Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0242/08
Data do Acordão:09/11/2008
Tribunal:1 SUBSECÇÃO DO CA
Relator:COSTA REIS
Descritores:TÉCNICOS OFICIAIS DE CONTAS
RECUSA DE INSCRIÇÃO
PROVA
FACTO
Sumário:I – Em face do objectivo visado com a Lei n.º 27/98, de 3 de Junho, de reparação de situações de injustiça, não podem considerar-se compatíveis com ela restrições relativas aos meios de prova que inviabilizem a pessoas que se encontrassem na situação visada de demonstrarem a sua existência para efeitos de inscrição como técnicos oficiais de contas, ao abrigo daquela Lei.
II -Tendo de se presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas (art. 9.º, n.º 3, do CC), tem de entender-se que está ínsita naquela Lei n.º 27/98 a intenção legislativa de permitir a utilização todos os meios probatórios admissíveis em procedimento administrativo que sejam necessários para prova de qualquer das situações daquele tipo que pudessem existir.
III - Constatando-se que são identificáveis várias situações em que pessoas podem ter sido responsáveis por contabilidade organizada nos termos do Plano Oficial de Contabilidade, de entidades que possuíssem ou devessem possuir esse tipo de contabilidade, durante o período de 1-1-1989 a 17-10-95, e que poderão não ter assinado declarações modelo 22 de I.R.C. ou anexos C de declarações de I.R.S., tem de concluir-se que é incompatível com a Lei n.º 27/98 o art. 3.º de um «Regulamento» aprovado pela Associação dos Técnicos Oficiais de Contas para execução desta Lei em que se determina que aquelas declarações assinadas pelo interessado na inscrição são o único meio de prova admissível da existência das referidas situações de responsabilidade por contabilidade organizada.
IV - Uma interpretação da Lei n.º 27/98 no sentido de ela consagrar uma restrição probatória que se reconduzia a um tratamento distinto, a nível da possibilidade de inscrição, de pessoas que se encontravam essencialmente na mesma situação de injustiça, seria materialmente inconstitucional, por ser ofensiva do princípio da igualdade, plasmado no art. 13.º da C.R.P., pelo que a interpretação conforme à Constituição que aquela Lei pode ter é no sentido da admissibilidade de todos os meios de prova admissíveis em procedimento administrativo.
Nº Convencional:JSTA0009421
Nº do Documento:SA1200809110242
Recorrente:COMISSÃO DE INSCRIÇÃO DA ASSOCIAÇÃO DOS TÉCNICOS OFICIAIS DE CONTAS
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: A… interpôs, no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, recurso contencioso de anulação da deliberação da Comissão de Inscrição da Associação dos Técnicos Oficiais de Contas, de 10/08/98, que recusou a sua inscrição como Técnico Oficial de Contas naquela Associação, para o que alegou que a mesma estava ferida de vícios de violação de lei e de forma.
A Entidade Recorrida respondeu para suscitar a questão da irrecorribilidade daquela deliberação e, sendo esta improcedente, para impugnar os fundamentos do recurso.
Por sentença de 28/09/2007 o recurso foi provido e o acto impugnado anulado.
Inconformada, a referida Comissão recorreu para este Tribunal rematando o seu discurso alegatório com a formulação das seguintes conclusões:
1. A sentença recorrida, no que toca à apreciação dos fundamentos do recurso contencioso de anulação interposto pelo ora recorrido, enferma de erro na interpretação das normas legais aplicáveis, razão pela qual deve ser a mesma revogada.
2. O tribunal a quo faz, salvo o devido respeito, uma interpretação deficiente da Lei n.º 27/98, especificamente do conceito legal de responsável directo por contabilidade organizada.
3. A Lei n.º 27/98 veio admitir, excepcionalmente, a inscrição na CTOC dos profissionais de contabilidade que tivessem tido a responsabilidade directa de contabilidades organizadas durante o período de referência nela previsto.
4. No entendimento da recorrente, a responsabilidade directa não se limita à execução da contabilidade (como erradamente considerou o tribunal a quo), mas abrange, ainda, a responsabilidade pela regularidade fiscal das contas de contribuinte obrigado a possuir contabilidade organizada e efectivamente assumida, de direito e de facto perante a Administração Fiscal, durante o período em referência.
5. Essas, aliás, as funções que, desde a aprovação do DL n.º 265/95, de 17/10, estão atribuídas exclusivamente aos TOCs, pelo que a experiência relevante na sua assunção era determinante para aceder à profissão para aqueles que não possuíam as habilitações académicas mínimas exigidas pela lei.
6. Essa responsabilidade, manifestamente, só existiria se o profissional de contabilidade, como técnico de contas ou responsável pela contabilidade, tivesse assinado juntamente com o contribuinte sujeito a imposto sobre o rendimento (IRC ou IRS), como responsável pela contabilidade, as declarações fiscais do segundo e de, nas mesmas, ter aposto o seu número de contribuinte no campo destinado àquele responsável.
