Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0902/17
Data do Acordão:01/24/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANTÓNIO PIMPÃO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P22817
Nº do Documento:SA2201801240902
Data de Entrada:07/14/2017
Recorrente:ADC - ÁGUAS DA COVILHÃ, EM
Recorrido 1:A... SA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
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1.1. A………….., SA, impugnou judicialmente, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, o indeferimento tácito da reclamação graciosa deduzida contra o ato de liquidação a que se reporta a fatura/recibo n.º0751203/19000535, no valor de 6.013,09€, emitida pela ADC – Águas da Covilhã, relativa ao consumo no período de 02/02/2012 a 01/03/2012, peticionando a anulabilidade dos atos impugnados.
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1.2. A sentença de 28/02/2017 (fls.274/284), concluiu o seguinte:
«Face ao exposto, julga-se a presente impugnação procedente e, em consequência, determina-se a anulação da liquidação impugnada, na parte a que se refere à “Tarifa Saneamento”, no montante de 2.933,84€, mais se condenando a ADC, EM, no reembolso do tributo pago indevidamente, e no pagamento dos respectivos juros compensatórios até à data do processamento da respectiva nota de crédito.».
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1.3. Não se conformando com a essa decisão, a ADC – Águas da Covilhã, EM, recorreu para o Tribunal Central Administrativo Sul que, por decisão sumária de 30/06/2017 (fls.336/338), declarou este Tribunal incompetente, em razão da hierarquia, para conhecer do recurso e competente a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.
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1.4. O recorrente apresentou as suas alegações nas quais formulou as conclusões seguintes (fls. 302 …):
«1. As Tarifas de saneamento encontram-se legalmente liquidadas em conformidade com o “Regulamento e Tabela de Taxas, Compensações e Outras Receitas” do Município da Covilhã, pela Lei das Finanças Locais, pela Lei Geral Tributária, pelo Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais, pela Lei do Sector Empresarial Local e pelos Estatutos da recorrente.
2. O tarifário de 2012 foi aprovado pelo órgão competente (vide Doc. sob o n.º 3, da Petição) e não se afiguram violados quaisquer preceitos legais ou a forma legalmente imposta para o mesmo. (aliás, as tarifas em causa foram estabelecidas em 10 de dezembro de 2010, tendo sido submetidas a discussão pública de Assembleia Municipal da Covilhã).
3. Tal tarifário foi divulgado e comunicado aos utentes, pela Recorrente, e nunca constituiu qualquer entrave à contratação ou manutenção dos serviços prestados pela mesma, mormente pela Recorrida.
4. Não obstante, tratarem-se de preços unilateralmente fixados, impostos por ato de autoridade pública e por entidade a quem foram delegados poderes de autoridade pública, não são os mesmos legalmente abusivos ou contrários à lei.
5. Aliás, se assim fosse, já a Inspeção-geral de Finanças e/ou o Tribunal de Contas, que analisa os planos económico-financeiros da empresa aqui recorrida, se teriam pronunciado sobre o assunto e imposto à Recorrente todas as legais consequências.
6. Acrescente-se apenas que, para além de tudo o que ficou expresso e demonstrado, os relatórios e as contas da Recorrente, estão publicados no site da mesma, para acesso de todos os utentes e com a transparência a que sempre os habituou.
7. Não é verdade que, das faturas emitidas pela Recorrente, não se afira a qualificação e a quantificação dos serviços ou as operações de apuramento da matéria sujeita a tarifação.
8. Os serviços e as tarifas de saneamento estão expressamente descritos e discriminados nas faturas emitidas e enviadas aos utentes;
9. Constam das mesmas: a descrição dos serviços e das tarifas, a explicação dos valores, o faturado, o valor unitário e o valor com IVA.
10. A atividade da Recorrente é fiscalizada pela “Entidade Reguladora de Serviços de Águas e Resíduos, I. P.”, e as suas contas, conforme alegado, pela Inspeção-geral de Finanças e pelo Tribunal de Contas.
