâneo com a impugnação judicial de acto de liquidação, mas com a impugnação judicial de acto de fixação de valor patrimonial, o que obsta ao prosseguimento dos autos para conhecimento daquele fundamento, pelo que o Tribunal abstém-se de o conhecer. (…)

D. No entanto sequentemente, a meritíssima juiz “a quo” considera que:
“Contudo, a impugnante também imputa ao acto de liquidação ilegalidades que se autonomizam das ilegalidades imputadas ao acto de avaliação que é a alegação de que a AF procedeu à liquidação de contribuição autárquica relativa a anos anteriores à apresentação da declaração pelo contribuinte para prédios alterados ou modificados, ou seja, um prédio que não tem a natureza de prédio omisso o que, no seu entender, viola o artigo 32.º n.º 2 do D.L. n.º 283/2007 de 12/11, o princípio da irretroactividade da lei fiscal e o art.º 14.º, n.º 2 do CCA. Estas ilegalidades são imputadas ao acto de liquidação pelo que são fundamento de impugnação judicial do acto de liquidação podendo os presentes autos prosseguir para a sua apreciação.”

E. E, apreciando do direito aplicável conclui que:
“Desta forma, no caso em apreço não estamos perante um prédio omisso, mas um prédio ao qual foi atribuída nova classificação: a urbana.
O art.º 32.º, n.º 2 do D.L. n.º 287/2003 de 12/11, diploma que aprova o IMI, prevê apenas a liquidação de contribuição autárquica para períodos anteriores à apresentação da declaração pelo contribuinte para prédios omissos e já não quanto aos prédios que se encontravam inscritos na matriz rústica e aos quais foi atribuída uma nova classificação.
E sendo assim, a AF ao liquidar contribuição autárquica para períodos anteriores à apresentação do Mod. 1 pelo contribuinte (2001 e 2002) atendendo ao valor patrimonial tributário apurado segundo a avaliação efectuada nos termos do CIMI com fundamento em que se tratava de prédio omisso violou aquela o art.º 32.º, n.º 2 do D.L. n.º 287/2003 de 12/11.
Em face do exposto, deve a liquidação ser anulada.”

F. Salvo o devido respeito, que é muito, entende a Fazenda pública que a sentença recorrida enferma de erro de direito, na medida em que parte dos seus fundamentos se encontra em contradição com a douta decisão.

G. A douta sentença proferida pelo tribunal “a quo”, enferma de errónea aplicação do direito vigente ao caso concreto.

H. Conforme o fundamentado, a avaliação efectuada mormente o valor apurado, independentemente se efectuada nos termos do novo Código do Imposto Municipal sobre Imóveis se nos termos do Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Industria Agrícola, aprovado pelo Dec. lei nº 45104, de 1 de Julho de 1963, aplicável “ex vi” Código da Contribuição Autárquica, deveria ter sido autonomamente sindicada,

I. não podendo fazer parte do objecto da impugnação judicial intentada.

J. Assim sendo, não estando em causa o valor patrimonial apurado, e atendendo ao que se encontrava plasmado no n.º 5 do art.º 31.º do Dec. Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro,
“5. Os códigos revogados continuam a aplicar-se aos factos tributários ocorridos até à data da entrada em vigor dos códigos e alterações referidos no art. 32.º do presente diploma, incluindo-se os factos que tenham beneficiado de isenção ou redução de taxa condicionadas e venham a ficar sem efeito na vigência dos novos códigos.”
Só se pode concluir que foi legalmente efectuada a liquidação adicional de Contribuição Autárquica relativamente ao ano de 2001

K. Na medida em que a alteração da qualificação do prédio é um facto que ocorreu na vigência do Código da Contribuição Autárquica.
Sem conceder,

L. Se doutamente se entender, inexistir contradição entre os fundamentos e a douta decisão proferida pelo Tribunal “a quo”,

M. salvo o devido respeito, que é muito, entende a Fazenda Pública que a sentença recorrida enferma de erro direito ao interpretar erradamente o n.º 2 do art.º 32.º do Dec. Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro.

N. Considerou a meritíssima Juiz “a quo” que o dito preceito apenas se aplicava a prédios omissos à matriz urbana, e já não quanto aos prédios que se encontravam inscritos na matriz rústica e aos quais foi atribuída a nova classificação de urbano.

