Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:096/17.6BEPDL
Data do Acordão:05/13/2021
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CRISTINA SANTOS
Descritores:DELEGAÇÃO DE PODERES
CSTAF
COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO
Sumário:I - O artº 74 nº 3 als. a), b) e c) ETAF habilita o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais a delegar poderes no seu Presidente, cujo exercício se mostra previsto no artº 78º al. f) ETAF, com faculdade de subdelegar nos termos do artº 46º nº 1 CPA.
II - Cabe à Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo (artº 24º/1/a)/vii ETAF) a competência em 1ª instância para conhecer da impugnação do despacho de injustificação de faltas praticado pelo Presidente do TAF de Ponta Delgada ao abrigo de subdelegação de poderes, outorgada na sequência de poderes delegados pelo Conselho no seu Presidente, na medida em que o jus disputatum evidenciado pelo objecto da causa envolve directamente as competências materiais do CSTAF, sendo incindível do objecto dos actos de delegação e subdelegação.
III - Para haver delegação de poderes é necessário que o órgão delegante seja titular da competência delegada, titularidade dependente de uma norma que a confira, e que uma norma jurídica habilite o delegante a praticar o acto que a tem por conteúdo (artºs 36º/1, 44º/1 e 47º/1 CPA).
IV - Nos termos do artº 49º/1/2 CPA o delegante (ou o subdelegante) pode avocar, revogar, anular ou substituir o acto praticado pelo delegado (ou subdelegado, posto que havendo subdelegação o delegado assume o papel de delegante) bem como emitir directivas ou instruções vinculativas genéricas relativas ao modo de exercício dos poderes delegados (artº 49º/1/2 CPA), o que significa que a competência dispositiva originária permanece na esfera jurídica do delegante (ou subdelegante), assumindo o delegado, em nome próprio, o exercício de uma competência alheia.
V - O segmento do artº 44º nº 5 CPA no sentido expresso de os actos praticados ao abrigo da delegação ou subdelegação de poderes valem como se tivessem sido praticados pelo delegante ou subdelegante, deixa clara a equivalência de natureza jurídica do acto praticado pelo delegado (ou subdelegado) com a do mesmo acto se praticado pelo delegante (ou subdelegante).
Nº Convencional:JSTA00071141
Nº do Documento:SA120210513096/17
Data de Entrada:05/31/2019
Recorrente:CONSELHO SUPERIOR DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS
Recorrido 1:A.............
Votação:MAIORIA COM 1 VOT VENC
Legislação Nacional:ARTS. 24.º, n.º 1, al. a)/vii, 74.º, n.º 3, als. a), b), c), do ETAF
ARTS. 36.º, n.º 1, 44.º, n.º 1, 47.º, n.º 1, do CPTA
ARTS. 44:º, n.º 5, 49.º, n.ºs 1 e 2, do CPA/2015
Aditamento:
Texto Integral: O Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, com os sinais nos autos, inconformado com o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul que declarou o TAC de Ponta Delgada competente em razão da hierarquia para conhecer de presente acção, em desfavor da competência em 1ª instância da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, dele vem recorrer, concluindo como segue:

A. O presente recurso visa a clarificação de qual o tribunal competente para apreciar a impugnação contenciosa de actos praticados ao abrigo de uma delegação de poderes realizada pelo CSTAF.
B. A clara definição do quadro de competências dos tribunais da jurisdição é essencial, para equilíbrio do funcionamento do sistema judicial.
C. Importando garantir que a competência que, segundo o critério de ponderação do legislador, foi atribuída a um tribunal de cúpula não seja indevidamente assumida por um tribunal de primeira instância.
D. Trata-se de uma questão que, pela sua relevância jurídica, se reveste de importância fundamental.
E. Estando em causa o exercício de poderes cuja titularidade a lei atribui ao CSTAF, uma entidade administrativa independente, para gestão e disciplina da jurisdição administrativa e fiscal, a respectiva apreciação judicial cabe à Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo (cfr. artigo 24.°, n.° 1, alínea a), vii), do ETAF).
F. Não dependendo a competência de quem seja o “agente” concreto desse exercício, mas sim do substrato material em causa.
G. A competência do tribunal não se altera, ainda que seja feito uso pelo CSTAF de instrumentos de desconcentração administrativa.
H. O Supremo Tribunal Administrativo é o tribunal competente para a apreciação da legalidade de actos/omissões no exercício de poderes de gestão e disciplina do CSTAF, independentemente de quem exerceu tais poderes: o seu titular originário, um delegante ou um subdelegante.
I. Se os poderes de gestão e disciplina do CSTAF forem exercidos pelo CSTAF, é indubitável a competência do STA (cfr. artigo 24.°, n.° 1, alínea a), vii)).
J. O mesmo se diga se o acto/omissão nesse contexto for atribuído ao seu Presidente (cfr. citada norma).
K. Acresce que, como decorre do citado artigo 24.°, n.° 1, alínea a), v), o Supremo Tribunal Administrativo é competente para a apreciação da legalidade dos actos/omissões do seu Presidente, não distinguindo entre a esfera da competência exclusiva e o exercício de poderes delegados pelo Conselho.
L. Estando também prevista a competência do STA para apreciar a legalidade de actos/omissões dos Presidentes dos Tribunais Centrais Administrativos, não distinguindo entre o exercício de competências próprias ou delegadas pelo Conselho (cfr. artigo 24.°, n° 1, alínea a), v)).
M. Quanto à apreciação de actos dos Presidentes dos Tribunais Administrativos e Fiscais, é certo que o artigo 24.° não os refere. 
N. Isto porque, quanto ao exercício de competências funcionais (n.° 3 do artigo 43.°-A do ETAF) e competências de gestão processual (n.° 4 do citado artigo) relativas à jurisdição - tais como aquelas que aqui se discutem a lei prevê recurso necessário para o CSTAF (n.° 5 do citado artigo 43.°-A).
O. O que significa que, nesse contexto, o objecto de impugnação judicial será a deliberação do CSTAF, e já não o ato/omissão do Presidente do TAF.
P. E, consequentemente, que deve ser o STA o tribunal competente para apreciar a legalidade do exercício desses poderes de gestão/funcionais relativos à jurisdição.
Q. Ora, se assim é quanto ao exercício de poderes de gestão/funcionais que cabem por lei aos presidentes dos TAF, também o deve ser, por maioria de razão, quando os poderes de gestão exercidos por tais Presidentes cabem ao CSTAF, e lhes foram apenas subdelegados.
R. Estando materialmente em causa o exercício da competência de gestão do CSTAF, resulta da lógica do sistema que a impugnação de actos ou omissões nesse contexto, seja qual for o seu “agente”, deve ser no tribunal de cúpula da jurisdição.
S. Apenas tal interpretação, face a todo o exposto, salvaguarda a coerência e equilíbrio do sistema.
T. Equilíbrio esse que na jurisdição comum é acautelado por via da previsão de recurso necessário para o Conselho Superior de Magistratura (CSM) (cfr. artigo 98.° da LOSJ) quanto aos actos e regulamentos administrativos emitidos pelo presidente da comarca, sem fazer distinção entre o exercício de competências próprias (cfr. nºs 2, 3, 4, do artigo 94.° da Lei de Organização do Sistema Judiciário (LOSJ) e o exercício de competências delegadas pelo CSM (cfr. n.° 9 do mesmo artigo).
U. O que significa que o acto final a impugnar será sempre uma deliberação do CSM.
V. Sendo, consequentemente, atribuída ao Supremo Tribunal de Justiça, tribunal de cúpula da jurisdição comum, a competência jurisdicional para a respectiva apreciação (artigo 168.°, n.° 1, do Estatuto dos Magistrados Judiciais).
W. Ou seja, nunca um acto do Presidente de comarca no exercício de poderes delegados pelo CSM fica sujeito à apreciação num tribunal de primeira instância.
X. E o mesmo se impõe, na lógica do sistema, quanto ao ato de Presidente dos TAF no exercício de poderes delegados pelo CSTAF.
Y. Razão pela qual a entidade demandada, e bem, é o CSTAF e não o Presidente do TAF de Ponta Delgada.
Z. Pois, no caso concreto, mais do que quem pratica (ou não) o ato, releva a titularidade e espécie dos poderes que são (ou não) exercidos através desse acto/omissão.
AA. Pelo que a competência cabe ao STA, dado estar em causa o exercício de um poder de gestão da titularidade do Conselho.
BB. Mas, mesmo que assim não se entenda, o que só como hipótese académica se admite, tendo a acção sido proposta contra o CSTAF resulta do artigo 24.°, n.° 1, alínea a), vii), que a competência para apreciar a acção é do STA.
CC. O artigo 24.°, n.° 1, alínea a), tem de ser interpretado no sentido de que estando em causa ações propostas contra alguma das entidades ali referidas, deve ser no Supremo Tribunal Administrativo que tais ações devem ser apreciadas.
DD. Ou seja, tal como a acção foi configurada pela Autora, propondo-a contra este Conselho, cabe ao STA a competência para a respectiva apreciação. 
EE. O STA é, pois, o tribunal competente, quer por a acção ter sido proposta contra entidade referida no artigo 24.°, n.° 1, alínea a), vii, quer por estar em causa o exercício do poder de gestão que lhe é atribuído por lei.
FF. Em conclusão, face a todo o exposto, atendendo a que o acórdão recorrido desvirtua a harmonia do sistema, ao pôr em causa a necessária uniformidade de tratamento, impõe-se a intervenção deste Supremo Tribunal em sede de recurso de revista.
GG. Intervenção essa que se impõe dada, ainda, a susceptibilidade de repetição da questão.
HH. Com efeito, estão em causa actos de gestão corrente, da competência do CSTAF, de ocorrência constante.
II. Sendo legalmente permitida a delegação e subdelegação neste contexto (cfr. n.° 6 do artigo 43.°-A e n.° 3 do artigo 74.° do ETAF e artigos 36.°, n.° 1, 44.°, n.° 4, e 46.° do Código do Procedimento Administrativo - CPA).
JJ. A delegação e subdelegação de poderes constituem instrumentos de desconcentração administrativa, permitindo uma gestão mais eficiente da jurisdição.
KK. Pelo que estamos perante uma questão que é “susceptível de se repetir num número de casos futuros indeterminados”, verificando-se “a capacidade de expansão da controvérsia que legitima o recurso de revista como garantia de uniformização do direito nas vestes da sua aplicação prática”.
LL. Atribuir a competência ao TAF de Ponta Delgada, estando em causa um ato do Presidente desse mesmo Tribunal, significa que, em abstracto, pode caber a um magistrado abrangido por essa presidência apreciar a legalidade desse ato.
MM. O que não constitui a solução mais equilibrada. 
NN. Quanto à fundamentação do acórdão recorrido, não se questiona que o ato é praticado pelo delegado e lhe é imputável.
OO. Tendo a mesma “capacidade” ou eficácia decisória que teria o ato se praticado pelo delegante.
PP. Ou seja, o acto praticado pelo delegado ou subdelegado é tão definidor da situação jurídica subjacente como o seria o acto se fosse praticado pelo delegante.
QQ. E, como tal, directamente impugnável contenciosamente.
RR. Devendo a aferição do tribunal competente ser feita atendendo aos princípios enformadores do sistema, salvaguardando a sua coerência interna.
SS. De todo o exposto, decorre a relevância da questão que justifica a sua apreciação em sede de recurso de revista.
TT. Tendo o acórdão recorrido violado o artigo 24.°, n.° 1, alínea a), vii, do ETAF, ao decidir pela competência do tribunal de primeira instância numa acção em que é demandado o CSTAF e em que está em causa o exercício de poderes de gestão que a este incumbem.
UU. Devendo ser dado provimento ao presente recurso, e reconhecida a competência da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo para apreciação da acção em apreço.
*
A Juiz de Direito A…………., ora Recorrida, contra-alegou concluindo como segue:

1. Nos termos do artigo 150º, nº 1, do CPTA o recurso de revista detém um carácter excepcional.
2. Para a sua admissão torna-se necessário que se esteja perante uma questão com "relevância jurídica ou social" ou que seja necessário "para uma melhor aplicação do direito".
3. Todavia, é sobre o Recorrente que recai o ónus de alegar e de demonstrar a verificação dos pressupostos de admissibilidade.
4. Quanto a isto, a alegação do Recorrente é deficitária, limitando-se a uma mera reprodução mecânica da letra da lei e por esse motivo não se pode aceitar como cumprido o ónus que sobre ele recai.
5. Quanto ao requisito de admissibilidade "relevância jurídica ou social" constata-se que no caso vertente não está em causa a apreciação de qualquer questão que detenha uma complexidade superior ao comum, mas a mera interpretação do disposto no artigo 24º, n° 1, alínea a), subalínea vii), do ETAF.
6. Ao que acresce ainda a circunstância de não vir a ter repercussão social, pois não são conhecidos outros casos semelhantes ao presente.
7. Já no que diz respeito ao requisito de admissibilidade "melhor aplicação do direito", refere-se que, não existindo casos similares, por maioria de razão, também não existiu um tratamento diferenciado pelas instâncias.
8. Não tendo o Recorrente cumprido com o ónus de alegar e demonstrar a verificação dos requisitos de admissibilidade do recurso de revista e por outro lado, não se verificando os mesmos, não deve o presente recurso ser admitido, tudo quanto decorre do artigo 150º, n° 1, do CPTA.
9. Na eventualidade de assim não se entender, refere-se que o ato impugnado consiste no despacho do Presidente do Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delegada, de 22.03.2017, e não num ato praticado pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, como pretende fazer entender o Recorrente.
10. Porquanto, o presente litígio não tem previsão no estatuído no artigo 24º nº l, alínea a), subalínea vii), do ETAF, pois, não foi intenção do legislador atribuir à Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo competência para conhecer de todos os actos/omissões praticados por todas as "entidades"/órgãos do CSTAF, mas de apenas quanto aos actos/omissões praticados pelo CSTAF e seu Presidente.
11. Mais se refere que os actos praticados pelo Presidente do Tribunal Administrativo de Círculo, ao abrigo da delegação de poderes, não estão sujeitos a recurso necessário para o CSTAF, nos termos do artigo 43º-A, nºs 6 e 8, do ETAF.
12. Porquanto o ato praticado pelo Presidente do Tribunal Administrativo de Círculo não pode ser equiparado a uma deliberação do CSTAF.
13. Nem se poderá entender que tem aplicação ao presente caso o disposto no artigo 24º, nº 1, alínea a), subalínea vii), do ETAF, pelo facto de a acção ter sido intentada contra o CSTAF, em cumprimento do disposto no artigo 10º do CPTA.
14. Não caindo a situação presente na previsão dos artigos 24º, nº l, alínea a), subalínea vii), e 37º do ETAF, deverá considerar-se o Tribunal Administrativo de Círculo, no caso, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delegada, competente para conhecer da acção administrativa, nos termos do artigo 44º, nº 1, do ETAF.
15. O referido entendimento não sai beliscado, pelo facto de estarmos perante um ato praticado ao abrigo da delegação/subdelegação de poderes.
16. Pois, nos termos do artigo 44º, nº 5, do CPA, deverá entender-se que os actos praticados pelo delegado ou subdelegado ao abrigo da delegação/subdelegação de poderes, são imputáveis àqueles e não ao delegante ou subdelegante.
17. Entendimento, este, que é unânime na doutrina e na jurisprudência.
18. Assim, estando em causa um ato praticado pelo Presidente do Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delegada, no uso da subdelegação de poderes, entidade que não se encontra referida no artigo 24º, nº 1, do ETAF, não se pode entender de outro modo que não seja que o tribunal competente para conhecer da acção administrativa é o Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delegada, nos termos do artigo 44º do ETAF - cfr. douto acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, datado de 15.10.2014, proferido no âmbito do processo nº 0618/14
19. Razão pela qual, deverá julgar-se improcedente o presente recurso e consequentemente manter-se o douto acórdão ora recorrido por ter feito uma correta interpretação da lei.
*
Mediante acórdão da Formação de Apreciação Preliminar deste STA foi decidido admitir a revista.
*
Colhidos os vistos legais e entregues as competentes cópias aos Exmos. Conselheiros Adjuntos, vem para decisão em conferência.
*
Para conhecimento da excepção da incompetência em razão da hierarquia, pela Instâncias foi julgada provada a seguinte matéria de facto:

1. Por despacho de 22.3.2017, praticado pelo Presidente do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Ponta Delgada, Juiz Desembargador Benjamim Barbosa, foram não justificadas as faltas dadas a título de baixa por doença, no período compreendido entre 19.12.2016 e 18.1.2017, pela Juíza de Direito desse TAF de Ponta Delgada, A…………..
2. Resulta da Deliberação (extracto) n.° 62/2017, publicada na 2ª série do Diário da República, n.° 20, de 27 de Janeiro de 2017, entre o mais, o seguinte:
Por deliberação do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, de 17 de janeiro de 2017, foram delegados, no seu Presidente, Juiz Conselheiro Vítor Manuel Gonçalves Gomes, os seguintes poderes:
a) (…)
b) (...)
c) Praticar atos relativos a licenças e faltas dos juízes da jurisdição administrativa e fiscal, com a faculdade de subdelegar.
d) (…)
e) (...)
f) Autorizar que magistrados se ausentem do serviço, com a faculdade de subdelegar.
g) Conceder autorizações de residência a juízes de direito, com a faculdade de subdelegar.
São ratificados todos os atos até agora praticados nos apontados domínios.
18 de janeiro de 2017. - O Presidente do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais,
Vítor Manuel Gonçalves Gomes.”.
3. Por sua vez, no Despacho (extracto) n.° 1608/2017, publicado na 2ª série do Diário da República n.° 35, de 17 de Fevereiro, consta o seguinte:
Ao abrigo da deliberação do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, de 17 de janeiro de 2017 [deliberação (extrato) n.º 62/2017, publicada no Diário da República, 2ª série, n.º 20, de 27 de janeiro de 2017], subdelego nos Presidentes dos Tribunais Centrais Administrativos Sul e Norte, respetivamente, Juiz Desembargador Rui Fernando Belfo Pereira e Juiz Desembargador Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos, e nos Presidentes dos Tribunais Administrativos e Fiscais, Juíza Desembargadora Irene Isabel Gomes das Neves (Zona Norte), Juiz Desembargador Antero Pires Salvador (Zona Centro), Juiz Desembargador Benjamim Magalhães Barbosa (Zona Lisboa e Ilhas) e Juiz Desembargador Paulo Filipe Ferreira Carvalho (Zona Sul), os poderes que me foram conferidos pela referida deliberação para a prática dos atos relativos a licenças, faltas, autorizações de ausência do serviço e autorizações de residência dos juízes em exercício de funções nos respetivos tribunais, ratificando todos os atos praticados nos apontados domínios desde 20 de dezembro de 2016.
27 de janeiro de 2017. - O Presidente do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, Vítor Manuel Gonçalves Gomes.”.

Ao abrigo do regime do artº 662º nº 1 CPC, ex vi artº 1º CPTA, aditam-se ao probatório os itens 4 a 10, factualidade alegada na contestação e não impugnada na réplica.

