Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0764/07
Data do Acordão:07/14/2008
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JORGE DE SOUSA
Descritores:OPOSIÇÃO DE JULGADOS
RECURSO POR OPOSIÇÃO DE JULGADOS
RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
CÓDIGO DE PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS
RECURSO DE ACORDÃO DA 2 SECÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO
SECÇÃO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO
Sumário:I – O regime do recurso jurisdicional por oposição de acórdãos, previsto no art. 284.º do CPPT, não foi revogado pela entrada em vigor do ETAF de 2002 e do CPTA, sendo aplicáveis a tais recursos, subsidiariamente, o regime previsto no art. 152.º deste último Código, no que não está regulado no CPPT e no regime do recurso de agravo.
II – Cabe ao Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo conhecer destes recursos, uma vez que, sendo fundados em oposição de acórdãos, estarão abrangidos pela designação «recursos para uniformização de jurisprudência», que é de interpretar como reportando-se a todos os recursos jurisdicionais que visam tal finalidade e não apenas àqueles a que o CPTA ou o CPC atribuem tal designação.
III – Não são invocáveis como fundamento do recurso por oposição de acórdãos, que são da competência do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo acórdãos proferidos pela Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo ou pelo respectivo Pleno.
Nº Convencional:JSTA00065150
Nº do Documento:SA2200807140764
Data de Entrada:09/21/2007
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:RECLAMAÇÃO.
Objecto:DESP RELATOR.
Decisão:INDEFERIMENTO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - REC JURISDICIONAL.
Legislação Nacional:ETAF02 ART27 N1 B.
CPPTRIB99 ART280 ART281 ART282 ART284.
CPTA02 ART152 N1 B.
CCIV66 ART9 N2.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC452/07 DE 2007/09/26.
Referência a Doutrina:BAPTISTA MACHADO INTRODUÇÃO AO DIREITO E AO DISCURSO LEGITIMADOR PAG186.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1 – O A…., apresentou reclamação do despacho proferido pelo Relator a fls. 312-316, que julgou findo o recurso que interpôs, a fls. 275, para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário, «ao abrigo do disposto no art. 284.º do CPPT e no art. 27.º/1/b) do ETAF».
O Reclamante termina requerendo que seja proferido acórdão sobre a matéria da reclamação que apresentou e se ordene o prosseguimento do recurso, invocando o disposto nos arts. 288.º, n.ºs 2 e 3, do CPPT e 700.º, n.º 3, do CPC.
Este art. 700.º, n.º 3, do CPC, que é a norma que define a amplitude da reclamação para a conferência de despachos proferidos pelo relator, estabelece que «a parte se considere prejudicada por qualquer despacho do relator, que não seja de mero expediente, pode requerer que sobre a matéria do despacho recaia um acórdão; o relator deve submeter o caso à conferência, depois de ouvida a parte contrária».
Como se vê por esta disposição, o direito que nela se reconhece é o de que «sobre a matéria do despacho recaia um acórdão», pelo que é a matéria do despacho, e não a matéria da reclamação, que limita os poderes de cognição da conferência.
2 – No despacho reclamado entendeu-se que não se verificam os requisitos do seguimento do recurso com fundamento em oposição de acórdãos, por o acórdão recorrido ser da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo e ambos os acórdãos invocados como fundamento terem sido proferidos pela Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo.
No despacho reclamado entendeu-se sobre os recursos por oposição de acórdãos no contencioso tributário, após a entrada em vigor do ETAF de 2002, que:
– a competência para o seu conhecimento é definida pelo art. 27.º, n.º 1, alínea b), do ETAF de 2002;
– o regime desses recursos é regulado, em primeira linha, pelo art. 284.º do CPPT, depois pelas regras gerais dos recursos jurisdicionais que constam dos arts. 280.º e 282.º do mesmo Código e com aplicação subsidiária do regime do agravo em processo civil, nos termos do art. 281.º do mesmo;
– não se estabelecendo naquele art. 284.º os requisitos de que depende a existência de «oposição de acórdãos», há que fazer apelo ao regime do art. 152.º do CPTA, ao abrigo da alínea c) do art. 2.º do CPPT.
O Reclamante aceita que a competência para o conhecimento dos recursos por oposição de acórdãos é regulada pelo art. 27.º, alínea b), do ETAF de 2002, que prevê a competência do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo para o conhecimento dos recursos para uniformização de jurisprudência. Na verdade, no próprio requerimento de interposição do recurso, o ora Reclamante indicou expressamente que o recurso foi interposto para aquele Pleno, «ao abrigo do disposto no art. 284.º do CPPT e no art. 27.º/1/b) do ETAF» de 2002 (fls. 275). Aliás, na presente reclamação, a fls. 319, o Reclamante continua a afirmar a aplicabilidade do referido art. 27.º, n.º 2, do CPTA.
