Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0119/23.0BALSB
Data do Acordão:02/21/2024
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:ANABELA RUSSO
Descritores:UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
MESMA QUESTÃO DE DIREITO
Sumário:I - O recurso para o Supremo Tribunal Administrativo de decisão arbitral pressupõe que se verifique, no caso entre as decisões arbitral recorrida e a decisão arbitral invocada como fundamento, oposição quanto à mesma questão fundamental de direito (artigo 25.º, n.º 2 do RJAT).
II - Inexistindo essa oposição, não deve tomar-se conhecimento do mérito do recurso.
Nº Convencional:JSTA000P31942
Nº do Documento:SAP202402210119/23
Recorrente:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A... UNIPESSOAL, LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
RECURSO DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA

PLENO DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO


1. RELATÓRIO

1.1. A Autoridade Tributária interpôs, ao abrigo do preceituado, conjugadamente, nos artigos 25º nº 2 do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT) e 152º nº 1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência, alegando que perfilharam entendimentos opostos relativamente à mesma questão fundamental de direito a decisão arbitral proferida a 30 de Novembro de 2021 no processo nº 386/2021-T (decisão recorrida) e a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Administrativo, a 27 de Fevereiro de 2019, no processo n.º 22/18.5BALSB (decisão fundamento – integralmente disponível em www.dgai.pt ).

1.2. Tendo alegado, conclui nos seguintes termos a sua motivação de recurso:

«A) A Autoridade Tributária e Aduaneira vem, nos termos do artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aplicável por força do artigo 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), interpor recurso para esse Supremo Tribunal da Decisão Arbitral, de 03.01.2022, emitida no processo n.º 252/2021-T, do CAAD, por estar em contradição com o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, em 27.02.2019, no Processo n.º 022/18.5BALSB, que se indica como fundamento, designadamente, no segmento decisório respeitante à condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios desde a data do pagamento do imposto até efetivo e integral reembolso.

B) A Decisão Arbitral recorrida colide frontalmente com a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Administrativo no Acórdão proferido em 27.02.2019, no processo n.º 022/18.5BALSB, que se indica como fundamento, relativamente ao termo inicial de contagem dos juros indemnizatórios, no caso de revisão oficiosa do ato tributário por iniciativa do contribuinte.

C) O pedido de pronúncia arbitral foi deduzido na sequência da notificação do despacho de indeferimento prolatado em 07/04/2021, após o pedido de revisão oficiosa, apresentado em 30/12/2020, das liquidações de ISV efetuadas pela Alfândega de Braga, resultantes da apresentação pela ora recorrida das Declarações Aduaneiras de Veículos (DAV) abaixo identificadas, pedido esse que sustentou a tempestividade da pretensão da Requerente junto da instância arbitral

DAV n°
Liquidação n°
Data limite de pagamento
2017/...07
2017/...70
2017-06-01
2017/...15
2017/...89
2017-05-31
2017/...08
2017/...20
2017-06-07
      2017/...21
2017/...50
2017-12-14
2018/...98
2018/...29
2018-02-06
2018/...30
2018/...37
2018-05-16
2018/...90
2018/...53
2018-05-16
2018/...33
2018/...88
2018-05-16
2018/...35
2018/...78
2018-12-26
      2019/...71
2019/...41
2019-03-08
2019/...48
2019/...53
2019-04-26
2019/...46
2019/...71
2019-06-17
2020/...37
2020/...76
2020-03-19
2020/...38
2020/...84
2020-03-19
2020/...46
2020/...92
2020-03-19
      2020/...21
2020/...69
2020-03-20
2020/...85
2020/...78
2020-03-31

D) A Decisão Arbitral sob recurso entendeu, na parte em que se refere aos juros indemnizatórios, serem devidos pela AT, a contar da data do pagamento do imposto.

E) A Decisão Arbitral recorrida incorreu, pois, em erro de julgamento ao não enquadrar o direito a juros indemnizatórios, como devia, no artigo 43º, nº 3, alínea c) da LGT, que consagra um regime especial, quanto aos juros indemnizatórios.

F) No Acórdão fundamento estava em causa “a extensão temporal dos juros indemnizatórios devidos em caso de revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte (art. 43.º n.º 3 al. c) LGT)”, tendo esse douto STA decidido quanto à extensão temporal dos juros indemnizatórios devidos em caso de revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte (art. 43º, nº 3, al c) da LGT), que “A decisão recorrida atribuiu a indemnização a partir da ocorrência do evento danoso, sendo que face às normas de direito tributário vigente tal indemnização não tem assento legal, pelo menos sob a égide do processo de impugnação da decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa do acto de liquidação”, concluindo que “não há lugar a juros indemnizatórios visto o pedido de revisão do acto tributário haver sido decidido em período inferior a um ano contado da apresentação deste pedido de revisão, como resulta do disposto no art.º 43.º, n.º 3, c) da Lei Geral Tributária.”.

