Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0654/13
Data do Acordão:07/09/2014
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:RECURSO POR OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
Sumário:A admissibilidade dos recursos por oposição de acórdãos, tendo em conta o regime previsto nos artigos 27.º, alínea b) do ETAF e 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, depende de existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito, sendo que a oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade das questões suscitadas e resolvidas, perante quadro legal substancialmente idêntico e substancial identidade das situações fácticas.
Nº Convencional:JSTA000P17808
Nº do Documento:SAP201407090654
Data de Entrada:03/26/2014
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:STICHING PENSIOENFONDS ABP E OUTRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -
1 – A Fazenda Pública, não se conformando com o Acórdão deste STA proferido nos presentes autos em 27 de Novembro de 2013 (a fls. 537 a 557), que concedeu provimento ao recurso por si interposto da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por STICHING PENSIONFONDS ABP e STICHING PENSIONFONDS ZORG EN WELZIJN contra acto de retenção na fonte de IRC sobre dividendos distribuídos no ano de 2007, no montante de 2.175.996,15, vem, nos termos dos artigos 27º al. b) do ETAF e 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), interpor recurso para este Supremo Tribunal, por oposição com o Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 28 de Novembro de 2012, proferido no recurso n.º 0694/12, já transitado em julgado.
O recorrente apresentou (a fls. 581 a 585) alegações tendentes a demonstrar a alegada oposição de julgados, concluindo nos seguintes termos:
1) Entre os doutos Acórdãos em causa, o fundamento e o recorrido, existe oposição susceptível de servir de fundamento ao recurso vertente.
2) Na verdade, posta a questão de saber se a entidade não residente podia ou não fazer repercutir as retenções na fonte efectuadas em Portugal na tributação do seu país de origem, enquanto para o Acórdão fundamento tal argumentação não tem a ver com a legislação portuguesa de eliminação da dupla tributação e que, por isso, a retenção em Portugal não pode ficar dependente do facto de essa eliminação ser, ou não, efectuada pelo Estado de origem, já para o Acórdão recorrido se o imposto retido na fonte em Portugal não poder ser recuperado no país da sua residência e não poder ser imputado no imposto devido no país de origem em qualquer percentagem, existe violação dos princípios da não discriminação e da livre circulação de capitais.
3) encontra-se, pois, preenchido o condicionalismo previsto no art. 284.º n.º 3 do CPPT.
Termos em que e, com o douto suprimento de V. Exas., deve decidir-se no sentido de que existe oposição de julgados e, em consequência, seguirem-se os demais termos até final.
Contra-alegaram as recorridas, nos termos de fls. 600 a 610, concluindo que:
A) A ora Recorrente apresentou o presente recurso, ao abrigo do número 3 do artigo 284.º do CPPT, invocando oposição de julgados entre o Acórdão proferido nos presentes autos e a decisão perfilhada no acórdão proferido por este Venerando Tribunal a 28 de novembro de 2012, no processo n.º 0694/12;
B) Constitui jurisprudência consolidada deste Venerando Tribunal que o recurso por oposição de acórdãos depende da existência de uma diversidade de soluções jurídicas ou de um entendimento inconciliável entre dois acórdãos quanto à mesma questão fundamental de direito;
C) No caso em apreço, inexiste identidade factual, uma vez que no acórdão fundamento a situação analisada prende-se com o pagamento de juros por uma parte de uma entidade residente em Portugal a uma entidade não residente, ao passo que no acórdão recorrido, estamos perante a distribuição de dividendos a um fundo de pensões não residente em Portugal;
D) De igual modo, inexiste identidade do quadro jurídico que sustenta as duas decisões, uma vez que nos presentes autos, o que está em causa são as disposições do Código do IRC e do Estatuto dos Benefícios Fiscais aplicáveis à tributação dos dividendos auferidos por fundos de pensões residentes e não residentes em Portugal – em particular o disposto nos artigos 16.º do EBF e 94.º, n.º 5 do CIRC – ao passo que no acórdão fundamento, o quadro nacional em discussão prende-se com as normas de tributação de juros obtidos por entidades não residentes em Portugal, em particular se a base de incidência para efeitos de aplicação da taxa de retenção na fonte são rendimentos brutos ou líquidos, aplicação da cláusula de nação mais favorecida às Convenções sobre Dupla Tributação;
E) Num caso discute-se se a norma do EBF é discriminatória por impor uma tributação mais gravosa a fundos de pensões não residentes, no aresto fundamento discute-se a aplicação da cláusula da nação mais favorecida no âmbito de um pagamento de juros a uma entidade não residente;
F) Por outro lado, inexiste tão pouco contradição nas soluções jurídicas adotadas, uma vez que a passagem do acórdão fundamento, invocada pela Recorrente na sua alegação – que conclui no sentido da irrelevância do quadro legislativo do país da residência do beneficiário dos rendimentos para efeitos de análise da compatibilidade do regime interno com as regras do Direito Comunitário – mais não é do que um corolário lógico da solução jurídica adotada no quadro do litígio aí em apreço;
G) De facto, no acórdão fundamento, este Venerando STA limitou-se a concluir pela irrelevância do argumento invocado pela ali Recorrida e, em concreto, pela irrelevância da análise da legislação interna do seu Estado de residência, o que bem se compreende, uma vez que este Venerando Tribunal pugnou pela compatibilidade do quadro fiscal nacional controvertido face ao Direito Comunitário;
H) Contrariamente, no Acórdão ora recorrido, é inequívoco que as normas nacionais foram previamente declaradas pelo TJUE contrárias à legislação comunitária, importando apenas aferir se as Recorrentes conseguem recuperar o imposto retido na fonte em Portugal para então se aferir se tal tratamento discriminatório é passível de conferir um tratamento fiscal mais gravoso ao sujeito passivo não residente;
I) Da análise da alegação apresentada pela ora Recorrente e em concreto da leitura dos pontos VI) a VIII), é evidente que estamos perante situações factuais distintas, quadros legislativos e fundamentos jurídicos diferentes, inexistindo qualquer oposição ou solução jurídica contraditória sobre a mesma questão fundamental de direito, não estando assim verificados os requisitos materiais para admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos interposto pela ora Recorrente, o que se invoca para os devidos efeitos legais.
Termos em que se requer a este Venerando Tribunal que dê o presente recurso por findo, por absoluta falta de verificação dos respetivos requisitos legais, e em concreto, a inexistência de qualquer oposição de julgados entre os Acórdãos melhor identificados na Alegação apresentada pela Recorrente, tudo com as demais consequências legais, mormente a baixa dos presentes autos à primeira instância para ampliação da matéria de facto e prolação de nova sentença.