O Reclamante também aceita que o regime destes recursos é regulado pelo art. 284.º do CPPT, como refere naquele requerimento e afirma repetidamente na douta reclamação.
Por outro lado, relativamente à aplicação das regras gerais dos recursos jurisdicionais previstas no CPPT e aplicação subsidiária do regime do agravo em processo civil, embora o ora Reclamante não refira genericamente que aceita a sua aplicação, também não manifesta discordância e faz mesmo referências expressas à aplicação dos arts. 281.º e 282.º, no seu requerimento de interposição de recurso de fls. 275.
Assim, a sua discordância com o regime de recursos por oposição de acórdãos indicado no despacho reclamado limita-se à aplicação subsidiária do art. 152.º do CPTA.
No entanto, é neste sentido a jurisprudência firmada pelo Pleno da Secção do Contencioso Tributário, relativamente a recursos por oposição de acórdãos interpostos em processos de impugnação judicial, como pode ver-se pelo acórdão de 26-9-2007, recurso n.º 452/07.
Neste acórdão, tirado por unanimidade, foi expressamente abordada e decidida a questão do regime global dos recursos por oposição de acórdãos nos processos a que é aplicável o regime de recursos jurisdicionais previsto no CPPT, e foram instaurados após 1-1-2004, como é o caso do presente recurso jurisdicional.
A solução adoptada neste aresto é essencialmente idêntica à que foi adoptada no despacho reclamado, como pode constatar-se pelo texto daquele acórdão, que se reproduz parcialmente:
2 – O presente processo iniciou-se depois do início do ano de 2004, pelo que lhe é aplicável o regime legal resultante do ETAF de 2002, nos termos dos arts. 2.º, n.º 1, e 4.º, n.º 2, da Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro, na redacção dada pela Lei n.º 107-D/2003, de 31 de Dezembro.
No art. 27.º, n.º 1, alínea b), do ETAF de 2002 que cabe ao Pleno da SCT do STA conhecer de «recursos para uniformização de jurisprudência», não se indicando quais os recursos abrangidos por essa designação.
Como o CPTA prevê, no seu art. 152.º, um tipo de recursos jurisdicionais a que é atribuída essa designação, é de entender que essa competência se reporta a esses recursos.
Sendo assim, cabe recurso para o Pleno da SCT do STA:
– de acórdãos das secções do contencioso tributário dos tribunais centrais administrativos com fundamento em oposição entre o acórdão de que se recorre e um acórdão anteriormente proferido pela secção do contencioso tributário de um dos tribunais centrais administrativos ou pela SCT do STA (art. 152.º, n.º 1, alínea a), do CPTA];
– de acórdãos da SCT do STA com fundamento em oposição entre o acórdão de que se recorre e outro acórdão da mesma Secção ou do respectivo Pleno.
Ao recurso jurisdicional por oposição de acórdãos, previsto no art. 284.º do CPPT, não é atribuída a designação de «recurso para uniformização de jurisprudência», pelo que se pode questionar se ele subsiste em relação aos processos a que se aplica o ETAF de 2002, uma vez que apenas prevê a intervenção do Pleno em recurso para uniformização de jurisprudência e não se prevê qualquer formação ou tribunal com competência para o conhecimento dos recurso com fundamento em «oposição de acórdãos».
No entanto, apesar de o CPPT já ter sido alterado por várias vezes desde a entrada em vigor do ETAF de 2002 e do CPTA, não foi introduzida qualquer alteração legislativa no regime de recursos jurisdicionais previsto no CPPT, pelo que é de entender que se pretendeu que ele seja mantido. Por outro lado, estabelecendo-se neste art. 284.º um regime especial de recurso para uniformização de jurisprudência, será ele o aplicável, em primeira linha, aos meios processuais a que se aplica o regime de recursos jurisdicionais previsto no CPPT, indicados no n.º 1 do art. 279.º.
Sendo assim, cabe ao Pleno da SCT conhecer destes recursos, uma vez que, sendo também fundados em oposição de acórdãos, caberão naquela designação de «recursos para uniformização de jurisprudência», que é de interpretar como reportando-se a todos os recursos jurisdicionais que visam tal finalidade e não apenas àqueles a que o CPTA ou o CPC atribuem tal designação.
