Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0345/13
Data do Acordão:11/27/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
NULIDADE
TÍTULO EXECUTIVO
ERRO NA FORMA DE PROCESSO
CONVOLAÇÃO
Sumário:I - A nulidade por falta de requisitos essenciais do título executivo (falta que, quando não puder ser suprida por prova documental, constitui nulidade insanável do processo de execução fiscal – art. al. b) do nº 1 do art. 165º do CPPT) não constitui fundamento de oposição, não sendo enquadrável na al. i) do nº 1 do art. 204º deste mesmo Código.
II - O erro na forma de processo (art. 193º do novo CPC) afere-se pela adequação do meio processual ao pedido que se pretende fazer valer. Tendo a recorrente invocado fundamentos legais de oposição à execução fiscal, a consequência jurídica da não verificação concreta dos pressupostos dos fundamentos alegados será a improcedência da oposição quanto a tais fundamentos e não a convolação para requerimento de arguição de nulidade ou para o meio processual impugnação judicial.
Nº Convencional:JSTA000P16609
Nº do Documento:SA2201311270345
Data de Entrada:03/04/2013
Recorrente:A............, LDA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A…………, Lda., com os demais sinais dos autos, recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, julgou improcedente a oposição deduzida contra a execução fiscal nº 3433200501046373, instaurada pelo Serviço de Finanças de Cascais - 2 para cobrança coerciva de dividas relativa IMI, no montante de 36.206,04 Euros.