11. A Recorrente rege a sua atividade no respeito pelos Princípios Gerais consignados na Lei de Bases do Ambiente e nos Princípios consagrados na Lei n.º 58/2005, de 29 de Dezembro, encontrando enquadramento jurídico quanto à constituição e regime na Lei n.º 58/98, de 18 de Agosto, alterada pela Lei n.º 53-F/2006, de 29 de Dezembro, que aprova o Regime Jurídico do Sector Empresarial Local.
12. Pelo que não existe qualquer desconformidade, mormente qualquer ilegalidade na atividade desenvolvida pela Recorrente.
13. O tarifário aplicado na liquidação do preço dos serviços da responsabilidade da Recorrente, é disponibilizado em suporte de papel e através do site da mesma — www.aguasdacovilha.pt — a todos os utentes;
14. Decorre do citado Regulamento a aplicação das tarifas aqui postas em crise (Cfr. art.º 36.º, 37.º e 38.º, com a epígrafe: respetivamente, Tarifa de Disponibilidade, Tarifa de Drenagem e Tarifa de Tratamento).
15. Este Regulamento, em conjugação com o tarifário em vigor, igualmente disponibilizado pela Recorrente; bem como todos os esclarecimentos prestados aos utentes no que respeita a legislação aplicável; a interpretação e clarificação, com acesso a legenda, de uma fatura tipo; entre muitos outros, fazem sucumbir, salvo melhor entendimento, a tese defendida pela Impugnante quanto à falta de informação dos utentes, que o tribunal a quo, entendeu como falta de fundamentação económico-financeira.
16. Não se verifica qualquer omissão do disposto no Art.º 8.º n.º 2 al. c) do RGTAL que possa sustentar como tendente a duplicação de tarifas.
17. O Município da Covilhã dispõe ainda de “Regulamento e Tabela de Taxas, Compensações e outras Receitas”, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 71, de 13 de Abril de 2010, e disponível no site www.cm-covilha.pt.
18. Deste Regulamento resulta, conforme impõe o art.º 8.º da Lei n.º 53-E/2006, de 29 de Dezembro, entre outras matérias:
a) A indicação da base de incidência objetiva e subjetiva;
b) O valor ou a fórmula de cálculo do valor das taxas a cobrar;
c) A fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas, designadamente os custos diretos e indiretos, os encargos financeiros, amortizações e futuros investimentos realizados ou a realizar pela autarquia local;
d) As isenções e sua fundamentação;
e) O modo de pagamento e outras formas de extinção da prestação tributária admitidas;
f) A admissibilidade do pagamento em prestações.
19. Termos pelos quais se pode afirmar que o supra enunciado Regulamento cumpre com o RGTAL e todos os legais dispositivos que lhe são aplicáveis.
20. Com efeito, as atualizações das tarifas são realizadas em conformidade com as normas legais e regulamentares aplicáveis (Cfr. art.º 32.º do “Regulamento de Águas Residuais”, capitulo VII tarifas e cobranças epígrafe regime tarifário: residuais “1 – A ADC estabelecera nos termos legais as tarifas e preços correspondentes ao serviços necessários ao correto funcionamento de todo o sistema, nomeadamente a disponibilidade do sistema de saneamento; a recolha de águas residuais e manutenção da rede e a do tratamento de águas residuais de forma a assegurar o equilibro económico e financeiro da ADC”; bem como o teor do disposto no Preâmbulo do referido Regulamento.
21. Ora as tarifas são legais, por praticado em conformidade com lei aplicável, e porque, como demonstrado, prevê a respetiva subdivisão de serviços e tarifas.
22. Não pode negar-se à Recorrente o cuidado e especial cumprimento dos princípios adstritos à informação e colaboração aos utentes.
23. O ato de liquidação foi realizado no estrito cumprimento de todos os deveres e incumbências a que a Recorrente se encontra adstrita, resultando as tarifas aplicadas, no aludido ato, da conjugação de disposições legais e regulamentares a que a mesma está vinculada.
