Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0122/16
Data do Acordão:04/20/2016
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
PRESSUPOSTOS
ADMISSÃO
Sumário:É de admitir o recurso de revista excepcional em que se coloca questão de saber se à isenção de IMI relativa a pessoas colectivas de utilidade pública (PCUP) se aplica, a partir de 1/12/2003 (data do início da vigência do CIMI, em substituição do CCA), o disposto na al. d) do art. 1º, da Lei nº 151/99, de 14/9, ou se aplica o disposto na al. e) do art. 44º do EBF ou, ainda, se ambos os regimes serão aplicáveis; bem como saber que realidades estão subsumidas na expressão legal «prédios destinados directamente à realização dos seus fins», prevista na al. e) do nº 1 do art. 44º do EBF, por se tratar de questão de relevância social de importância fundamental e com um amplo interesse objectivo (transpõe os limites do caso concreto aqui em apreciação, constituindo um caso “tipo” que se repete e previsivelmente continuará a repetir-se) e já que não se conhece pronúncia do STA sobre a matéria.
Nº Convencional:JSTA000P20399
Nº do Documento:SA2201604200122
Data de Entrada:02/02/2016
Recorrente:CAIXA ECONÓMICA MONTEPIO GERAL
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, na formação a que se refere o actual nº 6 do art. 150º do CPTA:

RELATÓRIO
1.1. Caixa Económica Montepio Geral (CEMG), com os demais sinais dos autos, vem interpor recurso de revista excepcional, nos termos do art. 150º do CPTA, do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte em 25/6/2015, no processo que aí correu termos sob o nº 1062/12.3BEAVR.

1.2. Invoca que a revista deve ser admitida, porquanto a questão de fundo objecto de pedido de apreciação jurisdicional é uma questão que, pela sua relevância jurídica e social, reveste importância fundamental e porquanto a admissão deste recurso é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, pois que:
a) O que está em causa nestes autos é, imediatamente, firmar jurisprudência quanto à aplicação da alínea d) do artigo 1º da Lei 151/99 de 14.09 e/ou da alínea e) do nº 1 do actual artigo 44º do EBF, ou ambas as disposições, ou seja, a amplitude da isenção de IMI das PCUP;
b) A manter-se a jurisprudência do acórdão recorrido, ao nível mediato, também as IPSS que são ope legis PCUP (salvo as misericórdias) verão a isenção de IMI restringida, uma vez que o benefício da alínea f) do nº 1 do actual artigo 44º do EBF, além de ter a mesma redacção no que ao caso interessa, funciona nos mesmos moldes, como resulta da alínea b) do nº 2 e nº 4, ambos do artigo 44º do EBF;
c) E nem a AT aplica a lei, pelo menos às IPSS, com a limitação que resulta do acórdão recorrido, o que é de conhecimento público;
d) Existem em Portugal milhares de entidades com o estatuto de pessoas colectivas de utilidade pública (PCUP) tal como a recorrente e milhares de IPSS (que são, presume-se, PCUP e podem usar o benefício enquanto tal, porque menos restritivo);
e) Não há jurisprudência fixada e uniforme no que tange às isenções de IMI de que beneficiam as PCUP (incluindo as IPSS);
f) Existem múltiplas decisões dos TAF e agora do TCANorte sobre a matéria, ainda não transitadas, sendo que ao nível dos TAF a maioria são no sentido propugnado pela aqui recorrente.
- Por outro lado, como adiante se expõe, o douto acórdão aplica a Lei de forma manifestamente errada ou juridicamente insustentável.
- Tal jurisprudência a fixar-se traria grande alteração da forma como a AT está (a) aplicar a lei (pelo menos quanto às IPSS) restringindo a amplitude do benefício fiscal e com isso causando alarde social no seio das PCUP e IPSS, já de si entidades com debilidades económicas.
- Acresce que, ao nível dos TAF, como resulta das decisões já juntas aos autos (...) há correntes jurisprudenciais diferentes, criando grande incerteza e instabilidade, o que só por si merece a intervenção do órgão de cúpula da justiça fiscal como condição para dissipar dúvidas.
Pede que o recurso seja admitido e lhe seja dado provimento.
E alega, em seguida, quanto ao mérito do recurso, formulando também as respectivas Conclusões.

1.3. Contra-alegou a AT formulando, a final, as conclusões seguintes:
A) A Recorrente interpôs o presente recurso mas nem sequer demonstra que se encontram preenchidos os requisitos exigidos pelo art. 150º do CPTA, pelo que o presente recurso de revista não deve, ser admitido.
B) A questão que a Recorrente pretende seja considerada pelo Tribunal “ad quem” no presente recurso de revista é, pois, a de que: “As questões em discussão, s.m.o. subsumíveis a erros de direito, estão clarificadas no douto acórdão do TCA Norte recorrido, a saber: a) Às isenções de IMI das PCUP, a partir de 01.12.2003 (data da introdução do CIMI em substituição do CCA) aplica-se a alínea d) do artigo 1º da Lei 151/99 de 14/09 e/ou a alínea e) do nº 1 do actual artigo 44º do EBF? b) Caso se conclua que se aplica apenas a alínea e) do nº 1 do actual artigo 44º do EBF, o que deve entender-se por “prédios destinados directamente à realização dos seus fins”? O douto acórdão aplica a lei de forma manifestamente errada ou juridicamente insustentável.”
C) Como se viu, a questão apresentada pelo Recorrente não assume relevância jurídica ou social, aferida em termos da utilidade jurídica, com capacidade de expansão da controvérsia que ultrapasse os limites da situação singular, pois o Acórdão recorrido limitou-se a aplicar as normas adequadamente, cumprindo todos os princípios constitucionais.
D) Além do que, nem decorre, da interposição do presente recurso, a possibilidade de melhor aplicação do direito, dado que o Acórdão recorrido nada mais fez do que, aplicar correctamente as normas legais aplicáveis, à situação em concreto, não se vislumbrando a necessidade de uniformização do mesmo direito.
