Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01185/13.1BEALM
Data do Acordão:06/09/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE TRANSMISSÃO ONEROSA DE IMOVEIS
CADUCIDADE
ISENÇÃO
REVENDA
Sumário:I - O legislador pretendeu que os prédios adquiridos para revenda deixassem de beneficiar da isenção logo que se verifique, para o que ora interessa, que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente no sentido de que a verificação da isenção concedida no momento da aquisição fica condicionada de forma resolutiva à verificação, rectius, à não verificação de um pressuposto que ocorrem de forma sucessiva após o facto gerador da obrigação deste tributo, o que significa que deparamos com uma situação em que a ocorrência de determinado facto ou factos impedem a constituição do direito à isenção e que traduz para o sujeito passivo a obrigação do pagamento do imposto caso tenha beneficiado da dispensa do seu pagamento na data da aquisição, sendo que no centro desta análise está a noção de destino diferente, na medida em que, como se viu, de acordo com o art. 11º nº 5 do CIMT, a aquisição a que se refere o art. 7º do mesmo Código, deixará de beneficiar da isenção, nomeadamente, logo que se verifique que aos prédios foi dado um destino diferente.
II - Para efeitos de caducidade da isenção de IMT que decorre da conjugação das normas contidas nos arts. 7º e 11º nº 5 do CIMT (isenção pela aquisição de prédios para revenda), não importa se o imóvel adquirido é ou não revendido no preciso estado em que foi adquirido; o que releva é que não haja uma metamorfose ou alteração substancial do bem que foi adquirido para revenda.
III - O critério fundamental para a aferição da existência de um “destino diferente”, radica na circunstância de o imóvel adquirido ter perdido a natureza de bem permutável - destinado a revenda - para assumir a natureza de “matéria-prima” - destinado a transformação, impondo-se ter presente, não tanto a forma como o bem foi contabilizado nas existências do sujeito passivo (como activo circulante, ou como matéria-prima), mas a realidade apurada, no sentido de saber se, de facto, o bem foi objecto de um processo económico de transformação, ou se, pelo contrário, a intervenção efectuada assumiu um carácter acessório, de optimização do bem para a sua rentabilização no mercado.
IV - No caso dos autos, é manifesto que houve uma alteração substancial dos imóveis que haviam sido adquiridos para revenda, simples terrenos para construção, sem qualquer edifício acabado ou inacabado, e os que foram, efectivamente vendidos, fracções autónomas integrantes de edifícios totalmente construídos após a aquisição dos lotes, o que conduz à afirmação de que mostra-se caducada a isenção de que o Recorrente havia beneficiado aquando da aquisição dos lotes de terreno para construção.
Nº Convencional:JSTA000P27823
Nº do Documento:SA22021060901185/13
Data de Entrada:05/28/2019
Recorrente:A............
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Processo n.º 1185/13.1BEALM (Recurso Jurisdicional)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. RELATÓRIO

A……………, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, datada de 23-01-2019, que julgou improcedente a pretensão pelo mesmo deduzida no presente processo de IMPUGNAÇÃO relacionado com a liquidação de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) no valor de € 65.245,64, efectuada por a Autoridade Tributária ter considerado verificada a caducidade da isenção para revenda de que beneficiou em 2007 na aquisição de 4 imóveis.


Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“ (…)

A - Preconiza o artigo 7º nº 1 do CIMT “são isentas de IMT as aquisições de prédios para revenda, desde que se verifique ter sido apresentada antes da aquisição a declaração prevista no artigo do artigo 109.º do CIRC (ao tempo em vigor), relativa ao exercício da atividade de comprador de prédios para revenda”, enquadramento que beneficia a recorrente.
B - Preceitua por sua vez o nº 2 deste artigo, que a isenção prevista “não prejudica a liquidação e o pagamento do imposto, nos termos gerais, salvo se se reconhecer que o adquirente exerce normal e habitualmente a atividade de comprador de prédios para revenda”.
C - O nº 3 do normativo em questão, refere que “para efeitos do disposto na parte final do corpo deste artigo, se considera que o contribuinte exerce normal e habitualmente a atividade, quando comprove o seu exercício no ano anterior mediante certidão passada pelo Serviço de Finanças competente, devendo constar sempre daquela certidão se, no ano anterior, foi adquirido para revenda ou revendido algum prédio antes adquirido para esse fim”.

D - E o nº 4 estabelece que “quando o prédio tenha sido revendido sem ser novamente para revenda, no prazo de três anos, e haja sido pago o imposto, este será anulado pelo Serviço de Finanças, a requerimento do interessado, acompanhado de documento comprovativo da transação”.
E - Dispõe ainda o artigo 11º nº 5 do CIMT que a “aquisição a que se refere o artigo 7º deixará de beneficiar da isenção logo que se verifique, respetivamente, “Que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de três anos ou o foram novamente para revenda”(sic.).
F- A isenção do IMT está dependente da verificação cumulativa dos seguintes requisitos, da apresentação, pelo contribuinte, da declaração a que alude o artigo 7º nº 3, antes da aquisição do prédio, para revenda; da realização da revenda no prazo de três anos - 11º nº 5, da revenda do prédio adquirido, sem lhe ter sido dado destino diferente - artigo 11º nº 5 1ª parte e que a revenda, efetuada naquele prazo legal, não tenha como finalidade nova revenda - artigo 11º nº 5, parte final.

