Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0740/09
Data do Acordão:10/14/2009
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:VALENTE TORRÃO
Descritores:LIQUIDAÇÃO
FUNDAMENTAÇÃO DO ACTO TRIBUTÁRIO
LIQUIDAÇÃO ADICIONAL
PRESSUPOSTOS DE FACTO
Sumário:I - Mostra-se fundamentado, do ponto de vista formal, o acto tributário de liquidação de IRS, se a Administração Tributária indicou os factos nos quais se baseou para efectuar a liquidação e se de tais factos resultam claramente os motivos pelos quais decidiu em certo sentido e não noutro.
II - Questão diversa, mas que se prende já com a validade substancial da fundamentação, é a de saber se os factos invocados pela Administração Tributária preenchem os pressupostos legais para a prática do acto de liquidação.
Nº Convencional:JSTA00066029
Nº do Documento:SA2200910140740
Data de Entrada:07/10/2009
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TT1INST LISBOA PER SALTUM.
Decisão:PROVIDO.
Área Temática 1:DIR PROC FISC GRAC - LIQUIDAÇÃO.
Legislação Nacional:CONST97 ART268 N3.
LGT98 ART77.
CIRS88 ART2.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
I. A Fazenda Pública veio recorrer da sentença proferida pela Mmª Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida por A… contra a liquidação adicional de IRS e juros compensatórios referente ao ano de 2002, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui:
Iª) - O presente recurso visa reagir contra a douta sentença declaratória da procedência parcial da impugnação deduzida contra a liquidação adicional de IRS do ano de 2002 no segmento que anula o acto de liquidação adicional de imposto.
IIª) - Fundamentação da sentença recorrida (síntese)
Não sendo conhecidos os factos concretos que levaram a impugnada a decidir daquela forma, não é possível sindicar a legalidade da decisão tomada, ou saber se a situação concreta se pode, efectivamente, subsumir à previsão legal.
De onde procede a alegada falta de fundamentação de facto.
IIIª) - Constando documentalmente provado o teor do Relatório transcrito na douta sentença da qual se recorre e que ora damos por integralmente reproduzido; E atendendo às doutas considerações teóricas: doutrinárias e jurisprudenciais, sobre a matéria da fundamentação;
IVª)- Não poderá daí resultar a conclusão de que "o Relatório é conclusivo, uma vez que se limita a fazer uso de generalidades".
Vª) - Efectivamente o relatório e as correcções ora em causa tiveram origem no procedimento desenvolvido na entidade empregadora do Impugnante,
VIª) - Porém encontra-se individualizada a situação concreta do Impugnante. Note-se que o Anexo V do Relatório é composto por um e-mail e um recibo de vencimento do Impugnante, o qual demonstra inequivocamente que o vencimento acordado com este trabalhador (e outros) era o vencimento líquido, sendo os montantes pagos a título de ajudas de custo e compensação por utilização de viatura própria, componentes desse mesmo vencimento líquido.
VIIª) - Questão diversa seria o Impugnante não concordar com as correcções preconizadas, provando que recebeu essas ajudas de custo por deslocações efectivamente efectuadas e não a título remuneratório.
VIIIª) - A manter-se na ordem jurídica, a douta sentença ora recorrida revela uma inadequada interpretação e aplicação quer do artº 2º do CIRS quer sobretudo, do artº 77° da LGT.
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada, com as devidas consequências legais.
II. O Mº Pº emitiu o parecer que consta de fls. 135/136, defendendo a manutenção da decisão recorrida.
III. Colhidos os vistos legais, cabe agora decidir.
IV. Com interesse para a decisão foram dados como provados em 1ª instância os seguintes factos:
1º).Em cumprimento da ordem de serviço n.° OI2006Q7547, foi efectuada pela impugnada uma acção de inspecção de análise interna à declaração de rendimentos modelo 3 do ano de 2002 do impugnante (cfr. relatório de inspecção, a fls. 9, do PAT).