Por despacho de 12 de Fevereiro de 2014 (fls. 611 dos autos) da Exma. Relatora neste STA veio o recurso a ser admitido, no entendimento de que se afigurava poder verificar-se a apontada oposição de acórdãos, ordenando-se em consequência a notificação das partes para as alegações, nos termos do n.º 3 do art. 282.º do CPPT, aplicável por força do disposto no n.º 5 do art. 284.º do CPPT.

A recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
1) Entre os doutos Acórdãos em causa, o fundamento e o recorrido, existe oposição susceptível de determinar o prosseguimento do presente recurso, encontrando-se preenchido o condicionalismo previsto no art. 284º do CPPT e art. 27º, nº 1, al. b) do ETAF.
2) Deve ser fixada jurisprudência desse Venerando Tribunal, a constante do douto Acórdão fundamento, isto é, de que posta a questão de saber se a entidade não residente podia, ou não, fazer repercutir no país da origem as retenções na fonte efectuadas em Portugal e se essa questão era, ou não, relevante para que se estivesse perante eventual restrição à livre circulação de capitais, a mesma não era relevante, uma vez que, tal facto não tem a ver com a legislação portuguesa de eliminação da dupla tributação e, por isso, a retenção em Portugal não pode ficar dependente do facto de essa eliminação ser, ou não, efectuada pelo Estado de origem.
3) Efectivamente, no caso em apreço não está em causa o “estabelecimento” da ora recorrida, em Portugal, para o exercício de uma actividade, através de uma agência, sucursal ou filial. Está em causa, apenas, a detenção de uma participação financeira numa empresa portuguesa.
4) a posição de beneficiário dos dividendos nunca é idêntica, quer seja residente quer seja não residente atendendo, precisamente, ao modo como esse rendimento vai integrar, ou não, o seu lucro tributável.
5) E não é comparável a situação de tributação de um sujeito passivo através de uma norma de incidência subjectiva ou através de uma norma de incidência objectiva. Assim, da mesma forma que o Estado Português estabeleceu uma norma para eliminar a dupla tributação, nas situações em que a base tributável consiste no lucro da sociedade, também o Estado da residência recorrida pode optar pela consagração de normas que eliminem a dupla tributação.
6) O facto de a ora recorrida poder, ou não, beneficiar no país da residência do crédito de imposto constitui um argumento que não tem que ver com a legislação portuguesa da eliminação da dupla tributação, uma vez que caberia ao País de residência diligenciar igualmente no sentido de dar cumprimento à Convenção em causa.
7) Se o País de residência se move por outras opções de política fiscal, a eventual ausência de neutralidade não pode ser imputada ao País da fonte, que não pode ser prejudicado pela situação criada pelo País de residência. Dito por outras palavras, a legalidade da tributação efectivada em Portugal não pode ficar dependente de a mesma ser ou não obtida no Estado de residência (cujo condicionamento, em virtude de opções no domínio da política fiscal, transcendem a AT portuguesa).
Termos em que e, com o douto suprimento de V. Exas., deve decidir-se no sentido de que existe oposição de julgados e deve o presente recurso ser julgado procedente, de acordo com a jurisprudência constante do Acórdão fundamento, revogando-se o Acórdão recorrido, com todas as legais consequências.

