Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0146/21.1BCLSB
Data do Acordão:03/24/2022
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
TRIBUNAL ARBITRAL
FEDERAÇÃO PORTUGUESA DE FUTEBOL
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Não é de admitir a revista do acórdão que confirmou o juízo firmado pelo TAD que havia mantido o sancionamento de sociedade desportiva se o juízo firmado se mostra assente em fundamentação jurídica consonante com a jurisprudência deste Supremo Tribunal produzida sobre as quaestiones juris objeto de discussão e estas se mostram desprovidas de uma especial relevância social.
Nº Convencional:JSTA000P29180
Nº do Documento:SA1202203240146/21
Data de Entrada:03/07/2022
Recorrente:VITÓRIA SPORT CLUBE - FUTEBOL, S.A.D.
Recorrido 1:FEDERAÇÃO PORTUGUESA DE FUTEBOL
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1. Vitória Sport Clube - Futebol, SAD [VITÓRIA …, SAD], invocando o disposto no art. 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA], peticiona a admissão do recurso de revista por si interposto do acórdão de 06.01.2022 do Tribunal Central Administrativo Sul [doravante TCA/S] [cfr. fls. 224/267 - paginação «SITAF» tal como as ulteriores referências à mesma, salvo expressa indicação em contrário], que negou provimento ao recurso interposto da impugnação dirigida contra FEDERAÇÃO PORTUGUESA DE FUTEBOL [FPF], mantendo a decisão arbitral do TAD [proferida no processo n.º 40/2020 e datada de 30.08.2021] que havia considerado improcedente a impugnação do Acórdão do Pleno da Secção Profissional do Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol, de 11.08.2020, e que aplicou à «VITÓRIA…, SAD» a pena disciplinar de «realização de um (1) jogo à porta fechada e multa no valor de 415 (quatrocentos e quinze) UC … que corresponde a € 29.631,00» pela violação do disposto nos arts. 127.º, n.ºs 1 e 2, 181.º, n.º 2 (na forma tentada), 182.º, n.º 2, 183.º, n.ºs 1 e 2, e 187.º, n.º 1, als. a), b), do RDLPFP/2019 [RD].

2. Motiva a admissão do recurso de revista [cfr. fls. 279/303] na relevância social e jurídica das questões/objeto de litígio [respeitantes à responsabilidade disciplinar das sociedades anónimas desportivas pelos comportamentos incorretos dos seus adeptos e punibilidade da tentativa nos termos do art. 20.º, n.ºs 2 e 3, do referido RD e do valor probatório dos relatórios produzidos (árbitro, delegado FPF e das forças policiais)] e, bem assim, para uma «melhor aplicação do direito», fundada no erro notório na apreciação da prova [art. 410.º, n.º 2, al. c), do Código de Processo Penal (CPP)], no vício da insuficiência da decisão da matéria de facto provada e decorrente nulidade da decisão [arts. 410.º, n.º 2, al. a), do CPP e 181.º, n.º 2, do RD], na violação dos princípios do Estado de Direito, da culpa e da presunção de inocência, dos direitos de defesa e a um processo equitativo, mercê da errada e inconstitucional interpretação e aplicação, mormente dos arts. 13.º, al. f), 20.º, n.ºs 2 e 3, 179.º, n.º 1, 181.º, n.ºs 1 e 2, do RD, 169.º e 410.º, n.º 2, als. a) e c), do CPP, 363.º, n.º 2, e 371.º, n.º 1 do Código Civil [CC], 02.º, 20.º, n.º 4, 32.º, n.ºs 2 e 10, da Constituição da República Portuguesa [CRP].