2ª).Na "descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria colectável" constante no relatório da inspecção melhor identificada no ponto anterior, lê-se o seguinte (cfr. fls. 9 a 11, do PAT):
(…)
111.2. Qualificação dos Factos
No decorrer de várias acções inspectivas externas ao exercício de 2002, efectuadas a várias sociedades do grupo em que é sociedade dominante a empresa denominada "B… SA", NIPC …, com sede na Av. …, nº …, em Lisboa, constatamos que o s.p. A…, auferiu da sociedade a seguir indicada, o seguinte rendimento da categoria A:

ENTIDADE PAGADORA
NIPC
RENDIMENTO
RETENÇÃO NA FONTE
C… Ldª
€31.430,00
€7.093,88
Nessa mesma acção, verificamos que o mesmo recebeu da mesma empresa a título de "ajudas de custo" o valor de € 3.993,80 e/ou de "compensação por utilização de viatura própria" o montante de € 4.195,63, conforme mapa que se junta como Anexo l.
Apesar da denominação que lhes foi atribuída, ficou provado, no âmbito da acção inspectiva à sociedade atrás identificada (bem como às restantes sociedades do "grupo"), que estes montantes são complementos de remuneração sujeitos a IRS nos termos do n.° 2 do artº. 2º do Código do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 442-A/88, de 30 de Novembro e com a nova redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 198/2001, de 3 de Julho (adiante designado por CIRS), nomeadamente pelos seguintes factos:
1. Mensalmente as sociedades distribuíam aos seus trabalhadores "Senhas Euroticket" na importância de € 124,70, não efectuando qualquer correcção às ditas "ajudas de custo";
2. Quando os trabalhadores se deslocavam ao serviço da sociedade, ela suportava todas as despesas incorridas pelos mesmos - alimentação e estadas;
3. Verificamos ainda que o valor do somatório das "ajudas de custo" com o da "compensação por utilização de viatura própria" é sempre idêntico, excepto a de dois meses (Dezembro e outro, normalmente quando o trabalhador recebe o subsidio de férias) em que é aproximadamente o dobro;
4. No mês de Dezembro, por amostragem, analisamos a forma de pagamento das remunerações auferidas pelos trabalhadores das várias empresas, nas quais constatamos que:
- As mesmas eram efectuadas por transferência bancária e em duas parcelas, uma equivalente à remuneração líquida e a outra igual ao somatório das "ajudas de custo" e da "compensação por utilização de viatura própria";
- Neste mês foram efectuadas 4 ordens para processamento de transferência bancária:
- Duas para o dia 12/12/2002 (Subsídio de Natal), remetidas à instituição bancária no dia 9;
- Outras duas para o dia 30/12/2002 (salário mensal), remetidas à instituição bancária no dia 20.
- Pelo o exposto, podemos concluir que no dia 9 e no dia 20 de Dezembro, as empresas já sabiam qual o montante a pagar de "ajudas de custo" e de "compensação por utilização de viatura própria" a cada um dos seus trabalhadores, embora nos tivessem apresentado apenas um mapa mensal (nos quais constatamos que existiram deslocações com datas posteriores ao dia 20 em todas as empresas);
5. Junto aos documentos contabilísticos e mapas das "ajudas de custo" e "compensação por utilização de viatura própria" da sociedade "D…, S.A." (Ex -…, S.A.), NIPC …, encontravam-se documentos referentes ao processamento de remunerações dos trabalhadores que rescindiram contrato com o s.p. no decorrer do ano. Na análise aos mesmos, constatamos que:
- No documento denominado "contas finais", verificamos que para o cálculo dos chamados, pelo s.p., "complementos" - que são as "ajudas de custo" e "compensação por utilização de viatura própria" - não são consideradas as deslocações efectivas, mas sim, os dias em que esteve ao serviço da empresa, bem como, os dias equivalentes aos subsídios de férias e de natal, e férias não gozadas, conforme documentos que se juntam a título de exemplo, como Anexo II;
- Aquando da admissão de novos empregados, desde logo, era acordado o valor remuneratório líquido mensal, isto é, era acertado qual o vencimento bruto e os complementos necessários para atingir esse vencimento líquido, conforme documentos que se juntam como Anexo III (o mesmo acontece quando são acordados reajustamentos salariais). Esses complementos são constituídos por "tickets de refeição", "Ajudas de Custo" e "compensação por utilização de viatura própria";
- Por fim, no mapa de análise por funções com data de 19/03/2002, que se junta como Anexo IV verificamos que:
- a determinados funcionários era-lhes afecto um veículo da empresa;
- a todos os funcionários (incluindo os com viatura da empresa) recebiam mensalmente um valor de "Ajudas de Custo" e "compensação por utilização de viatura própria";
- esses complementos ("Ajudas de Custo" e "compensação por utilização de viatura própria") para o custo anual do trabalhador eram multiplicados por 14.