G) Demonstrada está, assim, uma evidente contradição entre a Decisão recorrida e o Acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito que se prende com o pagamento de juros indemnizatórios nas situações de revisão do ato tributário por iniciativa do contribuinte, que importa dirimir, mediante a admissão do presente recurso e consequente anulação do segmento decisório contestado, com substituição do mesmo por nova Decisão que determine a improcedência do pedido de condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do nº 6, do artigo 152º do CPTA.

H) A infração a que se refere o nº 2, do artigo 152º do CPTA, traduz-se num manifesto erro de julgamento expresso na decisão recorrida, na medida em que a Decisão Arbitral viola o disposto na alínea c), do nº 3 do artigo 43º da LGT, o qual determina que, nas situações de revisão do ato tributário por iniciativa do contribuinte, são devidos juros indemnizatórios apenas a partir de um ano após a apresentação do pedido de revisão.

I) Como tem sido entendido pela Jurisprudência e Doutrina, o regime estabelecido no artigo 152.º do CPTA, para os recursos para uniformização da jurisprudência, destina-se a obter decisão que fixe a orientação jurisprudencial nos casos em que se verifiquem os seguintes pressupostos: i) existência de decisões contraditórias entre acórdãos do STA ou deste e do TCA ou entre acórdãos do TCA; ii) contraditoriedade decisória “sobre a mesma questão fundamental de direito”; iii) verificação do trânsito em julgado, quer do acórdão recorrido, quer do acórdão fundamento, devendo o recurso se mostrar interposto no prazo de 30 dias contado do trânsito do acórdão recorrido; iv) não conformidade da orientação perfilhada no acórdão impugnado com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA; a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta.

J) No presente caso, estão preenchidos todos os requisitos de admissibilidade do Recurso, impostos pelo artigo 152º do CPTA, designadamente os enunciados no Acórdão do Pleno do STA de 21.04.2016, proferido no processo nº 0698/15, quanto à contradição da mesma questão fundamental de direito, que pressupõe “identidade essencial quanto à matéria litigiosa”, conforme o Acórdão do S.T.J. de 02.02.2017, proferido no proc. 4902/14.9T2SNT.LI.SI-A.

K) Está em causa a aplicação, de forma diversa, dos mesmos preceitos legais em situações fácticas substancialmente idênticas, não se entendendo estas como total identidade dos factos, mas apenas a sua subsunção às mesmas normas legais, na linha do entendimento de Jorge Lopes de Sousa (CPPT anotado, a págs. 809), e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no recurso nº 87156, de 26.04.1995.

L) Resulta claro da jurisprudência assente desse Alto Tribunal que a norma do artigo 43.º, n.º 3, alínea c), da LGT consagra um regime especial, quanto aos juros indemnizatórios, que se aplica aos casos de revisão, como o dos autos, que não se enquadra na situação típica em que há impugnação da liquidação após o pagamento do imposto em causa.

M) Concluindo-se que, ao não ter subsumido o caso sub judice à alínea c) do nº 3 do artigo 43º da LGT, a Decisão Arbitral recorrida evidencia manifesta contradição quanto à mesma questão fundamental de direito com a jurisprudência firmada pelo Pleno do STA:

- no Acórdão convocado como fundamento, de 27.02.2019, proferido no Proc.º 022/18.5BALSB;

- e com a sua Jurisprudência mais recente, designadamente a firmada no Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 26.05.2022, no Processo nº 159/21.3BALSB, sobre a mesma matéria e em que estava em causa situação fática absolutamente idêntica e tendo por objeto o mesmo Imposto sobre Veículos, pelo que deve ser substituída por nova decisão que julgue improcedente o pedido de condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios.

1.3. Não houve contra-alegações.

1.4. O Exmo. Procurador-Geral-Adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo, emitiu parecer no sentido de não se tomar conhecimento do mérito do recurso por não se verificarem todos os requisitos de que depende a sua admissibilidade.

1.5. Colhidos os vistos dos Excelentíssimos Juízes Conselheiros Adjuntos, nos termos do preceituado no artigo 92.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, cumpre, agora, decidir, o que fazemos pela intervenção do Pleno desta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.

2. OBJECTO DO RECURSO

2.1. Pretende a Recorrente com a interposição do presente recurso que se uniformize jurisprudência relativamente a uma mesma questão fundamental de direito, que, em seu entender, foi decidida em sentido oposto nas decisões recorrida e fundamento, a saber, qual a extensão temporal de juros devida nas situações em que as liquidações são anuladas na sequência de pedido de revisão decidido pela Administração Tributária em prazo inferior a 1 ano sublinhando que a tese perfilhada pela decisão recorrida é divergente daquela que vem sendo a jurisprudência uniforme desta Secção e Tribunal.