2 – Contra-alegaram as recorridas, nos termos de fls. 682 a 704 dos autos, no sentido da inexistência de oposição de julgados e subsidiariamente no da manutenção do julgado recorrido.

3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Supremo Tribunal emitiu o parecer de fls. 710/711 dos autos, concluindo no sentido de se dever julgar verificada a oposição de julgados e, quanto ao mérito, no sentido da improcedência do recurso e consequente manutenção do julgado recorrido.


Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
- Fundamentação –
4 – Questões a decidir
Importa averiguar previamente se, no caso dos autos, estão reunidos os requisitos de admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos, cuja não verificação impede o conhecimento do presente recurso.

Concluindo-se no sentido da verificação daqueles requisitos, haverá então que conhecer do seu mérito.

5 – Matéria de facto
No acórdão recorrido encontram-se fixados os seguintes factos:
A) As Impugnantes são duas pessoas colectivas de direito holandês, constituídas sob a forma jurídica de Fundos de Pensões – o Fundo PGGM encontra-se constituído sob a forma jurídica de Fundação – e estabelecidas de acordo com a legislação interna da Holanda (cfr. fls. 4 ss do Processo Administrativo e fls. 148 a 152, todas dos autos).
B) As Impugnantes têm o seu domicílio fiscal na Holanda (cfr. fls. 4 ss do Processo Administrativo e fls. 46 e ss e fls. 148 a 152, todas dos autos).
C) No ano de 2007, as Impugnantes receberam dividendos na qualidade de accionistas de sociedades que foram sujeitos a tributação por retenção na fonte liberatória à taxa de 20% e 10% (cfr. documentos de fls. 89 e ss dos autos).
D) A Primeira Impugnante efectuou pedidos de reembolso do imposto retido na fonte para os casos em que foi aplicada a taxa interna de 20% no montante correspondente à diferença entre a taxa interna de 20% e a taxa de 10% prevista no ADT celebrado entre Portugal e a Holanda, através da entrega dos Modelos 14 ou 22 RFI (cfr. documentos de fls. 89 e ss dos autos).
E) O ABP suportou em Portugal em 2007 imposto por retenção na fonte no montante total de EUR 2.116.144,22 (cfr. documentos de fls. 89 e ss dos autos).
F) No ano de 2007, o PGGM suportou em Portugal imposto por retenção na fonte num total de EUR 59.851,93 (cfr. documentos de fls. 89 e ss dos autos).
G) A 24 de Setembro de 2009, as Impugnantes apresentaram junto do Serviço de Finanças de Lisboa-12 reclamação graciosa, nos termos do nº 4 do art. 132º do CPPT, na qual contestaram a legalidade das retenções na fonte de IRC relativas ao exercício de 2007, tendo o processo corrido seus termos sob o nº 3085200904003063 (cfr. fls. 7 e ss do Processo Administrativo).
H) Em 29/11/2010 foi proferido despacho de indeferimento da reclamação graciosa (cfr. fls. 166 e ss do Processo Administrativo).
I) Em 06/12/2010 foi assinado o aviso de recepção referente ao ofício que notifica as Impugnantes do projecto de indeferimento da reclamação graciosa (cfr. fls. 173 e 174 dos autos).
J) A Impugnação foi apresentada por remetida por telecópia datada de 21/12/2010 para tribunal tributário de Lisboa (cfr. fls. 2 e ss dos autos).

