Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0358/18.5BESNT
Data do Acordão:03/13/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MARIA DO CÉU NEVES
Descritores:REQUISITOS
RECORRIBILIDADE
ACTO CONFIRMATIVO
PENA DE DEMISSÃO
SUSPENSÃO DE EFICÁCIA
FUMUS BONI JURIS
PREJUÍZO DE DIFÍCIL REPARAÇÃO
PONDERAÇÃO DE INTERESSES
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P24326
Nº do Documento:SA1201903130358/18
Data de Entrada:02/01/2019
Recorrente:A.......
Recorrido 1:MINISTÉRIO DA JUSTIÇA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo


1.RELATÓRIO

A…………, identificado nos autos, intentou junto do TAF de Sintra providência cautelar pedindo a suspensão de eficácia do Despacho da Senhora Secretária de Estado Adjunta e da Justiça, de 30 de Janeiro de 2018, que com delegação de competências, manteve a Decisão do Diretor Geral de Reinserção e Serviços Prisionais que, no âmbito do processo disciplinar nº ................, lhe aplicou a pena de demissão.
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Por sentença proferida em 22 de Junho de 2018, foi julgada procedente a providência cautelar, sendo decretada a suspensão da eficácia requerida.
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O Ministério da Justiça, inconformado, recorreu para o Tribunal Central Administrativo Sul, que, por acórdão datado de 08.11.2018, concedeu provimento ao recurso e, julgou improcedente a providência requerida.
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É deste acórdão que vem interposto o presente recurso de Revista, tendo o ora Recorrente alegado e formulado as seguintes conclusões:
«A - Verifica-se que o acto da Senhora Secretária de Estado Ajunta da Justiça de 30 de janeiro de 2018, impugnado pelo ora Recorrente no procedimento cautelar, apesar de decidir no mesmo sentido, a fundamentação é divergente.
B – O Senhor Diretor Geral dos Serviços Prisionais, aplicou a pena de demissão, cuja fundamentação invoca o artº 297º da LGTFP, no qual constam de modo taxativo os fundamentos da demissão por motivo disciplinar.
C - Mas não enquadra o despedimento do Trabalhador, em qualquer dos números e alíneas que compõem o corpo do artigo.
D - A falta de fundamentação direito da demissão do aqui trabalhador/arguido, inquina o acto/demissão de ilegalidade que determina a sua anulabilidade.
E - A Senhora Secretária de Estado Ajunta da Justiça, entende que a fundamentação de direito é irrelevante, desde que a infração inviabilize o vínculo do emprego.
F - Assim não se encontram reunidos, os quatro requisitos cumulativos do Acto Confirmativo.
G - Sendo consequente este ACTO NÃO CONFIRMATIVO - consequente impugnável contenciosamente.
Termos em que deve o presente recurso proceder e revogar o Acórdão recorrido, com as demais consequências legais».
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O Ministério da Justiça contra-alegou, concluindo como se segue:
«A. A decisão que afeta diretamente o Recorrente e que produz efeitos jurídicos externos na sua esfera jurídica, sendo, por isso, impugnável nos termos do disposto no nº 1 do artigo 51º do CPTA e artigo 224º da LTFP, é, sem qualquer dúvida, o ato de 1º grau praticado pelo Senhor Diretor-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, de 31 de julho de 2017, e não o ato de 2º grau praticado pela Secretária de Estado Adjunta da Justiça, de 30 de janeiro de 2018;
B. O ato administrativo de 2º grau que se limita a reiterar uma decisão proferida anteriormente é considerado um ato confirmativo e, como tal, inimpugnável, nos termos do disposto no nº 1 do artigo 53º do CPTA;
C. O ato meramente confirmativo não pode ser aproveitado para reabrir um litígio. Por isso ele não pode ser impugnado, como determina o artigo 53º, por quem tendo sido constituído no ónus de impugnar o ato anterior dentro dos prazos legais, não o tenha feito. (...) O que significa que o despacho da Secretária de Estado Adjunta e da Justiça tem natureza meramente confirmativa do despacho do Diretor-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, por disposição expressa de lei, cfr. artigo 198º, nº 4 do CPA. (Excerto do acórdão em recurso.)