2.2. Atento o exposto, as questões que cumpre decidir são as seguintes: (i) saber se efectivamente se verifica a alegada oposição de julgamentos nas decisões recorrida e fundamento invocadas e, em caso afirmativo, se o sentido do julgado perfilhado na decisão recorrida não esta conforme a jurisprudência consolidada deste Supremo Tribunal Administrativo quanto a essa mesma questão fundamental de direito (ii) decidindo este Pleno pela verificação dos pressupostos substantivos, apreciar e decidir a questão fundamental de direito objecto de apreciação na decisão recorrida enunciada no ponto 2.1.

3. FUNDAMENTAÇÃO

3.1. Fundamentação de facto

3.1.1. Na decisão recorrida foi dada como provada a seguinte factualidade:

«5.3. A Requerente é uma sociedade comercial que se dedica à comercialização de veículos automóveis usados, conforme cópia da certidão permanente anexada com o pedido (doc. nº 1 anexado pela Requerente).

5.4. No decurso da sua atividade profissional, e no período entre Maio de 2017 e Março de 2020, introduziu no consumo, em Portugal, os seguintes veículos automóveis usados ligeiros de passageiros, apresentando para o efeito, junto da Alfândega de Braga, as respectivas Declarações Aduaneiras de Veículo (DAV) (cujas cópias foram anexadas pela Requerente):

MARCA
MODELO
ORIGEM
DAV Nº
DATA ENTRADA EM TN
TERMO PRAZO APRESENTAÇÃO DAV
DATA DAV
...
...
FR
2017/...
28-03-2017
02-05-2017
21-12-2020
...
...
FR
2017/...
28-03-2017
02-05-2017
21-12-2020
...
...
AL
2017/...
18-05-2017
19-06-2017
21-12-2020
...
...
FR
2017/...
05-11-2017
04-12-2017
21-12-2020
...
...
AL
2018/...
22-01-2018
20-02-2018
01-02-2018
...
...
ES
2018/...
13-04-2018
15-05-2018
10-05-2018
...
...
ES
2018/...
13-04-2018
15-05-2018
10-05-2018
...
...
ES
2018/...
13-04-2018
15-05-2018
10-05-2018
...
...
FR
2018/...
22-11-2018
20-12-2018
12-12-2018
...
...
AL
2019/...
20-02-2019
20-03-2019
25-02-2019
...
...
FR
2019/...
09-04-2019
10-05-2019
12-04-2019
...
...
AL
2019/...
30-05-2019
01-07-2019
01-06-2019
...
...
AL
2020/...
17-02-2020
17-03-2020
06-03-2020
...
...
LT
2020/...
17-02-2020
17-03-2020
06-03-2020
...
...
AL
2020/...
17-02-2020
17-03-2020
06-03-2020
...
...
LT
2020/...
17-02-2020
17-03-2020
11-03-2020
...
...
FR
2020/...
17-02-2020
17-03-2020
02-04-2020

5.5. No Quadro T das DAV identificadas no ponto anterior identificam-se as liquidações de ISV que incidiram sobre cada uma das viaturas nelas referidas, como a seguir se indicam (cujas cópias foram anexadas pela Requerente):

DAV Nº
LIQUIDAÇÃO ISV
DATA LIQUIDAÇÃO
MONTANTE
DATA PAGAMENTO
2017/...
2017/...
02-05-2017
3.315,94
18-05-2017
2017/...
2017/...
02-05-2017
3.316,84
17-05-2017
2017/...
2017/...
24-05-2017
1.870,39
24-05-2017
2017/...
2017/...
28-11-2017
2.649,11
29-11-2017
2018/...
2018/...
23-01-2018
2.002,68
30-01-2018
2018/...
2018/...
02-05-2018
226,29
08-05-2018
2018/...
2018/...
02-05-2018
3.505,49
08-05-2018
2018/...
2018/...
02-05-2018
226,29
08-05-2018
2018/...
2018/...
10-12-2018
57.405,11
11-12-2018
2019/...
2019/...
22-02-2019
1.455,79
22-02-2019
2019/...
2019/...
10-04-2019
2.432,16
10-04-2019
2019/...
2019/...
31-05-2019
10.414,85
31-05-2019
2020/...
2020/...
05-03-2020
4.681,35
05-03-2020
2020/...
2020/...
05-03-2020
287,82
05-03-2020
2020/...
2020/...
05-03-2020
4.939,68
05-03-2020
2020/...
2020/...
06-03-2020
287,82
10-03-2020
2020/...
2020/...
17-03-2020
4.421,16
31-03-2020
TOTAL
103.438,77.
5.6. No Quadro R de cada uma das DAV identificadas no ponto anterior, está identificado o ISV que incidiu sobre a “Componente Cilindrada” (num total de EUR 67.122,22), a respectiva redução devida pelo número de anos de uso aplicável sobre aquela componente (num total de EUR 19.614,89) e o ISV que incidiu sobre a “Componente Ambiental”, sem qualquer redução (num total de EUR 58 350,41).