7. Só foram, assim, responsáveis directos, nos termos e para os efeitos do artigo 1° da Lei n.° 27/98, os profissionais de contabilidade que, durante o período previsto naquele dispositivo legal, tivessem assinado, conjuntamente com os contribuintes, as respectivas declarações de imposto sobre o rendimento, na qualidade de responsáveis pela contabilidade.
8. O ora recorrido, ao não ter assinado, durante pelo menos três exercícios, de 1989 a 1994, estava fora do âmbito subjectivo de aplicação da Lei n.º 27/98.
9. Ao não ter assim entendido, deve a sentença recorrida ser revoga da por ter feito errada interpretação e aplicação do artigo 1° da Lei n.° 27/98.
O Recorrente contencioso contra alegou para defender a manutenção do julgado.
A Ilustre Magistrada do M.P. foi de parecer que o recurso não devia ser provido por a decisão recorrida se encontrar conforme a jurisprudência uniforme deste Tribunal.
Colhidos os vistos cumpre decidir.
FUNDAMENTAÇÃO
I. MATÉRIA DE FACTO.
A decisão recorrida julgou provados os seguintes factos:
a) Por requerimento entrado nos Serviços da recorrida, a 03.07.1998, o recorrente pedia a sua inscrição como Técnico Oficial de Contas e a sua inclusão na Lista dos TOC, ao abrigo da Lei n.° 27/98, de 03.06, e dizendo que preenchia todos os requisitos legais - fls. 1 do processo instrutor;
b) Fazia acompanhar tal requerimento de diversos documentos identificativos e ainda de cópias autenticadas das declarações Mod. 22 do IRC e anexo C à declaração Mod. 2 do IRS (...); relação das entidades a quem presta os seus serviços, com indicação do correspondente volume de negócios, no total de 2 folhas; - idem fls. 5 e segs. do instrutor;
c) E, além do mais, uma certidão passada pela Repartição de Finanças de Alvito, em que a funcionária que a subscreve certifica que "... é do meu conhecimento directo que o Sr. A…, proprietário do Gabinete de Contabilidade B…, sito na Rua …, n.°…, em …, é responsável por contabilidades organizadas, desde o ano de 1990, conforme declaração de início de actividade e que o mesmo não entregou os modelos 22 e anexos dos anos de 1991, 1992 e 1993, devidamente assinados por si, por ter sido informado nesta Repartição que não o podia fazer por não estar inscrito como Técnico de Contas na Direcção Geral dos Impostos". - fls. 53 do instrutor, e 45 destes;
d) Em resposta ao pedido de inscrição a entidade recorrida notificou o recorrente, por carta datada de 10.08.1998, dizendo, além do mais, que a Associação, para cumprir o mandato que a lei lhe conferira, emitiu regulamento de que lhe juntava cópia.
e) Que, de acordo com aquele Regulamento a prova da responsabilidade directa pela contabilidade organizada durante o período considerado relevante terá de ser feita através da entrega com o requerimento de inscrição de cópias autenticadas de declarações modelo 22 do IRC e/ou anexo C às declarações modelo 2 do IRS, assinadas pelo profissional de contabilidade no quadro destinado pelas mesmas ao responsável pela escrita.
f) Acrescentando "Verifica-se que a documentação apresentada por V. Ex.ª não está conforme com o exigido pelos referidos Estatuto e Regulamento estando em falta os documentos (….) 2 cópias autenticadas de declarações modelo 22 do IRC e/ou anexo C às declarações modelo 2 do IRS, ou certidão por cópia dessas declarações, emitida pela Direcção Distrital de Finanças competente, de onde conste a assinatura do candidato, o número de contribuinte e a designação da entidade a que respeitam as ditas declarações, referentes aos exercícios compreendidos entre os anos de 1989 a 1994, inclusive, cuja data de apresentação não seja posterior a 17 de Outubro de 1995."
g) Referia-se ainda "os mod. 2 anexo (que envia não tem data de apresentação. Os mod.22 de 95 e 96 não são válidos nos termos da lei."
h) E ainda: "Caso V. Exa., até ao termo do prazo concedido pela Lei n.° 27/98 para a apresentação dos requerimentos de inscrição …, 31 de Agosto próximo, não ofereça os documentos em falta, o seu pedido de inscrição considerar-se-á sem efeito" - fls. 57/58 do instrutor e doc. 1, a fls. 24/25 destes.
II. O DIREITO.
O relato antecedente informa-nos que o ora Recorrido impugnou, no TAC de Lisboa, a deliberação da Comissão de Inscrição da Associação dos Técnicos Oficiais de Contas, de 10/07/98, que recusou a sua inscrição como técnico oficial de contas na citada Associação, alegando a sua ilegalidade – não estava devidamente fundamentada, violava os princípios da igualdade, da boa fé e da responsabilidade, tinha sido proferida com usurpação de poderes, já a Comissão de Instalação do ATOC não dispunha de poderes para elaborar o Regulamento em que a mesma se fundou, e restringiu ilegitimamente o uso dos meios de prova.
