Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0533/14
Data do Acordão:12/03/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P18326
Nº do Documento:SA2201412030533
Data de Entrada:05/13/2014
Recorrente:A...., LDA
Recorrido 1:INST DA VINHA E DO VINHO, I.P.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A………, Lda., com os demais sinais dos autos, notificada do acórdão proferido em 29/10/2014 que negou provimento ao recurso por si interposto da sentença do Tribunal Administrativo Fiscal de Viseu, que julgara improcedente a impugnação judicial deduzida contra autoliquidação da taxa de promoção devida ao Instituto da Vinha e do Vinho, no montante global de € 956.907,48 e relativa aos meses de Junho de 2004 a Janeiro de 2005, vem arguir, ao abrigo do disposto no art. 125º do CPPT e nos arts. 615º, nº 1, alínea d) e nº 4, 666º, 197º, nº 1 e 199º, nº 1 do novo Código de Processo Civil, e nos termos de fls.875 a 884 dos autos,
1) a nulidade do acórdão, por omissão de pronúncia
a) quer por não se ter pronunciado sobre três questões devidamente individualizadas, a saber:
─ A aplicação do regime de auxílios «de minimis» ao caso dos presentes autos viola, entre outros, o disposto no nº 4 do artigo 2º do Regulamento (CE) nº 1998/2006, da Comissão (cf. páginas 11 a 14 e respectivas conclusões "Q" e "R" das alegações de recurso da recorrente.
─ A anulação da taxa de promoção ilegalmente cobrada não viola os princípios da confiança e segurança jurídica; ao invés, a previsão, no TFUE, da obrigação de notificação prévia e proibição de execução de uma medida de auxílio não notificada, cria, legítima e juridicamente, na esfera dos particulares, uma direito e uma expectativa de cumprimento da mesma obrigação pelos Estados-Membros, dignos de tutela do princípio da confiança e segurança jurídica, que assim se mostram violados. (cf. páginas 15 a 16 e respectivas conclusões W e "V" das alegações de recurso da recorrente).
─ o entendimento de que a anulação da taxa de promoção por vício formal de procedimento violaria o princípio da proporcionalidade fosse, por fim, considerado ilegal (pedido), uma vez que, em suma (fundamentos), a anulação da taxa de promoção, posta ilegalmente em execução, violando o disposto no artigo 108.0, n.º 3, do TFUE, mostra-se não apenas necessária e adequada à salvaguarda do Direito Comunitário, como proporcional face à violação, que o Estado Português bem conhecia, da proibição de execução da medida em causa enquanto não houvesse pronúncia final da Comissão sobre a mesma. (cf. páginas 14 a 15 e respectivas conclusões "S" a "U" das alegações de recurso da recorrente);
b) quer por não se ter pronunciado sobre alegada incompetência do STA, em razão da hierarquia [a requerente havia suscitado a excepção da incompetência absoluta do STA, decorrente da infracção das regras de competência em razão da hierarquia, já que no acórdão ora reclamado se deu por reproduzido o acórdão anteriormente proferido em 23/4/2013 (proc. 29/13), que declarava que não existia, no caso em apreço, obrigação de notificação prévia à Comissão da medida de auxílio