G- Todos os requisitos elencados estão preenchidos e por isso não caducou a isenção que beneficiava a recorrida, no que concerne aos terrenos para construção inscritos na matriz predial (151207), ao contrário do que sustenta a douta sentença do Tribunal “a quo”.
H - A douta sentença do Tribunal recorrido, não atribuiu a devida consideração jurídica no que concerne ao facto da revenda se ter consumado no que toca aos imóveis inscritos sobre os artigos ….. e ….., num prazo inferior a três anos e sem ter por finalidade nova revenda.
I - Na realidade, a revenda foi efetuada no prazo de três anos
J - A alteração administrativa de artigos não determina que a caducidade da isenção, no quadro legal do artigo 11º 5 do CIMT.
L - A desativação dos imóveis era uma obrigação legal, porque a realidade predial “terreno para construção” extinguiu-se na ordem jurídico-tributária para dar origem a um novo conceito de imóvel, o de “prédio urbano habitacional”, conceptualmente plasmado no artigo 6º nº 1 a) e nº 2 do CIMI.

M - Os artigos elencados provêm de outros artigos, por motivo de inscrição de prédio novo com a consequente desativação do terreno para construção,
N - A douta sentença entende que “(…), prejudicando a aplicação da isenção de IMT plasmada no artigo 7.º do CIMT, dado que é evidente que se verificou uma alteração substancial do imóvel (…)” (sic.)
O - A interpretação e aplicação do direito estiveram erradas ao subscrever que a obtenção de alvará de obra e a subsequente construção de um edifício e garagem, consubstancia, em si, a atribuição de um destino diferente não é acompanhada pelos Tribunais Superiores, sendo de referir ao agasalho de jurisprudência firmada, que a transformação de um terreno para construção, após o licenciamento ulterior em frações autónomas, que haveriam de ser vendidas, não configura à luz do direito aplicável “destino diferente” dado ao imóvel”,
P - Realidade que se destila da jurisprudência do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA, proferida na sequência de recurso tendo por fundamento a oposição de julgados - Acórdão 798/04 que decidiu a oposição de julgados resultante do Acórdão do Tribunal Central Administrativo de 10 de Dezembro de 2003 que decidiu o recurso n° 00452/03 e do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 23 de Fevereiro de 2000, com as necessárias adaptações.

Q - Jurisprudência que não foi levada em consideração, com o devido respeito que é elevadíssimo, pela sentença do Tribunal recorrido
R - Deflui da jurisprudência uniformizadora do STA, não pode ser relevante negativamente a venda de frações autónomas por banda dos revendedores de prédios ou a sua constituição em propriedade horizontal, que não dá lugar à existência de um prédio diverso do anterior, submetendo-o apenas a um regime jurídico diferente.
S - O prédio não deixa, pois, de ser um só e o mesmo, apenas estando dividido em andares, constituindo frações autónomas - cfr. o Acórdão do Pleno deste STA, de 10/11/1982 in Acórdãos Doutrinais 260/61, págs. 1084 e sgs.
T - Doutrinariamente diz-nos Nuno Sá Gomes, sobre esta temática in CTF 380, págs. 488 e sgs., que o fundamento da isenção em causa está na circunstância de os prédios adquiridos se manterem, como mercadorias, no ativo permutável (atualmente designado por “circulante”) da empresa tributada pelo exercício da atividade de aquisição de prédios para revenda mesmo com constituição posterior da propriedade horizontal.
U - Na mesma senda J. Silvério Mateus e L. Corvelo in “Os Impostos Sobre o Património Imobiliário” Anotados e Comentados Engifisco pag. 405, “um prédio unitário constituído em regime de propriedade horizontal e vendido por fracções autónomas não determina, só por si a perda de isenção, desde que estas sejam revendidas no prazo de três anos” (sic.).
V - No que tange aos restantes imóveis, atendendo ao princípio dado como assente, que a transformação de lotes em propriedade horizontal não constitui destino diferente, é mister ter presente que se configura uma situação de “justo impedimento” relativamente ao prazo fixado para a caducidade da isenção de IMT prevista no n.º 5 do artigo 11.º do CIMT (não ao abrigo do art. 146.º do CPC, mas ao abrigo do princípio geral de direito que lhe está subjacente),

X - Atentas as ocorrências que impediram o contribuinte de respeitar o prazo de três anos para a revenda do prédio e que a mesma não lhe foi imputável, traz se à colação o “justo impedimento”, admitido pela jurisprudência vertida no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo nº 706/11 de 31/01/2012.
Nestes termos, nos melhores de direito, sempre com o douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e revogada a douta Sentença do Tribunal “a quo”, com todas as consequências legais daí advindas.”

A Recorrida Autoridade Tributária e Aduaneira não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Conselheiros Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.




2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a matéria apontada nos autos resume-se, em suma, em indagar da bondade da decisão recorrida que julgou improcedente a pretensão formulada nos autos, no entendimento de que se mostra caducada a isenção para revenda de que o ora Recorrente havia beneficiado em 2005, aquando da aquisição de 4 lotes de terreno para construção, nos termos do estatuído no artigo 11º nº 5 do CIMT, na medida em que o Recorrente deu um destino diferente aos lotes em apreço.