D. O ato de 2º grau da Senhora Secretária de Estado Adjunta e da Justiça foi praticado no âmbito dos poderes hierárquicos existentes entre a DGRSP e o Ministério da Justiça, pelo que, o que importa considerar para este efeito é que os atos em questão (ato de 1º grau e ato de 2º grau), ao contrário do alegado pelo Recorrente, foram praticados no âmbito da mesma entidade - Ministério da Justiça - e não por entidades distintas;
E. Não há fundamentação divergente nos atos em causa, como se viu, e além do mais a fundamentação dos atos de 1º grau e de 2º grau não tem de ser totalmente coincidente, bastará que assente nos mesmos pressupostos de facto e de direito e que mantenha a situação do interessado sem qualquer alteração, como se verifica no caso dos presentes autos;
F. Pelo que, bem decidiu o acórdão em recurso ao considerar verificada a exceção da inimpugnabilidade do ato da Senhora Secretária de Estado Adjunta e da Justiça, de 30 de janeiro de 2018, por ser confirmativo do ato do Senhor Diretor Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, de 31 de julho de 2017, o que determinou a improcedência da presente providência cautelar;
G. Embora a questão da fundamentação não tenha sido apreciada na decisão recorrida (estando, por isso, fora do âmbito deste recurso), por cautela e dever de patrocínio, diremos, ainda, que o facto de a conduta do Recorrente não se subsumir a nenhuma das situações elencadas no nº 3 do artigo 297º da LTFP, tal não obsta a que a mesma seja considerada ilícita e culposa e, por isso, com relevo disciplinar para efeitos de aplicação da sanção de Demissão, nos termos previstos no artigo 187º e nº 1 do artigo 297º, uma vez que a infração disciplinar, ao contrário da infração criminal, não está subordinada ao princípio da tipicidade;
H. O acórdão recorrido fez uma interpretação correta da Lei e está bem fundamentado, não merecendo qualquer reparo;
Termos em que deve o recurso apresentado ser julgado improcedente e manter-se o acórdão recorrido com as devidas consequências legais.».
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Por acórdão deste STA, proferido em 11.01.2019, na formação prevista no artº 150º do CPTA, o recurso foi admitido.
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O Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146º, nº 1 do CPTA não emitiu pronúncia.
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Sem vistos, por não serem devidos, cumpre decidir.
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2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. MATÉRIA DE FACTO
A matéria de facto fixada nos presentes autos é a seguinte:
«1. O Requerente é o Guarda Prisional ………… a prestar serviço, em Abril de 2014, no E.P. …………- fls. 12, vol. 1, do processo disciplinar nº ........
2. O requerente é o funcionário nº ……….. da Direcção Geral dos Serviços Prisionais, entrou em 14/02/2000 para a função pública (E.P. ……….), tomou Posse como Guarda (Prisional) em 15/08/2000 e teve as classificações de Bom nos anos de 2002 e 2003, Muito Bom nos anos de 2004, 2005 e 2006 e Bom no ano de 2007- nota biográfica de fls. 61 a 64 do p.d., vol 1.
3. Teve dois louvores: - o primeiro em 2004/09/06 “pela coragem, determinação e profissionalismo demonstrados na recaptura de um recluso que se encontrava na situação de ausência ilegítima do EP de ………”, e - o segundo em 2010/06/15 “pelo sentido de responsabilidade, sacrifício e abnegação, demonstrados na recaptura de um recluso que se encontrava na situação de ausência ilegítima do EP ……..” - nota biográfica, fls. 64 do p.d..
4. Em 17/04/2014, foi instaurado ao Requerente, juntamente com outros, o processo disciplinar nº .............., na sequência da queixa dessa data, por factos alegadamente ocorridos em 4/04/2014, no estabelecimento comercial “………….” sito em Mem Martins - vol. 1 do p.d. nº ........., fls. 2 a 25 e foto de fls. 158.
5. Por Despacho de 16/05/2014 do Director Geral dos Serviços Prisionais, confirmada em sede de recurso hierárquico, foi determinada a suspensão preventiva do requerente, juntamente com outros - fls. 129 e 226 do p.a.
6. O requerente foi notificado da Decisão referida em 5, pelo ofício nº 000329 datado de 13/08/2014 fls. 255.
7. Em 3 de Julho de 2015, no âmbito do inquérito NU ........ .0 PBSNT, o requerente (juntamente com outros) foi acusado de:


8. O Requerente manteve-se em prisão preventiva na data da acusação, onde se mantinha desde 30/01/2015 no EP ………. - idem e fls. 1890
9. Por Acórdão de 13 de Junho 2016, no âmbito do Processo nº ..............0PBSNT, o Requerente A………… foi absolvido da prática de todos os crimes que lhe vinham imputados - Acórdão de fls. 2567 a 2717, vols. XI e XII do p.a., que aqui se dá como reproduzido.
10. Em 30/11/2016 foi dado por encerrada a instrução no p.d, nº ............ fls. 2807, X vol.
11. Na mesma data - 30/11/2016 - foi lavrada Acusação no p.d. nº ..............., tendo sido imputadas ao Requerente as seguintes infracções disciplinares:


12. Em 3 de Janeiro 2017, o Requerente apresentou a sua defesa e arrolou três testemunhas - fls. 2866 a 2869, vol. XIII.
13. Em 4/04/2017 foram ouvidas as testemunhas, Chefe ……….., …………… e Chefe ………….., arroladas pelo requerente - fls. 3132 a 3134, vol. XIV do p.a.