5.7. A Requerente pagou a totalidade do imposto de ISV nas datas indicadas no ponto 5.5., supra, em conformidade com o evidenciado no Quadro T de cada uma das referias DAV (cujas cópias foram anexadas pela Requerente).

5.8. A cada um dos veículos acima identificados foi atribuída uma matrícula nacional, pelo Instituto Mobilidade dos Transportes – Delegação Distrital Viação de Braga, em conformidade com o evidenciado no Quadro M de cada uma das DAV acima identificadas nos pontos 5.4. e 5.5. (cujas cópias foram anexadas pela Requerente):

MARCA
MODELO
ORIGEM
DAV Nº
MATRÍCULA ATRIBUÍDA
FR
2017/...
FR
2017/...
AL
2017/...
FR
2017/...
AL
2018/...
ES
2018/...
ES
2018/...
ES
2018/...
FR
2018/...
AL
2019/...
FR
2019/...
AL
2019/...
AL
2020/...
LT
2020/...
AL
2020/...
LT
2020/...
FR
2020/...

5.9. A Requerente procedeu ao pagamento do imposto liquidado, de acordo com as datas evidenciadas em cada uma das DAV, mas considera que as liquidações de ISV identificadas estão feridas de um vício de ilegalidade no que diz respeito ao cálculo da componente ambiental, por não ter sido considerada qualquer percentagem de redução do imposto naquela componente, em função da antiguidade do veículo, o que a Requerente calcula em EUR 16.931,74.

5.10. A Requerente apresentou, em 30-12-2020, junto da Alfândega de Braga, um pedido de revisão oficiosa dos actos de liquidação de ISV identificados no ponto 5.5., supra, interposto ao abrigo do disposto no artigo 78 da Lei Geral Tributária (LGT), com fundamento em erro imputável aos serviços (doc. nº 2 anexado pela Requerente) peticionando a anulação parcial daquelas liquidações.

5.11. A Requerente foi notificada, através do Ofício nº ...24, de 22-01-2021, do despacho do Senhor Director da Alfândega de Braga, de 03-02-2021, relativo à intenção de indeferir o pedido de revisão oficiosa apresentado com base nos seguintes argumentos (doc. nº 3 apresentado pela Requerente):

(…)

5.12. Através do mesmo Ofício foi a Requerente notificada para exercer, querendo, no prazo de 15 dias, o respectivo direito de audição (doc. nº 3 apresentado pela Requerente).

5.13. A Requerente apresentou o seu direito de audição dentro do prazo, reiterando a argumentação apresentada com o pedido de revisão oficiosa dos actos de liquidação de ISV em crise, requerente a sua anulação parcial (doc. nº 4 apresentado pela Requerente).

5.14. A Requerente foi notificada, através do Ofício nº..., de 08-04-2021, do despacho de indeferimento do pedido de revisão oficiosa dos actos de ISV identificados, proferido pelo Senhor Director da Alfândega de Braga, em 07-04-2021 (doc. nº 5 apresentado pela Requerente).

5.15. A Requerente apresentou, em 29-06-2021, o presente pedido de constituição de Tribunal Arbitral, peticionando a anulação parcial das liquidações de ISV identificadas e o reembolso do montante de ISV que considera ter pago em excesso (EUR 16.931,74), acrescido de juros indemnizatórios.

5.16. No pedido de pronúncia arbitral, a Requerente vem requerer, caso subsistam dúvidas sobre a interpretação do artigo 11º do TFUE, o reenvio prejudicial da questão inerente à alegada violação do disposto neste artigo do TFUE pelo artigo 11º do Código do ISV.».

3.1.2. Na decisão fundamento resultaram apurados os seguintes factos:

«1. A Requerente é proprietária do prédio urbano, descrito na Caderneta Predial Urbana como terreno para construção urbana, inscrito sob o n°..., da Freguesia de..., Concelho de Loulé, Distrito de Faro.

2. O Valor Patrimonial Tributário (VPT) era, para efeitos das liquidações de Imposto do Selo em crise (ano 2012 e ano 2013), de EUR 1.009.490,00, determinado em 2012.

3. Sobre o imóvel acima identificado foram emitidas as seguintes liquidações de Imposto do Selo (verba 28.1.):

4. O montante de Imposto do Selo liquidado, no valor de EUR 10.094,90, relativo ao ano de 2012, deveria ser pago até 31 de Dezembro de 2013, através da nota de cobrança n° 2013...