Por sua vez, é do seguinte teor o probatório fixado no Acórdão fundamento:
1. A Impugnante é uma sociedade de direito espanhol, com sede e direcção efectiva em Calle … …, …, Madrid, Espanha, matriculada no Registo Mercantil, folio 154 e seguintes, tomo 15.339, secção 8.ª, número M-257189. Cfr. doc. n.° 4, junto aos autos a fls. 39-58.
2. Em 25/05/2001, a Impugnante e a B……, assinaram um escrito denominado “Contrato de Préstamo”, nos seguintes termos:













Cfr. doc. n.° 5, junto aos autos a fls. 60-63.
3. A sociedade B……, S.A. pagou juros à Impugnante em 2002, 2003 e 2004, aos quais aplicou uma taxa de retenção na fonte de 15%. Cfr. docs. n.° 6, 7 e 8, juntos aos autos a fls. 64-72.
4. Em 30/12/2004, a Impugnante apresentou uma reclamação graciosa relativamente aos actos de retenção na fonte referidos em 3. supra. Cfr. doc. n.° 1, junto aos autos a fls. 18-30.
5. Pelo Ofício 9147 de 06/0712005, foi comunicado à Impugnante o indeferimento da reclamação graciosa referida em 4. supra, constando da Informação anexa, nomeadamente que:

"Estando a CDT entre Portugal e Espanha em vigor a qual expressamente refere que a taxa de tributação a aplicar aos rendimentos em questão é de 15% e cumpridos que estão os requisitos formais compete à entidade que tem a obrigação de proceder à retenção, ou à administração Tributária no caso entidade competente não ter procedido a essa retenção aplicar o disposto na “Convenção” o que não está em causa na presente reclamação, uma vez que a entidade devedora dos rendimentos cumpriu a norma legal em vigor.”
Cfr. docs. n.° 2 e 3, juntos aos autos a fls 31-38.

6 – Apreciando.
6.1 Dos requisitos de admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos
Importa, em primeiro lugar, verificar do preenchimento dos requisitos de admissibilidade do presente recurso por oposição, pois que não obstante a Relatora do Acórdão recorrido ter proferido despacho em que consignou poder verificar-se a apontada oposição de acórdãos, importa reapreciar se a mesma se verifica, já que tal decisão, como vem sendo jurisprudência pacífica e reiterada deste Supremo Tribunal (vide, entre outros, o Acórdão de 7 de Maio de 2003, rec. n.º 1149/02), não só não faz caso julgado, como não impede ou desobriga o Tribunal de recurso de a apreciar (cfr. art. 685.º-C, n.º 5 do Código de Processo Civil - CPC) – cfr. também neste sentido JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário: Anotado e Comentado, volume II, 5.ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2007, p. 814 (nota 15 ao art. 284.º do CPPT).
O presente processo iniciou-se no ano de 2010, pelo que lhe é aplicável o regime legal resultante do ETAF de 2002, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, e 4.º, n.º 2, da Lei n.º 13/2002 de 19 de Fevereiro, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 107-D/2003 de 31 de Dezembro.

Assim, a admissibilidade dos recursos por oposição de acórdãos, tendo em conta o regime previsto nos artigos 27.º, alínea b) do ETAF, 284.º do CPPT e 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), depende de existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito e que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.

No que ao primeiro requisito respeita, como tem sido inúmeras vezes explicitado pelo Pleno desta Secção relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF de 1984 e da LPTA, para detectar a existência de uma contradição, quais sejam:

- identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica;

- que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica;

- que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta;

- a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta (Acórdãos do Pleno desta Secção do STA de 26 de Setembro de 2007, 14 de Julho de 2008 e de 6 de Maio de 2009, recursos números 452/07, 616/07 e 617/08, respectivamente).

A alteração substancial da regulamentação jurídica relevante para afastar a existência de oposição de julgados verifica-se «sempre que as eventuais modificações legislativas possam servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados para determinação da solução jurídica» (v. Acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA de 19 de Junho de 1996 e de 18 de Maio de 2005, proferidos nos recursos números 19532 e 276/05, respectivamente).

Por outro lado, a oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais (cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, op. cit., p. 809 e o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de Abril de 1995, proferido no recurso n.º 87156).

Vejamos, então, se tais pressupostos se verificam.