14. O Relatório Final - datado de 30 de Junho de 2016, porém, afigurando-se lapso, devendo ser 30 de Junho de 2017 - conclui, propondo-se a pena de demissão ao requerente (juntamente com todos os outros, à excepção de …………) – fls. 3355 a 459, vol. XVI, que aqui se dão como reproduzidas.
15. Em 31/07/2017, o Director Geral proferiu Despacho, que determinou a pena de demissão ao requerente, tal como proposto no Relatório Final referido em 14 - fls. 3460.
16. Por ofício datado de 1/08/2017 e registado em 2/08/2017 foi a mandatária requerente notificada da decisão final - fls. 3467/8.
17. Em 16/08/2017 foi o Requerente notificado da Decisão Final referida em 15 –fls. 3516 a 3518.
18. Em 5 de Setembro 2017, o requerente interpôs recurso hierárquico para a Ministra da Justiça - fls. 3641 a 3650.
19. Em 30/01/2018 foi proferida Decisão Final, nos termos da Informação de 23 de Outubro 2017, e de 18/12/2017, mantendo-se a decisão referida em 15 - fls. 3657 a 3675, e fls. 3690 a 3745, vol. XVII, que aqui se dão como reproduzidas.
20. O requerente aufere uma remuneração mensal com o valor base de 944,02€ a que acrescem os subsídios de refeição, renda de casa e fardamento e os suplementos de “por serviço na guarda prisional” e de “segurança prisional”, no total ilíquido de 1509,99€ - doc. nº 4.
21. À quantia referida em 20, são descontados montantes devidos à ADSE, IRS, COA, penhoras, sindicato, pensão de alimentos e outros, acabando por receber, mensalmente, a título de salário, a quantia líquida de 580,00€ (quinhentos e oitenta euros) - doc. nº 4.
22. Com essa quantia, o Requerente tem de fazer face a despesas correntes de electricidade, água, gás, telefone e despesas correntes de sobrevivência - doc. 5, 6, 7 e 8 juntos com a p.i.
23. Em 29/03/2018, os presentes autos cautelares deram entrada.
24. Em 16/05/20 18, deu entrada em juízo o processo principal, que corre neste Tribunal com o nº 580/18.4 BESNT - resulta do sitaf.
25. Em 24/04/2018, o Ministério da Justiça veio juntar Resolução Fundamentada, nos termos seguintes (sublinhado nosso):




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2.2. O DIREITO
Como resulta da petição inicial que enforma os presentes autos de suspensão de eficácia, o requerente/ora recorrente elege como acto suspendendo o Despacho proferido por delegação de competências conferido pela Ministra e praticado pela Secretária de Estado Adjunta e da Justiça que, em sede de recurso hierárquico – classificado pelas instâncias como necessário – o indeferiu, confirmando o acto consubstanciado no Despacho do Director Geral de Reinserção e Serviços Prisionais de 31/07/2017, que aplicou ao ora recorrente a pena de demissão, por violação dos deveres gerais de prossecução do interesse público, de zelo, de isenção e de lealdade.
O TAF deferiu a providência; mas o TCAS, ao invés, indeferiu-a por considerar que o acto era meramente confirmativo da pronúncia emitida pelo órgão a quo – acto de 1º grau; e, com base na inimpugnabilidade daquele acto, indeferiu a pretensão do requerente da suspensão de eficácia.
Ou seja, a questão nesta sede de revista consiste, desde logo em saber se o acto impugnável, é o praticado pela Secretária de Estado-Adjunta e da Justiça, com poderes delgados, ou ao invés, o acto praticado Director Geral de Reinserção e Serviços Prisionais de 31/07/2017, atento o disposto na actual versão/2015 do CPA, designadamente no seu artº 198º, nº 4 que expressamente consagra o seguinte: «O indeferimento do recurso hierárquico necessário ou (…) conferem ao interessado a possibilidade de impugnar contenciosamente o acto do órgão subalterno ou fazer valer o seu direito ao cumprimento, por aquele órgão, do dever de decisão».
As instâncias classificaram o recurso hierárquico como necessário e, pese embora, esta questão não se mostrar controversa, ela mostra-se crucial para a decisão que viermos a tomar, sendo que, a natureza do recurso, como infra referiremos, se mostra acertada, mostrando-se correta a solução aduzida no Acórdão recorrido, quando em síntese, conclui: «por força do regime previsto nos artºs 224º e 225º, nº 4 LTFP, a impugnação administrativa das decisões disciplinares sob a forma de recurso hierárquico ou tutelar, com atribuição expressa de efeito suspensivo da eficácia do acto recorrido, por disposição expressa do artº 3º, nº 1, al. c) do DL 4/2015 de 07.01, diploma que aprovou a revisão do CPA, assume a natureza de impugnação necessária, tal como estabelece o artº 189º, nº 1, CPA/revisão de 2015».