1.2. Termina as alegações formulando as conclusões seguintes:
I- Qualquer execução fiscal deverá impreterivelmente ter por base um título executivo válido;
II- Como se prevê expressamente no número 1 do artigo 190° do C.P.P.T., "a citação será sempre acompanhada do título executivo";
III- No caso concreto, como anexos à citação da recorrente foram remetidas nove certidões de dívida do processo principal e mais duas dos apensos - que segundo o certificador cumprem, cada uma delas, os "termos dos artigos 88°, 162° e 163°, todos, do Código de Procedimento e do Processo Tributário" — o que não corresponde à verdade, por falta de requisitos essenciais legalmente impostos;
IV- As certidões que constituem os pretensos títulos executivos dos presentes autos estabelecem um determinado montante de dívida e limitam-se a indicar a proveniência dessa dívida como sendo de "IMI - Imposto Municipal sobre Imóveis" - o que as revela (a elas, certidões) como manifestamente insuficientes;
V- E nem se defenda a interpretação literal do previsto na alínea d) do n° 1 do artigo 163° do C.P.P.T. - no sentido de se poder sustentar que a inscrição "IMI — Imposto Municipal sobre Imóveis" é bastante para esclarecer a executada sobre a "natureza ou proveniência da dívida";
VI- A procedência desse insustentável entendimento equivaleria à omissão de todos os princípios que norteiam as regras do procedimento tributário e das mais elementares garantias dos contribuintes (com ampla dignidade e protecção Constitucional) - designadamente: o princípio da verdade material (artigo 55° da Lei Geral Tributária); o princípio da legalidade (n°s. 2 e 3 do artigo 103° da Constituição da República Portuguesa e artigo 8° da L.G.T.); o princípio da participação e do contraditório; o princípio da imparcialidade e, essencialmente, o principio de obrigatoriedade de fundamentação (n.° 3 do artigo 268° da C.R.P. e n.° 1 do artigo 77° da L.G.T.);
VII- Neste condicionalismo, deveria a douta decisão "sub-judice" ter equacionado e relevado a possibilidade dos vícios apontados pela recorrente terem prejudicado a defesa (como alegado) e, assim sendo, impunha-se a convolação da petição de oposição em requerimento de arguição de nulidades, a ser apreciado no processo de execução fiscal;
VIII- Além do mais, em nenhum dos documentos que acompanham a citação (pretensos títulos executivos) há uma identificação do prédio sobre o qual recai o imposto alegadamente em dívida;
IX- O que, só por si, confere à recorrente o direito de questionar a legalidade da dívida exequenda (alínea h) do n° 1 do artigo 203° do C.P.P.T.) - de acordo com a matéria alegada em sede de oposição;
X- E, não havendo lugar a qualquer liquidação, não estava igualmente "autorizada a sua cobrança à data em que tiver ocorrido a respectiva liquidação" (alínea a) do n° 1 do artigo 204° do C.P.P.T.);
XI- Ou, em alternativa, sempre se estaria na presença de uma situação de duplicação de colecta (alínea g) do n° 1 do artigo 204° e artigo 205°, ambos, do C.P.P.T.) - que é do conhecimento oficioso (artigo 175° do C.P.P.T.).
XII- Não colhe, assim, a tese preconizada na douta sentença recorrida com a citação dos artigos 119° e 120° do C.I.M.I. - pois não havendo lugar a liquidação de I.M.I. pelo prédio rústico, é natural que o sujeito passivo não aguardasse qualquer notificação, nem requeresse uma 2ª via;
XIII- O que equivale a dizer que, também pelo exposto, deveria ter sido julgada procedente a presente oposição (alínea i) do n° 1 do artigo 204° do C.P.P.T.);
XIV- Em todo o caso, assentando a douta decisão na impossibilidade da discussão da legalidade da liquidação da dívida exequenda em sede de oposição fiscal - sempre deveria o Tribunal ter, também aqui, declarado a existência de erro na forma de processo e ordenado a convolação do meio processual inadequado em meio processual adequado (ou seja, a convolação dos presentes autos de oposição à execução fiscal em impugnação judicial);
XV- Finalmente, na oposição oportunamente deduzida a ora recorrente levantou, entre outras, a questão de, não havendo lugar a qualquer liquidação, não estar a exequente autorizada à cobrança da colecta e que, em todo o caso, exigindo o tributo, sempre se estaria na presença de uma duplicação de colecta;
XVI- O douto Tribunal dever-se-ia ter pronunciado sobre esta questão - o que não fez em absoluto - verificando-se uma omissão de pronúncia;
XVII- A douta sentença recorrida violou o disposto nos artigos 35°, n° 2; 88°; 125°; 162°; 163°; 165°, n° 1, b); 175°; 190°; 203°; 204°, n° 1, g) e i) e 205°, todos, do C.P.P.T.; artigos 112°, n° 1, a); 113°, n° 6; 119° e 120°, todos, do C.I.M.I; artigos 198°, nº 4 e 668°, d), todos, do CPC; artigos 8°; 55° e 177°, n° 1, todos, da L.G.T. e artigos 103°, n°s. 2 e 3 e 268°, n° 3 da C.R.P..
Termina pedindo o provimento do recurso com a revogação da sentença recorrida e a procedência da oposição ou, assim, não se entendendo, decretar-se os termos do peticionado nas conclusões VII, XIV, XVI, respectivamente, com as legais consequências.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. Emitindo pronúncia sobre a invocada nulidade da sentença, a Mma. Juíza do Tribunal “a quo” sustentou que tal nulidade não se verifica pois que foram apreciadas todas as questões que as partes submeteram à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão ficou prejudicada pela solução dada a outras.

1.5. O MP emite douto Parecer nos termos seguintes, além do mais:
«1. Nulidade da sentença
Omissão de pronúncia sobre a questão da duplicação de colecta (petição art. 28°).
A oponente incorre em erro na qualificação jurídica do fundamento alegado que se traduz, substantivamente, em ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, questão apreciada na sentença.
O tribunal não está vinculado à qualificação jurídica adoptada pelas partes (art. 664º CPC).
Consequência jurídica: inexistência de nulidade por omissão de pronúncia.
2. A nulidade do título executivo (art. 165º n° 1 al. b) CPPT) não constitui fundamento de oposição à execução fiscal, devendo ser arguida perante o órgão da execução fiscal, sendo eventual decisão desfavorável passível de reclamação para o tribunal tributário (art. 276º CPPT/acórdãos STA SCT 20.11.2002, processo n° 1701/02; 28.02.2007, processo n° 1178/06; 14.03.2007, processo n° 950/06; 23.10.2007, processo n° 26762; Pleno SCT 23.02.2005, processo n° 574/04, Pleno SCT 19.11.2008, processo n° 430/08).
3. A recorrente invocou fundamentos legais de oposição à execução fiscal:
- falta de notificação da liquidação do imposto no prazo de caducidade, por alegado conhecimento da liquidação da dívida exequenda apenas na data da citação (petição art. 22°; art. 204° n° 1 al. e) CPPT)
- ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, fundamento de oposição quando a lei não assegura meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação (petição art. 23°; art. 204º n° 1 al. h) CPPT).
A consequência jurídica da inverificação concreta dos pressupostos dos fundamentos alegados é a improcedência da oposição e não a convolação para requerimento de arguição de nulidade ou para o meio processual impugnação judicial (conclusões VII e XIV).
CONCLUSÃO
O recurso não merece provimento.
A sentença impugnada deve ser confirmada.»