O regime aplicável aos recursos por oposição de acórdãos a que se aplica o ETAF de 2002 é constituído, em primeira linha, pelas regras do art. 284.º, que consubstancia um tipo especial de recurso visando a uniformização de jurisprudência,
Para além disso, pressupõe-se neste art. 284.º a aplicação das regras gerais dos recursos jurisdicionais previstas no CPPT, designadamente quanto à legitimidade e quanto à forma e ao prazo de interposição. Na verdade, o n.º 1 deste art. 284.º inculca essa ideia, pois, referindo que «caso o fundamento for a oposição de acórdãos, o requerimento da interposição do recurso deve indicar...» infere-se que apenas se visa especificar as especialidades do requerimento, com aplicação das regras gerais nos pontos em que não se assinalam especialidades. Por outro lado, no n.º 5 deste art. 284.º remete-se para o n.º 3 do art. 282.º. A isto acresce que as regras dos n.ºs 4 a 7 desse mesmo artigo e do art. 286.º não contêm qualquer indicação que permita restringir a sua aplicação a algum ou alguns tipos de recursos.
Assim, são aplicáveis a estes recursos por oposição de acórdãos, depois das regras deste art. 284.º, as regras gerais constam dos arts. 280.º e 282.º do CPPT ( Este último inclui mesmo na sua epígrafe a expressão «Regras gerais». ). Subsidiariamente, aplicam-se a estes recursos as regras do agravo em processo civil, como determina o art. 281.º deste Código.
No que não estiver regulado no recurso de agravo, será aplicável subsidiariamente o regime de recursos jurisdicionais do CPTA [art. 2.º, alínea c), do CPPT], com primazia para as regras do recurso para uniformização de jurisprudência.
É o que sucede, designadamente com as regras que estabelecem os requisitos de admissibilidade deste tipo de recursos, matéria em que é necessário fazer apelo às regras do art. 152.º do CPTA.
Não se vê razão para não manter esta jurisprudência.
Na verdade, o art. 284.º do CPPT, que o Reclamante entende ser a única disposição aplicável aos recursos por oposição de acórdãos, não contém elementos que permitam definir o conceito de oposição de acórdãos, isto é, que permitam apurar quando é que se deve entender que um acórdão está em oposição com outro e entre que acórdãos é que pode haver oposição.
E este é, seguramente, um conceito que necessita de preenchimento, pois seria manifestamente absurdo o resultado a que conduziria uma interpretação literal, permitindo que fossem invocados como fundamento do recurso por oposição de acórdãos a decidir por uma formação especializada em matéria tributária quaisquer acórdãos (de qualquer Tribunal, de qualquer jurisdição, com qualquer especialização) transitados ou não, com divergências sobre questões de facto ou questões de direito, com dissonância sobre qualquer pormenor, mesmo sem importância decisória.
Por outro lado, sendo o recurso por oposição de acórdãos uma espécie de recurso para uniformização de jurisprudência, como o próprio Reclamante aceitou no requerimento de interposição de recurso, na falta de qualquer indicação própria do contencioso tributário dos requisitos desse tipo de recursos, há que fazer apelo à legislação subsidiária que, em matéria de recursos jurisdicionais regulados pelo CPPT, quando não se encontra regulamentação no regime do agravo em processo civil (art. 281.º deste Código), é o que consta das «normas sobre organização e processo nos tribunais administrativos e tributários» [art. 2.º, alínea c), do CPPT], em que se insere o referido art. 152.º do CPTA.
Assim, é de manter o decidido no despacho reclamado sobre este ponto.
3 – No despacho reclamado decidiu-se que, integrando o regime do recurso por oposição de acórdãos previsto no art. 284.º do CPPT com o regime previsto no art. 152.º para os recursos para uniformização de jurisprudência e tendo em conta as regras de competência para o conhecimento destes recursos previstas no ETAF de 2002 e as que vigoravam no ETAF de 1984, é de concluir que apenas serão invocáveis com fundamento do recurso acórdãos proferidos pela Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo (ou respectivo Pleno).
Escreveu-se no despacho reclamado:
À face dos arts. 22.º, 24.º e 30.º do ETAF de 1984, que estabelecem as competências dos plenos das secções e do Plenário do Supremo Tribunal Administrativo para a apreciação de recursos como fundamento em oposição de julgados, os recursos em que está em causa apreciar conflitos de jurisprudência entre acórdãos proferidos por formações especializadas de áreas diferentes, administrativa e fiscal, eram apreciados por uma formação, o Plenário, constituída por Juízes de ambas as áreas.