3. FUNDAMENTOS

3.1. DE FACTO

Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:

“…

1. No dia 2 de Maio de 2007, A…………., ora Impugnante, adquiriu à sociedade “B……………, Lda.”, os lotes de terreno para construção designados por lotes cento e quarenta e três, cento e cinquenta e nove, cento e sessenta e cento e sessenta e um, sitos na …………………, freguesia de Gâmbia – Alto da Guerra, concelho de Setúbal, inscritos na respectiva matriz sob os artigos ….., ….., …….. e ……., respectivamente - cfr. escrituras públicas de fls. 22 a 29-v do processo administrativo apenso aos autos;

2. As aquisições referidas no ponto anterior ficaram isentas de IMT ao abrigo do n.º 2 do artigo 7.º do Código de IMT por o Impugnante ter declarado nas escrituras públicas que as mesmas se destinavam a revenda – cfr. escrituras públicas de fls. 22 a 29-v do processo administrativo apenso aos autos;

3. Em Outubro de 2007 os serviços da Câmara Municipal de Setúbal emitiram, em nome do Impugnante e a requerimento deste, os Alvarás de Obras de Utilização n.º 341/07, 338/07, 431/07 e 430/07, para a construção de edifícios e garagens no prédio sito em Urbanização …………, freguesia de Gâmbia, concelho de Setúbal, lotes 161, 160, 159 e 143, respectivamente – cfr. fls. 30 a 35-v do processo administrativo apenso aos autos;

4. No dia 18 de Março de 2009, o Impugnante apresentou a modelo 1 de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) declarando a conclusão das obras no prédio inscrito sob o artigo ….. da freguesia de Gâmbia-Alto da Guerra, concelho de Setúbal, procedendo à inscrição de prédio novo constituído por 8 fracções autónomas – cfr. cópia da declaração modelo 1 de IMI a fls. 39 a 40-v do processo administrativo apenso aos autos;

5. No dia 17 de Setembro de 2009, o Impugnante apresentou a modelo 1 de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) declarando a conclusão das obras no prédio inscrito sob o artigo …… da freguesia de Gâmbia-Alto da Guerra, concelho de Setúbal, procedendo à inscrição de prédio novo constituído por 8 fracções autónomas – cfr. cópia da declaração modelo 1 de IMI a fls. 41 a 42-v do processo administrativo apenso aos autos;

6. No dia 22 de Janeiro de 2010, o Impugnante apresentou a modelo 1 de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) declarando a conclusão das obras no prédio inscrito sob o artigo ……. da freguesia de Gâmbia-Alto da Guerra, concelho de Setúbal, procedendo à inscrição de prédio novo constituído por 8 fracções autónomas – cfr. cópia da declaração modelo 1 de IMI a fls. 43 a 44-v do processo administrativo apenso aos autos;

7. No dia 22 de Janeiro de 2010, o Impugnante apresentou a modelo 1 de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) declarando a conclusão das obras no prédio inscrito sob o artigo ….. da freguesia de Gâmbia-Alto da Guerra, concelho de Setúbal, procedendo à inscrição de prédio novo constituído por 8 fracções autónomas – cfr. cópia da declaração modelo 1 de IMI a fls. 45 a 46-v do processo administrativo apenso aos autos;

8. O Impugnante foi sujeito a procedimento de inspecção tributária credenciado pela ordem de serviço n.º OI201101362 – cfr. fls. 16 do processo administrativo apenso aos autos;

9. O Relatório de Inspecção Tributária resultante do procedimento inspectivo referido no ponto anterior concluiu pela caducidade da isenção de pagamento de IMT de que o Impugnante havia sido beneficiário na aquisição dos imóveis em 2007, nos termos do n.º 5 do artigo 11.º do Código do IMT, por o mesmo ter dado destino diferente aos prédios adquiridos para revenda, ao ter edificado construções nesses terrenos, num total de oito fogos destinados a habitação – cfr. fls. 16 a 21-v do processo administrativo apenso aos autos;

10. Em 22 de Novembro de 2011, o Chefe do Serviço de Finanças de Setúbal 1 emitiu, em nome do Impugnante e no seguimento do Relatório de Inspecção Tributária referido no ponto anterior, a liquidação de IMT relativa aos lotes de terreno inscritos na matriz sob os artigos ……., ….., …… e ….. da freguesia de Gâmbia – Pontes e Alto da Guerra, nos seguintes moldes:

“(…)
Artigo ……
IMT – 246.420,00X6,5%=16.017,30€
I.SELO – 246.420,00X0,8%=1.971,36-1.280,00=691,36€
JUROS - € 2.640,00€
Artigo ……
IMT – 246.420,00X6,5%=16.017,30€
I.SELO – 246.420,00X0,8%=1.971,36-1.280,00=691,36€
JUROS - € 2.640,00€
Artigo …..
IMT – 259.489,13X6,5%=16.866,79€

I.SELO – 259.489,13X0,8%=2.075,91-1.280,00=795,91€
JUROS - € 2.780,02€
Artigo ……..
IMT – 251.450,00X6,5%=16.344,25€
I.SELO – 251.450,00X0,8%=2.011,60-1.280,00=731,60€
JUROS - € 2.693,89€
(…)” – cfr. fls. 36 do processo administrativo apenso aos autos;
11. Das 32 fracções construídas pelo Impugnante foram vendidas 6 fracções autónomas no prazo de 3 anos a contar da data de aquisição de 2 de Maio de 2007, 3 do anterior artigo matricial ……. e 3 do anterior artigo matricial ….. - por acordo.