5. Dado que o referido montante não foi pago dentro do prazo limite para pagamento voluntário, a divida evoluiu para cobrança coerciva, tendo dado origem ao processo de execução fiscal (PEF) n° ...2014..., instaurado em 20 de Janeiro de 2014, no valor total de EUR 10.324,52.

6. O imposto (EUR 10.094,90) e o respectivo acrescido (EUR 229,62) foram pagos, em 25 de Junho de 2014, em sede de execução fiscal.

7. O montante de Imposto do Selo liquidado, no valor de EUR 10.094,90, relativo ao ano de 2013, deveria ser pago de acordo com as seguintes prestações:

8. A Requerente não pagou nenhuma das prestações de imposto, relativas ao ano 2013, dentro do prazo para pagamento voluntário legalmente estabelecido para o efeito, tendo a divida evoluído para cobrança coerciva, dando origem aos seguintes PEF, instaurados em Junho de 2014, nos seguintes termos (montantes em Euros):

9. A Requerente apresentou, em 30 de Outubro de 2015, requerimento dirigido ao Chefe do Serviço de Finanças de Loulé ..., no âmbito dos PEF identificados nos pontos 5.1.5, 5.1.6. e 5.1.8., no sentido de requerer a extinção das referidas execuções fiscais e “(...) o levantamento de eventuais penhoras que possam ter sido (...) realizadas para garantia das alegadas dividas (...), bem como o cancelamento do seu registo se a este tiver havido Lugar (…)”.

10. A Requerente apresentou, em 28 de Setembro de 2016, dois pedidos de revisão oficiosa de acto tributário relativos aos actos de liquidação acima identificados no ponto 5.1.3., no sentido de peticionar, para cada um dos anos em causa (2012 e 2013), a “(...) rescisão do acto tributário de imposto do selo da verba 28.1 da TGIS (…)”; e em consequência, requerer “(...) a anulação desse acto tributário (...)”, e “(...) a restituição a Requerente da quantia indevidamente paga (...) acrescida de juros indemnizatórios sobre essa importância, contados desde o pagamento indevido (...) ate a data da emissão da respectiva nota de credito, a taxa legal (…)”.

11. A Requerente foi notificada dos despachos de deferimento parcial de cada um dos pedidos de revisão oficiosa dos actos tributários acima identificados (com dispensa do direito de audição previa), formulados com base na Informação n° ...17..., de 04-05-2017 (processo n° ...16... relativo ao Imposto do Selo de 2012) e com base na Informação n° ...17..., de 04-05-2017 (processo n° ...16... relativo ao Imposto do Selo de 2013), ambas da DS de IMT, as quais foram emitidas no sentido de decidir “(...) o deferimento parcial da (...) revisão oficiosa (…)” para cada um dos actos, “(...), com as seguintes consequências:

a. Relativamente ao ano 2012, determinou-se “(...) a anulação da liquidação contestada; a restituição do imposto indevidamente pago, no valor de €10.094,90; o não reconhecimento do direito aos juros indemnizatórios (…)” e, “quanto ao valor de €229,62, também (...) reclamado, e referente a juros de mora e custas cobrados em sede de execução fiscal (...) o procedimento de revisão dos actos tributários (...) não e o meio próprio para apreciar esta matéria (…)”, dela não conhecendo;

b. Relativamente ao ano 2013, determinou-se “(...) a anulação da liquidação contestada; a restituição do imposto indevidamente pago, no valor de € 10.094,90; o não reconhecimento do direito aos juros indemnizatórios (…)” e, “quanto ao valor de € 455,35, também (...) reclamado, e referente a juros de mora e custas cobrados em sede de execução fiscal (...) o procedimento de revisão dos actos tributários (...) não é o meio próprio para apreciar esta matéria (…)”, dela não conhecendo».

3.2. Fundamentação de Direito

3.2.1. Da admissibilidade do Recurso para Uniformização de Jurisprudência: os pressupostos formais.

Por despacho da ora Relatora de 14 de Setembro de 2023 o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência foi liminarmente admitido, por então se terem julgado verificados os pressupostos formais de admissão, designadamente de tempestividade e legitimidade.

Reanalisados os articulados e averiguada a existência de quaisquer circunstâncias contemporâneas ou de ocorrência posterior à prolação do referido despacho liminar de admissão, conclui-se inexistir qualquer fundamento para que o reconhecimento de legitimidade e de tempestividade então realizado deva ser alterado: a Recorrente ficou vencida na decisão arbitral recorrida e interpôs o presente recurso no prazo de 30 dias contados do trânsito em julgado da decisão sumária proferida a 6 de Junho de 2023, proferida pelo Tribunal Constitucional no recurso de constitucionalidade que lhe foi dirigido pelo Ministério Público da sequência da sua notificação da decisão arbitral recorrida.