Com efeito, dispõe o artº 224º da LTFP – Lei 35/2014 de 20.06 - sob a epígrafe “Meios impugnatórios” que «Os atos proferidos em processo disciplinar podem ser impugnados hierárquica ou tutelarmente, nos termos do Código do Procedimento Administrativo, ou jurisdicionalmente», e o artº 225º, sob a epígrafe “Recurso hierárquico ou tutelar”, que:
«1 - O trabalhador e o participante podem interpor recurso hierárquico ou tutelar dos despachos e das decisões que não sejam de mero expediente, proferidos pelo instrutor ou pelos superiores hierárquicos daquele.
2 - O recurso interpõe-se diretamente para o respetivo membro do Governo, no prazo de 15 dias, a contar da notificação do despacho ou da decisão, ou de 20 dias, a contar da publicação do aviso a que se refere o nº 2 do artigo 214º.
(…)
4 - O recurso hierárquico ou tutelar suspende a eficácia do despacho ou da decisão recorridos, exceto quando o seu autor considere que a sua não execução imediata causa grave prejuízo ao interesse público.
5 - O membro do Governo pode revogar a decisão de não suspensão referida no número anterior ou tomá-la quando o autor do despacho ou da decisão recorridos o não tenha feito.
(…)» - sub. nossos.
Dispõe, ainda o artº 3º do DL nº 4/2015 de 07.01 [que aprova o Novo Código de Procedimento Administrativo/versão 2015], que:
«1. As impugnações administrativas existentes à data da entrada em vigor do presente decreto-lei só são necessárias quando previstas em lei que utilize uma das seguintes expressões:
(…)
c) A utilização de impugnação administrativa «suspende» ou «tem efeito suspensivo» dos efeitos do acto impugnado.
(…)».
Por último, diz-nos o nº 1 do artº 189º do CPA/2015 que «1. As impugnações administrativas necessárias de atos administrativos suspendem os respectivos efeitos».
Assim, como resulta da conjugação do teor das normas transcritas, o meio impugnatório gracioso interposto pelo recorrente em 01.09.2017 do Despacho de 31.07.2017 do Director Geral de Reinserção e Serviços Prisionais que, decidindo o procedimento disciplinar nº ......... contra si instaurado, lhe aplicou a pena de demissão, assume a natureza de recurso hierárquico necessário, como decidido no acórdão recorrido.
E assumindo esta natureza, desde logo se conclui – cfr. artº 51º, nºs 1 e 2, al. a) do CPTA – que o único acto que o requerente da presente providência poderia impugnar judicialmente seria o 2º acto, ou seja o acto praticado pela Secretária de Estado da Justiça, por ser o acto que pôs fim ao procedimento administrativo e que produziu efeitos jurídicos externos na situação individual e concreta do requerente.
Ainda que assim não fosse entendido, importa analisar a questão por outro prisma – o prisma analisado no acórdão recorrido.
É que o Acórdão recorrido, também considerou o segundo acto, como acto meramente confirmativo do primeiro.
Só que, para sabermos se existe uma relação de confirmatividade entre estas duas decisões, impõe-se que, averiguemos, antes de mais, o que verdadeiramente está em causa nas imputações feitas ao requerente/recorrente, dado que, o acto confirmativo é entendido como sendo aquele que, emanado da mesma entidade e dirigido ao mesmo destinatário, repete, perante os mesmos pressupostos de facto e de direito, o conteúdo e a fundamentação do acto anterior, sem nada acrescentar ou retirar ao conteúdo deste.
Deste modo, se não houver identidade de sujeitos, de objecto e de decisão entre os dois actos, o segundo acto não será conformativo, mas sim um acto novo, modificativo de primeiro e, portanto definitivo e lesivo; Acresce que, para haver identidade de decisão, importa, não apenas a existência de identidade de resolução dada ao caso concreto, mas também identidade da fundamentação da decisão e identidade das circunstâncias ou pressupostos da decisão.
Em síntese, o acto confirmativo “não tira nem põe nas situações criadas pelo acto confirmado" - cfr. M. Caetano, “Manual de Direito Administrativo”, vol. I, 10ª edição, pág. 452 e Freitas do Amaral, “Direito Administrativo”, vol. III, pág. 230 e segs.
O acto meramente confirmativo é, pois, proferido na sequência de acto administrativo contenciosamente impugnável, em idêntico sentido, pela mesma entidade, e subsistindo os sujeitos e as circunstâncias legais, e factuais, do acto confirmado. Configura, pois, acto contenciosamente inimpugnável, porque não tem eficácia externa própria, e nem possui, autonomamente, natureza de acto lesivo de direitos ou de interesses protegidos.
Perante estas noções, vejamos o caso concreto:
Na petição inicial que enforma os presentes autos de suspensão de eficácia, o requerente/recorrente apenas se insurge contra o acto praticado pelas Secretária de Estado Adjunta da Ministra da Justiça, em sede de delegação de poderes, apontando-lhe diversas ilegalidades, por referência às apontadas ao acto primário – o despacho anterior do Director Geral.