1.6. Corridos os vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2. Na sentença recorrida julgaram-se provados os factos seguintes:
A) No dia 22.10.1990 foi objecto de registo a constituição da sociedade por quotas "A…………, Lda.", matriculada sob o n° ……… na Conservatória do Registo Comercial de Cascais. (Doc. fls. 10/12 do processo de execução fiscal apenso).
B) Da inscrição datada de 22.10.1999 constam como sócios B…………, C…………, cabendo a gerência a D………… (já falecido) e a C…………. (Doc. fls. 10/12 do processo de execução fiscal apenso).
C) Corre termos no Serviço de Finanças de Cascais - 2 o processo de execução fiscal n° 3433200501046373, instaurado contra a Oponente para cobrança coerciva a dívidas relativas a IMI, no montante de € 36.206,04, com base nas certidões de dívida que aqui se dão por integralmente reproduzidas (Doc. fls. 1 e segs. do processo de execução fiscal apenso).
D) No dia 23.09.2009, a oponente foi citada, na pessoa do sócio gerente C………... (Doc. fls.14/16 do processo de execução apenso).
E) Em 26.10.2009, deu entrada no Serviço de Finanças de Cascais - 2 a petição inicial que originou os presentes autos. (Cfr. carimbo aposto a fls. 2 dos autos).

3.1. A sentença considerou que a oponente invocou na Petição Inicial da presente oposição, as questões seguintes: (i) nulidade dos títulos executivos por falta dos requisitos essenciais; (ii) ilegalidade da divida exequenda; (iii) extinção do processo de execução fiscal por força do artigo 177° do CPPT.
E, apreciando cada uma destes fundamentos, a sentença julgou-os improcedentes, com a fundamentação seguinte:
▬▬ Quanto à nulidade das certidões que constituem os títulos executivos:
Conforme a jurisprudência do STA, a nulidade por falta de requisitos do título executivo (cfr. arts. 163º e 165º do CPPT), só pode ser invocada e apreciada no processo de execução fiscal, sendo a eventual decisão desfavorável passível de reclamação para o tribunal tributário. Ou seja, a nulidade da falta de requisitos essenciais do título executivo — nos termos da al. b) do nº 1 do art. 165° do CPPT — não é fundamento de oposição à execução fiscal por não enquadrável na al. i) do nº 1 do seu art. 204°.
Por outro lado, ainda que houvesse nulidade da citação, nos termos do n° 4 do art. 198° do CPC, a arguição não deve ser atendida se se demonstrar que não existiu prejuízo para a defesa do citado, a nível da globalidade dos direitos processuais que podem ser exercidos na sequência da citação. E o mesmo sucede com a falta de fundamentação dos títulos executivos, a qual não é subsumível a nenhum dos fundamentos válidos de oposição à execução fiscal, contidos no art. 204° do CPPT, mas antes do próprio processo de execução, onde poderia ser arguida e conhecida, com possível reclamação para o juiz do tribunal tributário (cfr. art. 162° e ss. e 276° do CPPT). É que, a falta de requisitos do título executivo (mesmo quando não possa ser suprida por prova documental) não é subsumível a nenhum das alíneas do citado art. 204°, n° 1, nem mesmo na sua alínea i), logo não constituindo um válido fundamento de oposição à execução fiscal.
Assim, a oposição não poderá proceder com esses fundamentos.
▬▬ Quanto à falta de notificação da liquidação, por a oponente só ter tomado conhecimento desta com a citação efectuada nos autos de execução (daí concluindo a oponente que lhe assiste o direito de discutir a legalidade da divida exequenda ao abrigo da al. h) do nº 1 do art. 204° do CPPT.
Não é esta, manifestamente, a situação dos autos, pois a legislação prevê e assegura a impugnação ou recurso judicial contra o mencionado acto de liquidação, sendo que, por outro lado, a liquidação IMI, efectuada dentro do prazo normal, não carece de notificação ao sujeito passivo, bastando o envio do documento de cobrança aludido nos arts. 119º e 120° do CIMI para tornar a dívida exigível.
▬▬ Quanto à extinção do processo de execução fiscal por força do art. 177° do CPPT.
O prazo fixado neste art. 177º do CPPT tem natureza ordenadora e disciplinar, pelo que se for ultrapassado, não ocorre desde logo a extinção do processo de execução fiscal, como aliás, considerou o Tribunal Constitucional, no âmbito do proc. n° 14/09.

