Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0108/22.1BALSB
Data do Acordão:05/24/2023
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:ARAGÃO SEIA
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P31018
Nº do Documento:SAP202305240108/22
Data de Entrada:09/02/2022
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (DSCJC)
Recorrido 1:Z..., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:


A Diretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), entidade requerida nos autos de pedido de pronúncia arbitral tributária que correram termos no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) sob o n.º 500/2021-T, vem, por não se conformar com parte da decisão final aí proferida e nos termos do disposto no artigo 25.º, n.º 2 e 4, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), na redação da Lei n.º 119/2019 de 18 de setembro, apresentar Recurso para Uniformização de Jurisprudência, por contradição da decisão proferida nos autos com as decisões proferidas nos processos CAAD n.ºs. 14/2011-T (parte do recurso respeitante a dedução de custos) e 295/2018-T (parte do recurso respeitante aos juros liquidados pela ATA).

Alegou, tendo concluído:
A. O presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência tem como objeto o acórdão arbitral proferido no processo n.º 500/2021-T, em 01-07-2022, por Tribunal Arbitral Coletivo em matéria tributária constituído, sob a égide do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), na sequência de pedido de pronúncia arbitral apresentado ao abrigo do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro.
B. O acórdão arbitral recorrido colide frontalmente com a jurisprudência firmada na decisão arbitral proferida no processo n.º 14/2011-T, datada de 4 de janeiro de 2012, já transitada em julgado (cfr. certidão do processo arbitral), nos segmentos decisórios constantes dos pontos (ii) e (iii) da alínea a) do dispositivo, que determinam a anulação parcial das liquidações de IRC dos exercícios de 2016 e 2017, na parte em que decorre das correções atinentes a «Gastos não aceites -gastos financeiros não incorridos para a obtenção ou garantia de rendimentos.».
C. O Acórdão arbitral recorrido também colide com a jurisprudência firmada na decisão arbitral proferida no processo n.º 295/2018-T, datada de 31 de maio de 2019 e já transitada em julgado (cfr. certidão do processo arbitral), no segmento decisório constante da línea b) do dispositivo, que determina a anulação total das liquidações de juros compensatórios.
D. A Recorrente defende, com o devido respeito, que o acórdão arbitral recorrido incorreu em erro de julgamento, quando, em contradição total com o acórdão proferido no processo n.º 14/2011-T, o Tribunal arbitral considerou procedente «o vício de violação de lei invocado pela Requerente, consubstanciado na errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 23.º, n.ºs 1 e 2, alínea c), do Código do IRC, relativamente às correções efetuadas pela AT à matéria coletável de IRC dos exercícios de 2016 e 201 7, atinentes a “Gastos não aceites - gastos financeiros não incorridos para a obtenção ou garantia de rendimentos", nos montantes de € 304.759,67 e de € 122.015,58, respetivamente, pelo que, nessa exata medida, são parcialmente inválidos os atos de liquidação adicional de IRC dos anos de 2016 e de 2017 que, por isso, devem ser parcialmente anulados (cf. artigo 163.º, n.º 1, do CPA, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea d), do RJAT)».
E. O acórdão arbitral recorrido entendeu, com relevância para apreciação do presente recurso, o seguinte:
«21. Como resulta do facto provado l), em dezembro de 2007, ocorreu a fusão por incorporação, com transferência global do património das sociedades incorporadas "Y... SGPS, S.A." e "X... Indústria - ..., S.A." para a Requerente, enquanto sociedade incorporante; tratou-se, pois, de uma operação de fusão e, mais concretamente, de uma fusão inversa.