E) Aliás, a jurisprudência tem sido unânime quanto à excepcionalidade deste tipo de recurso, sendo a sua admissibilidade como refere, entre outros, o Acórdão nº 0400/15 de 09/09/2015 do STA: “...sendo a sua admissibilidade condicionada não por critérios quantitativos mas por um critério qualitativo - o de que em causa esteja a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito - devendo este recurso funcionar como uma válvula de segurança do sistema e não como uma instância generalizada de recurso.”
F) E, prossegue o douto Acórdão: “E, na interpretação dos conceitos a que o legislador recorre na definição do critério qualitativo de admissibilidade deste recurso, constitui jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal Administrativo - cfr., por todos, o recente Acórdão deste STA de 2 de abril de 2014, rec. n.º 1853/13 - que «(...) o preenchimento do conceito indeterminado de relevância jurídica fundamental verificar-se-á, designadamente, quando a questão a apreciar seja de elevada complexidade ou, pelo menos, de complexidade jurídica superior ao comum, seja por força da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de um enquadramento normativo especialmente intricado ou da necessidade de concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, ou quando o tratamento da matéria tem suscitado dúvidas sérias quer ao nível da jurisprudência quer ao nível da doutrina. Já relevância social fundamental verificar-se-á quando a situação apresente contornos indiciadores de que a solução pode constituir uma orientação para a apreciação de outros casos, ou quando esteja em causa questão que revele especial capacidade de repercussão social, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio. Por outro lado, a clara necessidade da admissão da revista para melhor aplicação do direito há-de resultar da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros e consequente necessidade de garantir a uniformização do direito em matérias importantes tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória - nomeadamente por se verificar a divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais e se ter gerado incerteza e instabilidade na sua resolução a impor a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa e tributária como condição para dissipar dúvidas - ou por as instâncias terem tratado a matéria de forma ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, sendo objectivamente útil a intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do sistema
G) Pelo que, não deve ser admitido o presente recurso de revista, uma vez que a questão objecto do mesmo não preenche os requisitos previstos no artigo 150º do CPTA.
H) Aliás, limita-se, no recurso de revista, a reiterar a posição antes assumida, não fazendo sequer referência à verificação dos pressupostos de admissibilidade do Recurso.
I) Impunha-se que a Recorrente ao lançar mão deste meio de recurso, que fundamentasse as razões pelas quais entendia que o recurso deveria ser admitido.
J) Na verdade, da leitura das alegações de recurso, apenas manifesta discordância com o teor do acórdão recorrido.
K) A Recorrente, nem sequer faz qualquer alusão nas conclusões de recurso quanto à verificação dos pressupostos da admissão da revista.
L) Ora, tal como impõe o artigo 639º do CPC são as conclusões de recurso que delimitam e definem o seu objecto, razão pela qual, se nada foi alegado neste sentido não deve recurso ser admitido.
M) Por tudo o supra exposto, e uma vez que a Recorrente incumpriu o ónus imposto pelo n.º 2, do artigo 672.º, do CPC aplicável ex vi artigo 1.º, do CPTA, aplicável ex vi n.º 2, do artigo 279.º, do CPPT o recurso de revista interposto pela Recorrente deve ser rejeitado;
N) Ainda que se admitisse que tal ónus havia sido observado - o que por mera hipótese de raciocínio se concede -, não se verifica in casu qualquer dos requisitos elencados pelo artigo 150º, do CPTA para que a revista seja admitida;
O) Em causa não está uma questão jurídica fundamental, porquanto a apreciação de uma isenção de IMI, ou o preenchimento de pressupostos objectivos da concessão de benefícios, não reveste de elevada complexidade jurídica, não exigindo, para ser solucionada, de difíceis operações exegéticas, nem um enquadramento jurídico especialmente intricado, nem, ainda, a concatenação de diversos regimes legais ou institutos jurídicos;
P) Como se retira, aliás, da jurisprudência unânime, pacífica e recentemente proferida pelo TCA Norte, e que vem interpretando e aplicando de forma adequada a legislação em causa nos presentes autos.
Q) Assim, se reafirma que, não existindo divergência do acórdão recorrido relativamente à jurisprudência do TCA Norte proferida em inúmeras situações idênticas à dos autos, não estamos perante uma questão jurídica fundamental, porquanto não reveste de elevada complexidade jurídica, nem complexidade jurídica superior ao comum.
R) Não se trata, igualmente, de uma questão de relevância social fundamental, nem qualquer repercussão social porquanto não se vislumbra a necessidade de intervenção do STA;
S) Acresce que a admissão da revista não se afigura claramente necessária, dado que, a jurisprudência do TCA norte veio consolidar uma única corrente de decisão, razão pela qual se nos afigura que a motivação do presente recurso, salvo o devido respeito, se prende unicamente com a discordância da recorrente com o acórdão recorrido, conforme se retira das alegações de recurso.
T) Pelo exposto, não deve ser admitido o presente recurso de revista, uma vez que a questão objecto do mesmo não preenche os requisitos previstos no artigo 150° do CPTA.
U) Salvo o devido respeito, também quanto ao mérito do recurso, a Recorrente não tem razão nos argumentos que aduz, desde logo, porque contrariamente ao que defende, o Acórdão recorrido fez uma correcta aplicação e interpretação da lei, nomeadamente das disposições indicadas pelo Recorrente, a Lei nº 151/99 de 14/09 e o artigo 44º/1 al.e) do EBF, aos factos, pelo que se deve manter nos seus precisos termos.
V) À questão que considerou fundamental, o Acórdão recorrido vem referir o seguinte: “a questão jurídica fundamental é a de saber se o acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou procedente o pedido de anulação da decisão que confirmou hierarquicamente o indeferimento do pedido de isenção de imposto municipal sobre a fracção e condenou a ora Recorrente a emitir novo acto com as vinculações explanadas no acórdão recorrido, padece de erro de julgamento de direito. (…) Para a resolução desta questão identificamos dois problemas jurídicos fundamentais: o problema se saber qual a lei aplicável [ou seja, o de saber se é aplicável a alínea d) do artigo 1º da Lei nº 151/99 de 14 de Setembro, ou a alínea e) do nº 1 do artigo 44º do Estatuto dos Benefícios Fiscais - redacção em vigor - ou ambas] e o problema de saber se, a ser aplicável (apenas) a alínea e) do nº 1 do artigo 44º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, o que se deve entender por «prédios destinados directamente à realização dos seus fins» para efeitos deste normativo.”