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*
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II- B - DOS FACTOS NÃO PROVADOS
Não se provou que:
A) A Instituição Bancária “O……………” não tenha permitido que se fizessem as escrituras a favor dos compradores, por não aceitar efectuar os distrates das hipotecas.

Compulsados os autos, analisados os articulados e atenta a prova documental constante dos mesmos, não existem quaisquer outros factos com relevância para a decisão, atento o objecto do litígio, que devam julgar-se como não provados.
II- C – FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
Os factos acima enunciados encontram-se, todos eles, comprovados pelos documentos acima discriminados, que não foram impugnados pelas partes nem há indícios que ponham em causa a sua genuinidade, e foram tidos em consideração por haverem sido articulados pelas partes ou por deles serem instrumentais (cfr. artigo 5.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo Civil).
O facto dado como não provado resulta de, apesar de alegado pelo Impugnante, o mesmo não produziu qualquer prova nesse sentido, assentando a sua argumentação em considerandos generalistas, não carreando para os autos qualquer elemento fáctico concreto nesse sentido.”

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3.2. DE DIREITO

Assente a factualidade apurada cumpre, então, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal está cometida a tarefa de indagar da bondade da decisão recorrida que julgou improcedente a pretensão formulada nos autos, no entendimento de que se mostra caducada a isenção para revenda de que o ora Recorrente havia beneficiado em 2005, aquando da aquisição de 4 lotes de terreno para construção, nos termos do estatuído no artigo 11º nº 5 do CIMT, na medida em que o Recorrente deu um destino diferente aos lotes em apreço.

Nas suas alegações, o Recorrente refere que a isenção do IMT está dependente da verificação cumulativa dos seguintes requisitos, da apresentação, pelo contribuinte, da declaração a que alude o artigo 7º nº 3, antes da aquisição do prédio, para revenda; da realização da revenda no prazo de três anos - 11º nº 5, da revenda do prédio adquirido, sem lhe ter sido dado destino diferente - artigo 11º nº 5 1ª parte e que a revenda, efetuada naquele prazo legal, não tenha como finalidade nova revenda - artigo 11º nº 5, parte final, sendo que todos os requisitos elencados estão preenchidos e por isso não caducou a isenção que beneficiava a recorrida, no que concerne aos terrenos para construção inscritos na matriz predial (……………), ao contrário do que sustenta a douta sentença do Tribunal “a quo”, que não atribuiu a devida consideração jurídica no que concerne ao facto da revenda se ter consumado no que toca aos imóveis inscritos sobre os artigos …….. e …….., num prazo inferior a três anos e sem ter por finalidade nova revenda.

Assim, a revenda foi efetuada no prazo de três anos, verificando-se que a alteração administrativa de artigos não determina que a caducidade da isenção, no quadro legal do artigo 11º 5 do CIMT, pois que a desativação dos imóveis era uma obrigação legal, porque a realidade predial “terreno para construção” extinguiu-se na ordem jurídico-tributária para dar origem a um novo conceito de imóvel, o de “prédio urbano habitacional”, conceptualmente plasmado no artigo 6º nº 1 a) e nº 2 do CIMI e os artigos elencados provêm de outros artigos, por motivo de inscrição de prédio novo com a consequente desativação do terreno para construção.

A interpretação e aplicação do direito estiveram erradas ao subscrever que a obtenção de alvará de obra e a subsequente construção de um edifício e garagem, consubstancia, em si, a atribuição de um destino diferente não é acompanhada pelos Tribunais Superiores, sendo de referir ao agasalho de jurisprudência firmada, que a transformação de um terreno para construção, após o licenciamento ulterior em fracções autónomas, que haveriam de ser vendidas, não configura à luz do direito aplicável “destino diferente” dado ao imóvel”, realidade que se destila da jurisprudência do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA, proferida na sequência de recurso tendo por fundamento a oposição de julgados - Acórdão 798/04 que decidiu a oposição de julgados resultante do Acórdão do Tribunal Central Administrativo de 10 de Dezembro de 2003 que decidiu o recurso n° 00452/03 e do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 23 de Fevereiro de 2000, com as necessárias adaptações, jurisprudência que não foi levada em consideração, com o devido respeito que é elevadíssimo, pela sentença do Tribunal recorrido, sendo que deflui da jurisprudência uniformizadora do STA, não pode ser relevante negativamente a venda de fracções autónomas por banda dos revendedores de prédios ou a sua constituição em propriedade horizontal, que não dá lugar à existência de um prédio diverso do anterior, submetendo-o apenas a um regime jurídico diferente, ou seja, o prédio não deixa, pois, de ser um só e o mesmo, apenas estando dividido em andares, constituindo fracções autónomas e no que tange aos restantes imóveis, atendendo ao principio dado como assente, que a transformação de lotes em propriedade horizontal não constitui destino diferente, é mister ter presente que se configura uma situação de “justo impedimento” relativamente ao prazo fixado para a caducidade da isenção de IMT prevista no n.º 5 do artigo 11.º do CIMT (não ao abrigo do art. 146.º do CPC, mas ao abrigo do princípio geral de direito que lhe está subjacente), de modo que, atentas as ocorrências que impediram o contribuinte de respeitar o prazo de três anos para a revenda do prédio e que a mesma não lhe foi imputável, traz se à colação o “justo impedimento”, admitido pela jurisprudência vertida no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo nº 706/11 de 31/01/2012.

