Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0801/11
Data do Acordão:01/18/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:CONTRA-ORDENAÇÃO FISCAL
IVA
NULIDADE INSUPRÍVEL
DESCRIÇÃO DOS FACTOS
Sumário:I – O requisito da decisão administrativa de aplicação de coima “descrição sumária dos factos” (artigo 79.º, n.º 1, alínea b), primeira parte, do RGIT) deve interpretar-se tendo presente o tipo legal de infracção no qual se prevê e pune a contra-ordenação imputada ao arguido, pois que os factos que importa descrever, embora sumariamente, na decisão de aplicação da coima serão precisamente os factos tipicamente ilícitos declarados puníveis pela norma fiscal punitiva aplicada.
II – O facto tipificado como contra-ordenação no n.º 2 do artigo 114.º do RGIT reporta-se à tipificação constante do n.º 1 do mesmo preceito legal, mas cometido de forma negligente, sendo seu pressuposto essencial a prévia dedução da prestação tributária não entregue.
III – Neste sentido, a falta de entrega da prestação tributária de IVA, não preenche o tipo legal de contra-ordenação acima referido, uma vez que no IVA a prestação a entregar não é a prestação tributária deduzida, mas sim a diferença positiva entre o imposto suportado pelo sujeito passivo e o imposto a cuja dedução tem direito.
Nº Convencional:JSTA00067351
Nº do Documento:SA2201201180801
Data de Entrada:09/12/2011
Recorrente:A..., LDA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF COIMBRA PER SALTUM
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - CONTRA ORDENAÇÃO
Legislação Nacional:RGIT01 ART11 A ART26 N4 ART79 N1 B ART114 N2
CIVA84 ART26 N1 ART40 N1
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC855/11 DE 2011/11/23; AC STA PROC241/09 DE 2009/04/29; AC STA PROC540/09 DE 2009/09/16; AC STA PROC624/09 DE 2009/11/25; AC STA PROC887/09 DE 2009/12/02; AC STA PROC85/10 DE 2010/04/21; AC STA PROC539/09 DE 2009/11/18
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA E OUTRO REGIME GERAL DAS INFRACÇÕES TRIBUTÁRIAS ANOTADO 4ED PAG435
ALFREDO JOSÉ DE SOUSA E OUTRO CÓDIGO DE PROCESSO TRIBUTÁRIO COMENTADO E ANOTADO 3ED PAG456
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo
1 - RELATÓRIO
A…… LDA vem recorrer para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra proferida nos autos de recurso de contra-ordenação n° 080920050600091.6, decisão essa que julgou improcedente o recurso por si interposto, nos termos do art. 80° do RGIT, da decisão do Senhor Chefe do Serviço de Finanças de Castelo de Paiva, que lhe aplicou a coima de € 470,22 Eur.
Termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
1. Vem o presente recurso apresentado da douta sentença que julgou improcedente o recurso judicial apresentado contra a decisão de aplicação de coima.
2. Nos processos judiciais por contra-ordenações tributárias, pode ser admitido recurso em que a coima aplicada é de valor inferior à alçada dos tribunais tributários, nos casos em que a admissão do recurso e mostre manifestamente necessária para melhoria da aplicação do direito, por aplicação subsidiária do artº 73º nº 2 do Regime Geral das Contra-Ordenações.
3. O Objectivo desta disposição, ao prever a possibilidade de aceitação de recursos nos casos em que eles são manifestamente necessários para melhoria da aplicação do direito, não é viabilizar a correcção de decisões que optem por uma determinada corrente jurisprudencial, mas sim permitir a emenda de erros jurisprudencialmente inadmissíveis, que estejam à margem de qualquer corrente jurisprudencial.
4. A descrição sumária dos factos prevista no artigo 79.°, n.° 1, alínea b) do RGIT como requisito da decisão administrativa da aplicação da coima visa assegurar ao arguido a possibilidade do exercício efectivo dos seus direitos de defesa, no pressuposto de um conhecimento perfeito dos factos que lhe são imputados.