3.2.2. Da admissibilidade do recurso para Uniformização de Jurisprudência: os pressupostos substanciais.

Como é sabido, a admissibilidade do Recurso para Uniformização de Jurisprudência depende, nuclearmente, da verificação cumulativa de dois requisitos: a) que haja contradição entre a decisão recorrida e o acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito; b) que a decisão impugnada não esteja estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo sobre a mesma questão (cfr. artigos 27.º, alínea b), do ETAF, 284.º do CPPT e 152.º do CPTA).

Há jurisprudência recentemente consolidada a obstar à admissão do recurso se o Pleno ou a Secção por sucessivos acórdãos (especialmente quando deles resulta a intervenção de todos ou quase todos Senhores Conselheiros em exercício de funções na data de prolação do acórdão, o que permite concluir que todos perfilham o mesmo fundamento e sentido decisório), já se pronunciaram sobre a questão, julgando-a, reiteradamente e sem votos de vencido, no mesmo sentido.

Há contradição ente a decisão recorrida e a decisão fundamento sobre uma mesma questão fundamental de direito sempre uma mesma questão de direito (que nos é submetida para julgamento de uniformização) foi apreciada e decidida num quadro fáctico substancialmente idêntico. Ou seja, a existência de uma mesma questão de direito pressupõe que exista uma identidade substancial de situações fácticas e que os factos determinantes em ambos os julgamentos tenham sido subsumidos a um regime jurídico substancialmente idêntico. Se o regime aplicado numa e noutra das decisões não for substancialmente idêntico - o que ocorrerá sempre que à luz de eventuais alterações de regime possam ser suscitados e valorados argumentos capazes de conduzir a outra solução - então não pode afirmar-se que num e noutro dos arestos foi apreciada uma mesma questão fundamental de direito.

Sintetizando. A apreciação do mérito do Recurso para Uniformização de Jurisprudência depende de um conjunto de pressupostos substantivos e o Supremo Tribunal Administrativo só o aprecia e uniformiza jurisprudência se tais requisitos estiverem cumulativamente preenchidos. Estes pressupostos destinam-se a confirmar que a questão de direito suscitada em ambas decisões (recorrida e fundamento) é substancialmente idêntica e que as respostas dadas por cada um dos julgamentos convocados são opostas.

É o que resulta, tendo presente que este Recurso para Uniformização de Jurisprudência foi interposto de decisão arbitral, do preceituado nos artigos 25.º, n.ºs 2 e 3 do RJAT, 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), 140.º, n.º 3 e 152.º, n.º 3 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e 688.º, n.º 2 do Código de Processo Civil (CPC).

Posto isto, e revertendo ao caso concreto, podemos já adiantar que não é discutido nem discutível que quer na decisão recorrida quer na decisão fundamento os Tribunais apreciaram o mérito das pretensões apresentadas pelos Requerentes dos respectivos pedidos de pronúncia arbitral. E é também seguro concluir-se que através desses julgamentos foi posto termo aos respectivos processos.

A questão que permanece é, pois, tão só, a de saber se esses julgamentos proferiram decisões opostas relativamente a uma mesma questão de direito.

Vejamos, então, o que aí ficou decidido.

Na decisão recorrida estava em causa a legalidade do ISV liquidado sobre um conjunto de viaturas importadas, tendo o julgador, após concluir que o artigo 11.º do Código do ISV era desconforme o direito da União Europeia, decidido anular parcialmente as liquidações, reconhecer ao contribuinte o direito o reembolso do que indevidamente tinha pago e, bem assim, condenar a Autoridade Tributária no pagamento de juros indemnizatórios contados sobre esse valor desde a data de pagamento ao abrigo do preceituado nos artigos 43.º, n.º 1 al. d) da LGT e 61.º, n.º 5 do CPPT (sublinhado de nossa autoria, tal como os demais que infra se encontram realizados nas decisões recorrida e fundamento).

Recuperemos o discurso fundamentador na parte pertinente para o que nos cumpre decidir:

«6.51. Nestes termos, entende este Tribunal Arbitral que o disposto no artigo 11º do Código do ISV, nas datas em que se efectuaram as liquidações de ISV aqui impugnadas, estava em desconformidade com o disposto no artigo 110º do TFUE porquanto aquele artigo não podia, em conformidade com o que este artigo dispõe, calcular o imposto sobre veículos usados oriundos de outro Estado membro sem ter em conta a depreciação dos mesmos.

6.52. E, neste caso, o imposto calculado não poderia ser superior ao montante de ISV contido no valor residual de veículos usados similares que já foram registados no Estado membro de importação, ou seja, dos veículos usados nacionais.