3.2. Do assim decidido discorda a recorrente alegando, como se viu:
a) Quer a nulidade da sentença, por omissão de pronúncia (cfr. as Conclusões XV e XVI) relativamente à questão de, não havendo lugar a qualquer liquidação, não estar a exequente autorizada à cobrança da colecta e que, em todo o caso, exigindo o tributo, sempre se estaria na presença de uma duplicação de colecta;
b) Quer o erro de julgamento, porque
- são manifestamente insuficientes as certidões que constituem os pretensos títulos executivos (apesar de estabelecerem um determinado montante de dívida, limitam-se a indicar a proveniência dessa dívida como sendo de "IMI - Imposto Municipal sobre Imóveis") - cfr. Conclusões I a VI – e nem elas nem os documentos que as acompanham, identificam o prédio sobre o qual recai o imposto (conferindo à recorrente o direito de questionar a legalidade da dívida exequenda (al. h) do n° 1 do art. 204° do CPPT), e sendo que a sentença também devia ter equacionado e relevado a possibilidade dos vícios apontados pela recorrente terem prejudicado a defesa, impondo-se a convolação da petição de oposição em requerimento de arguição de nulidades, a ser apreciado no processo de execução fiscal (Conclusão VII);
- não havendo lugar a qualquer liquidação, também não estava "autorizada a sua cobrança à data em que tiver ocorrido a respectiva liquidação" (al. a) do n° 1 do art. 204° do CPPT), quer porque, em alternativa, sempre se estaria na presença de uma situação de duplicação de colecta (al. g) do n° 1 do art. 204° e art. 205°, ambos, do CPPT) – cfr. Conclusões VIII a XIII);
- em todo o caso, assentando a decisão na impossibilidade da discussão da legalidade da liquidação da dívida exequenda em sede de oposição fiscal, sempre deveria ter-se concluído pela ocorrência de erro na forma de processo e ordenado a convolação da oposição em impugnação judicial - cfr. Conclusão XIV.
Vejamos, pois, estas suscitadas questões.

4.1. Quanto à invocada nulidade da sentença, por omissão de pronúncia.
Diz a recorrente que a sentença não se pronunciou relativamente à questão de, não havendo lugar a qualquer liquidação, não estar a exequente autorizada à cobrança da colecta e que, em todo o caso, exigindo o tributo, sempre se estaria na presença de uma duplicação de colecta.
Carece, porém, de razão legal.
Prevista no art. 125º do CPPT e na al. d) do nº 1 do art. 615º do novo CPC (que corresponde ao anterior art. 668º), a nulidade da sentença por omissão de pronúncia ou por excesso de pronúncia relaciona-se com o disposto no nº 2 do art. 608º e com o nº 1 do art. 609º, ambos do actual CPC (a que correspondiam os anteriores arts. 660º e 661º).
Ali se estabelece, com efeito, que, por um lado, o juiz nem pode ocupar-se senão de questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras, nem pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir e, por outro lado, o juiz deve, igualmente, resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
De salientar, ainda, que o conceito de «questões» não se confunde com o de «argumentos» ou «razões» aduzidos pelas partes em prol da pretendida procedência das questões a apreciar («Para se estar perante uma questão é necessário que haja a formulação do pedido de decisão relativo a matéria de facto ou de direito sobre uma concreta situação de facto ou jurídica sobre que existem divergências, formulado com base em alegadas razões de facto ou de direito». (Cfr. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, volume II, 6ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2011, pp. 362 e ss., anotação 10 ao art. 125º.
Cfr., também, entre muitos outros, o acórdão do STA, de 29/4/2008, proc. nº 18150, in AP-DR, de 30/11/2010, p. 1311.)
Ora, como salienta o MP, é a oponente que incorre em erro na qualificação jurídica do fundamento alegado, pois que este se traduz, substantivamente, em ilegalidade da liquidação da dívida exequenda (o que a oponente alega é que não havendo lugar a qualquer liquidação, não estava a exequente autorizada à cobrança da colecta, daí ocorrendo a pretensa duplicação de colecta). E esta questão da eventual ilegalidade da liquidação da dívida foi apreciada na sentença, como dela bem se descortina.
Daí que, uma vez que o Tribunal não está vinculado à qualificação jurídica adoptada pelas partes (nº 3 do art. 5º do novo CPC - correspondente ao nº 3 do anterior art. 664º), e uma vez que a sentença apreciou a questão da eventual ilegalidade da liquidação da dívida, não se verifique a alegada nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