A Entidade Recorrida respondeu suscitando a questão da irrecorribilidade da deliberação - por a mesma não consubstanciar um acto definitivo uma vez que se limitara a pedir novos elementos para a aceitação da inscrição do Recorrente contencioso e, nessa medida, não passava de um acto trâmite preparatório da decisão final - e impugnando os fundamentos do recurso.
A sentença recorrida julgou improcedente a referida questão prévia, bem como a invocada falta de fundamentação do acto impugnado, e os vícios de incompetência absoluta e usurpação de poderes, de violação dos princípios da igualdade, da boa fé e da responsabilidade que lhe foram imputados, considerando, no entanto, que o mesmo limitara ilegalmente os meios de prova no tocante à prova dos requisitos exigidos e, com esse fundamento, anulou-o.
É contra este julgamento que o presente recurso se dirige, nele se sustentando que o Sr. Juiz a quo tinha interpretado deficientemente a Lei 27/98 do que tinha resultado um errado julgamento.
Vejamos, pois.
1. A questão de mérito suscitada neste recurso é a de saber se o Recorrente contencioso reunia as condições legais para ser inscrito como Técnico Oficial de Contas na respectiva Associação e, consequentemente, a de saber se a sentença recorrida decidiu bem quando considerou que a Entidade Recorrida errou ao rejeitar essa inscrição.
A Agravante não aceita esse julgamento por entender que a Lei n.º 27/98 veio admitir, excepcionalmente, a inscrição na ATOC dos profissionais de contabilidade que tivessem tido a responsabilidade directa de contabilidades organizadas durante o período nela previsto e que o ora Recorrido não preenchia esse requisito já que não demonstrara que, durante esse período, assinara, na qualidade de responsável pela contabilidade, as declarações de imposto sobre o rendimento conjuntamente com os contribuintes. Deste modo, ao não demonstrar que não tinha assinado essas declarações, durante pelo menos três exercícios, de 1989 a 1994, estava fora do âmbito subjectivo de aplicação da Lei n.º 27/98.
Deliberação impugnada não estava ferida de qualquer ilegalidade.
2. Esta questão já foi objecto de diversas decisões deste STA, algumas delas contraditórias, o que motivou a interposição de recursos por oposição de julgados e a fixação de jurisprudência através do Tribunal Pleno. – vd., por ex., Acórdão de 18/05/2004 (rec. 48.397). Jurisprudência essa que tem vindo a ser reforçada com a prolação de novas decisões no mesmo sentido.
Sendo assim, e sendo que a ora Recorrente não conseguiu abalar o acerto dessa jurisprudência, limitar-nos-emos a acompanhar o que vem sendo dito sobre a questão ora controvertida.
Escreveu-se no Acórdão do Pleno de 7/02/2006, (rec. 419/04) onde se responde desenvolvidamente aos argumentos expostos no presente recurso:
Antes de mais, importa precisar o alcance da Lei n.º 27/98.
Esta Lei estabelece o seguinte:
Artigo 1.º
No prazo de 90 dias a contar da publicação da presente lei, os profissionais de contabilidade que desde 1 de Janeiro de 1989 e até à data da publicação do Decreto-Lei n.º 265/95, de 17 de Outubro, tenham sido, durante três anos seguidos ou interpolados, individualmente ou sob a forma de sociedade, responsáveis directos por contabilidade organizada, nos termos do Plano Oficial de Contabilidade, de entidades que naquele período possuíssem ou devessem possuir contabilidade organizada podem requerer a sua inscrição como técnicos oficiais de contas na Associação de Técnicos Oficiais de Contas (ATOC).
Artigo 2.º
1 – Verificados os requisitos referidos no artigo 1.º, não pode a inscrição como técnicos oficiais de contas na ATOC, desde que requerida no prazo fixado, ser recusada.
2 – Se a ATOC não proceder a inscrição dos interessados que satisfaçam os requisitos do artigo 1.º, no prazo de 15 dias após a apresentação do respectivo pedido, os mesmos considerar-se-ão automaticamente inscritos naquela Associação e habilitados ao pleno exercício da profissão de técnicos oficiais de contas.
3 – Para tanto, valerá para todos os efeitos como prova bastante o duplicado do requerimento do pedido de inscrição ou cópia notarialmente autenticada, com o carimbo de entrada na ATOC.
Artigo 3.º
1 – Todos os actos dos profissionais de contabilidade que se inscrevam na ATOC ao abrigo do presente diploma ocorridos perante a administração fiscal desde 1 de Janeiro de 1998 são tidos como praticados por técnicos oficiais de contas legalmente habilitados.