5. O facto tipificado como contra-ordenação no n.° 2 do artigo 114.° do RGIT reporta-se à tipificação constante do n.° l do mesmo preceito legal, mas cometido de forma negligente, sendo seu pressuposto essencial a prévia dedução da prestação tributária não entregue.
6. Neste sentido, a falta de entrega da prestação tributária de IVA não preenche o tipo legal de contra-ordenação acima referido, uma vez que no IVA a prestação a entregar não é a prestação tributária deduzida, mas sim a diferença positiva entre o imposto suportado pelo sujeito passivo e o imposto a cuja dedução tem direito.
Termos em que e nos mais de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente e consequentemente, revogada a douta sentença recorrida e julgar-se provido o recurso judicial apresentado contra a decisão de fixação de coima.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Neste Supremo Tribunal Administrativo o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer do seguinte teor:
O recurso interposto visa melhoria na aplicação do direito, nos termos do art. 89.° n.° 2 do Regime geral das contra-ordenações, aplicável subsidiariamente, razão pela qual parece ser de admitir.
Visa-se com o mesmo que seja reconhecido como requisito de aplicação da coima a possibilidade de defesa, s no pressuposto de um conhecimento perfeito dos factos que lhe são imputados.
Tem ainda o mesmo em vista a melhor interpretação do disposto nos arts. 79.° n.° l e 114.° n.° 2 do Regime geral das infracções tributárias (R.G.I.T.).
Face à matéria apurada em que, para além do que se remete para o auto-de notícia, apenas se fez constar a existência de certo montante de I.V.A."exigível", a sua não entrega, o termo do prazo e o período a que respeita.
Há que reconhecer não ter sido dado cabal conhecimento dos factos.
Contudo, em conformidade com o disposto no art. 79.° n.° 1 al. a) do R.G.I.T. prevê-se que tal ocorra através de uma "descrição sumária".
Sendo de constatar que a administração fiscal optou pela audição escrita da recorrente, não estava a mesma dispensada de descrever ainda os relativos à dedução de I.V.A. que foi efectuada, o que não consta.
Também o probatório é relativamente a tal omisso, não satisfazendo a tal a remessa que ainda neste última é efectuada para o auto de notícia, em que mais se fez ter sido entregue uma declaração periódica de I.V.A., o assinalado e não terem sido entregues todos os meios de pagamento.
Aliás, relevante é ainda que, nesse contexto, a ora recorrente tenha já arguido tal falta na impugnação judicial que apresentou, pelo que é de lhe reconhecer razão - no sentido de ter sido cometida nulidade embora "dependente de arguição no prazo de 10 dias, ou no acto de impugnação" decidiu o ac. do Pleno do S.T.J. no proc. 5671/01, naquela que parece ser a melhor interpretação no que respeita ao regime de nulidades em processo de contra-ordenação, no quadro do previsto no art. 120.° do C.P.P.. Nestes termos, parece que o recurso é, nestes termos, de proceder.