Em sede de processo disciplinar, a que foi aplicado o regime da Lei nº 35/2014 – LGTFP, o recorrente, guarda prisional, mostra-se acusado da prática da violação dos deveres gerais de prossecução do interesse público, de zelo, de isenção e de lealdade, previstos, respectivamente, nas alíneas a), b) e) e g) do nº 2 do artº 73º da lei supra identificada, estando em causa comportamentos, verificados entre as 21,53h e as 21,55h do dia 4 de Abril de 2014, que redundaram na violação grave da integridade física de empregado e clientes de estabelecimento de restauração e bebidas do concelho de Sintra, antecedidos de desordem no mesmo local em 28 de Março, pelas 22,30h, com consequentes atitudes de incentivo à desistência da queixa pelos ofendidos.
Em sede de recurso hierárquico, o recorrente alega (i) falta de fundamentação da decisão punitiva, defendendo que o Director Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, ao aplicar a pena de demissão “invoca o artº 297º da LTFP [artº 18º do EDFP], no qual constam de modo taxativo os fundamentos da demissão por motivo disciplinar”; porém, e porque não a enquadra “em nenhum dos números e alíneas que compõem o artigo”, fica por revelar o fundamento da decisão”, uma vez que aquela “apenas remete para o artigo”. Consequentemente, tem-se o acto impugnado “inquinado” por ilegalidade, determinante da sua anulabilidade, por violação do artº 125º do Código do Procedimento Administrativo”; (ii) violação do princípio da proporcionalidade, associado ao facto do trabalhador arguido ter sido absolvido no julgamento penal (por o ofendido ter desistido da queixa por ofensa à integridade física, à ordem do qual esteve preventivamente preso durante catorze meses, e à circunstância de ter recebido louvores e de ser detentor de classificações de Muito Bom, o que, a seu ver, permitem vê-lo como funcionário “modelar”; (iii) Violação do princípio da imparcialidade, questionando-se, a legitimidade do instrutor inicial do processo para o desenvolvimento das diligências iniciais de recolha de prova; termina pedindo que a sanção aplicada seja substituída por uma outra menos gravosa.
Ora, estas questões, foram todas abordadas na Informação elaborada em 18.12.2017, pela Direcção de Serviços Jurídicos e de Contencioso, no âmbito do recurso hierárquico, que veio a merecer Parecer favorável, determinante do Despacho de indeferimento do recurso hierárquico interposto.
E, foram-no, no sentido de justificar o decidido no acto primário, mas aduzidas fundamentações que não constavam do mesmo; aliás, nesta informação faz-se alusão não só ao invocado pelos recorrentes [que são vários] como, igualmente ao invocado pela Direcção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, que para tanto foi ouvida, nos termos do disposto no artº 195º, nº 2 do CPA.
Analisando as questões suscitadas pelo recorrente, fez-se constar na referida Informação [e posteriormente no Parecer e Decisão final que acolheram os seus fundamentos] justificações e argumentos sobre cada ponto suscitado pelo recorrente, que até então não tinham sido, de forma integral, enumerados e levados ao conhecimento do recorrente, designadamente com a referência a jurisprudência e doutrina [princípios da imparcialidade e da proporcionalidade], que até então não tinha sido dada a conhecer ao recorrente, formulando juízos finais de decisão, em parte, diferentes, dos que anteriormente existiam no acto primário; tal bastaria para que se concluísse estarmos perante fundamentação que não existia no acto primário.
Acresce que, o mesmo aconteceu quanto à invocação por parte do recorrente relativamente aos louvores obtidos, no sentido de não terem servido para integrar qualquer tipo de atenuante, tendo-se justificado, quer de facto, quer de direito, o motivo pelo qual não se alterava a medida da pena aplicada ao recorrente, justificação esta apoiada em jurisprudência e em fundamentação até então inexistente no acto primário.
E igualmente em relação à suspeição do instrutor (violação do princípio da imparcialidade), é aduzida fundamentação que não é totalmente coincidente com a que resulta do acto primário, quer de facto, quer de direito.
Por último, quanto à fundamentação da decisão final punitiva, em que o recorrente já vinha alegando que a decisão final do acto primário, apenas continha a invocação do artº 297º da LTFP (artº 18º do EDFP), não lhe sendo possível, deste modo e de forma clara, entender a fundamentação do acto, por não estar integrado em nenhuma das alíneas do normativo, também neste segmento, se tecem considerandos sobre o princípio da tipicidade, remetendo a argumentação para a doutrina do Prof. Paulo Veiga e Moura, in “O Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas”, e se aduzem fundamentações no sentido da sua desnecessidade, que anteriormente não tinham sido invocadas no acto primário.
E, igualmente, com fundamentação parcialmente divergente, se concluiu que a conduta dos arguidos é suficientemente demonstrativa de que todos revelam personalidade inadequada para o exercício de funções, enquanto guardas prisionais, concluíndo pela existência de fundamentação, mas aduzindo fundamentos, nem todos coincidentes, com os que tinham sido convocados para o acto primário do Director Geral de Reinserção e Serviços Prisionais.