W) Tendo concluído aquele Acórdão “(...) À luz de tal justificação e da interpretação que fazemos da lei aplicável, é notório que a Recorrida não tem direito à isenção. Porque invoca como fundamento do seu direito não a afectação do imóvel a fins de utilidade pública, mas a afectação a esses fins dos rendimentos eventuais que consiga extrair da afectação desse imóvel a outros fins.”
X) Quanto à interpretação da alínea e) do nº 1 do artigo 44º do EBF, considerou o Acórdão recorrido estarmos perante uma isenção mista (subjectivo e objectivo), sendo que o pressuposto subjectivo deste benefício fiscal nunca esteve em causa.
Y) O litígio centrou-se no pressuposto objectivo - na questão do destino do imóvel em causa à directa realização dos seus fins, nos termos da parte final da alínea e) do nº 1 do artigo 44º do EBF.
Z) Refere o Acórdão: “…a interpretação que fazemos deste segmento do dispositivo é a de que só se verifica o pressuposto objectivo do benefício se os próprios prédios forem destinados à realização dos fins prosseguidos pelas pessoas colectivas de utilidade pública. E já não assim quando as pessoas colectivas de utilidade pública destinem à realização desses fins os rendimentos obtidos com a alienação ou oneração desses prédios.” (...) Ora, do teor da lei resulta que tem que existir uma relação directa entre o destino dos prédios e os fins prosseguidos pela pessoa colectiva. Sendo que essa relação só é directa quando resulta da própria afectação ou utilização do prédio. Já quando são os rendimentos do prédio que estão afectos a utilidade pública da pessoa colectiva, a relação entre o prédio e os fins de utilidade pública não é directa, mas indirecta.”
AA) A Recorrente ao invocar como fundamento do seu direito, não a afectação do imóvel a fins de utilidade pública, mas a afectação a esses fins dos rendimentos eventuais que consiga extrair da afectação desse imóvel a outros fins, é motivo justificativo para que a isenção em causa não lhe seja concedida.
BB) Por tudo o supra exposto, verifica-se que o Acórdão ora recorrido fez uma correcta interpretação e aplicação da lei, nomeadamente das disposições indicadas pelo Recorrente, o artigo 44º/1 al. e) do EBF e o artigo 1º, alínea d) da Lei nº 151/99 de 14/09, aos factos, pelo que, se deve manter nos seus precisos termos.
Termina invocando que não deve ser admitido o presente recurso de revista, por não se encontrarem preenchidos os requisitos do art. 150° do CPTA e que, caso assim não se entenda, não deve o mesmo proceder.

1.4. O MP emite Parecer, nos termos seguintes:
«1. A intervenção do Ministério Público nos recursos jurisdicionais interpostos no âmbito do CPTA é subsequente à sua notificação (art. 146º nº 1 CPTA).
2. O Ministério Público suscita expressamente questão de inconstitucionalidade, nos seguintes termos:
O recurso de revista de acórdãos dos tribunais centrais administrativos é característico da jurisdição administrativa, como claramente resulta de:
a) inexistência no contencioso tributário de norma de competência paralela à constante do art. 24º nº 2 ETAF 2002 (cf. art. 26º ETAF 2002);
b) impossibilidade de integração da lacuna por via de interpretação analógica ou extensiva da norma citada, recusada pelos princípios hermenêuticos;
e) composição da formação incumbida da apreciação preliminar sumária dos pressupostos substantivos do recurso: três juízes de entre os mais antigos da Secção de Contencioso Administrativo (art. 150º nº 5 CPTA);
d) inexistência no Contencioso Tributário de espécie paralela à 7ª espécie da Secção de Contencioso Administrativo (recursos de revista de acórdãos dos tribunais centrais administrativos; cfr. deliberação do CSATF nº 1313/2004, 26 janeiro 2004).
e) persistência da inexistência da citada espécie após a recente reformulação de critérios de classificação pela deliberação do CSTAF nº 2186/2015, 24 novembro 2015 (Diário da República, 2ª série - nº 235 - 1 dezembro 2015).
No sentido da inaplicabilidade do recurso de revista no contencioso tributário pronuncia-se doutrina qualificada (José Casalta Nabais Considerações sobre o Anteprojecto de revisão da Lei Geral Tributária e do Código de Procedimento e de Processo Tributário Cadernos de Justiça Administrativa nº 61 Janeiro /Fevereiro 2007 p. 13; Jorge Lopes de Sousa Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado 6ª edição 2011 Volume IV anotação 37 ao art. 279º CPPT p. 390).
Neste contexto deve ser recusado o conhecimento do objecto do recurso, com fundamento na inconstitucionalidade das seguintes normas:
- norma constante do art. 150º nº 1 CPTA, na interpretação segundo a qual a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo é competente em razão da matéria para o conhecimento de recurso de revista interposto de acórdão proferido pela Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo, por violação da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República sobre organização e competência dos tribunais (art. 165º nº 1 al. p) CRP numeração RC/97).
- norma constante do art. 26º al. h) ETAF 2004 (aprovado pela Lei nº 13/2002, 19 fevereiro), na interpretação segundo a qual a competência para o conhecimento do recurso de revista é deferida pela norma constante do art. 150º nº 1 CPTA, por violação da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República sobre organização e competência dos tribunais (art. 165º nº 1 al. p) CRP numeração RC/97).
3. Sem prescindir
A intervenção processual do Ministério Público, circunscrevendo-se à apreciação do mérito do recurso, é posterior à apreciação preliminar sumária sobre a verificação dos pressupostos para conhecimento do recurso, por formação constituída pelos três juízes mais antigos da secção (arts. 146º nº 1 e 150º nº 5 CPTA).»