24. Por conseguinte, é de concluir que as tarifas estão fundamentadas de acordo com os critérios legalmente impostos, de forma clara e expressa e que permitiram à recorrida impugnar.
25. Aliás, como se pode verificar, a mesma questão foi objeto de sentença favorável à aqui Recorrente, no âmbito do proc. n.º 97/11.SBECTB 400/11.OBECTB, 497/11.3BECTB, 653/11.4BECTB, 176/12.4BECTB E 225/12.6BECTB, todas do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, que confirmaram a inexistência de quaisquer ilegalidades.
26. Assim, não há falta de fundamentação económico-financeiro nas tarifas de saneamento, nem tão pouco por essa eventual falta, se poderá aferir a alegada duplicação, que se encontra inequivocamente explicada e individualizada por consubstanciar diferentes utilidades (tratamento de esgoto e drenagem de esgoto).
27. Sendo que a TARIFA FIXA DE DISPONIBILIDADE DE SANEAMENTO corresponde a uma tarifa cujo objetivo consiste na remuneração da entidade gestora por custos fixos incorridos na construção, conservação e manutenção dos sistemas necessários para a prestação de serviços (vide art. 36.º do Regulamento Municipal).
28. E A TARIFA VARIÁVEL DE SANEAMENTO, indexada ao volume de água utilizado, consubstanciando:
•a drenagem do esgoto, consubstanciada na recolha através as infraestruturas públicas, constituídas por ramais e coletores, distinto do que consubstancia,
•o tratamento, que implica avultados investimentos em Estações de tratamento de águas residuais com os respetivos recurso humanos específicos.
29. Serviços que obviamente integrando o saneamento, certo é que se podem distinguir dado refletir custos de investimento e de operacionalidade perfeitamente independentes e diferentes, o que justifica a distinção que o legislador cuidou em estabelecer, quer no decreto-regulamentar 23/95 de 23 de agosto e no atual decreto-lei 194/2009 de 20 de agosto, preconizando-se o princípio da transparência na prestação dos serviços.
30. Não há qualquer duplicação de tarifas, sendo inclusive de louvar a diferenciação dos valores que comporta o serviço de saneamento, informando-se os utentes dos concretos serviços que utiliza e a correspondente comparticipação nos custos dai decorrentes e aqui também se encontrando plasmados os princípios que determinam a fixação dos tarifários em conformidade com o disposto no Regime Económico-financeiro dos Recursos Hídricos.
31. Posto isto, mais acresce que, a douta sentença do tribunal a quo, fez uma deficiente e precipitada interpretação da alegada “Falta de fundamentação” alegada pela recorrida e justificando a “tendente duplicação” na falta de estudos ou elementos que justificassem a fundamentação das tarifas, sem que tal fato fosse alegado e demonstrado nos autos, já que o processo administrativo de criação e fixação das tarifas pelo Município não foi em momento algum solicitado à ora recorrente.».
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1.5. A recorrida contra-alegou tendo concluído de seguinte modo (fls. 322 …):
«1.ª O objeto do presente recurso reconduz-se à questão discutida na sentença recorrida, que apenas conheceu um dos vícios suscitados pela ora Recorrida, que consiste em determinar se o Regulamento municipal de águas residuais padece de ilegalidade, em especial por não cumprir as exigências legais previstas no artigo 8.º, n.º 2, alínea c), da Lei n.º 53-E/2006, ou seja por não apresentar a fundamentação económico-financeira das tarifas de Saneamento nele previstas.