No Acórdão recorrido estava em causa a legalidade das retenções na fonte de IRC, efectuadas de acordo com a legislação interna portuguesa, sobre dividendos distribuídos por sociedades anónimas residentes em Portugal a Fundos de Pensões estabelecidos na Holanda (cfr. as alíneas A) a C) do probatório fixado), sendo a questão decidenda a de saber se a sentença errou ao julgar ilegal a retenção de imposto na fonte aquando da percepção de dividendos por Fundos de Pensões de direito holandês – entidades não residentes – por violação do direito de livre circulação de capitais consagrados nos arts. 12.º e 56.º do TCE e proibição de discriminação em razão da residência, face à isenção de imposto de que beneficiariam homólogas entidades residentes em Portugal, atento o que dispunha, à data dos factos, o art. 14.º (actual art. 16.º) do EBF (cfr. Acórdão recorrido, a fls. 549 dos autos).

Por sua vez, no Acórdão fundamento, estava em causa a legalidade das retenções na fonte de IRC, efectuadas à taxa prevista na Convenção contra a Dupla Tributação celebrada entre Portugal e Espanha, sobre juros pagos por uma sociedade anónima residente em Portugal a uma sociedade espanhola (cfr. os números 1 a 5 do probatório fixado) sendo as questões decidendas as de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento ao concluir pela anulação parcial da liquidação, por entender que a sujeição à retenção de imposto (IRC), à taxa de 15%, sobre os juros pagos nos anos de 2002, 2003 e 2004, pela sociedade de direito português “B……, SA.,” à sociedade de direito espanhol e sem estabelecimento estável em Portugal “A…, SL”, é contrária à liberdade de estabelecimento, à liberdade de circulação de capitais e ainda ao princípio da preferência comunitária e se o acto de retenção na fonte de IRC que incidiu sobre o rendimento bruto auferido pela ora Recorrida, em 2002, 2003 e 2004, proveniente de juros, padece do vício de violação do disposto nos artigos 56.° e 58.° do TCE (actualmente artigos 63.° e 65.° TFUE), uma vez que o imposto a pagar pelas entidades residentes incide exclusivamente sobre o rendimento líquido.

Não há, pois, identidade, sequer substancial, das situações de facto subjacentes aos arestos em confronto, como não há identidade de questões decidendas, verificando-se ainda diferenças de relevo quanto ao quadro jurídico de referência aplicável, em razão da diversa natureza dos rendimentos objecto de tributação por retenção na fonte (dividendos e juros) e da residência e natureza das entidades beneficiárias dos rendimentos (fundos de pensões holandeses e sociedade anónima de direito espanhol), não obstante, dentro deste quadro jurídico, serem em ambos os arestos também invocáveis regras e princípios de direito europeu comuns (não discriminação e liberdade de circulação de capitais).

Essa identidade parcial do quadro jurídico de referência não chega, porém, para que à luz dos critérios que se têm vindo a firmar jurisprudencialmente e que são hoje pacificamente aceites na jurisprudência deste STA se julgue verificada a oposição de julgados juridicamente relevante para que o presente recurso prossiga para conhecimento do respectivo mérito, pois que não se pode afirmar com rigor que os arestos em confronto tenham adoptado decisões antagónicas relativamente à mesma questão fundamental de direito.

As decisões constantes de um e outro aresto são, aliás concordantes no que respeita ao provimento dos recursos interpostos pela Fazenda Pública, embora no acórdão fundamento no provimento do recurso se tenha revogado a sentença recorrida e julgado improcedente a impugnação e no Acórdão recorrido se tenha anulado a decisão recorrida e determinado a baixa dos autos ao tribunal “a quo” para que profira nova decisão após ampliação da matéria de facto, dada a julgada necessidade de apurar se o ADT celebrado entre Portugal e a Holanda permite, no caso concreto, neutralizar a tributação, e, por conseguinte, fazer respeitar a imposição comunitária da livre circulação de capitais, pois que sem isso não é possível, conscientemente, decidir sobre a concreta (i)legalidade e anular ou manter as liquidações impugnadas(cfr.Acórdão recorrido, a fls. 557 dos autos).

O recurso deve, pois, ser julgado findo.


- Decisão -

7 – Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em julgar findo o recurso.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 9 de Julho de 2014. – Isabel Cristina Mota Marques da Silva (relatora) - José da Ascensão Nunes Lopes – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes – Pedro Manuel Dias Delgado – Ana Paula da Fonseca Lobo – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia – José Maria da Fonseca Carvalho – Dulce Manuel da Conceição Neto – Joaquim Casimiro Gonçalves.