1.5. Corridos os vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2. Nas instâncias julgaram-se provados os factos seguintes [a al. N) foi aditada pelo TCAN ao abrigo do nº 1 do art. 662º do CPC]:
A) Em 03/05/2012 a Autora requereu ao Chefe do Serviço de Finanças de Oliveira de Azeméis o reconhecimento oficioso da isenção de Imposto Municipal sobre Imóveis, com efeitos a partir do ano de aquisição do imóvel, relativamente ao prédio urbano inscrito na matriz da freguesia de ……….., Concelho de Oliveira de Azeméis sob o artigo nº 4479º fracção C, (fls. 12 a 14 dos Autos);
B) Por ofício de 21/05/2012 do Serviço de Finanças de Oliveira de Azeméis a Autora foi notificada do projecto de decisão de indeferimento do pedido de isenção, com os seguintes Fundamentos “O sujeito passivo deverá provar a directa afectação aos fins estatutários” (fls. 15 dos Autos);
C) Por requerimento datado de 22/05/2012 a Autora exerceu o seu direito de audição, invocando que o imóvel se destina directa e imediatamente aos fins da CEMG, dado que as mais-valias realizáveis com a alienação do imóvel, bem como eventuais rendimentos resultantes de arrendamento temporário são transferidos, como resultados da Caixa, para o Montepio, bem como que a alínea d) do art. 1.º da Lei 151/99, de 04-09 não obriga a que os prédios se destinem “directamente” à realização dos fins das IPSS e PCUP e que o entendimento da DGI vai no sentido de que as entidades referidas no actual artigo 44º do EBF poderão beneficiar de CA (actual IMI) desde que os prédios de que são proprietários e os respectivos rendimentos sejam afectos directa e imediatamente aos seus fins estatutários (fls. 16 a 17 dos Autos);
D) Por ofício de 24/05/2012 do Serviço de Finanças de Oliveira de Azeméis a Autora foi notificada da decisão de indeferimento do pedido de isenção proferida em 24/05/2012, convertendo em definitivo o projecto de decisão, por não ter sido provada a directa afectação aos fins estatutários na defesa apresentada (fls. 18 dos Autos);
E) Em 29/05/2012 a Autora recorreu hierarquicamente da decisão de indeferimento da isenção de IMI a que se refere o ponto anterior, reproduzindo os argumentos utilizados em sede da audição prévia antecedente (fls. 19 a 20 dos Autos);
F) Por decisão proferida em 14/09/2012 pela Subdirectora-Geral dos Impostos foi indeferido o recurso hierárquico com os seguintes fundamentos: “(...) Para efeitos da referida isenção, o prédio tem ser afecto directamente à realização dos fins estatutários do Montepio Geral - Associação Mutualista, Instituição Particular de Solidariedade Social, situação que não se verifica, dado o prédio não estar a ser utilizado para os fins da instituição, mas tendo como objectivo a sua alienação para a eventual realização de mais-valias, por parte da Instituição Financeira - Caixa Económica Montepio Geral” (fls. 21 a 26 dos Autos e PA apenso não numerado);
G) Em 18/12/2012 a Autora apresentou a petição inicial da presente acção no Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro (fls. 2 dos Autos);
H) Por despacho concordante de 08/10/1991, proferido pelo Primeiro-Ministro, foi deferido o pedido à Caixa Económica de Lisboa, anterior designação da actual Caixa Económica Montepio Geral, formulado em 31/05/1990, de concessão de declaração de utilidade pública nos termos do Decreto-Lei nº 460/77, de 7 de Novembro (fls. 33 a 34 dos Autos, DR n.º 243, II Série, de 22/10/1991, e DR n.º 205, III Série, de 06/09/1991);
I) Nos termos dos artigos 4º e 5º dos Estatutos da Caixa Económica Montepio Geral vigentes desde 01/08/1999, a mesma foi constituída com a finalidade de pôr à disposição do Montepio Geral os resultados dos seus exercícios, feitas as deduções estatutariamente previstas, para que este os aplique na satisfação dos seus fins, estando anexa ao Montepio Geral, seu fundador, o que se traduz na afetação de resultados e na comunhão, por ambas as instituições, dos titulares dos correspondentes Órgãos Institucionais (admitido e publicação disponível em https://www.montepio.pt/iwov-resources/SitePublico/documentos/pt_PT/
institucional/estatutos-montepio/Estatutos-CaixaEconomicaMontepioGeral.pdf);
J) Nos termos do artigo 36º dos Estatutos referidos, os resultados da Caixa Económica apurados em cada exercício terão a seguinte afectação: Um mínimo de 20% para a reserva legal, um mínimo de 5% para a reserva especial, as importâncias necessárias para outras reservas e o remanescente para o Montepio Geral (admitido e publicação disponível em https://www.montepio.pt/iwovresources/SitePublico/documentos/pt_PT/institucional/estatutos-montepio/Estatutos-CaixaEconomicaMontepioGeral.pdf);
K) Nos termos do artigo 2º dos Estatutos do Montepio Geral - Associação Mutualista, vigentes desde 1998, são, designadamente, fins do Montepio Geral:
a) Conceder e garantir, através de modalidades individuais e colectivas, benefícios de segurança social e de saúde destinados a prevenir ou a reparar as consequências da verificação de factos contingentes relativos à vida e à saúde dos associados e seus familiares e dos beneficiários por aqueles designados;
b) Prosseguir outras formas de protecção social e de promoção da melhoria da qualidade de vida, através da organização e gestão de equipamentos, serviços e obras sociais e outras actividades que visem principalmente o desenvolvimento cultural, moral, intelectual e físico dos associados e seus familiares, e dos beneficiários por aqueles designados, em especial das crianças, jovens, idosos e deficientes;
c) Contribuir para a resolução dos problemas habitacionais dos associados;
d) Gerir regimes profissionais complementares das prestações garantidas pela segurança social e outras formas colectivas de protecção social.” (admitido e publicação disponível em https://www.montepio.pt/iwovresources/SitePublico/documentos/pt_PT/
institucional/estatutos-montepio/associacao-mutualista-estatutos.pdf);
L) Nos termos do artigo 3º nº 1 dos Estatutos do Montepio Geral - Associação Mutualista, o Montepio Geral, para auxiliar a realização dos seus fins:
a) Dispõe de uma caixa económica anexa, com personalidade jurídica e estatutos próprios, denominada Caixa Económica Montepio Geral;
b) Pode criar estabelecimentos dele dependentes;
c) Pode constituir rendas vitalícias;
d) Pode deter participações financeiras.” (admitido e publicação disponível em https://www.montepio.pt/iwovresources/SitePublico/documentos/pt_PT/institucional/
estatutos-montepio/associação-mutualista-estatutos.pdf);
M) Nos termos do artigo 3º nº 2 dos Estatutos do Montepio Geral - Associação Mutualista, o Montepio Geral, e para a prossecução dos seus fins pode, designadamente:
a) Fazer aplicações mobiliárias e imobiliárias;
b) Contrair empréstimos;
c) Desenvolver outras iniciativas e realizar todos os actos e contratos legalmente permitidos.” (admitido e publicação disponível em https://www.montepio.pt/iwov-resources/SitePublico/documentos/pt_PT/institucional/estatutos-montepio/associação-mutualista-estatutos.pdf).