2 – São revogadas e consideradas de nenhum efeito todas as normas, directivas, instruções ou despachos que disponham em contrário do estabelecido no número anterior.
Artigo 4.º
A presente lei entra em vigor na data da sua publicação e aplica-se a todo o território nacional.
Esta Lei foi aprovada pela Assembleia da República com base na Proposta de Lei n.º 15/VII, que tem o seguinte teor na sua parte introdutória e exposição de motivos:
Proposta de Lei n.º 154/VII
Permite que, a Título Excepcional, se Admita a Inscrição como Técnico Oficial de Contas de Responsáveis Directos por Contabilidade Organizada, nos Termos do Plano Oficial de Contabilidade, no Período Decorrido entre 1 de Janeiro de 1989 e 17 de Outubro de 1995, de Entidades que Possuíssem ou Devessem Possuir esse Tipo de Contabilidade
Exposição de motivos
Com a entrada em vigor dos códigos dos impostos sobre o rendimento em 1 de Janeiro de 1989, tendo sido revogado o Código da Contribuição Industrial e deixado de ser obrigatória a assinatura dos técnicos de contas inscritos na Direcção-Geral das Contribuições e Impostos ao abrigo da Portaria n.º 420/76, de 14 de Julho, alguns profissionais exerceram funções enquanto tal sem se encontrarem definitivamente inscritos na DGCI.
A versão final do Estatuto dos Técnicos Oficiais de Contas, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 265/95, de 17 de Outubro, veio exigir habilitações académicas para o exercício da profissão que muitos dos referidos profissionais não possuem, não contemplando qualquer disposição transitória que lhes permita a respectiva inscrição como técnicos oficiais de contas, contrariamente ao que se verificava em projectos anteriormente apresentados.
Vedar, sem mais, àqueles profissionais a inscrição como técnicos oficiais de contas poderia provocar situações injustas. Mas, simultaneamente, há que ter em consideração que a dignificação da profissão de técnico oficial de contas, em conformidade com a orientação subjacente ao respectivo estatuto, reafirmada nas conclusões aprovadas no I Congresso dos TOC, e atenta a realidade social, implica, no futuro, a exigência de habilitações académicas de nível superior para o exercício da profissão.
Tendo em consideração a realidade enunciada, foi determinada a constituição de um grupo de trabalho, por Despacho n.º 290/97-XIII, de 30 de Junho de 1997, do Ministro das Finanças, com a incumbência de analisar as situações de candidatos a inscrição como técnicos oficiais de contas que não possuíssem os requisitos para tal e pudessem ser consideradas de injustiça flagrante por omissão da lei quanto à definição dos termos e condições extraordinárias em que a inscrição destes candidatos pudesse ser admitida.
Neste contexto, e tendo em consideração as conclusões do referido grupo de trabalho, a presente proposta de lei vem permitir que, a título excepcional e como última e derradeira hipótese, se admita a inscrição como técnico oficial de contas de responsáveis directos por contabilidade organizada nos termos do Plano Oficial de Contabilidade, no período decorrido entre 1 de Janeiro de 1989 e a data de publicação do Estatuto dos Técnicos Oficiais de Contas, de entidades que, naquele período, possuíssem ou devessem possuir esse tipo de contabilidade, através da abertura, no corrente ano, de um concurso extraordinário para o efeito.
Através desta Exposição de Motivos, constata-se com segurança que o concurso extraordinário para inscrição como técnico oficial de contas admitido pela Lei n.º 27/98, independentemente de os candidatos reunirem os requisitos exigidos pelo Decreto-Lei n.º 265/95, de 17 de Outubro, teve um carácter excepcional, visando reparar situações de injustiça.
Essas situações de injustiça que se tinha em vista reparar eram as dos técnicos de contas que no período entre 1-1-89 [data da extinção da Contribuição Industrial e entrada em vigor do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (art.ºs 2.º e 3.º do Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30/11)] e a data da publicação do Decreto-Lei n.º 265/95 tinham podido exercer a actividade como técnicos de contas, junto de entidades que dispunham de contabilidade organizada, para efeitos fiscais, mas não reuniam os requisitos para se inscreverem como técnicos oficiais de contas, à face do preceituado no Estatuto do Técnicos Oficiais de Contas, aprovado por este Decreto-Lei.
Na verdade, o Código da CCI exigia, no seu art. 48.º, que as declarações dos contribuintes fossem assinadas pelos contribuintes ou seus representantes e «pelo respectivo técnico de contas responsável» e o art. 52.º do mesmo Código estabelecia que «até se proceder à regulamentação legal do exercício da respectiva profissão só poderão ser considerados técnicos de contas responsáveis, para os efeitos do art. 48.º, os que estiverem inscritos como tais na Direcção-Geral das Contribuições e Impostos».