2.ª O Tribunal a quo decidiu e bem que “não se vislumbra fundamento legal que permita a criação, por via regulamentar, de mais do que uma taxa ou tarifa, como contrapartida remuneratória pela realização de uma mesma actividade, (…)”, concluindo que a falta de fundamentação económico-financeira, “invocada na presente impugnação contra os actos impugnados (...) para além de infringir directamente a lei, artigo 8.º n.º 2, alínea c) do RGTAL, aprovado pela Lei n.º 53-E/2006 sempre seria capaz de votar a presente impugnação ao sucesso, pois sem ela não é possível verificar se inexiste duplicação de tributos, sendo que a aprovação de duas tarifas para o saneamento, sem que, no plano dos factos se demonstre a possibilidade de individualização dos serviços prestados – drenagem e tratamento – se terá como tendente à duplicação de obtenção de receita por um mesmo serviço”
3.ª A Recorrida, ao contrário do que parece sugerir a Recorrente, desde que contesta a cobrança das taxas de saneamento em crise, que invoca a ilegalidade do Regulamento com fundamento na falta de fundamentação económico-financeira.
4.ª A Recorrente, alegando que a Recorrida nunca se referiu à falta de fundamentação económico-financeira, mas sim à falta de informação, pretende camuflar o facto de, em momento algum, conseguir demonstrar a fundamentação económico-financeira das duas tarifas cobradas.
5.ª As nominadas “conclusões” das alegações da Recorrente, até porque são mais extensas do que o corpo das alegações, não correspondem a um mínimo de esforço de síntese das mesmas, não se podendo falar de efetivas conclusões, sendo, na verdade, o desenvolvimento ou a continuação do que consta no corpo das alegações, pelo que nem podem sequer ser passíveis de despacho de aperfeiçoamento.
6.ª O Regulamento de águas residuais aprovado em Assembleia Municipal de 10.12.2010 criou, nos seus artigos 32.º n.º 1, 33.º n.ºs 2 e 3, 37.º e 38.º, três taxas de saneamento: uma fixa, de disponibilidade do serviço e duas taxas variáveis: uma de drenagem de esgotos e outra de tratamento de esgotos, cada uma incidindo sobre o volume de água faturado.
7.ª O Regulamento n.º 26/2011 omitiu a sua fundamentação económico-financeira, pelo que a Recorrida fica sem compreender e nunca poderia aceitar que lhe cobrem duas taxas variáveis de saneamento a que acresce uma taxa fixa de disponibilidade.
8.ª O Regulamento aprovado em Assembleia Municipal de 10.12.2010 revela-se nulo e de nenhum efeito, por não cumprir as exigências legais previstas na Lei n. 53-F/2006, designadamente as indicadas na alínea c), do n.º 2 do artigo 8.º, ou seja por não apresentar a sua fundamentação económico-financeira.
9.ª A legalidade do Regulamento Municipal n.º 26/2011 não se cumpre com a mera remissão para as normas habilitantes, sendo necessário apresentar um estudo com a fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas, designadamente os custos diretos e indiretos, os encargos financeiros, amortizações e futuros investimentos realizados ou a realizar pela autarquia local, o que é expressamente previsto no artigo 8.º n.º 2, alínea c) da Lei n.º 53- E/2006.
10.ª A fundamentação económico-financeira omitida não é conhecida dos munícipes no âmbito da discussão em Assembleia Municipal, até porque na deliberação da Assembleia Geral junta com a contestação nada se oferece a este respeito.
11.ª A falta de fundamentação económico-financeira não é suprimível através da existência do respetivo tarifário legalmente aprovado ou da fatura emitida e enviada à Recorrida, nem consta no “Regulamento e Tabela de Taxas, Compensações e outras Receitas”.
12.ª Nos termos da alínea c), do n.º 2, do artigo 8.º da Lei n.º 53-E/2006 a justificação do valor da taxa de saneamento e se o mesmo reflete os custos dissociáveis e indissociáveis incorridos para o cabal desempenho da prestação de serviço de saneamento público, a existir, deveria encontra-se plasmada no estudo de fundamentação económico-financeira anexo ou ínsito no Regulamento n.º 26/2011, que criou as três taxas: uma fixa de disponibilidade e duas variáveis sobre o consumo de água faturado: drenagem e tratamento.
13.ª Não é em sede de contestação ou alegações que deve a ora Recorrente enunciar a fundamentação económico-financeira em falta no Regulamento, sob pena de assistirmos a uma fundamentação à posteriori vedada por lei.