É uma solução legal de razoabilidade evidente, ainda vigente para os processos iniciados anteriores de 1-1-2004, pois, o facto de ter havido pronúncia sobre idêntica questão em ambas as áreas, que legislativamente se pretenderam especializadas, revela que se está perante questão para cuja resolução relevarão conhecimentos especializados em ambas as áreas, e, por isso, justifica-se que a uniformização jurisprudencial, que pretende ser uma orientação superior visando evitar ulteriores divergências jurisprudenciais entre os tribunais com competências nas duas áreas incluídas na jurisdição administrativa e fiscal, seja efectuada ua intervenção de uma formação do Supremo Tribunal Administrativo composta por Juízes de ambas as áreas. Com efeito, essa intervenção de uma formação composta por Juízes de ambas as áreas é manifestamente aconselhável para assegurar o acatamento generalizado da decisão uniformizadora em ambas as áreas, que é a finalidade visada por uma decisão uniformizadora gerada por um conflito de decisões proferidas em áreas diferentes, pois a potencial influência da decisão sobre a ulterior jurisprudência será tendencialmente maior, em ambas as áreas, se for proferida por Juízes a quem, pela posição que ocupam no topo da hierarquia dos tribunais administrativos e fiscais, é reconhecida superior competência profissional nessas áreas.
É esta também a regra adoptada em matéria de conflitos em razão da matéria, que são apreciados por formação que contenha elementos com especialização nas áreas em causa (art. 29.º do ETAF de 2002, art. 35.º, n.º 2, da LOFTJ).
No ETAF de 2002, o Plenário é a única formação composta por juízes de ambas as secções do Supremo Tribunal Administrativo (art. 28.º deste diploma), mas apenas lhe compete conhecer dos conflitos de jurisdição entre tribunais administrativos de círculo e tribunais tributários ou entre as Secções de Contencioso Administrativo e de Contencioso Tributário (art. 29.º do mesmo diploma).
Pelo que se referiu, o facto de no ETAF de 2002 não se ter incluído na competência do Plenário do Supremo Tribunal Administrativo a apreciação de recursos para uniformização de jurisprudência deve ser interpretado como expressão de uma intenção legislativa de não admitir recursos para uniformização com fundamento em decisões proferidas por formações do Supremo Tribunal Administrativo especializadas em áreas diferentes.
Aliás, o ETAF de 2002, em outras disposições confirma esse desígnio legislativo ao prever apenas situações de uniformização de jurisprudência no âmbito de cada uma das áreas da jurisdição administrativa e fiscal, como pode ver-se pelos seus arts. 23.º, n.º 1, alínea f), 36.º, n.º 1, alínea g), 43.º, n.º 3, alínea d).
Assim, é de concluir que, no âmbito do ETAF de 2002, não se previu a prolação de decisões uniformizadoras relativamente a divergências jurisprudenciais ocorridas em áreas diferentes da jurisdição administrativa e fiscal.
Consequentemente, devem interpretar-se restritivamente as referências que no n.º 1 do art. 152.º do CPTA se fazem a acórdãos em contradição com o recorrido como reportando-se apenas a decisões proferidas pela Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo e ou por uma das secções do contencioso administrativo dos Tribunais Centrais Administrativos.
E, obviamente, na aplicação subsidiária deste regime ao contencioso tributário, com as necessárias adaptações, devem restringir-se os acórdãos invocáveis como fundamento do recurso a acórdãos proferidos pelas secções do contencioso tributário do Supremo Tribunal Administrativo ou de um dos tribunais centrais administrativos.
O ora Reclamante, na presente reclamação, não esboça pôr em causa a correcção lógica desta argumentação, fazendo assentar a sua discordância em dois pontos:
– a interpretação perfilhada não tem um mínimo de correspondência na letra da lei (ponto 3.1. da douta reclamação);
– uma restrição sem qualquer apoio na letra da lei constitui uma restrição sem fundamento ao direito de acesso aos Tribunais, constitucionalmente consagrado, impossibilitando o Reclamante de obter tutela judicial efectiva (arts. 20.º e 268.º, n.º 4, da CRP) (ponto 3.2. da douta reclamação).
Apreciar-se-ão estes pontos separadamente.
4 – No despacho reclamado fez-se, como explicitamente nele se refere, uma interpretação restritiva da alínea b) do n.º 1 do art. 152.º do CPTA, explicando-se que há razões para limitar o alcance da referência a «acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo», no que se refere ao acórdão fundamento, como reportando-se a «acórdãos proferidos pela Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo» e, na adaptação da norma ao contencioso tributário, «acórdãos proferidos pela Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo».
O art. 9.º, n.º 2, do CC proíbe, efectivamente, interpretações que não tenham «na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.