4. O despacho de 22.3.2017, referido em 1.,foi notificado à Autora por carta registada com aviso de recepção de 23.03.2017 – fls. 262-263 do p.a.;
5. Tendo o aviso de recepção sido assinado pela Autora no dia 03.04.2017 – fls. 264 do p.a.;
6. O despacho de 22.3.2017, referido em 1., foi rectificado pelo Presidente do TAF de Ponta Delgada por despacho de 07.04.2017 no sentido de não justificar “as faltas dadas a título de baixa por doença no período compreendido entre 19.12.2016 e 17.01.2017 pela Senhora Juíza do TAF de Ponta Delgada Dra. A……………” – fls. 265-266 do p.a.;
7. Tal rectificação foi notificada à Autora por carta registada com aviso de recepção de 10 de Abril de 2017 – fls. 271-272 do p.a.;
8. Tendo o respectivo aviso de recepção sido assinado pela Autora no dia 18.04.2017 – fls. 273 do p.a.;
9. A Autora intentou a presente acção administrativa de impugnação no TAF de Ponta Delgada no dia 03.07.2017 via site do citado tribunal – data de registo a fls. 1 dos autos em papel.
10. O despacho de 22.3.2017, referido em 1., é do teor que se transcreve:

“(..) Despacho
Regularmente notificada para se pronunciar sobre o projecto de despacho de não justificação das faltas dadas no período compreendido entre 19-12-2016 e 18-01-2017, a Senhora juíza de Direito Dr.a A………, não se pronunciou para efeitos do disposto no artigo 122º n.° 1, do C.P.A., no prazo que lhe foi concedido ao abrigo deste normativo.
Face ao silêncio da interessada e não se me afigurando que seja necessário realizar quaisquer outras diligências, converto em definitivo o projecto de despacho que foi notificado, o qual é do seguinte teor:
"1. A Senhora juíza, Dr.a A…………, do TAF de Ponta Delgada, encontra-se ausente do serviço desde 19-12-2016, tendo apresentado um certificado de incapacidade temporária por doença no período compreendido entre 19-12-2016 e 18-01-2017, e um segundo, com início em 18-01-2017 e termo a 17-02-2017.
Cumpre proferir despacho sobre a justificação, ou não, das faltas dadas no primeiro período acima referido (19-12-2016 a 18-01-2017).
2. Com interesse para a decisão a tomar consígna-se a seguinte factualidade:
a) Em 20-12-2016, pelas 09H42, a Sra. Juíza A………, enviou para o correio oficial do TAF de Ponta Delgada um email proveniente do seu endereço de email particular (A……….@gmail.com), contendo em anexo um ficheiro, em formato “JPEG”, da foto de um certificado de incapacidade temporária, emitido a seu favor em 19-12-2016, pelo médico Dr ………, dele constando que o referido atestado foi passado no consultório do médico, em Ponta Delgada (doc. n.° 3) 
b) No dia 20-12-2016, pelas 16H47, foi depositada na estação dos CTT de Telheiro, Barreira, Leiria, uma carta registada dirigida ao TAF de Ponta Delgada, contendo o original do certificado acima referido (doc. n.° 2).
c) No remetente da referida carta foram manuscritos os seguintes dizeres:
“A………….
……………….., 17
………………..
9500-…… PONTA DELGADA" (cfr. doc. n.° 2)
d) Em 03-01-2017, o Secretário do TAF de Ponta Delgada enviou, do endereço de correio oficial do TAF de Ponta Delgada, para o endereço profissional e para o endereço particular de correio electrónico da Senhora juíza Dr.a A…………, respectivamente, A..............@juiz-cstaf.org.pt e A………….@gmail.com), um email com os seguintes dizeres:
“Encarrega-me o Exmo. Senhor Juiz Presidente do TAF de Ponta Delgada de informar V. Exa. que o Certificado de incapacidade temporária para o trabalho não veio acompanhado da indicação dos dias e horas a que pode ser efetuada a verificação domiciliária, conforme dispõe o art° 20º n° 3 da Lei n° 35/2014, de 20 de Junho, indispensável para a justificação das faltas.
Mais informo que hoje já havia tentado fazer esta solicitação por contacto telefónico através dos números ……………. e………., sem ter sido possível” (doc. n.° 4).
e) Em 16-01-2017, pelas 15H21, o signatário enviou do seu endereço de email profissional juiz.presidente.taf.lisboa@tribunais.org.pt, um email para os endereços profissional e pessoal da Senhora Juíza Dr.a A……….., acima referidos, que na parte que interessa diz o seguinte:
“Exm.° Senhora Dra. A……….
Na sequência dos email enviados pelo Senhor Secretário, venho reiterar junto de V. Ex.a a necessidade de dar cumprimento ao artigo 20.°, n.° 3, da LGTFP." (doc. n.° 5).
f) No dia 18-01-2017, pelas 01H01, a Senhora juíza Dr.a A………….enviou para o endereço de correio electrónico julz.presidente.taf.lisboa(a)tribunais.org.pt, um email proveniente do seu endereço de correio electrónico particular (A…………@gmail.com), com os seguinte dizeres:
“Exmo. Sr. Presidente,
Junto remeto a declaração solicitada.
Melhores cumprimentos,
A……….." (doc. n.° 6).
g) O referido email veio acompanhado de um ficheiro, em formato WORD, intitulado “DECLARAÇÃO ADSE”, com os seguintes dizeres:
DECLARAÇÃO
A……….., beneficiária da ADSE n.°…………., residente em……….., n.° 17, ………., 9500- …..Ponta Delgada, vem, para efeitos do n.° 3 do artigo 20.º da LTFP, indicar os seguintes períodos:
Terças, quartas e quintas feiras, entre as 10,30 e as 13 horas, e entre as 14 e 16,30 horas.
A beneficiária
A…………….”
- (doc. n.° 7).
h) Nos dias 18 e 19 de Janeiro de 2017 a Senhora juíza Dr.a A……….. não compareceu ao serviço.
i) Em 19-01-2017, pelas 10H15, foi recepcionado no endereço de correio electrónico oficia! do TAF de Ponta Delgada um email, proveniente do endereço de correio electrónico pessoal, da Senhora juíza Dr.a A………., com os seguintes dizeres:
"Exmo. Sr. Secretario,
Venho por este meio informar que irei continuar de baixa médica, sendo o respetivo atestado oportunamente remetido a esse TAF. com os meus melhores cunprimentos,” (sic) - doc. n.° 8.
j) Em 23-01-2017, pelas 17H40, foi entregue no destino o objecto registado RF011427832PT, contendo o ofício n.° 2/17, e o despacho de 18-01-2017, do signatário, que ordenava a notificação da Senhora juíza Dr.a A……….. para comprovar a impossibilidade de envio atempado da declaração referida supra em d) e e)
- doc. n.° 9.
k) Em 25-01-2017, pelas 17H00, a Senhora juíza Dr.a A………. remeteu, do seu endereço de correio electrónico pessoal, para o endereço de correio electrónico pessoal do signatário …………..@outlook.pt, e para o endereço de correio electrónico correio@cstaf.pt, um email com os seguintes dizeres:
"Exmo. Sr. Presidente Do TAF de Ponta Delgada Com conhecimen[t]o ao CSTAF
Em resposta ao ofício n.° 2/2017 de V. Exa.a cumpre-me apenas informar que, como tive oportunidade de informar V. Exa. , com o devido suporte documental, remetido por carta registada em 2016.12.30, apresento o quadro clinico de Burn-out (esgotamento físico e psíquico) aí sobejamente caracterizado, con[c]luindo o meu médico assistente que "Estas situações de agudização de sintomas envolvem componente de "burn-out” pelo que por vezes é-lhe aconselhada evicção laborai para reforço terapêutico e recuperação tal como sucedeu entre janeiro e março do corrente ano”.
Assim, não só me foi prescrita evicção laboral para repouso absoluto e cura de sono, como me foi prescrita, entre outra terapêutica, a toma de 20 mg diários de …………, e 10 mg diários de …………… Retard. Entre os diversos efeitos secundários resultantes da toma desta medicação, permito-me realçar que os efeitos secundários deste último incluem "sonolência diurna, embotamento afetivo, redução do estado de alerta, confusão, fadiga, cefaleias, sensação de cabeça vazia, fraqueza muscular ataxia ou diplopia."
Perante este quadro, apenas remeti declaração solicitada quando tive condições físicas e psicológicas para o fazer, sendo certo que, até lá, sempre a verificação domiciliária poderia ser requerida para o meu domicílio, atempadamente comunicado ao CSTAF (e no qual o ofício por V. Exa. remetido foi por mim efetivamente rececionado, sendo o aviso de receção assinado pelo meu punho).
Cumprimentos,
A………..”.
- Doc. n.° 10.
*
Consignam-se ainda os seguintes factos, relevantes para a decisão:
l) Consta do certificado referido em b) supra, como data de emissão, o dia 19-12-2016 e como data do início da baixa o mesmo dia (doc. n.° 1).
m) O mesmo certificado foi passado por 30 dias, tendo sido aposto que o termo da baixa por doença era o dia 18-01-2017 (doc. n.° 1).
n) A Senhora juíza esteve de baixa por doença entre 16-02-2015 e 06-03-2015, tendo enviado uma declaração, através de email de 26-02-2015, referindo além dos mais o seguinte:
“Junto envio declaração para efeitos de verificação domiciliária da doença, que por lapso meu não seguiu com o atestado médico oportunamente enviado,....”
- (doc. n.° 11)
o) O folheto informativo relativo ao medicamento …………… Retard disponível emhttps://www………….download.php?f=27&key=16fbfo789f1567ea712f1cffa41167ae)
refere que este medicamento está especialmente indicado para o “Tratamento da ansiedade e insónia associadas ou não a estados psiconeuróticos e perturbações do 
ajustamento. As benzodiazepinas só estão indicadas quando estas situações são graves, incapacitantes ou originam um marcado estado de sofrimento. Como miorrelaxante (adjuvante) - alívio do espasmo muscular esquelético, resultante de patologia local tal como inflamação muscular ou articular, ou secundário a traumatismos. Como anticonvulsivante (tratamento adjuvante) - mal epiléptico e outras situações convulsivas. Em anestesiologia - medicação pré-anestésica”
- (doc. n.° 12)
p) No que se refere aos efeitos indesejáveis o folheto informativo refere o seguinte:
“Os efeitos indesejáveis são, quase sempre, uma extensão das acções farmacológicas e incluem sonolência diurna, embotamento afectivo, redução do estado de alerta, confusão, fadiga, cefaleias, sensação de cabeça vazia, fraqueza muscular, ataria ou diplopia. Ocasionalmente podem ainda ocorrer outros efeitos tais como náuseas, obstipação, anorexia, boca seca, aumento do apetite, alterações da libido, irregularidades menstruais e alterações cutâneas (urticária, rash ou prurido).
Os efeitos indesejáveis ocorrem habitualmente nos primeiros dias de tratamento e normalmente desaparecem com a continuação da terapêutica” (doc. n.° 12)
q) Em 20-12-2016, pelas 16H48, a Senhora juíza Dr.a A………. enviou para o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, com conhecimento ao signatário, uma pronúncia que lhe havia sido solicitada sobre os atrasos processuais em processos administrativos de natureza urgentes de que era titular no TAF de Ponta Delgada, através de correio registado entregue na estação dos CTT de Telheiro, Barreio, Leiria (doc. n.° 13).
* 
3. Nos termos do artigo 20º nº 1 da Lei nº 35/2014 de 20 de Junho, que aprovou a lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, normativo que tem por epígrafe “verificação domiciliária da doença”, salvo nos casos de internamento, de atestado médico passado nos termos do nº 2 do artigo 17º e de doença ocorrida no estrangeiro, pode o dirigente competente, se assim o entender, solicitar a verificação domiciliária da doença.
O n.º 2 acrescenta que quando a doença não implicar a permanência no domicílio, o respetivo documento comprovativo deve conter referência a esse facto.
Dispondo o n.º 3 que nos casos previstos no número anterior, o trabalhador deve fazer acompanhar o documento comprovativo da doença da indicação dos dias e das horas a que pode ser efetuada a verificação domiciliária, num mínimo de três dias por semana e de dois períodos de verificação diária, de duas horas e meia cada um, compreendidos entre as 9 e as 19 horas (negrito nosso).
Em anotação a este artigo 20º, Mário Pereira, em documento publicado online (https://issuu.com/mariopereirao/docs/2014Jei_35_2014_texto_atualiz220150), entende que caso a declaração a que se refere o n.º 3 não seja enviada a consequência será considerar como não escrita a autorização de ausência do domicílio constante do certificado de incapacidade temporária; podendo a verificação da doença ser feita a todo o tempo e não nos períodos pré-determinados, como sucede quando a declaração é enviada.
Não nos parece que esta interpretação seja de seguir.
Nos termos do artigo 8.º, n.º 1, do Estatuto dos Magistrados Judiciais, estes "têm domicílio necessário na sede do juízo onde exercem funções, podendo, todavia, residir em qualquer ponto da comarca, desde que não haja inconveniente para o exercício de funções”.
Isto é, o magistrado judicial não está impedido de mudar de domicílio sempre que o entender e sem necessidade de autorização, desde que o faça para qualquer local situado na respectiva área de circunscrição judicial.
Deste modo, o magistrado judicial, durante o período de baixa por doença e desde que não saía da área da respectiva circunscrição, pode residir em local diverso daquele que é conhecido dos serviços, bem como pode mudar de residência durante o período da doença, não existindo nenhum dever de imediatamente comunicar aos serviços essa mudança. 
Por isso a argumentação de que a verificação domiciliária pode ser efectuada no local da residência conhecida, além de conduzir a uma intolerável compressão dos direitos dos magistrados, designadamente a possibilidade de ter residências alternadas dentro do respectivo círculo judicial (cfr. artigo 82.°, n.° 1, do Código Civil), pode conduzir a resultados falseados, se por exemplo a verificação da doença é feita em local que, entretanto, deixou de ser, máxime por motivos de força maior, a residência do magistrado.
A interpretação deve, a nosso ver, ser outra.
Ao não enviar a declaração o beneficiário impede, objectivamente, que a verificação possa ser feita por não ser possível apurar, com exactidão, qual o local onde se encontra de baixa por doença, pois como já se salientou, não lhe é exigível que esse local corresponda àquele que é conhecido dos serviços, como de resto o n.° 4 do citado artigo 20.º expressamente admite.
Consequentemente, a falta de entrega da declaração, impedindo a verificação da doença, só pode ter um desfecho: conduzir à injustificação das faltas.
É para este sentido que se inclina o acórdão do TCA Sul de 13-03-2008 (rec. n.° 02233/98), que embora tirado no domínio da lei anterior, implicitamente não deixa de vincar que a falta de comunicação do lugar onde o funcionário se encontra em regime de baixa constitui, até, infracção disciplinar.
*
4. Como resulta da factualidade acima exposta a Sra. Juíza apresentou a declaração a que se refere o artigo 20º, n.° 3, da Lei n.° 35/14 no próprio dia em que se deveria apresentar ao serviço, visto que embora o certificado refira que o termo da baixa ocorre em 18-01-2017, o certo é que tendo sido passado por 30 dias, aliás por imperativo legal, o termo da baixa ocorreu a 17-01-2017 e não no dia imediato.
Fê-lo, não por iniciativa própria, mas apenas porque, segundo afirma, lhe foi solicitado; aliás, muito tempo depois de lhe ser recordado que deveria apresentar a declaração. 
Contudo, a Senhora juíza não podia desconhecer que sobre si impendia esse dever, desde logo atendendo à sua qualidade de magistrada judicial, mas também porque já em ocasião anterior apresentou essa declaração.
De facto, a senhora juíza esteve de baixa por doença entre 16-02-2015 e 06-03-2015, tendo enviado a declaração através de email de 26-02-2015, referindo o seguinte:
“Junto envio declaração para efeitos de verificação domiciliária da doença, que por lapso meu não seguiu com o atestado médico oportunamente enviado,....”
Alega, no entanto, que não o fez agora devido a uma situação de "sonolência diurna, embotamento afetivo, redução do estado de alerta, confusão, fadiga, cefaleias, sensação de cabeça vazia, fraqueza muscular ataxia ou diplopia", causada pela toma do medicamento …….. Retard.
Consultada a página da farmacêutica titular da respectiva Autorização de Introdução no Mercado, a ……….., e efectuado o download do folheto informativo, da respectiva leitura constata-se que este medicamento está especialmente indicado para o “Tratamento da ansiedade e insónia associadas ou não a estados psiconeuróticos e perturbações do ajustamento. As benzodiazepinas só estão indicadas quando estas situações são graves, incapacitantes ou originam um marcado estado de sofrimento. Como miorrelaxante (adjuvante) - alívio do espasmo muscular esquelético, resultante de patologia local tal como inflamação muscular ou articular, ou secundário a traumatismos.
Como anticonvulsivante (tratamento adjuvante) - mal epiléptico e outras situações convulsivas.
Em anestesiologia - medicação pré-anestésica”
No que se refere aos efeitos indesejáveis o folheto informativo expressamente refere aqueles que a Senhora juíza invoca mas acrescenta que “ocorrem habitualmente nos primeiros dias de tratamento e normalmente desaparecem com a continuação da terapêutica” (negrito nosso). 
Por conseguinte a alegação da Senhora juíza - que obviamente não constitui prova adequada da impossibilidade de, atempadamente, entregar a declaração dos períodos e local onde poderia ser feita a verificação da doença - não é inteiramente exacta.
Pelo contrário, os factos acima referidos refutam a veracidade dessa alegação.
Com efeito, resulta do depósito na estação dos CTT de Telheiro, Barreira, Leiria, do correio registado através do qual enviou o original do certificado de incapacidade temporária, que pelo menos no dia 20-12-2016 a Senhora juíza viajou para o continente, seguramente por avião, viagem que é de todo incompatível com o estado de “sonolência” e “embotamento” dos sentidos que pretender fazer crer que atravessava.
A entrega do próprio certificado demonstra que esse estado não era, pelo menos, tão grave que a impedisse de remeter conjuntamente a declaração, pois se o fosse impediria também o envio do próprio certificado.
Aliás, através de depósito de correio registado, efectuado na mesma data e no mesmo local, a senhora juíza pronunciou-se sobre os motivos dos atrasos nos processos urgentes de contencioso administrativo de que era então titular, pronúncia que é de todo incompatível com o estado de sonolência e embotamento que pretende fazer crer que atravessava.
Ademais, referindo o já citado folheto informativo que os tais efeitos indesejados desaparecem com a continuidade do tratamento, então na data em que foi advertida para fazer a entrega da declaração (03-01-2017) certamente que já não padecia de estado sonolento ou embotante que a impedisse de enviar a mesma.
A falta de entrega da declaração radica, pois, noutros motivos que não aqueles que alegou.
Em resumo, não tendo a Senhora juíza apresentado qualquer prova da impossibilidade de envio da declaração indicando o lugar e os períodos onde e quando poderia ser feita a verificação domiciliária da doença, e sendo manifesto que as meras alegações que produziu não são verosímeis, encontro-me impedido de considerar que as faltas que deu no período de 19-12-2016 a 18-01-2017 podem ser justificadas.
*
5. Em face de todo o exposto não justifico as faltas dadas a título de baixa por doença, no período compreendido entre 19-12-2016 e 18-01-2017, pela Senhora Juíza do TAF de Ponta Delgada, Dr.a A…………..”.
Notifique e comunique ao CSTAF e ao TCA Sul.
Lisboa, 2017-03-22
O Presidente do TAF de Ponta Delgada
Juiz Desembargador
(assinatura manuscrita) (Benjamim Barbosa)