É quanto basta para concluirmos que o acto praticado em sede de recurso hierárquico não se limita a manter a decisão constante do acto de 1º grau, tendo-lhe sido aduzidos fundamentos em parte diferentes e, noutro tocante, completamente inovatórios, pelo que, neste segmento assiste razão ao recorrente, no sentido de não estarmos perante um acto meramente confirmativo, sem prejuízo do que se decidir quanto ao mérito, obviamente.
Na verdade, e de acordo com o disposto no artº 53º, nº 1 do CPTA, a noção de acto administrativo confirmativo, exige que estes se limitem a reiterar, com os mesmo fundamentos, decisões contidas em actos administrativos anteriores, o que in casu, não sucede, uma vez que, o acto praticado pela Secretária de Estado Adjunta e da Justiça, em sede de recurso hierárquico aduz fundamentos de facto e de direito, que não são completamente coincidentes com os existentes no acto primário, caíndo desta forma um dos pressupostos essenciais à confirmatividade que consiste na identidade da fundamentação da decisão.
Face ao exposto, importa conceder provimento ao recurso e revogar a decisão recorrida, e por força do disposto no nº 5 do artº 150º do CPTA, conhecer, em substituição, do mérito da providência, tendo em conta a matéria de facto que se mostra assente pelas instâncias.
Vejamos:
Dispõe o art. 120º do CPTA (redacção dada pelo DL 214-G/2015, de 2/10), sob a epígrafe “Critérios de decisão”:
«1. Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as providências cautelares são adotadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente.
2. Nas situações previstas no número anterior, a adoção da providência ou das providências é recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências.
(…)».
Do exposto, resulta que constituem condições de procedência das providências cautelares:
1) O “periculum in mora”- receio de constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação (artº 120º nº 1, 1ª parte, do CPTA);
2) O “fumus boni iuris” (aparência de bom direito) – ser provável que a pretensão formulada ou a formular no processo principal venha a ser julgada procedente (art. 120º, nº 1, 2ª parte, do CPTA), e,
3) A ponderação de todos os interesses em presença segundo critérios de proporcionalidade (art. 120º, nº 2 do CPTA).
Sabido que esta nova redacção dada pelo legislador ao artº 120º do CPTA [DL nº 214-G/2015 de 2/10], indicia fortemente que a concessão da providência cautelar depende essencialmente da formulação de um juízo de probabilidade quanto ao êxito do processo principal [fumus boni iuris ou aparência do bom direito], impõe-se começar a nossa análise pela verificação ou não deste requisito.
E para tal, há que atentar na factualidade provada nestes autos cautelares, para nesta apreciação perfunctória, apurar da probabilidade ou verosimilhança da procedência da acção principal, não sendo suficiente uma mera alegação pelo requerente da titularidade de um direito, assim como não é de exigir a formulação de um juízo de certeza sobre a existência do direito que só mais tarde será apreciado na acção principal, de que os autos cautelares são dependentes.
Tal como vem entendendo este Supremo Tribunal, na integração deste requisito entende-se como «“provável” … o que tem uma possibilidade forte de acontecer, sendo surpreendente ou inesperado que não aconteça», sendo que, no domínio jurídico «isso exige que algum dos vícios atribuídos (…) ao ato suspendendo se apresente já - na análise perfunctória típica deste género de processos - com a solidez bastante para que conjeturemos a existência de uma ilegalidade e a consequente supressão judicial do ato».
Não se trata, portanto, dum juízo que se baste com a mera indagação de um mínimo de verosimilhança dos fundamentos de ilegalidade invocados como geradores da invalidade do ato tal como se mostrava previsto na al. b) do nº 1 do art. 120.º do CPTA na redação anterior à introduzida pelo DL nº 214-G/2015, em que o critério legal de decisão relativamente ao requisito da aparência do bom direito era, então, um critério vasto, bastando-se, para o efeito, que não fosse manifesta a falta de fundamento da pretensão a formular no processo principal.
Exige-se, pois, hoje que se apresente como provável a procedência da pretensão formulada ou a formular na acção principal para que se mostre preenchido este critério de decisão e que o requerente possa, assim, ver decretada a sua pretensão cautelar reunidos os demais requisitos cumulativamente exigidos.
Feitos estes considerandos, quanto ao fumus boni iuris ou aparência do bom direito, temos a alegação por parte do requerente [que pretende evitar a demissão até que haja decisão com trânsito em julgado na acção principal e, deste modo, continuar em exercício de funções como guarda prisional] que (i) foi absolvido no processo crime nº .............. .0PBSNT, de todas as infracções que lhe foram imputadas, (ii) que foi violado o princípio da proporcionalidade na aplicação da pena de demissão, por haver outras medidas menos gravosas que lhe poderiam ser aplicadas, (iii) designadamente, atento o seu bom comportamento anterior, como no seu entender demonstram os louvores que recebeu de “Bom” e “Muito Bom” e registados no seu registo biográfico.