Colhidos os vistos dos Exmos. Adjuntos, cumpre decidir
2- FUNDAMENTAÇÃO:
Em sede factual apurou-se na primeira instância a seguinte matéria de facto com relevo para a decisão da causa:
Foi levantado auto de noticia em 3/04/05, que aqui se dá por reproduzido, por o sujeito passivo A……, Lda. não ter entregue o montante do IVA exigível do período de 6/2004, no valor de 2.076,695, o termo do prazo para cumprimento da obrigação terminou em 10/08/04 e a data de cumprimento da obrigação era 4/3/05; a recorrente notificada para efeitos do art. 70° do RGIT, através de carta registada com a/r assinado em 29/9/05, não apresentou defesa;
Após revogação administrativa da decisão anterior de aplicação de coima, em 3/2/06 foi proferida decisão de aplicação de coima, que aqui se dá por reproduzida, A……, Lda., na qual se assentou que, "À arguida foi levantado auto de notícia pelos seguintes factos: I. Montante de imposto exigível: 2.076,69 €; 2. Valor da prestação tributária entregue: O €; 3. Valor da prestação tributária em falta 2.076,69 €; 4. Data para cumprimento da obrigação: 4/3/05; 5. Período a que respeita a infracção: 2004/6; 6. Termo do prazo para cumprimento da obrigação: 10/08/04; os quais se dão como provados. Os factos relatados constituem violação dos artigos abaixo indicados, punidos pelos artigos do RGIT referidos no quadro, constituindo contra-ordenações fiscais. Normas infringidas: art. 26°, n° 1 e 40°, n° 1, al. a) do CIVA, apresentação dentro do prazo, sem meio de pagamento; Normas punitivas: art. 114°, n°2, e 26°, n° 4 do RGIT. A responsabilidade própria da arguida deriva do art. 7° do DL n° 433/82, aplicável por força do art. 30 do RGIT, concluindo-se dos autos a prática pela arguida e como autora material da contra-ordenação identificada supra. Medida de coima: em abstracto, a medida da coima aplicável ao arguido em relação às contra-ordenações praticadas terá como limite mínimo o montante de €415,34 e limite máximo o montante de € 2.076,69, dado tratar-se de pessoa colectiva." Para a fixação da coima em concreto deve ter-se em conta a gravidade objectiva e subjectiva da contra-ordenação praticada, para tanto importa ter presente e considerar o seguinte quadro (art. 27° do RGIT): não há actos de ocultação; não há benefício económico, é acidental a prática desta conduta, negligência simples, sem obrigação de não cometer infracção, situação económica e financeira desconhecida, tempo decorrido desde a prática da infracção 3 a 6 meses.
Assim, tendo em conta estes elementos para a graduação da coima e de acordo com o disposto no art. 79° do RGIT, aplico ao arguido a coima de € 425,72, cominada no art. 114°, n° 2 e 26°, n°4, do RGIT, com respeito pelos limites do art. 26° do mesmo diploma, sendo ainda devidas custas nos termos do n°2 do DL n° 29/98 de 11/2.
_foi a recorrente notificada desta decisão, 6/2/09, e bem assim da coima aplicada, das custas e para proceder ao pagamento da coima e custas no prazo de 20 dias ou dentro do mesmo prazo interpor recurso.
3- DO DIREITO:
Para se decidir pela improcedência do recurso considerou a decisão recorrida o seguinte:
A coima (...) com indicação dos elementos que contribuíram para a sua fixação (...).»
As nulidades no processo de contra-ordenação fiscal vêm reguladas no art.63º do RGIT e entre elas consta, como nulidades insuprível, a falta de menção de algum elemento essencial da infracção; falta de requisitos legais da decisão de aplicação das coimas (...) .
Significa isto que a decisão deve conter a descrição dos factos, que no caso é manifestamente suficiente; a indicação das normas concretamente violadas e punitivas, ou seja, a subsunção dos factos ao direito quer no seu enquadramento jurídico quer nas consequências previstas na lei.
Trata-se de estabelecer [art. 79°, n°l, al. b)] um regime de menos solenidade para as decisões de aplicação de coimas comparativamente com as sentenças criminais, regime esse justificável pela menor gravidade das sanções contra-ordenacionais. O que releva é que a descrição factual que consta da decisão de aplicação de coima seja suficiente para permitir ao arguido aperceber-se dos factos que lhe são imputados e poder, com base nessa percepção, defender-se adequadamente. (1- Acórdão do STA de 29/03/06 no processo 0143/06, relatado pelo Consº Jorge de Sousa, iet www.dgsi.pt,
A referência às normas violadas é concretizada pois menciona apenas os arts. 26° n°1 e 40º n°l, al. a) do Código do IVA; quanto às normas punitivas elege os arts.114°, n°2, por se tratar de conduta negligente e 26° n°4, por se tratar de pessoa colectiva; na medida concreta da coima faz uma enumeração dos factos ponderados para a fixação da coima, nomeadamente a frequência da prática deste tipo de infracção (acidental), afastando desde logo tabelar a coima pelo mínimo, mas ainda perto do valor mínimo.
De facto as normas punitivas são em concreto os arts. 114° n°s l e 3 e 26°, n° 4 do RGIT.