14.ª Não logrou a Recorrente apresentar os elementos que poderiam fundamentar a taxa de saneamento cobrada, nem no Regulamento, onde deveriam estar, nem nos autos, razão bastante para permitir concluir que as tarifas impostas a todos os cidadãos do Município da Covilhã são aleatórias, injustificadas, são aquelas como poderiam ser quaisquer outras, pois desconhece-se a sua fundamentação económico-financeira e a ora Recorrente também não a sabe explicar.
15.ª A falta de fundamentação económico-financeira, além de justificar a ilegalidade do Regulamento em causa, por este não cumprir o requisito legal constante na alínea c), n.º 2 do artigo 8.º da Lei n.º 53-E/2006, sempre fundamentará a ilegalidade das duas tarifas cobradas, por não ser demonstrado que estas podiam, eventualmente, corresponder a dois serviços prestados.
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1.6. O Ministério Público emitiu a seguinte pronúncia:
«As conclusões devem condensar o argumentário expresso no texto das alegações, permitindo ao tribunal uma fácil apreensão dos fundamentos invocados pelo recorrente para a formulação do pedido de alteração ou anulação da decisão recorrida (art. 639º nº1 CPC)
No caso concreto as conclusões não cumprem essa função: expressando novos fundamentos não indicados no texto das alegações, assumem-se como o seu prolongamento.
Neste contexto promovo convite à recorrente para formulação de novas conclusões que sintetizem os fundamentos indicados no texto das alegações, com cominação de não conhecimento do recurso na parte afectada (art.639º nº3 CPC).».
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1.7. Notificadas as partes para se pronunciarem sobre a eventual incompetência deste STA, em razão da hierarquia, por se questionar matéria de facto nas conclusões 7, 8 e 9 nada disseram.
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1.8. Colhidos os vistos legais, cabe decidir.
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2. A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:
«a) Em 10 de Dezembro de 2010 foram aprovados pela Assembleia Municipal da Covilhã os regulamentos do sistema de abastecimento de água e de águas residuais, o qual foi publicado em Diário da República, 2.ª Série, n.º 8, de folhas 2508 a 2522, sob o Regulamento n.º 26/2011;
b) Para o ano de 2012, a título de saneamento devido por consumidores não-domésticos, foi fixado o seguinte tarifário (cfr. documento n.º 4, entregue com a contestação):


c) A impugnante foi notificada pela ADC, EM da factura n.º 0751203/19000535, no valor de 6.013,09€, relativa ao consumo do período de 02/02/2012 a 01/03/2012 (cfr. doc. 1 junto aos autos com a PI.);
d) No verso da factura mencionado no ponto anterior, encontra-se discriminado o valor liquidado a título de saneamento do seguinte modo, cujo teor aqui se dá integralmente reproduzido (cfr. doc. 1 junto aos autos com a PI)
Saneamento
Tarifa de Saneamento – 2.933,84 euros
Tarifa Disp. – 5,11 euros
e) A factura a que se referem as alíneas anteriores do probatório foi paga (provado por acordo cfr. alegação do artigo 3.º da petição inicial e aceite expressamente pela ADC, EM no artigo 1.º da sua contestação);
A 13/04/2012 a ora Impugnante apresentou junto da ADC da Covilhã, E.M., reclamação graciosa contra o acto de liquidação na alínea c) do probatório (Cfr. documento junto aos autos com a P.I.)
g) A 19/09/2011, a impugnante apresentou neste Tribunal a presente acção (cfr. data do SITAF).».
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3.1. Notificadas as partes para se pronunciarem sobre a eventual incompetência deste STA, em razão da hierarquia, por se questionar matéria de facto nas conclusões 7, 8 e 9 nada disseram.
Estas conclusões têm o conteúdo seguinte:
“7. Não é verdade que, das faturas emitidas pela Recorrente, não se afira a qualificação e a quantificação dos serviços ou as operações de apuramento da matéria sujeita a tarifação.