Ora, numa perspectiva meramente perfunctória, e pese embora o processo crime não se confundir com o processo disciplinar, uma vez que ambos têm por base a salvaguarda de bens jurídicos diferentes, temos que, atenta a absolvição, com trânsito em julgado, no âmbito do processo penal de todos os crime que lhe eram imputados, [e cujos factos igualmente servem de suporte ao processo disciplinar] será difícil, manter na acção principal, já intentada pelo requerente, as imputações disciplinares de violação do dever de prossecução do interesse público, do dever de zelo e de isenção e do dever de lealdade, que levaram à aplicação da pena de demissão, a que acresce, por força do princípio da proporcionalidade, a eventual necessidade de ponderar o bom comportamento do requerente que tinha desenvolvido até à prática destas infracções.
É, em nosso entender, quanto basta para que de forma perfunctória, possamos concluir pela verificação do fumus boni iuris.
E o mesmo ocorre quanto ao preenchimento do requisito do periculum in mora, que se traduz no receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal; ou seja, um perigo que resulta da demora da acção principal, pelo que só têm relevância os prejuízos que coloquem em risco a efectividade da sentença nela a proferir.
Ora, no caso, resulta evidente que a pena de demissão, a ser executada se traduz, pelo menos, na produção de prejuízos de difícil reparação, se atentarmos na factualidade provada, de onde resulta que o requerente se veria impossibilitado de fazer face às necessidades do dia a dia e de cumprir as despesas fixas que tem assumidas, ficando sem sustento financeiro - neste sentido cfr. Acórdão deste Supremo Tribunal proferido em quando aí se refere expressamente: «Tem-se como preenchido, no caso, o requisito do periculum in mora, na vertente dos prejuízos de difícil reparação, quando o Requerente, não dispondo de outros rendimentos para além do seu vencimento, deste se vê privado em decorrência da execução imediata da pena disciplinar suspendenda, pondo, assim, em risco, ou fazendo perigar, a satisfação de necessidades pessoais elementares, bem como a possibilidade do mesmo honrar compromissos assumidos».
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Quanto à ponderação de interesses, decorre assim, do nº 2 do artº 120º do CPTA, que na situação prevista nomeadamente na alínea b) do nº 1 do mesmo preceito “(…) a adopção da providência ou das providências será recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados, em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências (…).”
Introduziu-se neste segmento normativo o que tem sido apelidado de uma “cláusula de salvaguarda”.
Tal como é sustentado pelo Prof. M. Aroso de Almeida o “(...) artigo 120º, nº 2, introduz um inovador critério de ponderação, num mesmo patamar, dos diversos interesses, públicos e privados, que, no caso concreto, se perfilem, sejam eles do requerente, da entidade demandada ou de eventuais contra-interessados, determinando que a providência ou providências sejam recusadas quando essa ponderação permita concluir que «os danos que resultariam da sua concessão se mostram superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências».
E assim a justa composição dos interesses em jogo passa, ao contrário do antes previsto, a exigir que o tribunal proceda, em cada caso concreto, à ponderação equilibrada dos interesses, contrabalançando os eventuais riscos que a concessão da providência envolveria para o interesse público (e para interesses privados contrapostos) com a extensão dos danos que a sua recusa com toda a probabilidade poderia trazer ao requerente.
Temos, assim, que o juiz cautelar, fora da situação excepcional prevista no artº 120º, nº 1, al. a) do CPTA, mesmo verificados os requisitos ou pressupostos positivos supra aludidos deve recusar a concessão da providência cautelar quando o prejuízo resultante para o requerido se mostre superior ao prejuízo que se pretende obviar ou evitar com a decretação da providência.
Ou, nas palavras do Prof. J. C. Vieira de Andrade (in: ob. cit., págs. 353 e 354 - nota 795), “(...) há-de estabelecer-se tendo em consideração a possibilidade de evitar ou atenuar os prejuízos causados pela concessão através de contra-providências (...) artigo 120º, n.º 2, in fine (...)”, sendo que na ponderação a efectuar-se ela deve ser feita entre prejuízos ou danos e não entre os interesses em presença.
Com efeito, não consagra a lei qualquer prevalência do interesse público face aos demais interesses em conflito, tanto mais que, não se trata aqui de ponderar o interesse público com o interesse privado, mesmo que muitas vezes o interesse do requerido seja o interesse público e o interesse do requerente seja o interesse privado: o que está aqui em conflito são os resultados ou os prejuízos que podem resultar para os interesses, da concessão ou a recusa da concessão, para todos os interesses envolvidos, sejam públicos, sejam privados.
Temos, por conseguinte, que o juiz cautelar ao efectuar este juízo de ponderação terá de se colocar numa posição equidistante face aos interesses que lhe foram apresentados ponderando os direitos e bens em conflito, por forma a tentar obter a concordância prática em concreto dos mesmos.