No respetivo projeto de fusão está consignado o seguinte relativamente à contrapartida a atribuir aos acionistas das sociedades incorporadas: "Em virtude desta fusão haverá, tão e somente, a atribuição da totalidade das ações da W... detidas pelas Y... diretamente à acionista única da sociedade incorporada X... (INDÚSTRIA) - X... CAPITAL SGPS SA - não havendo, pelo mesmo motivo, lugar à fixação de outros critérios de avaliação de relações de troca das participações sociais." (cf. PA)
No mesmo projeto de fusão está, ainda, referido o seguinte quanto à modalidade da fusão e à atribuição e entrega de ações: “a totalidade das ações representativas do capital social da W... serão atribuídas aos acionistas da X... (INDÚSTRIA) (…)”; "Concluída a operação, as ações representativas do capital social da W... (…) serão atribuídas à X... CAPITAL SGPS SA, sócia única da sociedade incorporada X... (INDÚSTRIA) (...)". (cf. PA)
Nos termos do artigo 97.º, n.º 1, do CSC, “[d]uas ou mais sociedades, ainda que de tipo diverso, podem fundir-se mediante a sua reunião numa só"; sendo que, nos termos do n.º 4 do mesmo artigo, a fusão pode realizar-se, entre outras formas, ″[m]ediante a transferência global do património de uma ou mais sociedades para outra e a atribuição aos sócios daquelas de partes, ações ou quotas desta".
Dito isto. Importa aqui ter presente a seguinte factualidade que resultou provada:
''j) Em fevereiro de 2007, a sociedade ''X... Indústria - …, S.A. "celebrou um Contrato de Financiamento com o "Banco 1..., S.A." e com o ''Banco 2..., S.A.”, pelo qual contraiu um empréstimo de € 12.350.000,00 que lhe permitiu adquirir 78,95% do capital social da sociedade ''Y... SGPS, S.A.”.
o) No decurso do exercício de 2016, a Requerente contratualizou dois financiamentos de médio e longo prazo com o ''Banco 3..." e com o ''Banco 4...', no montante global de € 5.000.000,00, para liquidação do financiamento referido no facto provado j), tendo, dessa forma, passado a beneficiar de taxas de juros inferiores e de prazos de pagamento mais alargados.
p) No âmbito dos financiamentos mencionados nos factos provados j) e o), a Requerente incorreu em gastos no total de € 304.759,67 e de € 122.015,58, respetivamente, nos exercícios de 2016 e de 2017, que foram registados contabilisticamente nas contas SNC 681236 (Imposto de Selo - Financiamento MLP), 69112 (Empréstimos bancários- Financiamento MLP) e 6984 (Operações de financiamento).».
F. O Tribunal a quo equacionou a questão a decidir nos seguintes termos: «A questão jurídico-tributária que aqui se coloca consiste em determinar se os aludidos gastos de natureza financeira suportados pela Requerente, nos exercícios de 2016 e 2017, são, ou não, por ela dedutíveis, ao abrigo do disposto no artigo 23.º, n.ºs 1 e 2, alínea c), do Código do IRC.».
G. Esclarecendo o Tribunal arbitral que:
«Vistos e ponderados os argumentos num e noutro sentido, constitui nosso entendimento que é de aceitar a dedução fiscal de tais gastos de natureza financeira, por se mostrarem preenchidos os respetivos pressupostos legais decorrentes do artigo 23.º, n.ºs 1 e 2, alínea c), do Código do IRC.
Esta nossa posição é sustentada pela fundamentação vertida na decisão arbitral proferida, em 19.05.2017, no processo arbitral n.º 537/2016-T que, por merecer a nossa concordância, data venia, fazemos nossa (…)».
H. Ora, no âmbito da ação arbitral n.º 14/2011-T, o Tribunal apreciou precisamente a mesma operação de fusão inversa e a dedutibilidade dos encargos financeiros incorridos pela Requerente no exercício de 2007.
I. O Tribunal negou a dedutibilidade fiscal dos encargos financeiros suportados, julgando improcedente o vício de violação de lei, por infração ao disposto no artigo 23.º do Código do IRC, com a seguinte fundamentação:
«f) Dedutibilidade fiscal dos encargos financeiros na Requerente com o financiamento contraído pela B ...
64. Cabe agora apreciar a legalidade da liquidação de IRC de 2007 respeitante à Requerente com referência à correção ao lucro tributável, sobre que exclusivamente incide a impugnação objecto do presente pedido arbitral, que concerne aos encargos financeiros no montante de €342.418,19, a que corresponde o valor proporcional de imposto e juros liquidados de €104.340,61.
