Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0682/18
Data do Acordão:09/21/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:COSTA REIS
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P23619
Nº do Documento:SA1201809210682
Data de Entrada:07/06/2018
Recorrente:A............
Recorrido 1:CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA FORMAÇÃO PRELIMINAR DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA:

I. RELATÓRIO

A………… intentou, no TAF de Castelo Branco, contra a CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES (CGA), acção administrativa especial onde formulou os seguintes pedidos:
a) Ser considerado nulo e de nenhum efeito o acto administrativo através do qual a Ré impõe ao Autor “(…) a reposição a esta Caixa das pensões, subsídios e prestações abonados até 31 de Março findo, que totalizam € 188.475,11. (…)”, por violação do que foi determinado por sentença (acórdão) transitada em julgado;
b) Ser reconhecido como válido, eficaz e não susceptível de impugnação o acto administrativo que levou ao reconhecimento da situação de aposentado do recorrente, sendo declarada inválida a declaração de nulidade daquele acto proferido no despacho recorrido;
c) Ser considerado nulo e de nenhum efeito, ou caso assim não se entenda, anulável, o acto de revogação do acto administrativo que levou ao reconhecimento da situação de aposentado do recorrente, por tal revogação não estar prevista na lei e por tal revogação ser legalmente inadmissível;
d) Deve, de imediato, ser a Ré condenada a repor ao Autor o pagamento pontual e periódico da sua pensão, tal como determinada no despacho de 6 de Fevereiro de 1998, até haver decisão transitada em julgado sobre a determinação do tempo de serviço, a ter lugar em incidente de liquidação em processo de execução e sentença, conforme doutamente determinado no âmbito do douto Acórdão do Tribunal Judicial de Elvas transita em julgado;
e) a pagar ao Autor a diferença entre o montante que lhe tem sido pago a título de pensão e aquilo que lhe seria devido nos termos do despacho datado de 6 de Fevereiro de 1998, com as respectivas actualizações, desde Abril de 2009, como se não tivesse sido proferido o despacho recorrido, acrescidas de juros vencidos e vincendos à taxa legal”.

O TAF, por decisão da Relatora, julgou a acção improcedente e, em consequência, absolveu a Ré dos pedidos.
O Autor reclamou para a Conferência dessa decisão mas a titular do processo não admitiu a reclamação atenta a sua extemporânea apresentação.
O Autor reclamou desse despacho da Relatora mas sem sucesso já que a Conferência confirmou a sua decisão.

O Autor apelou para o TCA Sul mas este negou provimento ao recurso.

É desse Acórdão que o Autor recorre (artigo 150.º/1 do CPTA).

II. MATÉRIA DE FACTO
Os factos provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

III. O DIREITO
1. As decisões proferidas pelos TCA em segundo grau de jurisdição não são, por via de regra, susceptíveis de recurso ordinário. Regra que sofre a excepção prevista no art.º 150.º/1 do CPTA onde se lê que daquelas decisões pode haver, «excepcionalmente», recurso de revista para o STA «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». O que significa que este recurso foi previsto como «válvula de segurança do sistema» para funcionar em situações excepcionais em que haja necessidade, pelas apontadas razões, de reponderar as decisões do TCA em segundo grau de jurisdição.
Deste modo, a pretensão manifestada pelo Recorrente só poderá ser acolhida se da análise dos termos em que o recurso vem interposto resultar que a questão nele colocada, pela sua relevância jurídica ou social, se reveste de importância fundamental ou que a sua admissão é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
Vejamos, pois, se tais requisitos se verificam in casu socorrendo-nos para isso da matéria de facto seleccionada no Acórdão recorrido.

2. O Autor intentou, no TAF de Castelo Branco, contra a CGA, acção onde, além do mais, pediu a declaração de nulidade, ou a anulação, da decisão da Ré que lhe ordenou a reposição de pensões, subsídios e prestações no valor de € 188.475,11 e o reconhecimento de que despacho da Ré que o colocou na situação de aposentado era válido, eficaz e não susceptível de impugnação.