3. A FPF produziu contra-alegações em sede de recurso de revista [cfr. fls. 312/355], tendo nas mesmas pugnado, desde logo, pela não admissão do mesmo.
Apreciando:

4. Dispõe-se no n.º 1 do art. 150.º do CPTA que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

5. Do referido preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s no uso dos poderes conferidos pelo art. 149.º do CPTA, conhecendo em segundo grau de jurisdição, não são, em regra, suscetíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar quando: i) esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, revista de importância fundamental; ou, ii) o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

6. O TAD havia julgado totalmente improcedente a impugnação que a «VITÓRIA…, SAD» havia dirigido ao acórdão do Pleno da Secção Profissional do Conselho de Disciplina da FPF, mantendo o sancionamento que o mesmo tinha imposto [cfr. fls. 03/62].

7. O TCA/S, por unanimidade, manteve a decisão arbitral.

8. A «VITÓRIA…, SAD», aqui ora recorrente, para além da relevância social e jurídica do litígio, sustenta a necessidade de melhor aplicação do direito, insurgindo-se contra o que entende ser a inconstitucional e errada interpretação/aplicação feita no acórdão recorrido do quadro normativo supra enunciado.

9. A alegação expendida pela mesma não se mostra persuasiva, tudo apontando, ao menos primo conspectu e presentes os contornos do caso sub specie, no sentido de que as várias considerações que o acórdão recorrido teceu, aliás confirmativa da posição do TAD, parecem exatas, tanto mais que o juízo firmado não aparenta padecer de erros lógicos ou jurídicos manifestos, na certeza de que mostra-se assente em grande medida em fundamentação jurídica consonante com a jurisprudência deste Supremo Tribunal que foi produzida neste domínio e ainda do Tribunal Constitucional [TC] que convoca e cita, o que vale por dizer que a admissão do recurso não é necessária para uma melhor aplicação do direito, nem se pode fundar ou legitimar na relevância jurídica, cientes de que ante o que constitui o objeto de discussão legalmente admitido para o recurso de revista [art. 150.º, n.ºs 3 e 4, do CPTA] está afastada qualquer possibilidade de reapreciação do julgamento de facto.

10. Para além disso no caso também não se vislumbra uma especial relevância social ou indício de interesse comunitário significativo, presente que as questões de constitucionalidade não são um objeto próprio dos recursos de revista, pois podem ser separadamente colocadas junto do TC.

11. Com efeito, quanto a tais questões a intervenção solicitada deste Supremo não pode assegurar as finalidades inerentes à razão de ser do recurso excecional de revista, isto é, de, em termos finais, decidir litígios e/ou orientar e definir interpretações para futuras decisões de casos semelhantes no âmbito daquilo que constituem as matérias da sua competência especializada, tanto mais que em sede do controlo da constitucionalidade das normas e das interpretações normativas feitas a última palavra caberá ou mostra-se acometida ao TC.

12. Afigura-se-nos, para além disso, que para se lograr aceder ao TC e obter tutela em sede do controlo de questão de conformidade constitucional de normas não resulta como exigida, ou sequer como imposta, a necessidade de emissão de uma pronúncia sobre a questão por parte deste Supremo Tribunal no quadro do recurso de revista excecional tal como se mostra delimitado e gizado no art. 150.º do CPTA, tanto mais que um tal entendimento redundaria ou implicaria que, uma vez suscitada uma questão de constitucionalidade, houvesse lugar à necessária e imediata admissão do recurso de revista, ao arrepio daquilo que constituem as finalidades e âmbito do mesmo e dos critérios definidos.

13. Reiterando-se aqui o entendimento supra enunciado, o qual, aliás, faz aplicação à situação de posicionamento sucessivamente afirmado por esta Formação de Admissão quanto ao âmbito das questões objeto do recurso de revista quando, no essencial, este se cinge a questões de constitucionalidade, impõe-se, então, concluir no sentido de que a presente revista mostra-se inviável, não se justificando submetê-la à análise deste Supremo, valendo in casu a regra da excecionalidade supra enunciada.

DECISÃO
Nestes termos e de harmonia com o disposto no art. 150.º do CPTA, acordam os juízes da formação de apreciação preliminar da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal em não admitir a revista.
Custas a cargo da recorrente.
D.N..

Lisboa, 24 de março de 2022. – Carlos Carvalho (relator) – Teresa de Sousa – José Veloso.