4.2. Quanto ao mais:
4.2.1. Como se disse, a recorrente alega erro de julgamento, por parte da sentença, dado que as certidões que constituem os títulos executivos são manifestamente insuficientes (apesar de estabelecerem um determinado montante de dívida, limitam-se a indicar a proveniência dessa dívida como sendo de "IMI - Imposto Municipal sobre Imóveis") e nem elas nem os documentos que as acompanham, identificam o prédio sobre o qual recai o imposto.
Mas carece de razão legal.
É certo que, de acordo com o disposto na al. e) do nº 1 do art. 163º do CPPT, é requisito essencial do título executivo a menção da natureza e proveniência da dívida e que de acordo com o disposto na al. b) do nº 1 do art. 165º do mesmo Código, a falta de requisitos essenciais do título executivo, quando não puder ser suprida por prova documental, constitui nulidade insanável em processo de execução fiscal. Sendo que o que releva, neste âmbito, é que o título executivo permita ao executado a informação suficiente para saber com segurança qual é a dívida a que o título se refere, de forma a estarem assegurados eficazmente os seus direitos de defesa.
Mas, de todo o modo, o que no caso importa referir é que a nulidade do título executivo, por falta de requisitos essenciais e quando não puder ser suprida por prova documental, não constitui fundamento de oposição enquadrável na al. i) do nº 1 do art. 204º do CPPT, antes devendo ser arguida perante o órgão da execução fiscal e sendo eventual decisão desfavorável passível de reclamação para o Tribunal Tributário (art. 276º do CPPT).
Tem sido este, aliás, o sentido da actual jurisprudência do STA, como se pode ver dos acórdãos do Pleno da Secção do Contencioso Tributário, de 6/5/2009, rec. nº 0632/08, de 19/11/2008, rec. nº 430/08, de 17/12/2008, rec. nº 364/08, de 23/2/2005, rec. nº 0574/04, bem como os acórdãos da Secção, de 19/1/2011, rec. 0340/10 e de 15/2/2012, rec. nº 0383/11 (dos quais foi relator o presente), de 23/10/2007, rec. nº 026762, de 14/3/2007, rec. nº 0950/06, de 28/2/2007, rec. nº 01178/06 e de 20/11/2002, rec. nº 01701/02.
Em suma, a nulidade da falta de requisitos essenciais do título executivo – nos termos da al. b) do nº 1 do art. 165º do CPPT – não é fundamento de oposição à execução fiscal por não enquadrável no seu artigo 204º, nº 1, al. i).
E assim tendo decidido a sentença, improcede esta alegação de erro de julgamento.