Sobre a interpretação restritiva, ensina BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, página 186:
c) Interpretação restritiva: outras vezes, pelo contrário, o intérprete chega à conclusão de que o legislador adoptou um texto que atraiçoa o seu pensamento, na medida em que diz mais do que aquilo que se pretendia dizer. Também aqui a ratio legis terá uma palavra decisiva. O intérprete não deve deixar-se arrastar pelo alcance aparente do texto, mas deve restringir este em termos de o tornar compatível com o pensamento legislativo, isto é, com aquela ratio. O argumento em que assenta este tipo de interpretação costuma ser assim expresso: cessante ratione legis cessat eius dispositio (lá onde termina a razão de ser da lei termina o seu alcance).
Como se vê, a interpretação restritiva, por definição, é efectuada em situações em que a letra da lei não contém um elemento restritivo, mas o intérprete chega à conclusão que é necessário tê-lo em conta para que o texto se mostre compatível com o pensamento legislativo.
Se o elemento restritivo necessário para compatibilizar o texto com o pensamento legislativo consta do próprio texto, então não se estará a fazer uma interpretação restritiva, mas sim meramente literal ou declarativa.
Ora, a interpretação restritiva é, evidentemente, uma forma de interpretação não só admitida como imposta pelo art. 9.º, n.º 1, do CC, ao estabelecer, como primeira regra da interpretação jurídica que, «a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo».
Por outro lado, é também manifesto que a interpretação da referência a «acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo», feita na alínea b) do n.º 1 do art. 152.º do CPTA, como reportando-se, no contencioso administrativo, a «acórdão proferido pela Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo» e, na adaptação ao contencioso tributário, como significando «acórdão proferido pela Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo» tem no texto daquela norma muito mais que um mínimo de correspondência verbal: na verdade, é inquestionável que os acórdãos proferidos pela Secção do Contencioso Administrativo e pela Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo são «acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo», como se refere naquela alínea b) do n.º 1 do art. 152.º e são «acórdãos», como se exige no art. 284.º do CPPT.
Este ponto, relativo à admissibilidade da interpretação restritiva no nosso direito, é um ponto sobre o qual, são dispensáveis, obviamente, mais esclarecimentos.
5 – O Reclamante defende que a referida interpretação restritiva, por não ter apoio na letra da lei, viola do direito de acesso aos tribunais, constitucionalmente consagrado nos arts. 20.º, n. 1, e 268.º, n.º 4, da CRP, transcrevendo o art. 20.º, n.º 1, da CRP em que se refere que
A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos.
No caso em apreço, o ora Reclamante deduziu impugnação num Tribunal de 1.ª instância, recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo, o seu recurso foi apreciado quanto ao mérito e foi-lhe aberta a possibilidade de recorrer para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário, só lhe sendo recusada a utilização desta última possibilidade de apreciação por, na perspectiva subjacente ao despacho reclamado, o Reclamante não ter dado satisfação a um dos requisitos legais necessários para este tipo de recursos.
Mas, apesar disso, aqui está novamente o Supremo Tribunal Administrativo, ao proferir o presente acórdão, a apreciar a sua douta reclamação.
É difícil entender, neste contexto processual em que a pretensão do ora Reclamante foi apreciada, quanto ao seu mérito, num duplo grau de jurisdição, que possa afirmar-se que foi violado o direito de acesso aos tribunais para defesa dos direitos, pois o percurso processual que antecedeu o recurso para o Pleno constitui, precisamente, a materialização do exercício desse direito.
Por outro lado, quanto à não admissão do recurso para o Pleno, foi decidida por não estarem reunidos todas as condições legais que se entendeu serem legalmente, exigidos para o efeito, e, naturalmente, aquele direito de acesso aos tribunais, por exigência da própria optimização desse acesso em relação à generalidade dos cidadãos («a todos», como se diz naquele n.º 1 do art. 20.º), não pode deixar de ser um direito subordinado a condições.
Por outro lado, a satisfação daquele direito de acesso aos tribunais em processos de impugnação judicial de actos tributários não exige mais (antes exige menos) do que uma apreciação do mérito em dois graus, um dos quais a nível do Supremo Tribunal.
No que concerne ao direito de impugnação contenciosa de actos administrativos lesivos, reconhecido no art. 268.º, n.º 4, da CRP, não há dúvida de que ele foi satisfeito, pois foi apreciada jurisdicionalmente a impugnação apresentada pelo ora Reclamante.
Por isso, não ocorre violação do direito de acesso aos tribunais.
Termos em que acordam em indeferir a presente Reclamação.
Custas pelo Reclamante com taxa de justiça de 15 UC.
Lisboa, 14 de Julho de 2008. - Jorge de Sousa (relator) – António Calhau - Pimenta do Vale.