Que dizer?

O art. 7º nº 1 do Código do IMT preceitua que “São isentas do IMT as aquisições de prédios para revenda, nos termos do número seguinte, desde que se verifique ter sido apresentada antes da aquisição a declaração prevista no artigo 112.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) ou na alínea a) do n.º 1 do artigo 109.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), consoante o caso, relativa ao exercício da actividade de comprador de prédios para revenda”.
Por sua vez o art. 11º nº 5 do mesmo Código estabelece que “A aquisição a que se refere o artigo 7.º deixará de beneficiar de isenção logo que se verifique que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de três anos ou o foram novamente para revenda”.

Numa primeira linha de análise, podemos acompanhar a decisão recorrida quando aponta que o legislador pretendeu que os prédios adquiridos para revenda deixassem de beneficiar da isenção logo que se verifique, para o que ora interessa, que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente no sentido de que a verificação da isenção concedida no momento da aquisição fica condicionada de forma resolutiva à verificação, rectius, à não verificação de um pressuposto que ocorrem de forma sucessiva após o facto gerador da obrigação deste tributo, o que significa que deparamos com uma situação em que a ocorrência de determinado facto ou factos impedem a constituição do direito à isenção e que traduz para o sujeito passivo a obrigação do pagamento do imposto caso tenha beneficiado da dispensa do seu pagamento na data da aquisição, sendo que no centro desta análise está a noção de destino diferente, na medida em que, como se viu, de acordo com o art. 11º nº 5 do CIMT, a aquisição a que se refere o art. 7º do mesmo Código, deixará de beneficiar da isenção, nomeadamente, logo que se verifique que aos prédios foi dado um destino diferente.

Pois bem, percorrendo a matéria apurada nos autos, temos que o Recorrente, que exerce a actividade de compra e venda de prédios para revenda, em 02/05/2007, adquiriu 4 lotes de terreno para construção, tendo beneficiado da isenção de IMT, ao abrigo do disposto no art. 7º nº 1 do CIMT, sendo que em Outubro de 2007, os serviços da Câmara Municipal de Setúbal emitiram, a pedido do Recorrente, alvarás de obras de autorização para a construção de edifícios e garagens nos mencionados lotes, verificando-se ainda que em 2009 e 2010 apresentou DM 1 de IMI, declarando a conclusão de obras nos referidos lotes, procedendo à inscrição de prédio novo constituído por 8 fracções autónomas em cada lote e que das 32 fracções construídas pelo Recorrente foram vendidas 6 fracções no prazo de 3 anos contados da data de aquisição dos lotes, ocorrida em 02/05/2007.

Perante este quadro, o Recorrente faz apelo à jurisprudência do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA, proferida na sequência de recurso tendo por fundamento a oposição de julgados - Acórdão 798/04 que decidiu a oposição de julgados resultante do Acórdão do Tribunal Central Administrativo de 10 de Dezembro de 2003 que decidiu o recurso n° 00452/03 e do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 23 de Fevereiro de 2000, com as necessárias adaptações, jurisprudência que não foi levada em consideração, com o devido respeito que é elevadíssimo, pela sentença do Tribunal recorrido, sendo que deflui da jurisprudência uniformizadora do STA, não pode ser relevante negativamente a venda de fracções autónomas por banda dos revendedores de prédios ou a sua constituição em propriedade horizontal, que não dá lugar à existência de um prédio diverso do anterior, submetendo-o apenas a um regime jurídico diferente.

Nesta matéria, e de forma mais actual, temos que este Supremo Tribunal, no âmbito do seu Acórdão do Pleno de 17-09-2014, Proc. nº 01626/13, www.dgsi.pt fixou jurisprudência no sentido de que “Para efeitos de caducidade da isenção de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (IMT) que decorre da conjugação das normas contidas nos arts. 7º e 11º nº 5 do CIMT (isenção pela aquisição de prédios para revenda), não importa se o imóvel adquirido é ou não revendido no preciso estado em que foi adquirido; o que importa é que não haja uma metamorfose ou alteração substancial do bem que foi adquirido para revenda, pelo que se o imóvel adquirido é constituído por um terreno com um edifício habitacional já em construção ou remodelação segundo determinado projecto aprovado (seja em tosco, seja em adiantada fase de construção/remodelação), a expressão para revenda não exige que o imóvel seja alienado tal como existia no momento da aquisição, admitindo, antes, a possibilidade de realização pelo adquirente de todas as obras necessárias à ultimação dessa construção, por forma a acabá-lo, licenciá-lo para o referido destino, constituir a propriedade horizontal e alienar as respectivas fracções autónomas.”