em análise, mas esta conclusão emerge da consideração de que a parte financiada pela taxa de promoção que foi legalmente afecta às medidas de promoção e publicidade - parte relativamente à qual o Tribunal e a Comissão concordam que estamos perante um auxílio de Estado - respeitava os limites dos auxílios de minimis, sendo que tal questão do respeito do limite de minimis - que se traduz em matéria de facto - consubstancia matéria de que o Supremo Tribunal Administrativo não podia tomar conhecimento, por força da respectiva competência em razão da hierarquia.]
Ora, havendo dever de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso (cfr. a parte final do nº 2 do art. 608º do CPC – e consubstanciando a apontada incompetência em razão da hierarquia uma questão de conhecimento oficioso, nos termos explanados, o acórdão reclamado encontra-se, também por esse motivo, ferido de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do disposto nos artigos 125º, nº 1, do CPPT e art. 615º, nº1, al. d) e nº 4, do CPC.
2) E mais invoca que no acórdão reclamado o STA acabou por apreciar matéria de facto - apreciar a suposta aceitação por parte da Comissão da argumentação do Estado Português e apreciar o respeito pelo limiar de minimis da medida em causa nos autos, sendo que esta apreciação e decisão sobre matéria de facto consubstancia matéria de que o STA não poderá conhecer, em razão da hierarquia, nos termos do disposto nos arts. 26º, al. b), e 38º, al. a), do ETAF e 280º, nº 1, do CPPT.
3) E invoca, ainda, que ao não se proceder ao reenvio oportunamente requerido pela requerente, o STA consagra uma interpretação do parágrafo 3 do art. 267º do TFUE violadora do art. 8º da CRP, assim como do princípio do juiz legal/natural, consagrado nos arts. 216º, nº 1 e 217º, nº 3, também da CRP. Isto porque a interpretação consagrada nega a competência exclusiva atribuída ao TJUE para julgar questões prejudiciais relativas à interpretação de normas do direito comunitário, quando as mesmas são suscitadas em processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional, cujas decisões não sejam susceptíveis de recurso judicial previsto no direito interno.
E por outro lado, ao não aplicar aos presentes autos a norma ínsita no nº 4 do art. 2º do Regulamento (CE) nº 1998/2006, da Comissão, também se verifica uma infracção ao art. 8º da CRP.
Em suma, invocam-se nulidades decorrentes da violação do princípio do contraditório e de ter sido apreciada matéria de facto, e invoca-se, igualmente, a nulidade do próprio acórdão, por omissão de pronúncia, quer por não se ter declarado incompetente em razão da hierarquia (já que se trata de excepção que é de conhecimento oficioso), quer por não se ter pronunciado sobre a violação de normas comunitárias (em concreto, a norma constante do nº 4 do art. 2º do Regulamento (CE) nº 1998/2006, da Comissão) e bem assim o vício de inconstitucionalidade, por não se proceder ao requerido reenvio prejudicial para o TJUE, em alegada violação do parágrafo 3 do art. 267º do TFUE e do art. 8º da CRP, bem como por violação do princípio do juiz natural.