O. Salvo o devido respeito, que é muito, não pode a Fazenda Pública perfilhar de igual interpretação.

P. Com o diploma em apreço e legislação conexa, atribuindo-se especial relevância nesta matéria ao Código do Imposto Municipal sobre os Imóveis, o legislador procedeu à denominada “Reforma do Património”.

Q. Entre outras novidades, especial destaque foi dado ao novo regime de avaliações da propriedade urbana.

R. Nos diversos artigos precedentes ao artigo em análise, art.º 32.º do Dec. Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, destaca-se o n.º 1 do art.º 15.º que preceituava:
Artigo 15.º
Avaliação de prédios já inscritos na matriz
1 – Enquanto não se proceder à avaliação geral, os prédios urbanos já inscritos na matriz serão avaliados, nos termos do CIMI, aquando da primeira transmissão ocorrida após a sua entrada em vigor.

S. Constata-se que o legislador utiliza a expressão “prédios urbanos”, referindo-se aos já inscritos na matriz urbana.

T. Entende pois a fazenda pública, que a expressão “…prédios omissos cujo pedido de inscrição na matriz seja apresentado a partir do dia seguinte ao da publicação do presente diploma aplica-se o regime de avaliações previsto no CIMI…”

U. deverá ser interpretada no sentido de que é subsumível ao preceito a omissão de prédios a cada uma das matrizes, individualmente consideradas, à matriz rústica e à matriz urbana.

V. Por conseguinte o prédio em questão embora inscrito na matriz rústica, não pode deixar de ser considerado omisso à matriz urbana.

W. Esta interpretação é a que melhor se adequa ao pretendido pelo legislador de que fossem avaliados pelo novo regime de avaliação os prédios urbanos.

X. Nem se entende que assim não seja, com a interpretação dada ao preceito na douta sentença proferida pelo Tribunal “a quo” estaria criado uma diferença de regime de avaliação aplicável sem qualquer justificação, isto é,

Y. no caso de um prédio urbano, assim qualificado por facto ocorrido na vigência do Código da Contribuição Autárquica, totalmente omisso a ambas as matrizes, rústica e urbana, e participado na vigência do novo regime de avaliações, este seria considerado omisso e avaliado de acordo com as novas regras,

Z. no caso de igual prédio urbano, assim qualificado por facto ocorrido na vigência do Código da Contribuição Autárquica inscrito de acordo com a sua anterior qualificação na matriz rústica, mas omisso à matriz urbana, participado na vigência do novo regime de avaliações, incompreensivelmente a este prédio já não seria aplicável o novo regime de avaliações.

AA. Duas soluções de direito diferentes, a situações fácticas apenas divergentes no facto de um prédio estar omisso à matriz rústica e o outro não.

BB. A Fazenda Pública perfilha da interpretação que, um prédio urbano omisso à matriz urbana se subsume ao n.º 2 do art.º 32.º do Dec. Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, independentemente de estar ou não previamente inscrito na matriz rústica de acordo com a sua anterior qualificação.

CC. Em conclusão de tudo o anteriormente exposto, com a devida vénia entende a Fazenda pública que a douta decisão recorrida padece de erro de julgamento quanto à matéria de direito.

Nestes termos, deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, com as legais consequências.

2 - Não foram apresentadas contra-alegações.

3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer nos seguintes termos:
A interpretação efectuada na douta sentença recorrida quanto à norma contida no n.º 2 do art. 32.º do Dec.-Lei n.º 287/03, de 12-XI, afigura-se conforme com a Constituição que no art.º 103.º n.º 3 impede que os impostos tenham natureza retroactiva, sendo que o resultante da avaliação efectuada produz efeitos totalmente quanto a factos passados - contribuição autárquica relativa aos anos de 2001 e 2002.
Por outro lado, a mesma parece corresponder ao pensamento do legislador, conforme resulta do elemento sistemático a que recorre o art. 106.º do C.I.M.I.
Assim, o recurso é de improceder.
- Fundamentação -

4 – Questão a decidir
É a de saber se, como alegado, a sentença recorrida enferma de erro de direito, por contradição entre alguns dos seus fundamentos e a decisão (conclusões F) a K) das alegações de recurso) e por errada interpretação do disposto no n.º 2 do artigo 32.º do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro (conclusões M) a BB) das alegações).