O TAF, por sentença lavrada pela Relatora, julgou a acção improcedente, absolvendo a Ré dos pedidos.
O Autor reclamou para a Conferência mas, por despacho daquela Magistrada, a reclamação não foi admitida por ter sido extemporaneamente apresentada.
O Autor reclamou para a Conferência dessa não admissão, a qual identificou as questões a decidir como sendo (i) a consideração ou não do documento ora junto com a reclamação; (ii) a verificação ou não do alegado erro de julgamento assacado ao despacho reclamado; e (iii) a interpretação conforme à constituição ou não do art. 140.° do CPC no despacho reclamado.
As quais foram resolvidas do modo seguinte:
Quanto à primeira questão, sempre se diga que o documento ora junto com a presente reclamação não poderá ser tido em conta na apreciação que cumpre a esta Conferência fazer, porquanto tal documento não foi alvo de apreciação no despacho reclamado, e não se pode olvidar que a Conferência tem apenas por objecto de apreciação o próprio despacho reclamado ….
No tocante à segunda questão … considera-se que outra não poderia deixar de ser a solução tal como foi plasmada no despacho reclamado. ….. Importa referir, que quanto às testemunhas que foram arroladas com o requerimento no qual foi invocado justo impedimento, o despacho reclamado decidiu que tal justo impedimento não se verificava porque entendeu que a situação invocada não era subsumível, nem sequer em abstracto, ao conceito previsto no artigo 140.º, n.º 1, do CPC. Dito de outro modo, não foi o facto de as testemunhas não terem sido inquiridas que conduziu ao despacho reclamado, na medida em que o mesmo alicerçou-se na insuficiência ou inidoneidade do alegado e não na ausência de prova dos factos alegados.
Finalmente, no que respeita à terceira questão, e sem maiores delongas, do teor do despacho resulta que foi feita uma correcta interpretação do disposto no art.º 140.º do CPC, em conformidade com o art. 20.º da Constituição da República Portuguesa, não colhendo, também aqui, in totum, a argumentação do Reclamante.
Ante o exposto, e sem maiores delongas, não pode deixar de improceder a reclamação ora apresentada, por não assistir razão ao Reclamante; devendo, por conseguinte, ser mantido, na íntegra, o despacho reclamado.”

O Autor recorreu para o TCA mas este manteve aquela decisão pelas razões que se transcrevem:
“…
Como decorre da 1ª parte do art.º 140º, n° 2, do CPC a parte não deve ser admitida a praticar o acto fora do respectivo prazo enquanto não alegar e provar o justo impedimento a praticá-lo dentro do prazo. No preciso momento em que o interessado se apresenta para praticar o acto intempestivo, é que tem de fazer a alegação e prova do justo impedimento e, consoante jurisprudência uniforme, a doença do advogado da parte só constitui justo impedimento se for súbita e tão grave que o impossibilite, em absoluto, de praticar o acto, avisar o constituinte ou substabelecer o mandato.
Já no que tange ao indeferimento da produção da prova testemunhal sobre os factos alegados, uma vez que estes, ainda que viessem a ser provados, não poderiam constituir justo impedimento - tratando-se antes de um lapso seu ainda que desculpável - também entendemos que nada há que provar porquanto, a doença comprovada pela Ex.ma mandatária não terá os caracteres objectivos do justo impedimento, se não era um evento que obstasse à prática atempada do acto, não provando nem sequer alegando o requerente que devido à doença não pudesse substabelecer num colega, como lucidamente demonstrado na decisão recorrida.
Não se aceita, pois, que tal imponha a conclusão de que é por demais evidente, face ao que alegou e do que resulta dos próprios atestado médico, que a requerente não tinha a menor possibilidade em produzir as alegações naquele período de tempo, tendo sobretudo em conta o que a respeito se expendeu na decisão recorrida.
É que, enfatiza-se, dos termos do atestado não se pode, na verdade, deduzir que a requerente estivesse impossibilitada de substabelecer num colega e, neste particular, e na senda da decisão sob censura, estamos plenamente de acordo com ela quando afirma que a existência de uma dificuldade não é suficiente para se concluir que se está perante um evento que obsta a prática atempada do acto: é necessário verificar-se uma impossibilidade absoluta, um facto que obste à prática do acto, não bastando que o facto torne simplesmente mais difícil a prática do acto.
Assim sendo, o despacho recorrido não enferma de erro de julgamento ao indeferir, por extemporâneo, o requerimento de reclamação para a conferência em análise.”