N) Em 27.04.2012, a Caixa Económica Montepio Geral, adquiriu a fração autónoma designada pela letra “C” do prédio urbano, inscrito na matriz predial sob o n.º 4479, da freguesia da Vila ………….. e concelho de Oliveira de Azeméis. (Cfr. fls. 23 e 24 dos autos).

3.1. Por acórdão proferido no TAF de Aveiro em 22/12/2014 foi julgada procedente a acção administrativa especial que a ora recorrente - Caixa Económica Montepio Geral (CEMG) - deduziu com vista à anulação do acto de indeferimento de recurso hierárquico, praticado pela Subdirectora-Geral dos Impostos, relativo a benefício fiscal consubstanciado na isenção de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) relativamente a prédio urbano, requerido ao abrigo da al. d) do art. 1° da Lei n° 151/99, de 14/9, e da al. e) do n° 1 e al. b) do n° 2 e n° 4 do art. 44° do Estatuto do Benefícios Fiscais (EBF) e a substituição do mesmo por outro que confira a isenção de IMI ao imóvel em causa.
Dessa decisão do TAF de Aveiro a AT interpôs recurso para o TCA Norte onde, por acórdão de 25/6/2015 (fls. 265/273), foi tal recurso julgado procedente, com fundamento em que o disposto na al. d) do nº 1 do art. 169º da Lei nº 151/99, de 14/9, não se aplica a pedido de isenção de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), mas sim de Contribuição Autárquica (CA), pois que, sendo aquela isenção de IMI regulada na al. e) do nº 1 do art. 44º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), e dado que o prédio em causa não está destinado directamente à realização dos fins da CEMG), então, não goza de isenção de IMI.

3.2. O MM sustenta que o recurso de revista previsto no art. 150º do CPTA não é admissível em sede de contencioso tributário.
A recorrente, por sua vez, sustenta que se verificam os requisitos de admissibilidade do recurso excepcional de revista (art. 150º do CPTA).
O recorrido (Director-Geral da ATA) entende que não se verificam esses requisitos e que a recorrente nem sequer os invocou.
Vejamos, pois.

3.3. Antes de mais, importa apreciar a questão, suscitada pelo MP, da inadmissibilidade do recurso excepcional de revista em sede de contencioso tributário.
Alega o MP a inconstitucionalidade, (i) quer da norma constante do nº 1 do art. 150° do CPTA, na interpretação segundo a qual a Secção de Contencioso Tributário do STA é competente em razão da matéria para o conhecimento de recurso de revista interposto de acórdão proferido pela Secção de Contencioso Tributário do TCA, (ii) quer da norma constante da al. h) do art. 26° do ETAF de 2004 (aprovado pela Lei n° 13/2002, de 19/2), na interpretação segundo a qual a competência para o conhecimento do recurso de revista é deferida pela norma constante do art. 150° n° 1 do CPTA, inconstitucionalidades estas resultantes da violação da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República sobre organização e competência dos tribunais (al. p), do nº 1, do art. 165° da CRP, numeração da RC/97).
Ora, abreviando razões, dir-se-á que não obstante alguma doutrina sustentar a inadmissibilidade desta espécie de recurso em contencioso tributário (cfr. Casalta Nabais, Cadernos de Justiça Administrativa, nº 61- Janeiro/Fevereiro de 2007, p. 13; bem como, Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Vol. IV, 6ª edição, Áreas Editora, 2011, anotação V-37-a) ao art. 279º, p. 390), o que é verdade é que a jurisprudência recente e maioritária deste STA se consolidou no sentido de que é admissível no contencioso tributário este recurso excepcional de revista previsto no art. 150º do CPTA (cfr., entre muitos outros, os acs. desta Secção do STA, de 4/10/2006, rec. nº 854/06; de 29/11/2006, rec. nº 729/06; de 12/12/2006, rec. nº 584/06; de 30/5/2007, rec. nº 257/07; de 30/5/2007, rec. nº 285/07; de 2/7/2008, rec. nº 173/08; de 14/7/2008, rec. nº 0410/08; de 16/11/2011, rec. nº 0740/11; de 14/12/2011, rec. nº 01075/11; de 12/1/2012, rec. nº 0899/11; de 12/1/2012, rec. nº 01139/11; de 7/3/2012, rec. nº 1108/11; de 14/3/2012, rec. nº 1110/11; de 21/3/2012, rec. nº 84/12; de 26/4/2012, recs. nºs. 1140/11, 237/12 e 284/12; de 16/5/2012, recs. nºs. 0357/12 e 083/12; de 23/5/2012, rec. nº 0434/12; de 30/5/2012, rec. nº 0415/12; de 15/5/2013, rec. nº 01368/12; de 7/1/2015, rec. nº 0285/14; de 14/1/2015, rec. nº 01192/14; e de 8/7/2015, no rec. nº 0365/13, cuja fundamentação aqui mais uma vez se acolhe e reitera, visto também o disposto nº 3 do art. 8º do C.Civil).