5 – Matéria de facto
Na sentença objecto de recurso foram dados como provados os seguintes factos:
“1) Por escritura pública de 13/04/2000, a impugnante, à data designada “B……, SA” declarou adquirir o prédio rústico denominado “……” composto de lavradio, situado no ……, freguesia de Beiriz, do concelho da Póvoa da Varzim, inscrito na matriz predial rústica sob o n.º 984 – Cfr. fls. 8 e ss do processo físico, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

2) Em 28/01/2004, a impugnante apresentou a declaração para inscrição ou actualização de prédios urbanos na matriz (mod. 1) com referência ao prédio inscrito na matriz rústica sob o n.º 984 da freguesia de Beiriz indicando como motivo da apresentação da declaração “prédio omisso” “prédio novo”. Cfr. fls. 21 e ss do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

3) Por ofício de 18/01/2005 foi a impugnante notificada da avaliação do prédio ao qual foi atribuído o n.º P 2159, terreno para construção, pelo valor patrimonial de €5.729.000,00. Cfr. fls. 16 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

4) Foi emitida liquidação de contribuição autárquica relativa aos anos de 2001 e 2002 do prédio urbano inscrito na matriz sob o n.º 02159 no valor de € 32.157,73 pagável em Dezembro de 2005 constando um valor patrimonial de € 5.728.999,50. Cfr. fls. 7 do processo físico, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

5) Por informação de 05/02/2009 “tendo a impugnante apresentado apenas em 28/01/2004 uma declaração (Mod. 1) para efeitos de inscrição/alteração de prédios na matriz, a que se refere o artigo 13.º do CIMI (cfr. doc. a fls. 21 dos autos), da qual consta expressamente tratar-se de um prédio omisso cuja passagem a urbano ocorreu em 13/04/2000 (cfr. consta do termo de avaliação a fls. 17 dos autos), a avaliação do prédio teria que, em face do disposto no n.º 2 do art.º 32.º do D.L. n.º 287/2003 ser efectuada por aplicação do regime de avaliações previsto no CIMI”. Cfr. fls. 39 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

6) A presente impugnação deu entrada neste Tribunal em 03/04/2008 – Cfr. fls. 2 do processo físico cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.


6 – Apreciando.
6.1 Da alegada contradição entre alguns dos fundamentos e a decisão imputada à sentença recorrida
A sentença recorrida, a fls. 61 e 71 dos autos, julgou que atento o disposto nos artigos 134.º n.º 1 e 2 do CPPT e 89.º, n.º 1 da LGT, nos quais resulta a impugnabilidade autónoma dos actos de fixação de valores patrimoniais, não podia conhecer na impugnação do acto de liquidação das ilegalidades cometidas no procedimento de avaliação do valor patrimonial tributário subjacente à referida liquidação, podendo conhecer tão somente daquelas ilegalidades que a impugnante imputa ao acto de liquidação e que se autonomizam das ilegalidades imputadas ao acto de avaliação que é a alegação de que a AF procedeu à liquidação de contribuição autárquica relativa a anos anteriores à apresentação da declaração pelo contribuinte para prédios alterados ou modificados, ou seja, um prédio que não tem a natureza de prédio omisso o que, no seu entender, viola o art.º 32.º, n.º 2 do D.L. n.º 283/2007 de 12/11, o princípio da irretroactividade da lei fiscal e o art. 14.º, n.º 2 do CCA (cfr. sentença recorrida, a fls. 65 a 67 dos autos).

Alega a recorrente (cfr. conclusões F) a K) das alegações de recurso) que a sentença enferma de erro de direito, na medida em que parte dos seus fundamentos se encontra em contradição com a douta decisão, pois que afirmando que a avaliação efectuada mormente o valor apurado (…) deveria ter sido autonomamente sindicada, não podendo fazer parte do objecto da impugnação judicial intentada, então, não estando em causa o valor patrimonial apurado, e atendendo ao que se encontrava plasmado no n.º 5 do art.º 31.º do Dec. Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, só poderia ter concluído que foi legalmente efectuada a liquidação adicional de Contribuição Autárquica relativamente ao ano de 2001, na medida em que a alteração da qualificação do prédio é um facto que ocorreu na vigência do Código da Contribuição Autárquica.

Não nos parece, ao contrário do alegado, ter a sentença recorrida incorrido em erro de direito ao apreciar da legalidade da liquidação de contribuição autárquica sindicada efectuada ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 32.º do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, pois que a apreciação de tal questão não envolve directamente qualquer sindicância quanto ao valor patrimonial tributário que serviu de base à liquidação e terá sido o n.º 2 do artigo 32.º, e não o n.º 5 do artigo 31.º do Decreto-Lei n.º 287/2003, o fundamento jurídico da liquidação sindicada.

