Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0203/15
Data do Acordão:03/12/2015
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:VITOR GOMES
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
AQUISIÇÃO DA NACIONALIDADE PORTUGUESA
ÓNUS DE PROVA
ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:É de admitir a revista excepcional para apreciação do problema de saber se para a procedência de acção de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa é necessário estar demonstrada a inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional ou apenas não estar demonstrada essa ligação efectiva.
Nº Convencional:JSTA000P18727
Nº do Documento:SA1201503120203
Data de Entrada:02/23/2015
Recorrente:MINISTÉRIO PÚBLICO
Recorrido 1:A.......... REP. PELOS PAIS B........... E OUTRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar
Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo

1. O Ministério Público propôs no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa acção de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa, contra A…………, representada por seus pais, pedindo que se ordenasse o arquivamento do processo conducente ao respectivo registo, pendente na Conservatória dos Registos Centrais, «com fundamento na inexistência de ligação efectiva à comunidade portuguesa».

Por sentença de 28/11/2013, a oposição foi julgada improcedente.

O Ministério Público apelou para o Tribunal Central Administrativo Sul que negou provimento ao recurso (acórdão de 20/11/2014). E vem agora, ao abrigo do artigo 150.º do CPTA, interpor recurso de revista.

2. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, «excepcionalmente», recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». A jurisprudência deste Supremo Tribunal, interpretando o comando legal, tem reiteradamente sublinhado a excepcionalidade deste recurso, referindo que o mesmo só pode ser admitido nos estritos limites fixados neste preceito. Trata-se, efectivamente, não de um recurso ordinário de revista, mas antes, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, de uma «válvula de segurança do sistema» que apenas deve ser accionada naqueles precisos termos.

3. A questão que a recorrente pretende submeter ao presente recurso de revista respeita à aplicação do disposto no artigo 9.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 37/81, de 03/10, na redacção introduzida pela Lei n.º 2/2006, de 17/04, Lei da Nacionalidade, e no artigo 56.º, n.º 2, alínea a), do Decreto-Lei n.º 237-A/2006, de 14/12, Regulamento da Nacionalidade Portuguesa:

«Artigo 9.º
Fundamentos
Constituem fundamento de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa:

a) A inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional»

«Artigo 56.º
Fundamento legitimidade e prazo
1 – (…).
2 – Constituem fundamento de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa, por efeito da vontade ou da adopção:
a) A inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional».

As instâncias julgaram no mesmo sentido, embora com fundamentação algo diversa. O TAC radicou em que se mostrava preenchido o ónus da demonstração da ligação efectiva, atendendo aos elementos colhidos nos autos. Já o TCA concluiu, em linha com o acórdão deste Supremo Tribunal, de 19.6.2014, processo 103/14, que para a procedência da acção cabia ao Ministério Público provar que o requerente da nacionalidade não tinha ligação efectiva à comunidade portuguesa. Não estando efectuada essa prova, a acção teria de decair.

Há, portanto, um problema jurídico de alcance geral: saber se para a procedência de acção de oposição à aquisição de nacionalidade é necessário estar demonstrada a inexistência de ligação efectiva, o que se correlaciona com o respectivo ónus de prova.

Embora o acórdão recorrido tenha invocado uma decisão deste Supremo, os litígios em matéria de aquisição de nacionalidade por efeito da vontade são frequentes, versam sobre matéria de relevância comunitária e ainda não existe, a propósito da questão discutida no recurso, jurisprudência consolidada deste Supremo Tribunal, que possa servir de orientação para os envolvidos.

Assim, é de considerar-se que estamos perante matéria de importância fundamental (como também se considerou, ainda, no Proc. 1053/14, ac. 21.10.2014 e no Proc. 1548/14, ac. de 3/2/2015).

4. Decisão

Pelo exposto, decide-se admitir a revista.
Lisboa, 12 de Março de 2015. - Vítor Gomes (relator) - Alberto Augusto Oliveira - São Pedro.