Na verdade, como ali se considera, «a admissibilidade deste recurso no contencioso tributário tem sustentáculo formal no art. nº 26º, alínea h), do ETAF, e no art. 2º, alínea c), do CPPT, já que a remissão a que se refere esta alínea c) tem natureza dinâmica e não estática: as normas sobre processo nos tribunais administrativos são presentemente as constantes do CPTA e não as da LPTA.
Como se deixou afirmado nesses acórdãos, «quanto ao facto de no art. 26º do ETAF, em que se fixa a competência da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, não existir norma semelhante à do art. 24º, nº 2, nem existir qualquer remissão para o regime daquele art. 150º, não nos parece significativo.
Isto porque o art. nº 26º, alínea h), estabelece que à Secção de Contencioso Tributário cabe conhecer “De outras matérias que lhe sejam deferidas por lei”. Ora, sendo aplicáveis por remissão do art. 2º, alínea c), do CPPT, as normas do CPTA, onde se inclui o art. 150º citado, tratando-se de matéria tributária, fica estabelecida por lei a competência da referida Secção.
Também não nos parece colher qualquer apoio o argumento de que “o acesso ao STA, para os processos tribunais tributários, está muito mais aberto do que o está no contencioso administrativo, em face da possibilidade de recurso per saltum de decisões dos tribunais tributários sem as limitações que, para o contencioso administrativo, se prevêem no art. 151º, abertura cuja amplitude se estende até possibilidade de acesso ao Supremo Tribunal Administrativo em processos de valor não superior à alçada dos tribunais tributários (art. 280º, nº 5, do CPPT).”
Com efeito, o recurso excepcional de revista tem fundamentos específicos que em nada se assemelham ao recurso “per saltum” para a 2ª Secção do STA que é um recurso ordinário.
De qualquer forma, o que está em causa no recurso excepcional de revista são decisões dos tribunais centrais administrativos e não dos tribunais de 1ª instância.
E que dizer do argumento de que “mantém-se a admissibilidade generalizada de recurso de decisões dos tribunais centrais administrativos proferidas em processos instaurados antes de 15-9-1997, assegurada pelo art. 120º do ETAF de 1984”. Trata-se de uma garantia do passado. Mas para o futuro? Por que razão há-de ser negado aos administrados contribuintes um direito de que gozam os outros cidadãos (administrados)?
Por outro lado, e conforme se refere no acórdão transcrito, o recurso excepcional de revista, não visa a uniformização de jurisprudência, não existindo, por isso, qualquer incompatibilidade ou sobreposição com o regime de recurso previsto no art. 284º do CPPT.
De qualquer forma, se dúvidas pudessem ainda existir quanto à aplicação do recurso excepcional de revista, previsto no art. 150º do CPTA, ao processo judicial tributário, após as alterações ao CPC operadas pelo DL nº 303/2007, de 24 de Agosto, o referido recurso teria sempre de ser admitido por aplicação subsidiária do art. 2º, alínea e) do CPPT.
É que, se a existência de tal recurso, anteriormente, apenas em contencioso administrativo, poderia gerar questões de inconstitucionalidade, por discriminação dos cidadãos, como salientava Lebre de Freitas, (Código de Processo Civil Anotado, pág. 116.) sendo agora tal recurso admitido no processo civil, não faria sentido excluí-lo do processo judicial tributário. Tal traduziria, nitidamente violação do direito à tutela jurisdicional efectiva e ao princípio da igualdade constantes dos arts. 13º, nº 1 e 268º, nº 4 da CRP.».
Torna-se, assim, claro que o recurso excepcional de revista é admissível no contencioso tributário, não por via da interpretação analógica ou extensiva do art. 24º, nº 2, do ETAF de 2002, mas antes por força da aplicação da norma contida no art. 26º, alínea h), do mesmo ETAF e por força da expressa remissão para as normas do CPTA e do CPC contidas nas alíneas c) e e) do art. 2º do CPPT.
Neste contexto, cai imediatamente por terra a questão da inconstitucionalidade de natureza orgânica invocada, na medida em que ela tinha por pressuposto a aplicabilidade a esta Secção de Contencioso Tributário da norma de competência contida no art. 24º, nº 2, do ETAF.» (citado acórdão de 15/5/2013, rec. nº 01368/12).
Em suma, dado que, por um lado, este recurso é admissível no contencioso tributário por força da aplicação da norma contida na al. h) do art. 26º do ETAF de 2002 (e não por via da interpretação analógica ou extensiva do nº 2 do seu art. 24º) e dado que, por outro lado, é inquestionável que aquele art. 26º do ETAF, fixando a competência da Secção do Contencioso Tributário do STA, estabelece na al. h) que cumpre a esta Secção conhecer «De outras matérias que lhe sejam deferidas por lei», e que as als. c) e e) do art. 2º do CPPT contêm expressa remissão para as normas do CPC e do CPTA (e, por conseguinte, também para o art. 150º deste último diploma legal), fica claro que a competência desta Secção de Contencioso Tributário para conhecer do recurso excepcional de revista se encontra estabelecida na lei.
Ou seja, como se salienta no acórdão desta Secção, de 21/10/2015, proc. nº 0432/14, a referida competência encontra fundamento legal na remissão, operada pela mencionada al. c) do art. 2º do CPPT, para as normas do CPTA e, bem assim, na remissão operada pela al. e) do mesmo preceito legal para as normas do CPC, diploma este que desde as alterações introduzidas pelo DL 303/2007, de 24/8, passou também a prever recurso excepcional de revista para o Supremo Tribunal de Justiça dos acórdãos de tribunais da Relação, «não havendo, assim, razão para que este tipo de recurso excepcional encontrasse exclusão apenas no contencioso tributário (solução que, essa sim, suscitaria dúvidas quanto à sua conformidade à lei constitucional, por atentatória do direito à tutela jurisdicional efectiva e ao princípio da igualdade)».
Assim improcedendo, pois, a questão (atinente às inconstitucionalidades de natureza orgânica) invocada pelo MP.