3. O Recorrente discorda dessa decisão sustentando que a partir de meados de Novembro a sua mandatária “começou a sentir um cansaço excessivo e grande angústia, com dificuldades de concentração no trabalho, com ataques de pânico, que a impediam de se concentrar, traduzindo-se as mesmas em acelerações violentas do ritmo cardíaco e faltas de ar. A mandatária do recorrente contactou telefonicamente o seu médico de família no dia 6 de dezembro, que a aconselhou a parar completa e imediatamente qualquer atividade que tivesse a ver com o trabalho sob pena de se agravar bastante o seu estado de saúde, com consequências irreversíveis; a mandatária ora signatária não teve capacidade intelectual e/ou anímica para tomar uma atitude, designadamente informar o Recorrente do que se estava a passar ou substabelecer num Colega. Aliás, não haveria tempo para que outro advogado pudesse condignamente e sem saber nada do processo (que é complexo do ponto de vista de facto e de Direito), assumir a responsabilidade já no final do prazo, de elaborar a reclamação para a conferência; e a mandatária ora signatária não estava em condições nem sequer de emitir substabelecimento porque, mesmo esse ato implicaria algum esforço intelectual de contacto com o colega e explicação mínima do que estava em causa no processo.
Assim, a mandatária do Recorrente esteve incapacitada de cumprir o prazo de apresentação de reclamação para a conferência que terminaria no dia 9 de dezembro de 2013; nem foi possível praticar esse ato nos dias seguintes, uma vez que esteve incapacitada para o exercício de qualquer atividade intelectual desde o dia 6 de dezembro até à data em que praticou o dito ato (8 de janeiro de 2014).”

4. Conforme resulta do anterior relato a razão que o Recorrente vem, repetidamente, invocando para justificar a ocorrência do justo impedimento foi a doença da sua Mandatária e a impossibilidade da mesma poder substabelecer o seu mandato num Colega e dessa circunstância a ter impedido de apresentar tempestivamente as suas peças processuais.
Questão que foi apreciada pelo Acórdão recorrido tendo este, à semelhança do TAF, concluído que dos termos do atestado apresentado não se podia deduzir que a sua mandatária estivesse impossibilitada de substabelecer sendo certo, por outro lado, que só a impossibilidade absoluta da prática do acto podia ser justificativa do justo impedimento, não bastando que o facto tornasse mais difícil a prática do acto. Ora, daquele atestado não se podia concluir aquela impossibilidade absoluta. Ou seja, a questão suscitada nesta revista é a de saber se ocorreu uma situação que possa ser qualificada como justo impedimento.
As instâncias, como se viu, responderam negativamente a essa interrogação fazendo-o com larga citação de doutrina e de jurisprudência e com uma fundamentação jurídica semelhante e convincente. Sendo certo, por outro lado, que a questão do justo impedimento tem sido largamente tratada tanto pela jurisprudência dos Tribunais superiores como pela doutrina e que a solução que lhe vem dada não suscita divergências
Sendo assim, e sendo que decidiram segundo essa jurisprudência não se justifica a admissão da revista para uma melhor aplicação do direito.
Acresce que, atenta a multiplicidade de decisões sobre esta matéria, todas em sentido idêntico, a mesma não merece ser considerada de importância jurídica fundamental.

DECISÃO
Termos em que os Juízes que compõem este Tribunal acordam em não admitir a revista.
Custas pelo Recorrente.
Porto, 21 de Setembro de 2018. – Costa Reis (relator) – Madeira dos Santos – São Pedro.