No que respeita à descrição dos factos, ainda que sumaria, é necessário descrever actos materiais praticados pelo arguido, ou seja, os factos que constam do auto de notícia, e tal também é feito sendo dito que são os que são os que “se dão como provados."
Aos factos narrados subsumiu-se a norma concretamente aplicável quer a nível da identificação da infracção quer a nível das consequências no caso concreto, a moldura abstracta da coima aplicável, para depois entrar nas considerações respeitantes ao doseamento da coima em concreto, valorando-se, factos que se tenham apurado para além da infracção, como por exemplo se é prática não cumprir as obrigações fiscais ou outras circunstâncias agravantes ou atenuantes (art. 27° do RGIP), (2- Cfr. Acórdão do STA de 12/12/2006, no processo 01045/06, relatado pelo Cons° Brandão de Pinho, in wuw.dgsi.pt).
Deste modo, qualquer pessoa pode perceber e entender o que lhe é imputado e a razão da condenação de molde a aferir se com ela concorda ou discorda, assegurando-se de forma real o direito de defesa.
Não há dúvida que a decisão de aplicação de coima não padece de qualquer nulidade.
DECISÃO
Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente, por não provado, pelas razões expostas e, em consequência, mantém-se a decisão de aplicação da coima.
DECIDINDO NESTE STA
As questões objecto do presente recurso consistem em saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento ao considerar não verificada a nulidade da decisão administrativa de aplicação da coima por violação do disposto no art. 79°, nº 1, als. b) e c) do RGIT e importa ainda apreciar, porque a recorrente o suscita, se o facto tipificado como contra-ordenação no n.° 2 do artigo 114.° do RGIT tem como pressuposto essencial a prévia dedução da prestação tributária não entregue.
Concorda-se com o expendido pelo Sr. Procurador-Geral Adjunto junto deste STA que o recurso interposto visa melhoria na aplicação do direito passando-se de imediato ao conhecimento do mesmo.
Entendeu a sentença recorrida que não se verifica nulidade da decisão administrativa pois que a mesma efectuou uma sumária análise dos factos e das normas penais concretamente aplicáveis o que permite a qualquer pessoa perceber e entender o que lhe é imputado e a razão da condenação.
Não estamos de acordo.
Seguiremos de perto o recente acórdão deste STA de tirado no recurso nº 855 de 23/11/2011 em que o ora relator interveio como segundo adjunto.
Dispõe o art. 79 nº 1 do Regime Geral das Infracções Tributárias que «A decisão que aplica a coima conterá:
a) a identificação do infractor e eventuais comparticipantes;
b) a descrição sumária dos factos e indicação das normas violadas e punitivas;
c) a coima e sanções acessórias, com indicação dos elementos que contribuíram para a sua fixação;
d) a indicação de que vigora o princípio da reformatio in pejus, sem prejuízo da possibilidade de agravamento da coima, sempre que a situação económica e financeira do infractor tiver entretanto melhorado de forma sensível;
e) a indicação do destino das mercadorias apreendidas;
f) a condenação em custas.»
Como esclarecem Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos no seu Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, pag. 435 «os requisitos previstos neste artigo para a decisão condenatória do processo contra-ordenacional tributário visam assegurar ao arguido a possibilidade do exercício efectivo dos seus direitos de defesa, que só poderá existir com um conhecimento perfeito dos factos que lhe são imputados, das normas legais em que se enquadram e condições em que pode impugnar judicialmente aquela decisão».
No que respeita à “descrição sumária dos factos”, há que sublinhar que este requisito da decisão administrativa de aplicação da coima constante da primeira parte da alínea b) do n.º 1 do artigo 79.º do RGIT, deve interpretar-se tendo presente o tipo legal de infracção no qual se prevê e pune a contra-ordenação imputada à arguida, pois que os factos que importa descrever, embora sumariamente, na decisão de aplicação da coima serão precisamente os factos tipicamente ilícitos declarados puníveis pela norma fiscal punitiva aplicada (cf. neste sentido, entre outros, os Acórdãos desta Secção 241/09, de 29.04.2009, 540/09 de 16.09.2009, e 624/09, de 25.11.2009, todos in www.dgsi.pt).