No citado aresto, em que o Acórdão fundamento é o Ac. deste Supremo Tribunal referido pelo Recorrente, foi ponderado que:

“…

4.1. A questão fundamental de direito que opõe a decisão arbitral ao acórdão do Supremo Tribunal Administrativo é, como vimos, a de saber se nos casos em que o imóvel adquirido é constituído por um terreno com um edifício habitacional já em construção ou remodelação (seja em tosco, seja em adiantada fase de construção/remodelação) a expressão para revenda exige que o imóvel seja alienado tal como existia aquando da aquisição, afastando, assim, a possibilidade de realização de uma multiplicidade de obras indispensáveis à conclusão do edifício (com excepção de obras de natureza ligeira, isto é, de mera reparação e/ou conservação) ou admite a possibilidade de realização de todas as obras necessárias à ultimação da sua construção, por forma a acabá-lo, licenciá-lo para o referido destino, constituir a propriedade horizontal e alienar as respectivas fracções autónomas.

Saliente-se que ambas as decisões convergiram num aspecto: a constituição em propriedade horizontal não dá lugar à existência de um prédio diverso do anterior, submetendo-o apenas a um regime jurídico diferente, pelo que venda das respectivas fracções autónomas não representa “destino diferente” e não afasta, portanto, a isenção de tributação. Aliás, como se pode ver pela leitura das Fichas Doutrinárias publicadas no portal electrónico das finanças, a própria Administração Tributária já reconhece que o facto de um prédio ter sido adquirido com isenção de IMT e posteriormente ter sido submetido ao regime de propriedade horizontal, não implica, só por si, a caducidade do benefício de isenção de imposto. Pelo que não se impõe tratar, aqui, dessa questão.

Relativamente à questão que importa examinar, diremos, desde já, que a orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Administrativo contida no acórdão fundamento (do Pleno da Secção de 26/01/2005) é inteiramente justificada, tendo afastado definitivamente a posição expressa no acórdão da Secção de 27/05/1970 (rec. nº 16153) que foi invocada tanto na fundamentação do acto impugnado no tribunal arbitral como na motivação da decisão arbitral recorrida (Posição segundo a qual a isenção era excluída nos casos em que a sociedade comprava um terreno onde estava já em construção um prédio urbano e acabava a sua construção e procedia à sua venda, por se entender que não se revendia o lote de terreno no estado em que tinha sido adquirido..)

Acórdão fundamento que, aliás, representa a aceitação, ainda que mais abrangente e clarificadora, da posição que já anteriormente fora sufragada pelo Pleno desta Secção em 10/11/1982, no rec. nº 001730, e também por esta Secção em 23/02/2000, no rec. nº 018135.

Na verdade, a tese de que os prédios têm de ser revendidos no exacto estado em que foram adquiridos, não encontra, como bem se referia já nesse acórdão do STA de 23/02/2000, o mais leve suporte no texto da lei. «Alusão alguma fez, pois, aqui a lei à coincidência entre o estado dos prédios no momento da aquisição e no ulterior momento da revenda. Temos, portanto, que bem andou a 2ª instância ao proclamar que do dito artigo 16º, nº 1, “não resulta que o revendedor só beneficie da isenção quando revenda o prédio no estado em que o adquiriu. O que ele tem é de o revender no prazo de dois anos, independentemente do estado em que o prédio se encontrava quando o comprou e do estado em que se encontrava quando o revendeu”». (…).

Para efeitos de caducidade de isenção de imposto não importa se o imóvel é ou não revendido no preciso e exacto estado em que foi adquirido; o que importe é que não haja uma metamorfose ou alteração substancial do bem adquirido para revenda. Pelo que se este é constituído por um terreno com um edifício habitacional já em construção, as obras feitas pelo comprador para a finalização dessa construção, de modo a vender o terreno com o edifício já acabado (ou a vender as suas fracções autónomas), não representa uma transfiguração ou alteração substancial da afectação do imóvel adquirido para revenda, não representa, em suma, um “destino diferente” da revenda do imóvel adquirido.

Tal como se deixou salientado no acórdão fundamento, para os aludidos efeitos só constitui destino diferente a «alteração substancial» do prédio adquirido, nomeadamente a transformação de um prédio rústico em prédio urbano (pela compra de um terreno e posterior construção nele de um edifício para venda) ou a demolição de uma casa de habitação e posterior venda do terreno para construção, não representando destino diferente a circunstância de o prédio adquirido (terreno com um edifício habitacional ainda em tosco) ter sido revendido em estado diverso por força das obras de acabamento do edifício, da constituição em propriedade horizontal e da revenda das respectivas fracções autónomas.

Por conseguinte, só nos casos em que o edifício residencial adquirido em construção é sujeito a obras para alcançar uma afectação ou utilização completamente distintas (como aconteceria no caso de ser alterado para um edifício industrial, comercial ou escolar, que implicam obras de transformação profundas e uma mutação susceptível de configurar uma alteração substancial do imóvel, designadamente em termos de utilização) ou nos casos em que, ainda que mantendo a afectação habitacional, o edifício é sujeito a obras substanciais que o transformam em algo bem diverso daquilo que constava da licença de construção em vigor à data da aquisição, é possível afirmar que as obras realizadas pelo adquirente são idóneas a desviar o destino declarado: - a revenda de terreno com o edifício habitacional nele implantado ao abrigo de determinado projecto e licença de construção), integrando, assim, o conceito legal de “destino diferente”

Esta posição corresponde, aliás, à que já fora foi assumida, em sede de imposto de sisa, pela própria Administração Fiscal, como se pode ver pela leitura do Despacho da Direcção de Serviços dos Impostos do Selo e das Transmissões do Património, de 13-09-1995, publicado na CTF nº 380, pág. 490, com o seguinte teor: «O fundamento da isenção do nº 3 do artigo 11º está na circunstância de os prédios adquiridos se manterem no activo permutável, enquanto mercadorias das empresas tributadas pelo exercício da actividade de aquisição de prédios para revenda, não sendo esta característica afectada pelo acabamento dos prédios adquiridos, ainda em construção, e pela constituição posterior da propriedade horizontal.