6. Por fim, tendo em conta os documentos de suporte de diversas despesas contabilizadas, em comparação com o mapa de ajudas de custo e folha de "compensação por utilização de viatura própria" apresentadas, constatamos que determinados trabalhadores estariam no mesmo dia e na mesma hora em locais diferentes.
7. No caso do s.p. em análise, A…, juntamos como Anexo V um "e-mail" e um recibo de vencimento, pelo qual se prova que o vencimento acordado era o vencimento líquido.
8. Pelo o exposto, concluímos que os pagamentos de "ajudas de custo" e de "compensação por utilização de viatura própria" - que consideramos que são de complementos de remuneração sujeitos a IRS - é uma prática utilizada pelo grupo "B…" de forma a reduzir os encargos (sociais e fiscais) da empresa ..
Deste modo, consideramos que foram omitidos à tributação os rendimentos acima referidos (ajudas de custo e/ou compensação por utilização de viatura própria) pelo valor global de € 8.189,43.
Caso queira regularizar a situação poderá proceder à entrega de uma declaração de substituição mod. 3, enviando a estes serviços fotocópia da mesma.
(...)
3ª). Na sequência da inspecção melhor identificada no ponto 1, foi efectuada uma correcção ao rendimento global declarado pelo impugnante no montante de Euros 8.189,43 (cfr. relatório de inspecção, a fls. 11, do PAT).
4ª). Na sequência da inspecção melhor identificada no ponto 1, foi emitida a demonstração de acerto de contas n.° 2006 00001453048, da qual resulta o saldo a pagar no montante de Euros 3.214,05 (cfr. fls. 18, dos autos).
V. A única questão a decidir neste recurso é a de saber se o acto de liquidação impugnado - liquidação adicional de IRS do ano de 2002 - se encontra ou não fundamentado, tal como é exigido pelos artºs 268º, nº 3 da CRP e 77º da LGT.
A sentença recorrida deu resposta negativa a esta questão, louvando-se nos seguintes argumentos:
“Sucede que no caso em apreço, o relatório dos serviços de inspecção tributária, que constitui a fundamentação do acto de liquidação do acto impugnado, não indica factos concretos que permitam perceber porque motivo se considerou que o caso concreto era de subsumir na previsão legal.
De facto, o relatório é conclusivo, uma vez que se limita a fazer uso de generalidades como “alguns mapas”, “quando os trabalhadores se deslocavam ao serviço da empresa”, determinados trabalhadores estariam no mesmo dia e na mesma hora em locais diferentes”, sem que relativamente ao impugnante se concretize, por exemplo, se se deslocou ou não ao serviço da empresa, se consta de algum mapa, e de qual, como deslocado no mesmo momento temporal para destinos diferentes.
Não fica assim demonstrado o iter valorativo e cognoscitivo que levou a Administração tributária a decidir da forma como decidiu, o que tem por consequência, como acima se refere, a impossibilidade de sindicar a eventual existência de erro de facto sobre os pressupostos do acto impugnado”.
Discordando da sentença, entende a recorrente Fazenda Pública que do Relatório transcrito naquela não poderá resultar a conclusão de que “o Relatório é conclusivo, uma vez que se limita a fazer uso de generalidades”.