6.53. Nestes termos, reitera-se a conclusão de que as liquidações de ISV objecto do presente pedido arbitral padecem de ilegalidade, na parte em que não foi considerada a redução de imposto sobre a componente ambiental, impondo-se a sua anulação parcial.

6.54. Em consequência, será negativa a resposta a dar à questão a decidir, enunciada no ponto 6.10., porquanto se entende que a legislação portuguesa vertida no artigo 11º do Código do ISV, na redação em vigor nas datas em que as liquidações aqui impugnadas foram efectuadas (entre 02-05-2017 e 17-03-2020), não está em conformidade com o disposto no direito da União Europeia, designadamente no artigo 110º do TFUE (aplicável por força do artigo 8º, nº 4 da CRP), pelo que determina este Tribunal Arbitral que será de anular parcialmente os actos tributários de ISV objecto do pedido arbitral porquanto os mesmos padecem de ilegalidade na parte em que não foi considerada aplicável a redução de ISV relativa à componente ambiental, em conformidade com o disposto naquele artigo 110º do TFUE.

6.55. Em consequência, será também de anular o despacho de indeferimento do pedido de revisão oficiosa apresentado contra as liquidações de ISV agora parcialmente anuladas.

(…)

Do pagamento dos juros indemnizatórios

6.59. A par do pedido de declaração da ilegalidade parcial das liquidações de ISV identificadas no processo, a Requerente peticiona ainda o pagamento de juros indemnizatórios, incidentes sobre o montante de ISV cobrado em excesso (EUR 16.931,74).

6.60. No que diz respeito ao pagamento de juros indemnizatórios, de acordo com o disposto no nº 5, do artigo 24.º do RJAT “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”, daqui resultando que uma decisão arbitral não se limita à apreciação da legalidade do acto tributário.

6.61. De igual modo, de acordo com o disposto no artigo 24º, nº 1, alínea b) do RJAT, deverá ser entendido que o pedido de juros indemnizatórios é uma pretensão relativa a actos tributários (v.g. de liquidação), que visa explicitar/concretizar o conteúdo do dever de “restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito”.

(…)

6.62. Como refere Jorge Lopes de Sousa “insere-se nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD a fixação dos efeitos da decisão arbitral que podem ser definidos em processo de impugnação judicial, designadamente, a anulação dos actos cuja declaração de ilegalidade é pedida, a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento de juros indemnizatórios (…)” (sublinhado nosso).

6.63. Nos processos arbitrais tributários pode, nos termos do disposto nos artigos 43º, nº 1 da LGT, haver lugar ao pagamento de juros indemnizatórios, “(…) quando se determine, em (…) impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido” sendo que, nos termos do artigo 100º, nº 1 da LGT, “a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial (…) de processo judicial a favor do sujeito passivo, à plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei”.

6.64. Por outro lado, nos termos da alínea d) do nº 3, do artigo 43º da LGT, “são também devidos juros indemnizatórios (…) d) Em caso de decisão judicial transitada em julgado que declare ou julgue a inconstitucionalidade ou ilegalidade da norma legislativa ou regulamentar em que se fundou a liquidação da prestação tributária e que determine a respetiva devolução”.

6.65. Ora, na sequência da declaração de ilegalidade parcial dos actos de liquidação de ISV identificados, com os fundamentos acima apontados, terá de haver lugar ao reembolso parcial dos montantes de ISV pagos pela Requerente, relativo ao imposto incidente sobre a parte das liquidações em crise que se devem considerar anuladas, como forma de se alcançar a reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade já assinalada.

6.66. Assim, face ao estabelecido no artigo 61º do CPPT, estando preenchidos os requisitos do direito a juros indemnizatórios, a Requerente terá direito aos referidos juros, calculados à taxa legal em vigor, sobre a quantia de total de ISV indevidamente cobrada e paga em excesso, os quais serão contados de acordo com o disposto no nº 3 do artigo 61º do CPPT, ou seja, desde as datas do pagamento do imposto indevido até à data da emissão da respectiva nota de crédito.».

No acórdão fundamento também estão em causa pedidos de revisão oficiosa, no caso de actos de liquidação de Imposto de Selo (IS), referentes aos anos de 2012 e 2013, cujo prazo de pagamento terminou, respectivamente, em 2013 e 2014, pedindo-se igualmente a sua anulação, acrescida de juros indemnizatórios, tendo os mesmos sido deferidos parcialmente, por decisão de 11 de Maio de 2017, indeferindo-se, todavia, o pedido de juros indemnizatórios.