8. Os serviços e as tarifas de saneamento estão expressamente descritos e discriminados nas faturas emitidas e enviadas aos utentes;
9. Constam das mesmas: a descrição dos serviços e das tarifas, a explicação dos valores, o faturado, o valor unitário e o valor com IVA.”.
Nestas conclusões é afirmada matéria factual que, contudo, se encontra já estabelecida na alínea c) da matéria de facto.
Daí que se possa concluir que o recurso não questiona a matéria factual já fixada pelo que é de considerar este STA competente, em razão da hierarquia uma vez que o presente recurso versa apenas sobre matéria de direito.
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3.2. Afirma a recorrida na conclusão 5.ª das suas contra-alegações que “as nominadas “conclusões” das alegações da Recorrente, até porque são mais extensas do que o corpo das alegações, não correspondem a um mínimo de esforço de síntese das mesmas, não se podendo falar de efetivas conclusões, sendo, na verdade, o desenvolvimento ou a continuação do que consta no corpo das alegações, pelo que nem podem sequer ser passíveis de despacho de aperfeiçoamento.”.
Neste mesmo sentido sustenta o Ministério Público o seguinte:
«As conclusões devem condensar o argumentário expresso no texto das alegações, permitindo ao tribunal uma fácil apreensão dos fundamentos invocados pelo recorrente para a formulação do pedido de alteração ou anulação da decisão recorrida (art. 639º nº1 CPC).
No caso concreto as conclusões não cumprem essa função: expressando novos fundamentos não indicados no texto das alegações, assumem-se como o seu prolongamento.
Neste contexto promovo convite à recorrente para formulação de novas conclusões que sintetizem os fundamentos indicados no texto das alegações, com cominação de não conhecimento do recurso na parte afetada (art.639º nº3 CPC).».
Nos termos do artigo 639º 1 do CPC, as alegações devem apresentar conclusões “de forma sintética” indicando os fundamentos pelos quais pede a alteração ou anulação da decisão.
Na verdade não parecem ser as conclusões da recorrente um modelo de síntese.
Poderia, por isso, ordenar-se ao recorrente que tentasse sintetizá-las, nos termos do nº 3 do mesmo artigo 639º 1 do CPC.
Contudo, ainda que com algum esforço, não podemos deixar de referir que não são as mesmas absolutamente ininteligíveis.
Acresce que a interpretação do conceito de conclusões “de forma sintética” não tem merecido um entendimento uniforme na jurisprudência dos tribunais superiores.
Estamos perante um conceito relativamente indeterminado.
Parece-nos, contudo, que na situação concreta se entende a pretensão do recorrente e que a mesma foi interpretada pela recorrida que rebateu os diversos pontos questionados no recurso.
Torna-se, por isso, desnecessário efetuar o convite a que se refere o nº 3 do artigo 639º 1 do CPC.
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3.3. A sentença recorrida concluiu afirmando o seguinte:
“… se a autarquia podia cobrar numa só tarifa o preço pela drenagem das águas e pelo seu tratamento não infringe a lei que o faça fragmentando a sua base de incidência, visto que tal permite, desde logo, em abstrato, a cobrança apenas de uma dessas tarifas, quando seja possível individualizar a prestação de apenas um dos serviços. Imagine-se que um sujeito passivo pode necessitar da drenagem das águas, mas já não do seu tratamento, por dispor de uma ETAR própria, devolvendo as águas a jusante do tratamento da autarquia.
Entendemos, assim, em abstracto, que a fragmentação não implica a duplicação da tarifa, uma vez que uma só tarifa sempre podia compreender o valor da soma das duas tarifas criadas. Diferente seria se as duas tarifas incidissem sobre a mesma realidade objectiva, o que não podemos concluir pelo facto de ambas as tarifas serem calculadas com base no volume de água consumida, pois basta pensarmos que quer a drenagem, quer o tratamento de águas, se faz a determinado volume de água, medido em metros cúbicos, que sendo consumida há que drenar para seguidamente tratar.