Daí que para a recusa da concessão duma providência à luz do juízo de ponderação previsto no nº 2 do artº 120º não é suficiente, nem idónea uma qualquer lesão do interesse público porquanto o interesse público, por natureza, está ínsito ou subjacente a qualquer actuação desenvolvida por parte da Administração; logo terá de se assumir de forma específica e diferenciado do interesse genérico da legalidade e eficácia dos actos administrativos.
Neste mesmo sentido se tem pronunciado a Jurisprudência deste Supremo Tribunal, ao assinalar que «o que se estabelece no nº 2 do art. 120.º do CPTA não é que a providência deva ser recusada quando tal seja preferível para o interesse público, quando a recusa traga mais vantagem para este interesse, mas sim que essa recusa deve acontecer quando dela resultem danos ao interesse público, o que é diferente de não haver vantagem.
(…) E, mesmo que houvesse dúvidas sobre a existência de hipotéticos danos, elas teriam de ser valoradas a favor do Requerente e não contra ele, por força da referida regra do ónus da prova. Isto é, tem de se ter como assente, para efeitos de decisão do presente processo, que a adopção da providência de suspensão de eficácia, diferindo o eventual cumprimento da pena, não acarretará quaisquer danos para o interesse público, apenas podendo obstar a não seja desse cumprimento retirada a vantagem que poderia ser retirada se o cumprimento fosse imediato – cfr. Ac. proferido no proc. nº 1217/09, em 06.01.2010.
In casu, temos que a Resolução Fundamentada apresentada pelo requerido, se apresenta em termos genéricos para todos os envolvidos, salientando apenas que a concessão da providência teria repercussões muito negativas ao nível da imagem pública da Administração Prisional e do regular funcionamento interno dos seus serviços prisionais; por outro lado aduz, em relação ao requerente da providência, razões subjectivas de vingança, que nesta sede, de objectividade dos factos se afiguram de difícil percepção; e ainda que os factos acometidos ao requerente são de tal forma graves que tornam inviável o seu regresso às suas funções, concluindo que a suspensão da execução do acto colocaria em causa valores que o poder disciplinar pretende salvaguardar, designadamente o de punir condutas que contendam com o regular funcionamento dos serviços e a imagem da instituição.
Não cremos, porém que tal alegação justifique o não decretamento da providência, pois não vai ser a suspensão do acto que aplicou ao requerente a pena de demissão, que vai melhorar a imagem do cidadão comum perante os serviços prisionais, e os seus elementos ao serviço, designadamente quando o requerente já foi julgado em processo crime e foi absolvido da prática dos mesmos.
Por outro lado, também não cremos que se mostre provado nos autos, a existência de um interesse público qualificado, específico e concreto, que justifique o não decretamento da providência, dado que o requerido apenas se limita a alegar a existência de um interesse genérico, de eficácia dos actos administrativos, de manutenção genérica do prestígio da Direcção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, por ser vantajoso aos olhos da população em geral.
Ora, este argumento não pode prevalecer, designadamente quando essa mesma população em geral, já terá conhecimento da absolvição do requente no processo crime, não se vendo razões para ponderar in casu a favor do interesse público.
Ou seja, só quando as circunstâncias do caso concreto revelarem de todo em todo a existência de lesão do interesse público que justifique a qualificação de grave e se considere que essa qualificação deve prevalecer sobre os prováveis prejuízos causados ao requerente cautelar é que se impõe a execução imediata do ato, indeferindo-se, por esse facto, o pedido de suspensão, o que no caso não se verifica, atenta a situação económico-financeira e social em que o requerente ficará [cfr. factos provados] se não vir a suspensão do acto que lhe aplicou a pena de demissão ser suspensa na sua execução.
Com efeito, face ao supra exposto, temos que, no juízo de ponderação realizado à luz do nº 2 do artº 120º do CPTA não poderemos deixar de concluir pelo deferimento da providência requerida, porquanto devidamente ponderados os interesses em confronto, constata-se que os danos que resultariam da sua recusa serão superiores aos que podem resultar do seu deferimento, o que conduz à procedência da presente providência cautelar.
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3 - DECISÃO:
Atento o exposto, acordam em conferência os juízes que compõem este Supremo Tribunal em:

1. Conceder provimento ao recurso.
2. Revogar o acórdão recorrido.
3. Em substituição, e com os fundamentos supra expostos, julgar procedente a providência cautelar e, consequentemente, decretar a suspensão de eficácia do Despacho da Secretária de Estado Adjunta e da Justiça, de 30 de Janeiro de 2018, que manteve a Decisão do Director-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, no âmbito do processo disciplinar nº ............, que aplicou a pena de demissão ao requerente.

Custas a cargo do recorrido.

Lisboa, 13 Março de 2019. – Maria do Céu Dias Rosa das Neves (relatora) – António Bento São Pedro – José Augusto Araújo Veloso.