A respeito desta correção, o Relatório de Inspeção, que se dá como inteiramente reproduzido no ponto XIX dos factos provados, desenvolve o seguinte discurso justificativo:
- “A 31/12/2007 (data do lançamento na contabilidade), via fusão, a A ... registou na conta 23146 – Financiamento Médio/Longo Prazo o montante de €12.350.000 a crédito (...), reconhecendo desta forma na sua contabilidade um passivo de médio e longo prazo.Aquele financiamento, no montante de 12.350.000€, foi contraído pela B ... Indústria (...) para com aquele dinheiro pagar as ações da C ..., bem como a dívida contraída pela C ... SGPS para pagamento da compra das ações da A .... Verifica-se que o financiamento, bem como os respetivos encargos a ele associados, relacionados com a aquisição de partes de capital social da A ..., com a operação de fusão passam a ser suportados por ela própria, isto é, a sociedade adquirida, a A ..., passa a suportar os encargos financeiros e outros com a aquisição dela própria” (ponto 7.2).
- “À luz do art. 23.º do CIRC consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora. Assim, podemos concluir que os custos financeiros e outros, nomeadamente o imposto de selo, decorrentes deste financiamento, que após fusão ficou registado na conta 23146 não contribuíram para a realização de proveitos ou ganhos ou para a manutenção da fonte produtora da A ..., na medida em que, aquele empréstimo quando contraído foi utilizado unicamente para pagamento das ações da A ... na medida em que o único ativo da C ... SGPS era precisamente as ações da A ...” (ponto III.2.1);
- “aqueles encargos não estão relacionados com a atividade da A ... e sim com a atividade e interesse da D..., pelo que aqueles custos [são] comprovadamente dispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a impostos obtidos pela A ...” (ponto IX).
65. Por seu lado, a Requerente, para sustentar o vício de violação de lei apontado a esta correção “por violação frontal ao disposto no artigo 23.º do Código do IRC”, deduz fulcralmente fundamentos consistentes, tão simplesmente, em meros enunciados contrafactuais. Com efeito, sobre a dedutibilidade fiscal dos custos incorridos com o financiamento inicialmente contraído pela B ..., que, por efeito da fusão, foi transmitido para a própria Requerente, no RI, para além da observação de que está hoje assente que a “Administração fiscal apenas pode não aceitar como dedutíveis os juros suportados por uma empresa relativamente a empréstimos quando manifestamente se comprovar que os fundos obtidos foram aplicados em fins estranhos à atividade da empresa” (art. 308 do RI), alega-se fundamentalmente o seguinte:
- “a fusão poderia ter ocorrido com a B ... SA como incorporante – situação na qual os encargos com o financiamento continuariam a deduzir-se naquela sociedade” (cfr. arts. 294 e 300 do RI);
- “o Grupo B ... poderia (...) ter recorrido ao Regime Especial de Tributação de Grupos de Empresas (RETGS) para poder beneficiar do aproveitamento dos custos e subsequentes prejuízos gerados na B ... Indústria com o citado financiamento” (arts. 299, 303 e 306 do RI).
Pois bem, tendo em conta que, como já cima se explicitou (n.º 38), para decidir sobre a dedutibilidade dos encargos financeiros advenientes do empréstimo em questão, o que importa, no ponto, é a objetividade da operação documentalmente provada nos autos e a sua relação com os tópicos constantes do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC, não cabe aqui senão verificar, como refere a própria Requerente, se os fundos obtidos foram concretamente aplicados em fins estranhos à atividade da empresa que deles é devedora. Elementos hipotéticos, como são as opções, com muita frequência copiosas e diversas, que a empresa poderia ter tomado, ou as possibilidades de estruturação das operações de outras formas, também elas muitas vezes numerosas, não relevam para a apreciação da matéria sub judice, dado que não se cuida aqui de situações virtuais, de situações que poderiam ter acontecido mas não aconteceram, mas sim de ocorrências verificadas na realidade da vida, tal como se consideraram provadas. Efetivamente, o que cabe desenvolver por este Tribunal é a fiscalização da legalidade do ato tributário impugnado tendo em atenção os elementos concretos do caso submetido à sua apreciação e o complexo das avaliações feitas e das justificações apresentadas pela Administração Tributária.
Vejamos então, nesta base, a questão suscitada quanto à dedutibilidade fiscal dos encargos financeiros suportados pela Requerente, após a fusão, com o empréstimo contraído pela sociedade incorporada B ....