O Tribunal Constitucional pronunciou-se recentemente, aliás, sobre a questão da suscitada inconstitucionalidade orgânica [cfr. a Decisão Sumária nº 743/2014, de 5/11/2014, processo nº 926/2014 (3ª secção)], afastando-a, precisamente com o argumento de que a competência que o STA entende estar-lhe atribuída, por força dos referidos preceitos legais, está estabelecida por lei.

3.4. Quanto ao mais:
Desde logo é de referir que também o recorrido carece de razão quanto à aventada alegação de que a recorrente não invoca os requisitos de admissibilidade do recurso de revista.
Na verdade, como se vê do requerimento preliminar às alegações, a recorrente logo aí invoca desenvolvidamente (cfr., aliás, as alíneas transcritas no Ponto 1.2., supra), que a revista deve ser admitida, porquanto a questão de fundo objecto de pedido de apreciação jurisdicional é uma questão que, pela sua relevância jurídica e social, reveste importância fundamental e porquanto a admissão deste recurso é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.

3.5. Há, então, que apreciar se o recurso é admissível face aos pressupostos de admissibilidade contidos no próprio art. 150º do CPTA, em cujos nºs. 1 e 5 se estabelece:
«1 - Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
(…)
5 - A decisão quanto à questão de saber se, no caso concreto, se preenchem os pressupostos do nº 1 compete ao Supremo Tribunal Administrativo, devendo ser objecto de apreciação preliminar sumária, a cargo de uma formação constituída por três juízes de entre os mais antigos da Secção de Contencioso Administrativo».

3.6. Interpretando este nº 1, o STA tem vindo a acentuar (e disso dão conta ambas as partes) a excepcionalidade deste recurso (cfr., por exemplo o ac. de 29/6/2011, rec. nº 0569/11) no sentido de que o mesmo «quer pela sua estrutura, quer pelos requisitos que condicionam a sua admissibilidade quer, ainda e principalmente, pela nota de excepcionalidade expressamente estabelecida na lei, não deve ser entendido como um recurso generalizado de revista mas como um recurso que apenas poderá ser admitido num número limitado de casos previstos naquele preceito interpretado a uma luz fortemente restritiva», reconduzindo-se como o próprio legislador sublinha na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nº 92/VII e 93/VIII, a uma “válvula de segurança do sistema” a utilizar apenas e só nos estritos pressupostos que definiu: quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para a melhor aplicação do direito.
Na mesma linha de orientação Mário Aroso de Almeida pondera que «não se pretende generalizar o recurso de revista, com o óbvio inconveniente de dar causa a uma acrescida morosidade na resolução final dos litígios», cabendo ao STA «dosear a sua intervenção, por forma a permitir que esta via funcione como uma válvula de segurança do sistema». (Cfr. O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos, 2ª ed., p. 323 e Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2005, p. 150 e ss..)
E no preenchimento dos conceitos indeterminados acolhidos no normativo em causa (relevância jurídica ou social de importância fundamental da questão suscitada e a clara necessidade da admissão do recurso para uma melhor aplicação do direito (Sobre esta matéria, cfr. Miguel Ângelo Oliveira Crespo, O Recurso de Revista no Contencioso Administrativo, Almedina, 2007, pp. 248 a 296.), também a jurisprudência deste STA vem sublinhando que «…constitui questão jurídica de importância fundamental aquela – que tanto pode incidir sobre direito substantivo como adjectivo – que apresente especial complexidade, seja porque a sua solução envolva a aplicação e concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, seja porque o seu tratamento tenha suscitado dúvidas sérias, ao nível da jurisprudência, ou da doutrina.
E, tem-se considerado de relevância social fundamental questão que apresente contornos indiciadores de que a solução pode corresponder a um paradigma ou contribuir para a elaboração de um padrão de apreciação de casos similares, ou que tenha particular repercussão na comunidade.
A admissão para uma melhor aplicação do direito justifica-se quando questões relevantes sejam tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória, com recurso a interpretações insólitas, ou por aplicação de critérios que aparentem erro ostensivo, de tal modo que seja manifesto que a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa é reclamada para dissipar dúvidas acerca da determinação, interpretação ou aplicação do quadro legal que regula certa situação.» (ac. do STA - Secção do Contencioso Administrativo - de 9/10/2014, proc. nº 01013/14).
Ou seja,
- (i) só se verifica a dita relevância jurídica ou social quando a questão a apreciar for de complexidade superior ao comum em razão da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de enquadramento normativo especialmente complexo, ou da necessidade de compatibilizar diferentes regimes potencialmente aplicáveis, ou quando esteja em causa questão que revele especial capacidade de repercussão social, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio.
- e (ii) só ocorre clara necessidade da admissão deste recurso para a melhor aplicação do direito quando se verifique capacidade de expansão da controvérsia de modo a ultrapassar os limites da situação singular, designadamente quando o caso concreto revele seguramente a possibilidade de ser visto como um tipo, contendo uma questão bem caracterizada, passível de se repetir em casos futuros e cuja decisão nas instâncias seja ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, ou suscite fundadas dúvidas, nomeadamente por se verificar divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais, gerando incerteza e instabilidade na resolução dos litígios.
Não se trata, portanto, de uma relevância teórica medida pelo exercício intelectual, mais ou menos complexo, que seja possível praticar sobre as normas discutidas, mas de uma relevância prática que deve ter como ponto obrigatório de referência, o interesse objectivo, isto é, a utilidade jurídica da revista e esta, em termos de capacidade de expansão da controvérsia de modo a ultrapassar os limites da situação singular (a «melhor aplicação do direito» deva resultar da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros, em termos de garantia de uniformização do direito: «o que em primeira linha está em causa no recurso excepcional de revista não é a solução concreta do caso subjacente, não é a eliminação da nulidade ou do erro de julgamento em que porventura caíram as instâncias, de modo a que o direito ou interesse do recorrente obtenha adequada tutela jurisdicional. Para isso existem os demais recursos, ditos ordinários. Aqui, estamos no campo de um recurso excepcional, que só mediatamente serve para melhor tutelar os referidos direitos e interesses») - cfr. o ac. desta Secção do STA, de 16/6/2010, rec. nº 296/10, bem como, entre muitos outros, os acs. de 30/5/2007, rec. nº 0357/07; de 20/5/09, rec. nº 295/09, de 29/6/2011, rec. nº 0568/11, de 7/3/2012, rec. nº 1108/11, de 14/3/12, rec. nº 1110/11, de 21/3/12, rec. nº 84/12, e de 26/4/12, recs. nºs. 1140/11, 237/12 e 284/12.
