Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0628/09
Data do Acordão:10/07/2009
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:MIRANDA DE PACHECO
Descritores:VERIFICAÇÃO
GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS
IRS
PRIVILÉGIO CREDITÓRIO
PRIVILÉGIO IMOBILIÁRIO
LIMITE TEMPORAL
Sumário:O privilégio creditório imobiliário previsto no artigo 111.º do CIRS não contempla o imposto relativo ao ano a que respeita a data da penhora efectuada na execução fiscal.
Nº Convencional:JSTA000P10947
Nº do Documento:SA200910070628
Recorrente:MINISTÉRIO PÚBLICO
Recorrido 1:A... E OUTRO
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1 – O Ex.mo. Magistrado do Ministério Público, vem interpor recurso da sentença de verificação e graduação de créditos proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, nos autos de reclamação de créditos que correm seus trâmites por apenso à execução fiscal nº 3611-98/103137.6, instaurada no 3º Serviço de Finanças de Amadora, pela FP contra A…, com os sinais dos autos, por dívidas de IVA e juros compensatórios dos anos de 1995 e 1998, formulando as seguintes conclusões:
1. Na execução fiscal nº 3611-98/103137.6 foi penhorado, em 18.01.01, o direito de superfície da fracção autónoma destinada a habitação, designada pela letra “…”, correspondente ao piso um frente duplex do prédio urbano inscrito sito na Rua …, lote … — …, inscrita na matriz predial urbana da freguesia da … sob o art. 2088 e descrita na 2a Conservatória do Registo Predial da Amadora sob o nº 00781/140591 “0”;
2. Tal penhora foi registada na respectiva Conservatória do Registo Predial em 1/02/2001;
3. Fazenda Pública reclamou créditos por dívidas de IRS relativas ao ano de 2001, nos montantes de €305,69 e €2958,18, são créditos;
4. Estes créditos foram reconhecidos e graduados antes da quantia exequenda;
5. Entendeu-se que sendo créditos relativos a 2001 gozavam do privilégio creditório a que alude o art. 111° do CIRS;
6. Os créditos de IRS relativos aos três últimos anos gozam de privilégio mobiliário geral e privilégio imobiliário sobre os bens existentes no património do sujeito passivo à data da penhora ou outro acto equivalente, nos termos do disposto no art. 111° do CIRS;
7. Havendo que presumir que o legislador exprimiu o seu pensamento em termos adequados, nos termos do disposto no artº 9°, nº 3, do Código Civil, tem de se entender que só os créditos referentes aos três anos anteriores à penhora gozam do privilégio geral a que alude o mencionado preceito;
8. Os créditos por impostos referentes ao ano corrente na data da penhora, situação contemplada, por exemplo, nos arts. 736°, nº 1 e 743°, nº 1, ambos do C. Civil, não se comportam, salvo melhor entendimento, na redacção da norma do artº. 111ª do CIRS, como não se comportam na redacção do artº. 108° do CIRC;
9. Considerando a data em que teve lugar a penhora (18.01 01) apenas os créditos por impostos sobre o rendimento relativos aos anos de 2000, 1999 e 1998 gozariam daquele privilégio creditório;
10. Os créditos de IRS, sendo relativos ao ano de 2001, ano corrente da penhora, não eram reclamáveis pois não gozavam de garantia real ou preferência de pagamento sobre o bem penhorado (artº. 240°, no 1 do CPPT);
11. Tais créditos deviam ter sido rejeitados, nos termos do disposto no artº. 868°, n°4 do C.P. Civil;
12. Ao assim não proceder e graduar esses mesmos créditos antes da quantia violou a Mma Juiz “a quo” o disposto nos mencionados arts. 111° do CIRS e 240°, nº 1 do CPPT.
2 – Não foram apresentadas contra-alegações.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
3-A sentença recorrida fixou a seguinte matéria de facto:
1. Nos autos de execução supra referidos foi, em 18 de Janeiro de 2001, efectuada penhora do direito de superfície da fracção autónoma designada pela letra …, a que corresponde o piso um, em frente, duplex, do prédio urbano com o nº 104 a 104-B, sito na Rua …, lote …, …, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de …, sob o art 2088- fls. 13 do processo de execução.
2 A penhora foi registada em 1 de Fevereiro de 2001 – fls. 60.
3 O crédito por …, que lhe foi cedido por Crédito …, (fls. 51 do processo de incidente de Habilitação de cessionário, apenso) encontra-se garantido por hipoteca do direito de superfície do imóvel, registada provisoriamente, em 2 de Outubro de 1996 e convertida em definitiva por inscrição de 28 de Janeiro de 1997 – fls.59.
4- A graduação dos créditos verificados foi feita nos seguintes termos na sentença recorrida:
1.º Crédito reclamado pela B…, com juros limitados ao período de três anos a partir de 07/04-1998;
2.º Créditos reclamados de IRS e respectivos juros de mora;
3.º Créditos exequendos de IVA e respectivos juros de mora.
5- A única questão que vem controvertida no presente recurso prende-se em saber se os reclamados créditos de IRS, por relativos ao ano de 2001, gozam ou não do privilégio creditório imobiliário previsto no artigo 111.º do CIRS, sendo certo que a penhora na execução foi efectuada e registada no mesmo ano de 2001 (1. e 2. do probatório).
Estabelece o artigo 111.º do CIRS o seguinte:
Artigo 111.º
Privilégios creditórios
Para pagamento do IRS relativo aos últimos três anos, a Fazenda Pública goza de privilégio mobiliário geral e privilégio imobiliário sobre os bens existentes no património do sujeito passivo à data da penhora ou outro acto equivalente.”
Ora, a literalidade deste normativo, na presunção que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (artigo 9.º n.º 3 do CC), não consente outra interpretação que não seja a de que o aludido privilégio creditório não abrange o imposto relativo ao mesmo ano a que respeita a penhora efectuada na execução, ao invés do que se entendeu na sentença, apenas dele beneficiando o relativo aos três anos anteriores.
No caso em apreço, como defende o Magistrado do Ministério Público recorrente, o reclamado crédito de IRS relativo ao ano de 2001 não goza, sendo a penhora do mesmo ano, do privilégio imobiliário previsto no artigo 111.º do CIRS (cfr. acórdão de 12/07/06, no recurso n.º 641/06).
O facto do crédito reclamado não gozar de garantia sobre os bens penhorado constitui um dos fundamentos para a sua rejeição, como resulta do disposto no artigo 240.º, n.º 1 do CPPT.
Sendo assim, deve ser rejeitada a referida reclamação de créditos de IRS.
Termos em que se acorda conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida, na parte em que graduou o reclamado crédito de IRS de 2001, que, assim se rejeita.
Sem custas.
Lisboa, 7 de Outubro de 2009. Miranda de Pacheco (relator) – Pimenta do Vale – Isabel Marques da Silva.