Assim, o ponto que consideramos ser relevante para aferir da legalidade das duas tarifas cobradas, é o facto de estas incidirem ou não sobre diferentes serviços prestados pela autarquia, o que só podemos concluir quando seja possível confrontá-las com a sua fundamentação económico-financeira, sendo que a sua falta foi também invocada na presente impugnação contra os actos impugnados.
E de facto resulta do alegado pelas partes e não oferece controvérsia, que não existiu qualquer estudo ou outro elemento que permita atingir a justificação para a fixação das tarifas aprovadas e cobradas.
Essa omissão, para além de infringir directamente a lei, artigo 8.º, n.º 2, alínea c) do RGTAL, aprovado pela Lei n.º 53-E/2006 sempre seria capaz de votar a presente impugnação ao sucesso, pois sem ela não é possível verificar que inexiste duplicação de tributos, sendo que a aprovação de duas tarifas para o saneamento, sem que, no plano dos factos se demonstre a possibilidade de individualização dos serviços prestados – drenagem e tratamento – se terá como tendente a duplicação de obtenção de receita por um mesmo serviço.”.
Do exposto resulta que para a sentença recorrida é relevante, para aferir da legalidade das duas tarifas cobradas, o facto de estas incidirem ou não sobre diferentes serviços prestados pela autarquia, o que só é possível determinar perante a sua fundamentação económico-financeira.
Acrescenta que não existiu qualquer estudo ou outro elemento que permita atingir a justificação para a fixação das tarifas aprovadas e cobradas e que tal omissão infringe diretamente o artigo 8.º, n.º 2, alínea c) do RGTAL, aprovado pela Lei n.º 53-E/2006, e com tal omissão não é possível verificar que inexiste duplicação de tributos.
Ainda segundo a sentença recorrida a aprovação de duas tarifas para o saneamento, sem que, no plano dos factos se demonstre a possibilidade de individualização dos serviços prestados – drenagem e tratamento – conduzirá a duplicação de obtenção de receita por um mesmo serviço.
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3.4.Conforme resulta da matéria de facto provada (al. c) a impugnante foi notificada pela ADC, EM da factura n.º 0751203/19000535, no valor de 6.013,09€, relativa ao consumo do período de 02/02/2012 a 01/03/2012 (cfr. doc. 1 junto aos autos com a PI.).
Consta, ainda, da matéria de facto provada (al. d) que, no verso da factura mencionada no ponto anterior, encontra-se discriminado o valor liquidado a título de saneamento do seguinte modo, cujo teor aqui se dá integralmente reproduzido (cfr. doc. 1 junto aos autos com a PI)
Saneamento
Tarifa de Saneamento – 2.933,84 euros
Tarifa Disp. – 5,11 euros.
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3.5. O STA apreciou já as taxas referidas nos acórdãos de 08-11-2017, Proc. 0764/17, e de 15-11-2017, Proc. 0849/17, ainda que referentes, respetivamente, aos períodos de 16-11-2010 a 16-12-2010 e de 16-10-2010 a 15-11-2010.
É certo que, conforme consta do probatório, (al. a) em 10 de Dezembro de 2010 foram aprovados pela Assembleia Municipal da Covilhã os regulamentos do sistema de abastecimento de água e de águas residuais, o qual foi publicado em Diário da República, 2.ª Série, n.º 8, de folhas 2508 a 2522, sob o Regulamento n.º 26/2011 e (al. b) para o ano de 2012, a título de saneamento devido por consumidores não-domésticos, foi fixado o seguinte tarifário (cfr. documento n.º 4, entregue com a contestação).
As duas sentenças que foram apreciadas, naqueles acórdãos pelo STA, têm conteúdo diverso da sentença dos presentes autos.