E igualmente se vem entendendo que cabe ao recorrente alegar e intentar demonstrar a verificação dos ditos requisitos legais de admissibilidade da revista, alegação e demonstração a levar necessariamente ao requerimento inicial ou de interposição – cfr. arts. 627º, nº 2, 635º, nºs. 1 e 2, e 639º, nºs. 1 e 2 do novo CPC (Correspondentes aos arts. 676º, nº 2, 684º, nºs. 1 e 2, e 685º-A, nºs. 1 e 2, do anterior CPC.) - neste sentido, entre outros, os acórdãos do STA de 2/3/2006, 27/4/2006 e 30/4/2013, proferidos, respectivamente, nos processos nºs. 183/06, 333/06 e 0309/13.

3.7. No caso, ao invés do contra-alegado pelo recorrido, afigura-se-nos que estão verificados os apontados requisitos de admissibilidade do recurso de revista excepcional.
Conforme tem vindo a ser reconhecido, aliás, em inúmeros acórdãos desta formação, a que se refere o nº 1 do art. 150º do CPTA (cfr. v.g., o proferido em 2/3/2016, no proc. nº 1483/15), em que a revista igualmente foi admitida.
Na verdade, a recorrente pretende ver reapreciadas pelo STA, as seguintes questões, que o acórdão recorrido também considerou: saber se à isenção de IMI relativa a pessoas colectivas de utilidade pública (PCUP) se aplica, a partir de 1/12/2003 (data do início da vigência do CIMI, em substituição do CCA), o disposto na al. d) do art. 1º, da Lei nº 151/99, de 14/9, ou se aplica o disposto na al. e) do art. 44º do EBF ou, ainda, se ambos os regimes serão aplicáveis; e saber que realidades estão subsumidas na expressão legal «prédios destinados directamente à realização dos seus fins», prevista na al. e) do nº 1 do art. 44º do EBF, [isto, caso se entenda que é aplicável o disposto nesse normativo, em exclusividade ou em conjunto com o regime da Lei 151/99].
Ora, tendo em conta as centenas de PCUP existentes é evidente a susceptibilidade de repetição das questões controvertidas num número indeterminado de casos futuros. Realidade esta que tem chegado, aliás, ao conhecimento do Tribunal, dado o número de recursos desta natureza que têm vindo a ser distribuídos nesta formação de julgamento, sendo que a própria documentação junta aos presentes autos também dá conta de várias decisões de tribunais de 1ª instância em que é sufragado o entendimento proposto pela recorrente, no sentido de que o prédio em questão beneficia de isenção de IMI ao abrigo do disposto na al. d) do art. 1º da referida Lei nº 151/99, de 14/9 e al. e) do art. 44º do EBF.
Tese esta que, todavia, o acórdão recorrido, seguindo jurisprudência do TCAN, não acolheu, pois que julgou no sentido da não aplicação da al. d) do art. 1º da Lei nº 151/99 e, por consequência, da inexistência do alegado benefício com a amplitude pretendida pela recorrente (cfr. além do acórdão recorrido, também os acs. do TCA Norte, de 9/6/2015, rec. nº 699/13.8BECBR; de 17/9/2015, rec. nº 465/13.0BECBR; de 30/9/2015, recs. nº 0650/03, nº 0625/11 e nº 205/12; de 15/10/2015, recs. nº 0129/13 e nº 0589/12; e de 10/12/2015, rec. nº 0495/13.2BEPNF).
E como acima se deixou dito e noutro local o MP sublinha, (Cfr. Parecer no proc. nº 1658/15, desta Secção.) mesmo considerando o regime dualista inerente à própria actividade estatutariamente exercida pela recorrida (com especificidades próprias que, em regra, não se encontram noutras pessoas colectivas de utilidade pública), a questão suscitada revela capacidade de expansão da controvérsia de modo a ultrapassar os limites da situação singular da recorrente, pois que a aplicação da al. d) do nº 1 do art. 1º da Lei 151/99 e a interpretação da expressão “prédios destinados directamente à realização dos seus fins” se poderá colocar em relação a prédios titulados pelas demais PCUP.
Acrescem eventuais dificuldades quanto à desaplicação da al. d) do nº 1 da Lei 151/99 (na qual assenta a pretendida isenção de IMI), tendo em conta o também disposto no nº 1 do art. 28º e nos n.ºs 1 e 6 do art. 31º, ambos do DL nº 287/2003, de 12/11 (diploma que aprovou o CIMI e o CIMT) e de acordo com os quais (i) todos os textos legais que mencionam Código da Contribuição Autárquica ou contribuição autárquica se consideram referidos ao Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) ou ao imposto municipal sobre imóveis (IMI), (ii) o CCA é revogado mas a contribuição autárquica se considera substituída pelo imposto municipal sobre imóveis (IMI) e (iii) se mantêm em vigor os benefícios fiscais relativos à contribuição autárquica, agora reportados ao IMI.
Estamos, portanto, perante situação em que a admissão deste recurso de revista se reveste de relevância jurídica e social e em que se manifesta claro interesse objectivo (dado que transpõe os limites do caso concreto aqui em apreciação, constituindo um caso “tipo” que se repete e previsivelmente continuará a repetir-se) e em que também se reconhece a utilidade de intervenção do STA, com vista a uma pronúncia que possa servir como orientação para os tribunais de que aquele Tribunal é órgão de cúpula, assim contribuindo para uma melhor aplicação do direito.

DECISÃO
Nestes termos, acorda-se em admitir a presente revista excepcional.
Sem custas.

Lisboa, 20 de Abril de 2016. – Casimiro Gonçalves (relator) – Isabel Marques da Silva – Dulce Neto.