A Portaria n.º 420/76, de 14/07, emitida ao abrigo do disposto no § único daquele art.º 52.º do Código da Contribuição Industrial, veio estabelecer as condições de inscrição como técnicos de contas na Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, prevendo-se a possibilidade de suspensão e cancelamento da inscrição, e a publicação oficial, na 3.ª Série do Diário da República, da lista dos técnicos inscritos.
Com o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas deixou de ser obrigatório que os técnicos de contas assinassem as declarações juntamente com os contribuintes (art.ºs 94.º a 97.º daquele Código, na redacção inicial), deixando de existir um reconhecimento oficial do técnico de contas (Esta evolução no sentido do reconhecimento e posterior desaparecimento da figura institucional do técnico de contas é expressamente descrita no Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 265/95, de que consta o seguinte
A figura do técnico de contas foi institucionalizada através do Código da Contribuição Industrial e tinha em vista melhorar o tratamento contabilístico das contas das empresas através de profissionais devidamente credenciados», sendo a obrigação
Obrigação idêntica foi sendo mantida, expressa ou tacitamente, nos códigos que se lhe seguiram, com especial relevo para a manutenção dessa mesma obrigação no Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado.
Admitindo se a necessidade de se proceder a futura regulamentação da sua actividade, foi desde logo imposta a obrigação de o técnico de contas, conjuntamente com o respectivo sujeito passivo, assinar as declarações relativas aos contribuintes do grupo A. Tornou-se obrigatória a inscrição na Direcção-Geral das Contribuições e Impostos como condição para o exercício das suas funções e previu-se ainda a aplicação de sanções disciplinares, incluindo a suspensão ou até interdição da actividade.
Com a aprovação do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas e o das Pessoas Singulares, que começaram a vigorar em 1989, foi revogado o referido Código da Contribuição Industrial, deixando de ser obrigatória a sua assinatura nas declarações fiscais, desaparecendo, no plano institucional, a figura do técnico de contas.), que só voltou a existir novamente com o Decreto-Lei n.º 265/95, que criou os técnicos oficiais de contas e passou a impor a obrigação de deles disporem as entidades sujeitas aos impostos sobre o rendimento que possuam ou sejam obrigadas a possuir contabilidade regularmente organizada (art. 2.º deste diploma e Estatuto dos Técnicos Oficiais de Contas por ele aprovado).
Nos modelos de declarações para efeitos de I.R.C. e anexo C de I.R.S. continuou a incluir-se um local destinado à assinatura dos técnicos de contas, mas essa assinatura era facultativa. (Este carácter facultativo foi expressamente reconhecido no Ofício-Circulado n.º 55977, de 20/04/1990, da Direcção de Serviços do I.V.A., relativo às declarações de início de actividade e alterações, em que se refere que «embora se mantenham os campos 8, 9 e 10 do quadro 14, os mesmos devem ser entendidos como de preenchimento facultativo, não cabendo qualquer penalidade aos sujeitos passivos face ao seu não preenchimento» e se esclarece que a manutenção daqueles campos foi efectuada «face aos conhecidos apelos das associações profissionais que representam os interesses dos Técnicos de Contas».)
Tendo havido, durante mais de seis anos, a possibilidade de a escrita das entidades que tivessem contabilidade organizada ser assegurada por técnicos de contas que não reunissem os requisitos exigidos quer pela Portaria n.º 420/76, quer pelo Estatuto aprovado pelo Decreto-Lei n.º 265/95, de 17 de Outubro, geraram-se situações de facto em que pessoas que não possuíam os requisitos exigidos por este Estatuto desenvolveram, durante vários anos, essa actividade, com carácter profissional, formando, naturalmente, expectativas de continuarem a poder exercer profissionalmente a sua actividade no futuro, expectativas essas que são de qualificar como legítimas, porque assentes no regime legal então vigente.
Com o DL n.º 265/95 e Estatuto por ele aprovado, veio a gerar-se, na prática, uma situação de proibição de continuação do exercício desta actividade profissional por técnicos de contas que não reuniam os requisitos para se inscreverem como técnicos oficiais de contas, pois a exigência de que as entidades com contabilidade organizada dispusessem de um técnico oficial de contas conduziria, naturalmente, a que estas dispensassem os serviços de técnicos de contas que não estivessem inscritos como técnicos oficiais.
É esta impossibilidade prática de continuação do exercício de tal actividade por técnicos de contas que não reunissem os requisitos para inscrição como técnicos oficiais de contas, operada pelo DL n.º 265/95, que foi considerada como uma situação de injustiça, que se visou reparar com a Lei n.º 27/98.
A forma como se entendeu reparar esta injustiça foi permitir a inscrição como técnicos oficiais de contas às pessoas que tivessem exercido de facto a actividade de técnico de contas, durante três anos, como responsáveis directos por contabilidade organizada, nos termos do Plano Oficial de Contabilidade, independentemente de reunirem os requisitos para tal exigidos pelo Estatuto aprovado pelo aquele Decreto-Lei.