Segue acórdão de 15 de Outubro de 2014:

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
– Relatório –
1 – A Fazenda Pública, recorrente nos presentes autos, notificada do nosso Acórdão de 9 de Julho último, de fls. 715 a 732 dos autos, vem requerer a sua reforma quanto a custas (em ambas as instâncias), ao abrigo dos artigos 616º, n.º 1 e 666.º n.º 1 do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi da al. e) do art. 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), alegando que, tendo ficado vencida, e condenada em custas, em 1.ª instância e no recurso que interpôs para o Pleno da Secção por oposição de Acórdãos, atendendo ao valor da causa (€ 2.175.996,15) terá de pagar ainda, a título de taxa de justiça, €37.791,00, valor que se lhe afigura desproporcionado em face das características do serviço público concretamente prestado, devendo ser julgada inconstitucional – por violação do direito de acesso aos tribunais, consagrado no art. 20.º da CRP, conjugado com o princípio da proibição do excesso e o princípio da proporcionalidade – a norma que se extrai da conjugação do disposto no art. 6.º n.º 1 e 2 e Tabela I A e B anexa do RCP, na parte em que dela resulta que as taxas de justiça devidas sejam determinadas exclusivamente em função do valor da acção, sem o estabelecimento de qualquer limite máximo. Requer a reforma do acórdão quanto a custas, tendo em conta o limite máximo de €275,000,00 fixado na Tabela I do RCP, desconsiderando-se o remanescente aí previsto.

2 – Notificado o mandatário das recorridas (fls. 769 dos autos), nada disseram.

Foram dispensados os vistos, dada a simplicidade da questão.

Cumpre decidir, pois que a tal nada obsta.

3 – O Acórdão cuja reforma quanto a custas é directamente peticionada – pois que, a coberto de tal pedido de reforma, a Fazenda Pública pretende a alteração da condenação em custas em ambas as instâncias (cfr. o respectivo pedido, a fls. 766 dos autos) –, julgou findo o recurso por oposição de Acórdãos interposto pela Fazenda Pública em razão da não verificação dos respectivos pressupostos legais, razão pela qual não conheceu sequer do respectivo mérito.
A decisão de julgar findo o recurso conduziu à condenação da recorrente em custas, como não podia deixar de ser, não decorrendo tal condenação em custas de qualquer erro, lapso ou sequer descuido em que tenha incorrido o Acórdão cuja reforma é peticionada, antes da estrita aplicação das normas legais que determinam a responsabilidade por custas (artigo 527.º n.ºs 1 e 2 do Código de processo Civil, ex-artigo 446.º do mesmo Código), daí que nada haja a reformar no Acórdão quanto a custas.

No que ao pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça respeita, formulado a coberto do presente pedido de reforma quanto a custas, tem-se entendido que não cabe a este STA apreciá-lo senão no que respeita à acção que a ele foi dirigida – a saber, o recurso por oposição de julgados.
E, quanto a este, entendemos como justificada a dispensa do remanescente da taxa de justiça formulado pela recorrente ao abrigo do disposto no n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais.
Dispõe o referido preceito que “nas causas de valor superior a €275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento”.
Entendemos que o facto de o presente recurso ter sido julgado findo, não tendo conhecido senão dos pressupostos de admissibilidade do recurso por oposição, tornou a decisão adoptada de “complexidade inferior à comum”. Também a conduta processual das partes no recurso não merece censura que obste à dispensa do remanescente da taxa de justiça.
No que à decisão de primeira instância respeita, entende-se ser o Tribunal “a quo” que deve pronunciar-se sobre a requerida dispensa.

Determina-se, pois, nos termos do n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida pelo recurso, como requerido.

Pelo exposto, vai indeferido o pedido de reforma do Acórdão quanto a custas, determinando-se, porém, nos termos do n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida pelo recurso.

- Decisão -
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em deferir o pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça devido pelo recurso por oposição de acórdãos.

Sem custas.

Lisboa, 15 de Outubro de 2014. – Isabel Cristina Mota Marques da Silva (relatora) – José de Ascensão Nunes LopesFrancisco António Pedrosa de Areal RothesPedro Manuel Dias DelgadoAna Paula da Fonseca Lobo – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia – Dulce Manuel da Conceição Neto – Joaquim Casimiro Gonçalves.