Improcede, pois, a alegação da recorrente sintetizada nas conclusões F) a K) das suas alegações de recurso.

6.2 Da interpretação do disposto no n.º 2 do artigo 32.º do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro

A sentença recorrida anulou a liquidação impugnada por ter julgado que a AF ao liquidar contribuição autárquica para períodos anteriores à apresentação do Mod. 1 pelo contribuinte (2001 e 2002) atendendo ao valor patrimonial tributário apurado segundo a avaliação efectuada nos termos do CIMI com fundamento em que se tratava de prédio omisso violou aquela o art.º 32.º, n.º 2 D.L. n.º 287/2003 de 12/11, porquanto tal preceito legal prevê apenas a liquidação de contribuição autárquica para períodos anteriores à apresentação da declaração pelo contribuinte para prédios omissos e já não quanto aos prédios que se encontravam inscritos na matriz rústica e aos quais foi atribuída uma nova classificação, como o prédio em causa nos autos (cfr. sentença recorrida, a fls. 70 e 71).
Alega, porém, a recorrente (cfr. conclusões M) a BB) das alegações) que a sentença recorrida enferma de erro direito ao interpretar erradamente o n.º 2 do art.º 32.º do Dec. Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, porquanto, atendendo a que com o diploma em apreço e legislação conexa o legislador procedeu à denominada “Reforma do Património” onde, entre outras novidades, especial destaque foi dado ao novo regime de avaliações da propriedade urbana e atendendo igualmente ao disposto no n.º 1 do artigo 15.º do mesmo Decreto-Lei, entende a recorrente que a expressão “prédios omissos” deve ser interpretada no sentido de que é subsumível ao preceito a omissão de prédios a cada uma das matrizes, individualmente considerada, mais alegando ser essa interpretação a que melhor se adequa ao pretendido pelo legislador e a que evita uma diferença de regime de avaliação aplicável sem qualquer justificação.

O Excelentíssimo Procurador-Geral adjunto junto deste Supremo Tribunal defende a improcedência do recurso.

Vejamos.

A norma cuja interpretação é questionada – o n.º 2 do artigo 32.º do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, dispõe nos seguintes termos: «Aos prédios omissos cujo pedido de inscrição na matriz seja apresentado a partir do dia seguinte ao da publicação deste diploma aplica-se o regime de avaliações previsto no CIMI, sendo as liquidações da contribuição autárquica respeitantes aos anos anteriores ao de 2003 efectuadas com base na taxa prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 112.º daquele Código fixada para aquele ano».

A sentença recorrida interpretou a expressão legal “prédios omissos” à luz das disposições dos artigos 3.º, 4.º e 12.º, n.º 1 e 2 do Código do IMI, aprovado pelo artigo 2.º do diploma no qual se contém a disposição interpretando, para concluir que o legislador distinguiu entre prédio omisso, melhorado e aquele ao qual foi atribuído nova classificação, sendo que o primeiro será aquele que não se encontra inscrito na matriz (rústica ou urbana) por falta de apresentação da declaração para a sua inscrição, o segundo aquele que foi alterado mantendo, no entanto, a sua classificação e o terceiro aquele que alterou a sua classificação.

A interpretação adoptada na sentença recorrida procede a uma interpretação sistemática do conceito interpretando e nenhuma censura merece, tanto mais que sendo a disposição interpretanda retroactiva, como aliás reconhecido pelos comentadores (cfr. J. SILVÉRIO MATEUS/L. CORVELO DE FREITAS, Os Impostos sobre o Património. O Imposto do Selo, Lisboa, Engifisco, 2005, p. 84 – nota n.º 2 ao art. 32.º do DL n.º 287/2003), e proibindo a Constituição da República impostos retroactivos (cfr. o n.º 3 do artigo 103.º da CRP), há que ser cauteloso quanto à delimitação do âmbito de aplicação da referida disposição legal, evitando interpretações extensivas da norma na ausência de elementos inequívocos que permitam afirmar ter sido intenção do legislador considerar como omissos os prédios não inscritos na matriz urbana, mesmo que inscritos na matriz rústica.

Pelo exposto, impõe-se concluir que o recurso não merece provimento, sendo de confirmar a sentença recorrida, que bem decidiu.
- Decisão-
7 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.

Custas pela recorrente.
Lisboa, 10 de Outubro de 2012. – Isabel Marques da Silva (relatora) – Lino Ribeiro – Dulce Neto.