Assim, sendo esta a razão de ser do regime excepcional de admissibilidade de inscrição como técnico oficial de contas, é forçoso concluir que se justifica a aplicação do regime excepcional de admissibilidade de inscrição a todas as pessoas que se encontrassem nessa situação de injustiça, isto é, todas as pessoas que tivessem efectivamente exercido a actividade de técnico de contas nos termos do Plano Oficial de Contabilidade, durante o período referido.
8 – Na interpretação da lei importa reconstituir o pensamento legislativo tendo em atenção, entre outros factores, as condições em que a lei foi elaborada (art. 9.º, n.º 1, do Código Civil), pelo que a sua razão de ser, o elemento racional ou teleológico, «constitui um subsídio da maior importância para determinar o sentido da norma». (BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, páginas 182-183.)
Conhecendo o desígnio legislativo subjacente a esta Lei n.º 27/98 e tendo de presumir-se que o legislador adoptou nela o regime probatório adequado à concretização desse desígnio e não a impedir que ele seja atingido (Será essa, obviamente, a solução mais acertada, em matéria probatória, que tem de se presumir ter sido adoptada, por força do disposto no n.º 3 do art. 9.º do Código Civil.), tem de entender-se que não foram adoptadas nem serão compatíveis com aquela lei restrições de meios probatórios que inviabilizem pessoas que estivessem naquelas situações de injustiça de demonstrarem que foram «responsáveis directos por contabilidade organizada, nos termos do Plano Oficial de Contabilidade, no período decorrido entre 1 de Janeiro de 1989 e 17 de Outubro de 1995, de entidades que possuíssem ou devessem possuir esse tipo de contabilidade». (Cabeçalho e parte final da referida Exposição de Motivos.)
Na verdade, seria incongruente com a louvável preocupação legislativa em sanar situações de injustiça, tão intensa que justificou a adopção de um regime excepcional de inscrição de técnicos oficiais de contas sem que os interessados reunissem os requisitos considerados adequados, admitir o estabelecimento de restrições probatórias que pudessem inviabilizar tal objectivo, impedindo a prova de situações desse tipo que efectivamente existissem e obstando a que pessoas que estavam naquela situação de injustiça pudessem alcançar a reparação que se pretendia assegurar.
Por isso, tendo de se presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas (art. 9.º, n.º 3, do Código Civil), tem de entender-se que está ínsita naquela Lei n.º 27/98 a intenção legislativa de permitir a utilização de todos os meios probatórios admissíveis em procedimento administrativo que sejam necessários para prova de qualquer das situações daquele tipo que pudessem existir.
Assim, se se concluir que a restrição probatória adoptada no acto recorrido, aplicando o que consta dos art.ºs 1.º, n.º 1, alínea d), 2.º e art.º 3.º, n.º 1, do referido «REGULAMENTO», elaborado pela Entidade Recorrida para executar a Lei n.º 27/98 (cuja cópia consta de fls. 32 a 34), é incompatível com a concretização da intenção legislativa que a esta está subjacente, terá de considerar-se que aquela restrição é ilegal, por contrariar normas de hierarquia superior.
A tarefa de apurar a legalidade ou não da referida restrição probatória reconduz-se, assim, primacialmente, a averiguar se há ou não situações daquele tipo que não podem ser demonstradas através da apresentação de declarações modelo 22 de I.R.C. e anexos C de declarações de I.R.S.. No entanto, não fica também afastada a possibilidade de a adopção daqueles meios de prova poder ser considerada ilegal em si mesma, por incompatibilidade com aquela Lei, se ela for de considerar inidónea para a comprovação da existência da situação que se pretende demonstrar.
9 – Ora, são identificáveis várias situações em que pessoas podem ter sido responsáveis por contabilidade organizada nos termos do Plano Oficial de Contabilidade, de entidades que possuíssem ou devessem possuir esse tipo de contabilidade, durante o período de 1989 a 17-10-95, e que poderão não ter assinado declarações daqueles tipos.
Na verdade, desde logo, havia entidades que eram obrigadas a ter contabilidade organizada no período de tempo referido e que não apresentavam declarações daqueles tipos.
É o que sucedia com as pessoas colectivas que apenas dispunham de rendimentos directamente derivados do exercício de actividades culturais, recreativas e desportivas, que eram obrigadas a ter contabilidade organizada [art. 10.º, n.º 1, alínea c), do C.I.R.C. (Na redacção anterior à Lei n.º 10-B/96, de 23 de Março, que passou alterou aquele art. 10.º, passando a inicial alínea c) a ser a alínea b). )] mas não tinham de apresentar declaração modelo 22, por estarem isentas, como resulta do preceituado no art. 94.º do mesmo Código, na redacção vigente no período de tempo referido. (Neste sentido, pode ver-se PINTO FERNANDES e CARDOSO DOS SANTOS, Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas Anotado e Comentado, 3:ª edição, página 547.)