Naquelas escreveu-se o seguinte:
Com efeito, apesar da Entidade impugnada remeter para o “Regulamento e Tabela de Taxas, Compensações e outras Receitas” do Município da Covilhã [publicado no Diário da República, 2ª Série, nº 71, de 13 de Abril de 2010], junto a fls. 284 a 302 dos autos, certo é que em tal regulamento não se detecta, nem a entidade impugnada identifica, qualquer norma que aluda à tributação devida pela actividade de saneamento de águas residuais urbanas, sendo, assim, forçoso concluir pela inexistência de regulamento municipal aplicável às taxas/tarifas em causa nos autos.
Deste modo, por falta de norma regulamentar de incidência tributária, ter-se-á de concluir pela anulabilidade do acto de liquidação impugnado, por vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos, na parte relativa às taxas/tarifas de “Saneamento”.».
Para a sentença aqui e agora recorrida porque não existiu qualquer estudo ou outro elemento que permita atingir a justificação para a fixação das tarifas aprovadas e cobradas, tal omissão infringe diretamente o artigo 8.º, n.º 2, alínea c) do RGTAL, aprovado pela Lei n.º 53-E/2006, pelo que não é possível verificar que inexiste duplicação de tributos.
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3.6. Contudo a recorrente, naqueles como neste recurso, não contraria nas conclusões das alegações o afirmado na sentença recorrida.
Afirma a recorrente, em termos genéricos, que o ato impugnado não é ilegal porque praticado em conformidade com o regulamento tarifário de 2010, o qual está em conformidade com a lei habilitante.
Refere que o ato de liquidação foi realizado no cumprimento de todos os deveres a que a recorrente se encontra obrigada e que as tarifas aplicadas, no ato em apreciação resultaram da conjugação de disposições legais e regulamentares a que a mesma está vinculada.
Podemos, por isso, acompanhar os dois acórdãos citados quando afirmam o seguinte:
“…
Na verdade, como se constata da alegação e das conclusões que a encerram e que delimitam o objecto do recurso, a recorrente alheia-se da motivação factual e jurídica que determinou a decisão de procedência da impugnação, não ensaiando demonstrar o seu desacerto, pois que, de forma patente, não põe em crise os concretos motivos que levaram o Mmº Juiz a julgar procedente o pedido, deixando-os incólumes.
Ora, como tem sido afirmado, de forma reiterada, pelo Supremo Tribunal Administrativo, o recurso jurisdicional tem por objecto a sentença recorrida (e não o acto impugnado), destinando-se a anulá-la ou a alterá-la com fundamento em vício de forma (nulidade) ou de fundo (erro de julgamento) que o recorrente entenda afectá-la, não podendo obter provimento o recurso quando não é feito qualquer reparo às razões e fundamentos específicos que sustentam o decidido.
Ou, por outras palavras, constituindo o recurso jurisdicional um meio de impugnação da decisão judicial com vista à sua alteração ou anulação pelo tribunal superior após reexame da matéria de facto e/ou de direito nela apreciada, correspondendo, assim, a um pedido de revisão da legalidade da decisão com fundamento nos erros e vícios de que padeça, estará votado ao insucesso o recurso que se alheia totalmente da fundamentação factual e/ou jurídica que determinou a decisão de indeferimento liminar de um processo de impugnação – cfr. acórdão do STA de 11/05/2011, no recurso nº 04/11.”
Do exposto resulta que não merece provimento o presente recurso pois que a recorrente não contraria o afirmado na sentença recorrida de que não existiu qualquer estudo ou outro elemento que permita atingir a justificação para a fixação das tarifas aprovadas e cobradas e que tal omissão infringe diretamente o artigo 8.º, n.º 2, alínea c) do RGTAL, aprovado pela Lei n.º 53-E/2006, não sendo possível verificar se existe ou não a alegada duplicação de tributos.
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O recurso jurisdicional constitui um pedido de revisão da legalidade da decisão com fundamento nos erros e vícios de que padeça, pelo que improcede o recurso que se alheia da motivação factual e/ou jurídica que determinou a decisão de procedência da impugnação.
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4. Face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 24 de janeiro de 2018. – António Pimpão (relator) – Ascensão Lopes – Ana Paula Lobo.