A ultimação da construção, de harmonia com o projecto aprovado, não alterou substancialmente a natureza do prédio adquirido, o mesmo sucedendo após a constituição da propriedade horizontal, sendo, portanto, certo que o prédio adquirido para revenda teve efectivamente essa aplicação, mediante a revenda respectiva, por fracções autónomas.

A ultimação da construção de um prédio urbano já construído em tosco e posterior constituição da respectiva propriedade horizontal e posterior revenda em fracções autónomas não pode conduzir à perda da referida isenção».

E corresponde, também, à assumida no Parecer nº 119/95 do Centro de Estudos Fiscais, sancionado por despacho de 13/09/96 do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, segundo o qual o «fundamento da isenção [de compra para revenda] em causa está na circunstância de os prédios adquiridos se manterem no activo permutável, enquanto mercadorias das empresas tributadas pelo exercício da actividade de aquisição de prédios para revenda, não sendo esta característica afectada pelo acabamento dos prédios adquiridos, ainda em construção, e pela constituição posterior da propriedade horizontal.

(…) a ultimação da construção, de harmonia com o projecto aprovado, não alterou substancialmente a natureza do prédio adquirido, o mesmo sucedendo após a constituição da propriedade horizontal, sendo portanto, certo que o prédio adquirido para revenda, teve efectivamente essa aplicação, mediante a revenda respectiva por fracções autónomas.».

Razão por que se mostra há muito ultrapassada a tese sufragada no acórdão do STA de 27/05/1970, acolhida na decisão arbitral recorrida e defendida pelos Autores nela citados (SILVÉRIO MATEUS E CORVELO DE FREITAS), segundo a qual o benefício da isenção só actua desde que os prédios adquiridos para revenda sejam objecto desse destino nas mesmas condições em que se encontravam no momento em que foram adquiridos.

Posto isto, e voltando ao caso vertente, é evidente que não se pode abstrair da circunstância de o terreno adquirido ter nele implantado um edifício destinado à habitação e que se encontrava em avançada fase de construção/remodelação (como se pode concluir pela natureza das obras em curso e das que posteriormente foram realizadas pelo adquirente para efeitos de ultimação do edifício de acordo com o projecto aprovado à data da aquisição – cfr. ponto 6º do probatório), tendo em vista a sua revenda como edifício já concluído e em fracções autónomas.

Pelo que a realização dessas obras não representa uma transformação susceptível de configurar uma alteração substancial do destino do prédio adquirido. Por outras palavras, não se pode conceber que as obras ocorridas sejam idóneas a desviar o fim declarado (a revenda do prédio constituído por terreno com o edifício que nele já existia em construção), na medida em que elas se destinaram à finalização da construção do mesmo edifício, de acordo com o projecto já então aprovado, tendo em vista a revenda em fracções autónomas.

Aliás, da leitura da fundamentação do acto tributário impugnado no tribunal arbitral verifica-se que o que levou à prática do acto foi o facto de a Administração Tributária ter partido do pressuposto de que o imóvel adquirido fora um mero terreno de construção, que a sociedade adquirente transformara posteriormente através da construção de um edifício destinado à habitação. E é essa também a posição profusamente sustentada pela Autoridade Tributária na contestação apresentada ao pedido de pronúncia arbitral. Fundamentação que partiu, portanto, de um pressuposto de facto errado, pois, como se veio a provar, o imóvel era constituído por um terreno onde se encontrava já implantado um edifício destinado à habitação, devidamente licenciado e em avançada fase de construção/remodelação.

Por conseguinte, não se pode compreender que obras levadas a cabo pela adquirente – que visaram ultimar a construção do edifício de acordo com o projecto aprovado e torná-lo apto para a revenda em fracções autónomas – possam ser vistas como intervenções susceptíveis de integrar o conceito de “destino diferente” para efeitos de exclusão da isenção de imposto.

Acresce que, como bem refere a ora Recorrente, não se pode conceber que as obras ocorridas no imóvel em causa sejam idóneas a desviar o seu fim (a revenda) quando não é minimente questionado que o imóvel foi por si adquirido no âmbito da sua actividade, mantendo-se como activo permutável da empresa como mercadoria para desenvolvimento da actividade pela qual está colectada, nunca tendo sido qualificado como matéria-prima, destinando-se as obras que realizou unicamente à finalização do projecto de construção anteriormente aprovado, tendo em vista a sua revenda. Pelo que a interpretação seguida pelo Supremo Tribunal Administrativo no acórdão fundamento é a que melhor reflecte a letra e o espírito da lei, não fazendo qualquer sentido que se discriminem os revendedores em face dos construtores (que não pagam IMT pelos prédios que constroem).

Por tudo o que se deixou exposto, sufraga-se, mais uma vez, a posição acolhida no acórdão fundamento, segundo o qual «não obsta à isenção o facto de o prédio não estar ainda totalmente construído: o que foi adquirido … foi “um lote de terreno com um prédio em construção, ainda em tosco, a ser acabado”. De tal não resulta, todavia, nenhuma alteração substancial da sua estrutura externa ou disposição interna do edifício.