No caso subjudice a normas legais tidas como violadas pela decisão administrativa são as dos arts. 26º nº 1 e 40º nº 1 a) do CIVA referindo-se na mesma decisão, como normas punitivas os arts. 114º nº 2 e 26° nº 4 RGIT (falta de entrega da prestação tributária)- cf. fls. 41 dos autos.
A contra-ordenação fiscal imputada à arguida é a do artigo 114.º, n.º 2 do RGIT (cfr. a decisão de fixação da coima a fls. 41 dos autos), ou seja, a de “falta de entrega da prestação tributária” cometida a título de negligência.
A conduta ali tipificada como contra-ordenação consiste na «não entrega, total ou parcial, pelo período até 90 dias, ou por período superior (…) ao credor tributário, da prestação tributária deduzida nos termos da lei»
Ora, no que concerne ao preenchimento do tipo legal previsto nos n.º 1 e 2 do artigo 114.° do RGIT a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo, tem vindo a afirmar, de forma dominante e consolidada, que «a prévia dedução da prestação tributária não entregue constitui elemento essencial do tipo legal de contra-ordenação em causa e consequentemente para que se cumpra a “descrição sumária dos factos” que há-de constar da decisão administrativa de aplicação da coima, terá de haver referência, ainda que sumária, ao facto da prestação tributária ter sido deduzida» - conferir neste sentido Acórdãos de 21.04.2010, recurso 85/10, de 02.12.2009, recurso 887/09, de 18.11.2009, recurso 593/09, de 25.11.2009, recurso 624/09 e de 16.09.2009, recurso 540/09, todos in www.dgsi.pt.
Com efeito, como se sublinha no Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo 279/08 de 28.05.2009, «no âmbito do IVA fala-se de dedução de imposto relativamente ao imposto que o sujeito passivo tem a receber, nos termos dos arts. 19.º a 25.º do CIVA, não se referindo qualquer situação em que o sujeito passivo tenha de entregar imposto que tenha deduzido. De facto, no âmbito do referido direito à dedução, os sujeitos passivos não têm de entregar à administração tributária a prestação tributária que deduziram [o imposto que deduziram, à face da definição dada na alínea a) do art. 11.º do RGIT], mas, antes pelo contrário, apenas têm de fazer entrega do imposto na medida em que excede o IVA a cuja dedução têm direito, isto é, do imposto que não deduziram».
Assim as referências à «prestação tributária que nos termos da lei deduziu» e à «prestação tributária deduzida nos termos da lei», que se utilizam no art. 114.º do RGIT, apenas abrangem situações em que o sujeito passivo procede à dedução do imposto, subtraindo-a de uma quantia global.
Ora, no caso dos autos, é inequívoco que não consta da decisão que aplicou a coima (a fls.41), nomeadamente da descrição sumária dos factos, o recebimento do imposto anterior à entrega à administração tributária da declaração periódica que aí vem referida, o que afasta a possibilidade de preenchimento da hipótese do art. 114.°, n.° 2, do RGIT (que se reporta à conduta prevista no n.° 1 do mesmo artigo).
Assim sendo, e em face de tudo o exposto, não pode ter-se como adequadamente cumprido o requisito a que alude a alínea b) do n.° 1 do art. 79.° do RGIT (descrição sumária dos factos e indicação das normas violadas e punitivas), omissão essa que constitui nulidade insuprível (– Vide, neste sentido Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos no seu Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, pag. 435, e, no regime anterior, Alfredo José de Sousa e José da Silva Paixão, Código de Processo Tributário, comentado e anotado, 3ª Edição, pag. 456, nota 4.) - art. 63º, nº 1, al. d) do RGIT.
III-DECISÃO
Nestes termos, acorda-se em, dando provimento ao recurso jurisdicional, revogar a decisão recorrida, julgar procedente o recurso judicial e, em consequência, anular a decisão administrativa que aplicou à recorrente a coima aqui em causa.
Sem custas.
Lisboa, 18 de Janeiro de 2011. – Ascensão Lopes (relator) – Pedro Delgado – Casimiro Gonçalves.