DO DIREITO


A questão única trazida a recurso consiste em saber se, no que respeita aos actos praticados ao abrigo de delegação de poderes, o regime constante do artº 44º nº 5 CPA/revisão de 2015 envolve a alteração da competência jurisdicional para conhecer “dos processos em matéria administrativa relativos a acções ou omissões … [do] Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais” atribuída à Secção de Contencioso Administrativo do STA pelo artº 24º nº 1 a), vii) ETAF, que passaria a caber aos Tribunais Administrativos de 1ª Instância, no caso, ao TAF de Ponta Delgada.
Isto porque, no caso em apreço, o acto sancionatório em matéria laboral não emerge de deliberação do CSTAF nem de despacho do seu Presidente mas de despacho do Presidente do TAF de Ponta Delgada considerando-se no acórdão recorrido que
“(..) o artº 44º nº 5 CPA de 2015 não significa, ao contrário do entendimento plasmado na decisão recorrida, que os actos praticados ao abrigado da delegação ou subdelegação de poderes são imputados à esfera jurídica do delegante ou do subdelegante - pois os actos em causa são imputáveis ao delegado ou subdelegado (in casu o acto impugnado é imputável ao Presidente do TAF de Ponta Delgada, Juiz Desembargador Benjamim Barbosa) - mas apenas que os actos do subdelegado têm a mesma força jurídica que teriam se fossem praticados pelo subdelegante (..)” – pág. 7 do acórdão sob recurso.
Neste sentido, com fundamento em que se trata de acto imputável à esfera jurídica do Presidente do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Ponta Delgada, o acórdão sob recurso conclui que compete ao TAF de Ponta Delgada e não à Secção de Contencioso Administrativo do STA conhecer da impugnação do despacho de 22.03.2017 que declarou injustificadas as faltas no período compreendido entre 19.12.2016 e 18.1.2017 dadas a título de baixa por doença pela Juiz de Direito, ora Recorrida, em exercício de funções naquele TAF.
*
Todavia, face ao disposto no artº 24º nº 1 a), vii) ETAF, que comete à Secção de Contencioso Administrativo do STA o conhecimento dos processos relativos a acções ou omissões do CSTAF, o despacho de 22.03.2017 praticado por subdelegação de poderes e objecto de rectificação por despacho de 07.04.2017, não envolve nenhuma questão de competência jurisdicional.
Diversamente, o despacho de 22.03.2017 rectificado em 07.04.2017 implica tomar posição no tocante à natureza jurídica da delegação de poderes enquanto instituto do direito da organização administrativa.