2. Respondeu o Instituto da Vinha e do Vinho, I.P., nos termos de fls. 887 a 894 dos autos, no sentido de que inexistem inequivocamente as nulidades arguidas, devendo manter-se “in totum” o acórdão proferido.

3. Foram dispensados os vistos por se tratar de questão já apreciada de modo uniforme e reiterado.

4. Apreciando, pois:
Como a reclamante reconhece, o acórdão ora reclamado limita-se a reiterar, acolhendo na íntegra e reproduzindo a respectiva fundamentação, o já então decidido por acórdão deste Supremo Tribunal, de 23/4/2013, proferido no recurso nº 29/13.
A este acórdão foram, entretanto, também imputadas algumas nulidades e inconstitucionalidade pela recorrente (nulidades por violação do princípio do contraditório e por contradição entre os fundamentos e a decisão e inconstitucionalidade pela decisão de não reenvio), sendo que as demais também arguidas nos presentes autos o foram igualmente em relação ao acórdão deste STA, proferido no rec. nº 1503/12. E em ambos os casos, todas foram julgadas não verificadas e improcedentes por acórdãos deste mesmo STA, de 26/6/2013, proferidos nos recursos nºs. 29/13 e 1503/12.
É este julgamento que também aqui se reitera, nos termos e com os fundamentos constantes desses acórdãos do STA (de 26/6/2013 - recursos nºs. 29/13 e 1503/12), para os quais se remete, salvo quanto à alegada nulidade resultante de contradição entre os fundamentos e a decisão, não arguida nos presentes autos.
Razão pela qual e consequentemente se indeferirá o requerido.
Acresce que, como diz a recorrido IVV, I.P., claramente se constata do próprio acórdão proferido no recurso nº 29/13, de 23/4/2013, para o qual remete o acórdão ora reclamado, que aquele se pronuncia claramente sobre as questões que a reclamante enuncia como tendo sido objecto de omissão de pronúncia:
- sobre a questão de saber se a aplicação do regime de auxílios «de minimis» ao caso dos presentes autos viola o disposto no nº 4 do art. 2º do Regulamento (CE) nº 1998/2006, da Comissão, aquele acórdão refere o seguinte: «Acresce que também não podemos deixar de salientar que, mesmo em relação às dimensões da taxa de promoção que suscitaram dúvidas, a Comissão acabou por aceitar a argumentação da República Portuguesa no sentido de que se encontram abrangidas pelos Regulamento (CE) nº 1998/2006, de 15 de Dezembro, e cumprem os limites de minimis aí estabelecidos.
Ora, de acordo com o estabelecido no art. 2º do Regulamento (CE) nº 1998/2006, os auxílios de minimis estão isentos de notificação, não estando, pois, prevista qualquer aprovação ou confirmação por parte da Comissão. Em suma, para além de a Comissão ter concluído, logo no início do procedimento de averiguação, que a parte da taxa de promoção do vinho afecta ao financiamento do IVV, I.P., não constituía um auxílio de Estado, à partida, no momento da sua criação, era igualmente plausível ou prognosticável que a pequena parte afecta ao financiamento das medidas de promoção e publicidade respeitassem os limites de minimis, como a Comissão veio reconhecer a final. Na verdade, só à medida que fossem realizadas tais acções é que se poderia averiguar se seriam ou não ultrapassados os limites de minimis, não havendo até então qualquer obrigação de notificação.
O que se conclui é que a Comissão avançou de forma automática para o procedimento de averiguação sem antes ter analisado se os alegados auxílios estavam abaixo dos limiares fixados como um auxílio de minimis e, por conseguinte, fora do seu âmbito de intervenção, uma vez que o seu controlo pertence à responsabilidade exclusiva dos Estados-membros».
Ou seja, entendeu o STA acolher o entendimento da Comissão de que foram respeitados os limiares de minimis legalmente previstos, de onde facilmente se retira que não considera ilegal esse entendimento, pelos fundamentos acabados de citar.
- Sobre as restantes questões (quer a relativa à alegação de que anulação da taxa de promoção ilegalmente cobrada não viola os princípios da confiança e segurança jurídica, quer a relativa ao princípio da proporcionalidade) aquele acórdão afirma: «Tendo-se concluído pela inexistência, no caso em apreço, da obrigação de notificação, tal implica necessariamente inexistir igualmente obrigação de suspensão da execução da taxa em causa, justificando-se a manutenção da auto-liquidação em causa. Mas ainda que assim não se entendesse, a anulação da totalidade da taxa de promoção, como pretende a recorrente, por vício formal de procedimento, que é o único vício por si alegado, nas circunstâncias do caso, seria contrária, desde logo, ao princípio da proporcionalidade.
(…)
Por outro lado, o juízo de aferição da legalidade da auto-liquidação não pode deixar de levar em conta as consequências que a recorrente pretende retirar de uma pretensa violação formal da regra «standstill», sem ter demonstrado ou sequer alegado que, no caso em apreço, estavam ultrapassados os limites de minimis, ou que a taxa respeita a produtos importados de outros Estados-Membros ou de Países Terceiros. Em suma, a tese da recorrente conduziria, como já foi dito, a resultados absurdos e manifestamente desproporcionados».


DECISÃO
Assim, nos termos e pelos fundamentos, na parte aplicável, constantes dos preditos acórdãos deste STA, de 26/6/2013 (recs. nºs. 29/13 e 1503/12), acordam os juízes da secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em indeferir o requerido.

Custas pela requerente.

Junte cópia certificada dos acórdãos proferidos em 26/6/2013 nos procs. nºs. 29/13 e 1503/12.

Lisboa, 3 de Dezembro de 2014. – Pedro Delgado (relator) - Fonseca Carvalho - Isabel Marques da Silva.

Nota: Os acórdãos supra identificados encontram-se tratados e divulgados informaticamente nesta base de dados.