Debruçando-se sobre a questão, que enunciou como sendo a de saber qual «a extensão temporal dos juros indemnizatórios devidos em caso de procedência total ou parcial do pedido de revisão do acto tributário», o Supremo Tribunal Administrativo considerou que «A decisão arbitral recorrida atribuiu a indemnização a partir da ocorrência do evento danoso, sendo que face às normas de direito tributário vigente tal indemnização não tem assento legal, pelo menos sob a égide do processo de impugnação da decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa do acto de liquidação».

Fundamentando a sua decisão escreveu-se no aresto identificado que não há lugar «a juros indemnizatórios visto o pedido de revisão do acto tributário haver sido decidido em período inferior a um ano contado da apresentação deste pedido de revisão, como resulta do disposto no art.º 43.º, n.º 3, c) da Lei Geral Tributária».

Em suma, do confronto dos julgamentos invocados resulta que não há - como bem sublinhou o Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto no seu douto parecer e este Pleno da Secção de Contencioso Tributário vem julgando em idênticas circunstâncias de direito, que aqui se convocam, nos termos e ao abrigo do preceituado no artigo 8.º, n.º 3 do Código Civil, como fundamento da nossa decisão – uma efectiva oposição de decisões quanto a uma mesma questão fundamental de direito.

Como lapidarmente se exarou no acórdão proferido pelo Pleno desta Secção, a 26 de Abril de 2023, processo n.º 81/22.6BALSB, integralmente disponível em www.dgsi.pt [com inteira aplicação nos autos uma vez que também aí se discutiu a eventual oposição de julgados nas situações em que numa decisão a atribuição de juros se funda na al. c) do n.º 3 do artigo 43.º da LGT e outra na al. d) do n.º 3 do mesmo artigo e diploma legais]: «a diferença quanto ao termo inicial do prazo de contagem dos juros indemnizatórios não resulta de um diverso entendimento da mesma questão jurídica fundamental, mas antes de nas decisões arbitrais em confronto ser diverso o quadro jurídico de referência concretamente aplicado: os juros indemnizatórios foram concedidos com base em pressupostos diversos e ao abrigo de diferentes previsões legais; a diversidade de decisões quanto à questão do dies a quo dos juros indemnizatórios não resultou de uma diferença na interpretação e aplicação de um mesmo quadro jurídico, mas antes ficou a dever-se à circunstância de as decisões em confronto terem conteúdo e âmbito diverso, o que retira relevância à divergência quanto ao termo inicial da contagem dos juros indemnizatórios

Sublinhamos, como mero reforço argumentativo, que o quadro jurídico tido por referência na decisão arbitral recorrida, artigo 43.º, n.º 3 al. d) da LGT, nem sequer estava legalmente consagrado na data em que foi proferida a decisão arbitral recorrida apreciada no acórdão fundamento (A al. d) do n.º 3 do artigo 43.º da LGT foi aditada pela Lei nº 9/2019, de 1 de Fevereiro.), que, por essa razão, igualmente o não considerou, como linearmente resulta da sua leitura. Sendo que foi este normativo (al. d), do n.º 3 do artigo 43.º da LGT), repita-se, não relevado minimamente no acórdão fundamento, que constituiu o critério interpretativo ou elemento normativo fulcral na decisão arbitral recorrida.

Em conclusão, e como começamos por adiantar no ponto 3.2.2., § 3 deste acórdão, em que densificamos o que deve entender-se como uma mesma questão fundamental de direito para efeitos de admissão de Recurso para Uniformização de Jurisprudência, se o regime aplicado numa e noutra das decisões não for substancialmente idêntico - o que ocorrerá sempre que à luz de eventuais alterações de regime possam ser suscitados e valorados argumentos capazes de conduzir a outra solução - então não pode afirmar-se que num e noutro dos arestos foi apreciado em sentido oposto uma mesma questão fundamental de direito.

E, assim sendo, não podendo afirmar-se que as decisões em confronto decidiram a mesma questão fundamental de direito em sentido divergente, divergência esta que seria imprescindível para o conhecimento do mérito do presente recurso para uniformização de jurisprudência, não há que tomar conhecimento do mérito do mesmo, como a final se decidirá.

3.3. As custas da presente acção serão suportadas pela Recorrente, integralmente vencida, nos termos do artigo 527.º do CPC, aplicável ex vi artigo 281.º do CPPT.

4. DECISÃO

Em face do exposto, acordam os Juízes do Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo, não conhecer o mérito do Recurso interposto para Uniformização de Jurisprudência.

Custas pela Recorrente.

Registe, notifique e, transitado em julgado o acórdão comunique-se ao CAAD.

Lisboa, 21 de Fevereiro de 2024 – Anabela Ferreira Alves e Russo (relatora) – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - Isabel Cristina Mota Marques da Silva – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes – José Gomes Correia - Joaquim Manuel Charneca Condesso – Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz – Gustavo André Simões Lopes Courinha – Pedro Nuno Pinto Vergueiro – Fernanda de Fátima Esteves.