O mesmo sucedia com grande parte das cooperativas, que estavam isentas de I.R.C. [nos termos previstos no art. 11.º do C.I.R.C. (Na redacção inicial e nas dadas pelas Leis n.ºs 75/93, de 20 de Dezembro, e 39-B/94, de 27 de Dezembro, no que concerne ao período que releva para efeitos de inscrição na Associação dos Técnicos Oficiais de Contas.)], não tendo de apresentar declarações modelo 22, mas tinham obrigação de manter contabilidade organizada (art. 98.º, n.º 1, do mesmo Código).
Os técnicos de contas que fossem responsáveis pela contabilidade destas pessoas colectivas durante o período de tempo referido, nunca poderiam demonstrar o exercício dessa actividade para efeitos de inscrição, por não terem assinado quaisquer declarações modelo 22, o que, só por si, demonstra que a restrição probatória adoptada pela Entidade Recorrida não se compagina com a Lei n.º 27/98, que também a estas pessoas pretendia assegurar a possibilidade de inscrição como técnicos oficiais de contas.
Por outro lado, sendo facultativa a aposição das assinaturas de técnicos de contas em declarações apresentadas por contribuintes para efeitos tributários, é evidente que podem existir situações em que elas não fossem apostas, apesar de existirem técnicos responsáveis pela contabilidade subjacente às declarações. Trata-se de situações em que, se existia a situação de injustiça que esteve na génese da Lei n.º 27/98, se pretendia também assegurar a possibilidade de inscrição, que não poderia fazer-se com a apresentação das declarações exigidas pela Entidade Recorrida.
Um outro tipo de situações de facto contempladas pela Lei n.º 27/98 em que seria impossível efectuar a prova através de declarações assinadas seria a dos técnicos de contas que exerciam tal actividade no âmbito de sociedades. Na verdade, nestes casos, se a declaração fosse assinada pela sociedade, quem aporia a sua assinatura seria quem tinha poderes de representação externa da sociedade (membros da gerência ou do conselho de administração), independentemente de serem essas pessoas quem tinham de facto sido as responsáveis pela contabilidade. Na verdade, seja quem for a pessoa singular que coloca a assinatura, nos casos em que se está perante a representação de uma sociedade, quem assina, juridicamente, é esta pessoa colectiva e não quem actua em sua representação. Por outro lado, é manifesto que nesta actividade desenvolvida em sociedades não há qualquer razão para se concluir que a pessoa física que subscreveu as declarações em nome da sociedade é a mesma que exerceu a actividade profissional de técnico de contas que a Lei 27/98 considera relevante para efeitos de inscrição, isto é, nada garante que seja essa pessoa e não outra quem estava na situação de injustiça que se visou reparar. Ora a Lei n.º 27/98 expressamente refere no seu art. 1.º que releva para efeitos de inscrição a responsabilidade directa por contabilidade «sob a forma de sociedade», pelo que aceita a possibilidade de ser valorada para efeitos de inscrição a actividade desenvolvida no âmbito de sociedades, apesar de, nestes casos, nunca haver a possibilidade jurídica de as declarações terem sido assinadas pelos técnicos de contas que foram responsáveis pela contabilidade e haver sempre a possibilidade de a pessoa física que assina em representação da sociedade não ser a que se encontrava na situação de injustiça que se pretendia resolver.
A constatação da possibilidade de existirem situações de facto em que técnicos de contas foram responsáveis por contabilidade organizada, nos termos do Plano Oficial de Contabilidade, em entidades que possuíssem ou devessem possuir esse tipo de contabilidade, durante o período de 1989 a 17-10-95 e que não tivessem assinado declarações modelo 22 do I.R.C. e anexo C da declaração modelo 22 do C.I.R.S., leva a concluir pela inconstitucionalidade material das normas do referido «Regulamento» que a impõem [arts. 1.º, n.º 1, alínea d), 2.º e 3.º, n.º 1] e da própria Lei n.º 27/98, se fosse essa a sua interpretação. Na verdade, à face desta interpretação, existiriam técnicos de contas que estiveram nessa situação que poderiam obter a inscrição, por terem assinado declarações referentes a três anos entre 1989 e 1994, e outros que, estando na mesma situação ou, eventualmente, tendo exercido até durante mais de três anos aquela actividade, estariam, impossibilitados de obter a inscrição. Como é óbvio, todos aqueles que tinham exercido de facto aquelas funções se encontravam na situação de injustiça que a Lei n.º 27/98 pretendeu resolver, pelo que um tratamento distinto de uns e outros, a nível da possibilidade de inscrição, derivado da eventualidade de terem ou não assinado aquelas declarações facultativas, que alguns nem sequer poderiam ter apresentado, seria absolutamente arbitrário e, por isso, ofensivo do princípio da igualdade, plasmado no art. 13.º da C.R.P..