Com efeito, aquele Relatório e as correcções agora em causa tiveram origem no procedimento desenvolvido na entidade empregadora do impugnante e resulta do Anexo V do Relatório individualizada a situação concreta do impugnante, sendo que o e-mail e o recibo de vencimento do mesmo demonstram que o seu vencimento era o vencimento líquido, sendo os montantes pagos a título de ajudas de custo e compensação por utilização de viatura própria, componentes desse mesmo vencimento líquido.
V.1. Como é sabido, a exigência legal de fundamentação do acto tributário decorre, quer do artº 268º da CRP, quer do artº 77º da LGT.
Esta última disposição legal determina o seguinte:
"1- A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária".
A exigência de fundamentação visa dois aspectos importantes: do lado do administrado (neste caso do contribuinte) permite-lhe conhecer o percurso cognoscitivo e volitivo que levou a Administração a decidir naquele sentido e não noutro, podendo aquele conformar-se com o acto ou impugnar o mesmo pela via administrativa ou judicial; do lado da Administração obriga-a a ponderar os factos e a uma melhor aplicação do direito, de modo a convencer o administrado da validade dos seus fundamentos e da decisão.
A fundamentação pode, no entanto, assumir duas modalidades: a fundamentação em sentido formal, traduzida na exigência de indicação de factos que levaram a Administração a decidir em determinado sentido e que deve ser suficiente, clara e congruente de modo a poder ser entendida pelo administrado; a fundamentação em sentido substancial que tem já a ver com o mérito da decisão e com a legalidade "stricto sensu" do próprio acto. A primeira constitui vício de forma e conduz à anulação do acto, mas este poderá ainda eventualmente ser renovado, se eliminado o vício; a segunda conduz também à anulação do acto, mas este porque ilegal, não pode ser renovado.
V.2. Aqui chegados, desde logo se vê que a apreciação da sentença recaiu sobre a fundamentação em sentido formal, pelo que importa então apurar se, face ao probatório, ocorre aquele invocado vício.
Para realizar a liquidação adicional em causa nos autos, a Administração Tributária louvou-se no Relatório da Inspecção Tributária, parcialmente transcrito na sentença.
Ora, as razões aí invocadas foram as seguintes:
"1. Mensalmente as sociedades distribuíam aos seus trabalhadores "Senhas Euroticket" na importância de € 124,70, não efectuando qualquer correcção às ditas "ajudas de custo";
2. Quando os trabalhadores se deslocavam ao serviço da sociedade, ela suportava todas as despesas incorridas pelos mesmos - alimentação e estadas;
3. Verificamos ainda que o valor do somatório das "ajudas de custo" com o da "compensação por utilização de viatura própria" é sempre idêntico, excepto a de dois meses (Dezembro e outro, normalmente quando o trabalhador recebe o subsídio de férias) em que é aproximadamente o dobro;
4. No mês de Dezembro, por amostragem, analisamos a forma de pagamento das remunerações auferidas pelos trabalhadores das várias empresas, nas quais constatamos que:
- As mesmas eram efectuadas por transferência bancária e em duas parcelas, uma equivalente à remuneração líquida e a outra igual ao somatório das "ajudas de custo" e da "compensação por utilização de viatura própria";
- Neste mês foram efectuadas 4 ordens para processamento de transferência bancária:
- Duas para o dia 12/12/2002 (Subsídio de Natal), remetidas à instituição bancária no dia 9;
- Outras duas para o dia 30/12/2002 (salário mensal), remetidas à instituição bancária no dia 20.