Como assinala Nuno Sá Gomes, in CTF 380, págs. 488 e segts., o fundamento da isenção em causa está na circunstância de os prédios adquiridos se manterem, como mercadorias, no activo permutável da empresa tributada pelo exercício da actividade de aquisição de prédios para revenda, «não sendo esta característica afectada pelo acabamento dos prédios adquiridos, ainda em construção, e pela constituição posterior da propriedade horizontal».

Como, aliás, acontece com a aquisição de prédios rústicos adquiridos para revenda e posterior loteamento com venda por lotes, não obstante as numerosas obras que, em geral, tal operação implica, desde a construção da rede viária ao saneamento básico.
Ao contrário do sentenciado, não se está, assim, face a matérias-primas adquiridas para transformação em mercadorias – cfr. DL nº 410/89, de 21 de Novembro - mas antes de mercadorias integrantes do activo permutável da empresa.

Pelo que sendo a sisa um imposto sobre o património ou sobre a riqueza - cfr. o art. 1º do Código de Sisa e o Ac. do STA de 06/10/1999 rec. 23.831 - não deve tributar a venda de elementos do activo permutável, sujeita, antes, a impostos sobre o rendimento.

É essa, aliás, a doutrina actual da Administração como pode ver-se em Pinto Fernandes, Código de Sisa Anotado, 4ª edição, 1997, págs. 196 e 296: relativamente à aquisição de prédios inacabados, em tosco, para o adquirente os adquirir e vender posteriormente, mantendo-se o prédio no activo permutável do adquirente, a ultimação da construção e a constituição de propriedade horizontal e posterior venda em fracções autónomas não conduz à perda da isenção pois que não alterou substancialmente a natureza do prédio adquirido.». …”.

Com este pano de fundo, cabe ter presente que o aresto em causa afirma que “só constitui destino diferente a «alteração substancial» do prédio adquirido, nomeadamente a transformação de um prédio rústico em prédio urbano (pela compra de um terreno e posterior construção nele de um edifício para venda) ou a demolição de uma casa de habitação e posterior venda do terreno para construção”, sublinhando depois que “só nos casos em que o edifício residencial adquirido em construção é sujeito a obras para alcançar uma afectação ou utilização completamente distintas (como aconteceria no caso de ser alterado para um edifício industrial, comercial ou escolar, que implicam obras de transformação profundas e uma mutação susceptível de configurar uma alteração substancial do imóvel, designadamente em termos de utilização) ou nos casos em que, ainda que mantendo a afectação habitacional, o edifício é sujeito a obras substanciais que o transformam em algo bem diverso daquilo que constava da licença de construção em vigor à data da aquisição, é possível afirmar que as obras realizadas pelo adquirente são idóneas a desviar o destino declarado: - a revenda de terreno com o edifício habitacional nele implantado ao abrigo de determinado projecto e licença de construção), integrando, assim, o conceito legal de “destino diferente”.

Além disso, este Supremo Tribunal reitera o entendimento anterior, segundo o qual o critério fundamental para a aferição da existência de um “destino diferente”, radica na circunstância de o imóvel adquirido ter perdido a natureza de bem permutável - destinado a revenda - para assumir a natureza de “matéria-prima” - destinado a transformação, impondo-se ter presente, não tanto a forma como o bem foi contabilizado nas existências do sujeito passivo (como activo circulante, ou como matéria-prima), mas a realidade apurada, no sentido de saber se, de facto, o bem foi objecto de um processo económico de transformação, ou se, pelo contrário, a intervenção efectuada assumiu um carácter acessório, de optimização do bem para a sua rentabilização no mercado.

Como já ficou dito, na situação dos autos, o Recorrente, que exerce a actividade de compra e venda de prédios para revenda, adquiriu os lotes de terreno para revenda, conforme declarado na respectiva escritura, sendo inequívoco que o mesmo Recorrente não procedeu à revenda dos lotes, antes tendo requerido, após a aquisição, as respectivas licenças junto da competente CM e construído edifícios e garagens em cada um dos lotes, com 8 fracções autónoma cada edifício, tendo vendido 6 fracções no prazo de 3 anos, contados da data de aquisição dos lotes de terreno.

Sendo assim, como é, temos de considerar que, no caso dos autos, é manifesto que houve uma alteração substancial dos imóveis que haviam sido adquiridos para revenda, simples terrenos para construção, sem qualquer edifício acabado ou inacabado, e os que foram, efectivamente vendidos, fracções autónomas integrantes de edifícios totalmente construídos após a aquisição dos lotes, o que conduz à afirmação de que mostra-se caducada a isenção de que o Recorrente havia beneficiado aquando da aquisição dos lotes de terreno para construção, o que significa que o acto de liquidação sindicado não pode deixar de se manter na ordem jurídica, situação que tem um verdadeiro efeito de implosão no que concerne ao presente recurso, ficando prejudicada a apreciação do mais apontado nesta instância de recurso.




4. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pelo Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.

Custas pelo Recorrente.

Notifique-se. D.N..




Lisboa, 09 de Junho de 2021. - Pedro Nuno Pinto Vergueiro (Relator) - Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - Nuno Filipe Morgado Teixeira BaSTOS