Por isso, a única interpretação da Lei n.º 27/98, nomeadamente dos seus art.ºs 1.º e 2.º, que é conforme à Constituição é a de que não se pretendeu nela restringir às ditas declarações os meios de prova da existência das situações de facto a que se referem.
Outros argumentos, demonstrando a inadequação das ditas declarações para prova de toda a actividade que naquela lei se considera relevante para efeitos de inscrição, confirmam que é esta a interpretação correcta da Lei n.º 27/98
Desde logo, a apresentação daquelas declarações é, em si mesma, um meio de prova pouco fiável da existência de uma actividade de responsabilidade por escrita durante um período determinado, uma vez que não é obrigatório que quem apresenta e subscreve a declaração tenha sido quem ao longo de todo o ano a que ela se refere tenha sido o responsável pela contabilidade. Na verdade, para além das vicissitudes naturais que impusessem a substituição de técnicos de contas (como falecimento ou doença), as entidades obrigadas a manter contabilidade organizada podiam utilizar os serviços dos técnicos de contas que entendessem, nada obstando a que utilizassem os serviços de mais do que um técnico no decurso de um determinado ano, ou no ano subsequente, antes de ser apresentada a declaração referente ao ano anterior. Por isso, ao fim e ao cabo, a aposição da assinatura de um técnico de contas numa determinada declaração só prova directamente que ele era o responsável pela escrita no momento em que ela é apresentada.
Assim, mesmo que se pudesse admitir, como presunção natural cujo suporte estatístico não é evidentemente seguro, que quem assina a declaração referente a um determinado ano é quem foi responsável pela escrita ao longo de todo esse ano, a manifesta falta de fiabilidade de tal presunção sempre imporia a um legislador sensato, que presumivelmente consagra as soluções mais acertadas, que não erigisse aquele meio de prova em único utilizável para prova da existência das situações relevantes para efeito de inscrição.
Esta conclusão é reforçada pela evidência da existência de outros meios de prova mais fiáveis, como é o caso da prova de os interessados terem sido tributados pelo exercício da actividade de técnicos de contas durante o período de tempo referido, que podia ser efectuada através da exibição de cópias das respectivas declarações pessoais de rendimentos apresentadas por esses técnicos para efeitos de liquidação do seu próprio I.R.S. (Durante todo o período de tempo relevante para a inscrição, a actividade de técnico de contas sempre foi uma das indicadas na lista de profissões anexa ao C.I.R.S., sob o n.º 502.) e através dos documentos relativos ao pagamento de remunerações, que permitiam comprovar quais as entidades a quem os serviços foram prestados. (A emissão destes documentos era obrigatória [art. 107.º, n.º 1, alínea b), do C.I.R.S., na redacção inicial].)
Por isso, é de concluir que não haveria sequer razões para erigir as declarações modelo 22 de I.R.C. e os anexos C das declarações modelo 2 de I.R.S. em meios de prova preferenciais das situações de injustiça que a Lei n.º 27/98 visava sanar, pelo que é de repudiar a interpretação segundo a qual é esse o único meio de prova admissível.
Há, assim, abundantes elementos interpretativos que conduzem com segurança à conclusão de que não terá sido consagrado na Lei n.º 27/98 nem será compatível com ela um regime probatório em que as declarações modelo 22 de I.R.C. e os anexos C às declarações modelo 2 de I.R.S. sejam o único meio de prova admissível e, que, se ele tivesse sido aí consagrado, seria materialmente inconstitucional.
Para além deste conjunto de elementos, constata-se que o texto da Lei n.º 27/98 não contém qualquer referência a tal restrição probatória ou qualquer outra.
Ora, quando a lei não distingue não deve o intérprete distinguir também, se não há razões sérias que justifiquem que se efectue uma distinção.(ANTUNES VARELA, em Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 123, página 30, e ano 124, página 39.)
Por isso, não há o mínimo suporte textual ou racional para que se conclua pela consagração de qualquer restrição, o que conduz à conclusão de que serão admissíveis todos os meios de prova admitidos em procedimento administrativo, que são todos os meios admitidos em direito (art. 87.º, n.º 1, do C.P.A.).
10 – Conclui-se, assim, que é ilegal o referido «Regulamento», ao restringir, nos termos que restringiu, as possibilidades de prova da responsabilidade directa por contabilidade organizada.”(Neste sentido podem ver-se, entre os mais recentes, os Acórdãos deste STA de 26/09/2007 (rec. 331/07), de 2/10/2007 (rec. 529/07), de 28/11/07 (rec. 5007) e de 20/02/2008 (rec. 965/07) e o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 335/2005, de 6/07/2005.)
Termos em que os Juízes que compõem este Tribunal acordam em negar provimento ao recurso e em confirmar a decisão recorrida.
Sem custas, por a Autoridade Recorrida estar isenta (art. 2.º da Tabela de Custas).
Lisboa, 11 de Setembro de 2008. – Costa Reis (relator) – Rui Botelho – Freitas Carvalho.