- Pelo o exposto, podemos concluir que no dia 9 e no dia 20 de Dezembro, as empresas já sabiam qual o montante a pagar de "ajudas de custo" e de "compensação por utilização de viatura própria" a cada um dos seus trabalhadores, embora nos tivessem apresentado apenas um mapa mensal (nos quais constatamos que existiram deslocações com datas posteriores ao dia 20 em todas as empresas);
5. Junto aos documentos contabilísticos e mapas das "ajudas de custo" e "compensação por utilização de viatura própria" da sociedade "C…, S.A." (Ex -…, S.A.), NIPC …, encontravam-se documentos referentes ao processamento de remunerações dos trabalhadores que rescindiram contrato com o s.p. no decorrer do ano. Na análise aos mesmos, constatamos que:
- No documento denominado "contas finais", verificamos que para o cálculo dos chamados, pelo s.p., "complementos" - que são as "ajudas de custo" e "compensação por utilização de viatura própria" - não são consideradas as deslocações efectivas, mas sim, os dias em que esteve ao serviço da empresa, bem como, os dias equivalentes aos subsídios de férias e de natal, e férias não gozadas, conforme documentos que se juntam a título de exemplo, como Anexo II;
- Aquando da admissão de novos empregados, desde logo, era acordado o valor remuneratório líquido mensal, isto é, era acertado qual o vencimento bruto e os complementos necessários para atingir esse vencimento líquido, conforme documentos que se juntam como Anexo III (o mesmo acontece quando são acordados reajustamentos salariais). Esses complementos são constituídos por "tickets de refeição", "Ajudas de Custo" e "compensação por utilização de viatura própria";
- Por fim, no mapa de análise por funções com data de 19/03/2002, que se junta como Anexo IV verificamos que:
- a determinados funcionários era-lhes afecto um veículo da empresa;
- a todos os funcionários (incluindo os com viatura da empresa) recebiam mensalmente um valor de "Ajudas de Custo" e "compensação por utilização de viatura própria";
- esses complementos ("Ajudas de Custo" e "compensação por utilização de viatura própria") para o custo anual do trabalhador eram multiplicados por 14.
6. Por fim, tendo em conta os documentos de suporte de diversas despesas contabilizadas, em comparação com o mapa de ajudas de custo e folha de "compensação por utilização de viatura própria" apresentadas, constatamos que determinados trabalhadores estariam no mesmo dia e na mesma hora em locais diferentes.
7. No caso do s.p. em análise, A…, juntamos como Anexo V um "e-mail" e um recibo de vencimento, pelo qual se prova que o vencimento acordado era o vencimento líquido.
8. Pelo o exposto, concluímos que os pagamentos de "ajudas de custo" e de "compensação por utilização de viatura própria" - que consideramos que são de complementos de remuneração sujeitos a IRS - é uma prática utilizada pelo grupo "B…" de forma a reduzir os encargos (sociais e fiscais) da empresa ..
Deste modo, consideramos que foram omitidos à tributação os rendimentos acima referidos (ajudas de custo e/ou compensação por utilização de viatura própria) pelo valor global de € 8.189,43".
Esta fundamentação invocada pela Administração Tributária, pela sua clareza e congruência satisfaz, do ponto de vista formal, a exigência legal de fundamentação do acto tributário. Na verdade, indicam-se factos ocorridos genericamente na empresa onde o impugnante trabalhava, indiciadores de que as ajudas de custo e a compensação por utilização de viatura própria constituíam uma forma de evitar a tributação das remunerações e refere-se depois a situação concreta do impugnante que estaria enquadrado naquele regime genérico, tendo recebido por essa forma determinados valores que não foram sujeitos a tributação e que a Administração entende que o deveriam ter sido.
Questão diversa, mas que não está em causa no recurso, é a de saber se a fundamentação invocada é válida do ponto de vista substancial, isto é, se os factos invocados pela Administração Tributária são suficientes para que o valor de todas as ajudas de custo e da compensação por utilização de viatura própria, possa ser classificado como remuneração ao abrigo do artº 2º do CIRS.
Temos então, em face do que ficou dito, que a decisão da Administração Tributária não padece do vício de forma por falta de fundamentação que a sentença julgou verificado, pelo que esta não pode manter-se.
VI. Nestes termos, acorda-se em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida e ordenar a baixa dos autos ao tribunal tributário para conhecimento das demais ilegalidades do acto.
Sem custas.
Lisboa, 14 de Outubro de 2009. – Valente Torrão (relator) – Pimenta do ValeIsabel Marques da Silva. Considero que a liquidação de IRS em causa não se encontra suficientemente fundamentada em relação ao sujeito passivo, que é o que, a final, interessa no caso dos autos. Votaria uma decisão no sentido da adoptada no nosso acórdão de 23/4/2008 (rec nº 1044/07) .
Isabel Marques da Silva.