4.2.2. A recorrente alega, igualmente, que, por um lado, não havendo lugar a qualquer liquidação, se verifica o fundamento previsto na al. a) do nº 1 do mesmo art. 204º do CPPT (não estava "autorizada a sua cobrança à data em que tiver ocorrido a respectiva liquidação") e, por outro lado e em alternativa, sempre se estaria na presença de uma situação de duplicação de colecta (al. g) do n° 1 do art. 204° e art. 205°, ambos, do CPPT).
Mas, também quanto a esta alegação carece de razão legal.
Com efeito, a eventual nulidade do título executivo (ainda que por insuficiência do mesmo) não constitui, como acima se disse, fundamento de oposição à execução fiscal, não sendo enquadrável na al. i) do nº 1 do art. 204º do CPPT, nem se subsumindo ao fundamento da duplicação de colecta (al. g) do mesmo normativo), até porque esta só ocorre se estiver pago o imposto relativo à primeira colecta.
E menos, ainda, se subsume ao fundamento de oposição previsto na al. a) do nº 1 do mesmo artigo 204º do CPPT, pois que este fundamento se reconduz à alegação da ilegalidade abstracta da dívida e a invocada falta de autorização para cobrança da dívida dos autos não se reconduz a tal ilegalidade abstractamente considerada.
Daí que também nesta parte improcedam as Conclusões do recurso.

4.2.3. Finalmente, a recorrente alega que a sentença também devia ter equacionado e relevado a possibilidade dos vícios apontados pela recorrente terem prejudicado a defesa, impondo-se a convolação da petição de oposição em requerimento de arguição de nulidades, a ser apreciado no processo de execução fiscal e que, em todo o caso, assentando a decisão na impossibilidade da discussão da legalidade da liquidação da dívida exequenda em sede de oposição fiscal, sempre deveria ter-se concluído pela ocorrência de erro na forma de processo e ordenado a convolação da oposição em impugnação judicial.
O erro na forma de processo (art. 193º do novo CPC) afere-se pela adequação do meio processual ao pedido que se pretende fazer valer.
Ora, atentando na Petição Inicial da presente oposição, constatamos que a recorrente invoca (i) a nulidade dos títulos executivos por falta dos requisitos essenciais; (ii) a ilegalidade da dívida exequenda (à luz do disposto na al. h) do nº 1 do art. 204º do CPPT, por só com a citação ter tomado conhecimento da liquidação; à luz da al. a) do nº 1 do art. 204º, dado que, não havendo lugar a qualquer liquidação, não estava “autorizada a sua cobrança à data em que tiver ocorrido a respectiva liquidação”; e à luz da al. g) do mesmo normativo, dado que sempre se está na presença de uma situação de duplicação de colecta) e (iii) e a extinção do processo de execução fiscal por força do artigo 177° do CPPT.
Pedindo, além do mais, que seja «julgada procedente a nulidade dos títulos executivos arguida nos anteriores artigos 1º a 18º, inclusive, da presente oposição», que os fundamentos da presente oposição sejam «julgados provados e totalmente procedentes – ordenando-se a extinção dos autos executivos ora colocados em crise» e que «em todo o caso, deve determinar-se a extinção dos presentes autos executivos por decurso do prazo previsto no art. 177º do CPPT».
Assim, independentemente de eventual incongruência entre a pretendida convolação para requerimento de arguição de nulidades e a pretendida convolação para petição inicial de impugnação judicial, o que é verdade é que, como aponta o MP, a recorrente invocou fundamentos legais de oposição à execução fiscal: (i) falta de notificação da liquidação do imposto no prazo de caducidade, por alegado conhecimento da liquidação da dívida exequenda apenas na data da citação (cfr. o art. 22º da petição e a al. e) do nº 1 do art. 204º do CPPT); (ii) ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, fundamento de oposição quando a lei não assegura meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação (art. 23º da petição e al. h) do nº 1 do citado art. 204º do CPPT).
Sendo que a consequência jurídica da não verificação concreta dos pressupostos dos fundamentos alegados será a improcedência da oposição quanto a tais fundamentos, não cabendo, portanto, convolação para requerimento de arguição de nulidade ou para o meio processual impugnação judicial.

5. Em suma, a sentença não enferma da nulidade (por omissão de pronúncia), nem dos também invocados erros de julgamento, que a recorrente lhe imputa, improcedendo, portanto, todas as Conclusões do recurso.

DECISÃO
Nestes termos, acorda-se em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 27 de Novembro de 2013. - Casimiro Gonçalves (relator) – Francisco RothesDulce Neto.