a. delegação de poderes administrativa – artºs. 44º a 50º CPA;


Em razão das conclusões de recurso, o caso presente convoca o regime da delegação de poderes administrativa, regulado nos artºs. 44º a 50º do CPA.
Na circunstância, a norma habilitante do acto de delegação de 17.01.2017 do CSTAF no Presidente do Conselho (artºs 36º/1, 44º/1 e 47º/1 CPA) e que indica os poderes delegáveis consta do artº 74º nº 3 als. a), b) e c) ETAF:
“3 - O Conselho pode delegar no presidente, ou em outro dos seus membros, a competência para:
a) Praticar actos de gestão corrente e aprovar inspecções;
b) Nomear os juízes para uma das secções do Supremo Tribunal Administrativo e dos tribunais centrais administrativos;
c) Ordenar inspecções extraordinárias, averiguações, inquéritos e sindicâncias.”
Por sua vez, o exercício da competência delegada pelo delegado consta do artº 78º f), ETAF, ambos os artigos na versão dada pelo DL 214-G/2015 de 02.10 (c/republicação).
*
Ou seja, o acto jurídico de delegação de poderes por deliberação do CSTAF de 17.01.2017 funda-se em acto legislativo habilitante [o citado artº 74º nº 3 als. a), b) e c)] tendo por referência quanto ao objecto da delegação o conjunto das competências (poderes) atribuídas ao delegante pelo artº 74º nºs. 1 e 2, ambos do ETAF, na medida em que “(..) para haver delegação de poderes, é necessário que o órgão delegante seja titular da competência delegada e tal titularidade depende de uma norma que a confira (artigo 36º nº 1).E, além disso, a delegação requer que uma norma jurídica habilite o delegante a praticar o acto que a tem por conteúdo (artigo 44º nº 1).(..)” (Sérvulo Correia in Comentários à revisão do Código de Procedimento Administrativo, Almedina/2016, págs. 100-101.)
Especificamente, o conteúdo da delegação de 17.01.2017, isto é, os poderes delegados pelo CSTAF no Presidente, é delimitado pela previsão habilitante do artº 74º nº 3 a) ETAF [Praticar actos de gestão corrente] sendo especificadamente (artº 47º/1 CPA) os seguintes:
“c) Praticar actos relativos a licenças e faltas dos juízes da jurisdição administrativa e fiscal, com a faculdade de subdelegar.” - ponto 2 do probatório.
Deste modo, verifica-se que o poder de delegação, isto é, a competência para permitir ao delegado (Presidente do Conselho) “praticar actos relativos a licenças e faltas dos juízes da jurisdição administrativa e fiscal” é atribuído ao delegante (o CSTAF) por norma do mesmo valor hierárquico da norma que, em abstracto, define as competências próprias do órgão delegante, ou seja, a norma de habilitação da delegação e a norma atributiva do poder delegado têm idêntico valor hierárquico, observando o requisito da especificação e publicidade (artº 47º/1/2 CPA).
*
Em matéria de subdelegação, o delegante é autorizado por disposição expressa de lei a autorizar o delegado a, por sua vez, subdelegar os poderes delegados (artº 46º/1 CPA), funcionando este dispositivo como norma habilitadora, o que se verifica expressamente no acto de delegação de 17.01.2017 do CSTAF no Presidente do Conselho, a quem expressamente são consignados poderes para os subdelegar:
“c) Praticar actos relativos a licenças e faltas dos juízes da jurisdição administrativa e fiscal, com a faculdade de subdelegar.” - ponto 2 do probatório.
Subdelegação concretizada por despacho do Presidente do CSTAF de 27.01.2017 nos Presidentes dos Tribunais Administrativos e Fiscais especificamente no que ora importa à Zona Lisboa e Ilhas, no Presidente do TAF de Ponta Delgada, como segue
Ao abrigo da deliberação do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, de 17 de janeiro de 2017 …, subdelego …, e nos Presidentes dos Tribunais Administrativos e Fiscais, Desembargador Benjamim Magalhães Barbosa (Zona Lisboa e Ilhas) … , os poderes que me foram conferidos pela referida deliberação para a prática dos atos relativos a licenças, faltas, autorizações de ausência do serviço e autorizações de residência dos juízes em exercício de funções nos respectivos tribunais,…”
Tendo em conta que o delegante (ou o subdelegante) pode avocar, revogar, anular ou substituir o acto praticado pelo delegado (ou subdelegado, posto que havendo subdelegação o delegado assume o papel de delegante) bem como emitir directivas ou instruções vinculativas genéricas relativas ao modo de exercício dos poderes delegados (artº 49º/1/2 CPA) temos que a competência dispositiva originária permanece na esfera jurídica do delegante (ou subdelegante).



b. actos do delegante e delegado – equivalência jurídica - competências de tribunal de 1ª instância do STA;


De acordo com a jurisprudência pacífica e o entendimento mais generalizado da doutrina, durante a delegação o delegante não fica privado do exercício dos poderes, cuja titularidade mantém, antes se verifica a transferência para o delegado da faculdade de exercer uma competência atribuída por lei ao delegante, o que significa que o delegado assume, em nome próprio, o exercício de uma competência alheia. (Pedro Costa Gonçalves, Manual de Direito Administrativo, Vol. I, Almedina/2019, págs.954-956, 958, 959-960, 976-978.)
Conforme sublinha a doutrina da especialidade “(..) o valor jurídico e eficácia do acto não se degrada pelo facto de ser praticado por delegação de poderes permitida por lei. Na delegação não se compreende apenas a outorga do poder de decidir, mas também, naturalmente, do poder de decidir como decidiria o delegante (..) o acto do delegado tem a mesma natureza que teria caso houvesse sido praticado pelo delegante. (..)” (Mário Esteves de Oliveira, Direito administrativo - Lições,1980/FDL, págs. 384 e 584.)
No quadro do novo CPA “(..) o nº 5 é inovatório, deixando clara a identidade de natureza do acto do delegado (ou subdelegado) com a do mesmo acto se praticado pelo delegante (ou subdelegante). A asserção de que os actos praticados ao abrigo da delegação ou subdelegação de poderes valem como se tivessem sido praticados pelo delegante ou subdelegante corresponde a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Administrativo (..)” (Sérvulo Correia in Comentários …, Almedina/2016, pág. 94.)
É este sentido de equivalência de natureza jurídica entre o acto praticado pelo delegante e o acto praticado ao abrigo de uma delegação de poderes que o nº 5 do artº 44º CPA expressa, ou seja, “(..) esta norma não pode ter querido dizer outra coisa senão que os actos do (sub) delegado têm a mesma força jurídica que teriam se fossem praticados pelo (sub) delegante … apesar de valerem como tal, os actos em causa são imputáveis ao delegado ou subdelegado, como é entendimento comum (..)” (Luiz Cabral de Moncada, Código do Procedimento Administrativo – anotado, Coimbra Editora/2015, pág. 198.)
Transpondo esta equivalência jurídica para o plano adjectivo, cumpre considerar a situação trazida a recurso no quadro definido pelo artº 24º do ETAF relativamente à competência em 1ª instância atribuída ao Supremo Tribunal Administrativa nas matérias da Secção de Contencioso Administrativo.
O caso concreto centra-se no despacho de 22.3.2017 do Presidente do Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada de não justificação das faltas dadas a título de baixa por doença no período compreendido entre 19.12.2016 e 18.1.2017, pela Juiz de Direito em exercício de funções naquele TAF.
O citado despacho de 22.3.2017 foi praticado ao abrigo da delegação de poderes do CSTAF no Presidente do Conselho, que subdelegou no Presidente do TAF de Ponta Delgada.

*
No artº 24º ETAF ao atribuir ao STA competências de tribunal de 1ª instância o legislador determinou-se em função de dois elementos estruturais da relação processual: as partes presentes no processo e o objecto da causa substanciado pela relação jurídica material. (Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, Código do Processo nos Tribunais Administrativos e ETAF – anotados, Almedina/2004, págs.80-84.)
No primeiro o legislador teve em atenção a qualidade ou estatuto dos demandados ou seja, as acções em que tratando-se da função administrativa são demandados os mais altos órgãos do Estado ou da Justiça - de que são exemplo as alíneas a), c), e) ou f) do nº 1 ETAF.
No segundo, o legislador centrou-se no jus disputatum evidenciado pelo objecto da causa, de que são exemplo os processos relativos a eleições previstas no ETAF, a providências cautelares e acções executivas relativas a processos da competência “inicial” do STA, alíneas c) e d) do nº 1 ETAF, e acções de regresso no domínio indemnizatório em que sejam demandados juízes do STA e TCA’s ou magistrados do Ministério Público em funções junto destes tribunais, alínea f) do nº 1 ETAF.
O caso trazido a recurso é claramente um litígio cujo objecto envolve directamente as competências materiais do CSTAF (artº 74º nºs. 1 e 2 ETAF) delegadas no Presidente do Supremo Tribunal Administrativo (artº 74º nº 3 als. a), b) e c) ETAF), por inerência, Presidente daquele Conselho, que os subdelegou no Presidente do TAF de Ponta Delgada (artº 46º/1 CPA), matéria levada aos pontos 2 e 3 do probatório.
O que significa que a relação jurídica controvertida em matéria de direito laboral constitutiva do objecto do presente processo é incindível do objecto do acto de delegação de poderes da deliberação do CSTAF e do despacho de subdelegação do seu Presidente, delegação ao abrigo da qual surge o despacho de injustificação de faltas do Presidente do TAF de Ponta Delgada de 22.3.2017, praticado no exercício de competência alheia delegada e subdelegada e cujo titular originário por disposição legal expressa é o CSTAF.

*
De quanto vem de ser exposto se conclui que a relação material controvertida constitutiva do objecto da causa prende-se com o exercício de competências do CSTAF delegadas no seu Presidente ao abrigo do artº 74º nº 3 als. a), b) e c), ETAF e objecto de subdelegação no Presidente do TAF de Ponta Delgada, cuja titularidade é cometida ao CSTAF conforme artº 74º nºs. 1 e 2, ETAF.
Consequentemente, a competência em 1ª instância para conhecer da relação material controvertida nos presentes autos cabe à Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo conforme disposto no artº 24º nº 1 al. a) vii) do ETAF.
***


Pelo exposto acordam, em conferência, os Juízes Conselheiros da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo em julgar este Tribunal competente em 1ª instância para o julgamento da causa e, por consequência, revogar o acórdão do TCA-Sul.

Custas a cargo da Recorrida – valor da causa: €30.000,01.

Notifique.

Lisboa, 13.MAI.2021. - Maria Cristina Gallego dos Santos (relatora) - Maria do Céu Dias Rosa das Neves - José Francisco Fonseca da Paz (vencido conforme declaração anexa).


DECLARAÇÃO DE VOTO
Nos termos do art.° 24.°, n.° 1, al. a), vii, do ETAF, compete ao STA conhecer em primeira instância dos processos em matéria administrativa relativos a acções ou omissões do CSTAF ou do seu Presidente.
O acto impugnado foi proferido pelo Presidente do TAF de Ponta Delgada que não é uma das entidades indicadas no aludido art.° 24.°, n.° 1, al. a).
Ainda que este acto tenha sido praticado ao abrigo de uma subdelegação de poderes do CSTAF, é da autoria e responsabilidade do subdelegado e não da entidade subdelegante.
A circunstância de o art.° 44.º, n.° 5, do actual CPA, referir que os actos praticados ao abrigo de delegação ou subdelegação de poderes valem como se tivessem sido praticados pelo delegante ou subdelegante não significa que, como se existisse um fenómeno de representação, eles devam ser imputados a este, mas apenas que - como bem notou o acórdão recorrido - eles são dotados da mesma força jurídica.
Assim, apesar de o actual ETAF não conter uma disposição idêntica à do art.° 7.°, do ETAF aprovado pelo DL n.° 129/84, de 27/4 - creio que por desnecessidade - considero ser de manter o entendimento tradicional que se vinha seguindo.
Nestes termos, porque o acto impugnado não corresponde a uma acção ou omissão do CSTAF nem do seu Presidente, entendo, em consonância com o acórdão recorrido, que face ao disposto no art.° 44.°, n.° 1, do ETAF, seria de atribuir a competência ao TAF, negando-se, em consequência, provimento ao recurso.