66. Deve começar-se por recordar que os juros suportados pelos sujeitos passivos de IRC como remuneração de empréstimos contraídos e demais encargos financeiros associados são dedutíveis como custos no apuramento do lucro tributável em conformidade com o disposto no art. 23.º do CIRC, n.º 1, al. c), segundo o qual, na redação em vigor em 2007, “consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora”, nomeadamente “encargos de natureza financeira, como juros de capitais alheios aplicados na exploração”.
Assim, nos termos desta disposição legal, a dedutibilidade fiscal dos juros suportados depende de um juízo quanto à sua indispensabilidade para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora (corpo do n.º 1), explicitando mesmo a al. c) do n.º 1 desta disposição que esses juros de capitais alheios são “aplicados na exploração”.
Este requisito da indispensabilidade dos custos/gastos para a realização dos proveitos/rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, estabelecido pelo art. 23.º do CIRC, tem sido objecto de devido tratamento jurídico pela jurisprudência em ordem à resolução dos casos concretos que tem de enfrentar, pelo que a solução que se vai dar ao caso sub judice se arrima diretamente na aplicação das diretrizes jurisprudenciais desenvolvidas neste âmbito, como, aliás, o impõe o princípio elementar constante do n.º 3 do art. 8.º do Cód. Civil.
Pois bem, principia-se por assinalar que, em síntese muitas vezes reiterada, o Supremo Tribunal Administrativo declarou quanto ao sentido e funcionamento do requisito da indispensabilidade dos custos para efeitos fiscais o seguinte: “o requisito de indispensabilidade de um custo tem de ser interpretado como um conceito indeterminado de necessário preenchimento casuístico, em resultado de uma análise de perspetiva económica empresarial, na perceção de uma relação de causalidade económica entre a assunção de um custo e a sua realização no interesse da empresa, atento o objecto societário do ente comercial em causa” (cfr., por exemplo, os acórdãos do STA de 15.6.2011, proc. n.º 049/11, n.º III e de 29.3.2006, proc. n.º 01236/05, n.º 3.4).
Nesta sequência, o Supremo Tribunal Administrativo já precisou devidamente no seu acórdão de 10.7.2002, proc. n.º 0246/02, que “os custos previstos naquele art. 23º têm de respeitar à própria sociedade contribuinte, a se”, pelo que “[p]ara que determinada verba seja considerada custo daquela é necessário que a atividade respetiva seja por ela própria desenvolvida, que não por outras sociedades ainda que em relação de domínio”, reiterando nos seus acórdãos subsequentes de 7.2.2007, proc. n.º 01046/05, n.º III, de 20.5.2009, proc. 01077/08, de 30.11.2011, proc. n.º 0107/11 e de 30.05.2012, proc. n.º 0171/11, que: “os custos têm de respeitar desde logo à própria sociedade contribuinte, isto é, para que determinada verba seja considerada custo daquela é necessário que a atividade respectiva seja por ela própria desenvolvida, que não por outras sociedades”, pois, “[a] não ser desta forma, como que podia ser imputada a uma sociedade o exercício da atividade de outra com a qual ela tivesse alguma relação”. Noutra vertente, encontra-se igualmente devidamente explicitado que é pressuposto na aplicação do art. 23.º do CIRC “a consideração individualizada de cada empresa ou instituição pelo que não podem interferir aqui raciocínios daqueles em que se faz apelo a critérios de gestão do “grupo” ou mesmo dos financiamentos – ainda que gratuitos – dos seus sócios ou mesmo a vontade destes que nessa matéria é irrelevante, visto que se trata de um critério legal, sendo unicamente relevante a pessoa coletiva cujos custos estão em apreciação” (vd. o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 16.10.2007, proc. n.º 01276/06).
Deste modo, é estritamente em relação à entidade cujos custos estão em consideração, tendo em atenção à atividade empresarial que desenvolve, que importa apreciar a dedutibilidade fiscal dos encargos financeiros.
Essa dedutibilidade fiscal supõe, então, que os custos incorridos com os encargos financeiros possuam uma conexão de causalidade com a atividade empresarial desenvolvida, maxime sirvam ao desenvolvimento da atividade da sociedade deles devedora. Consequentemente, como observa MARIA DOS PRAZERES LOUSA, “O problema da dedutibilidade dos juros para efeitos da determinação do lucro tributável” in Estudos em homenagem à Dr. Maria de Lourdes Correia e Vale, Lisboa, 1995, p. 349, não podem ser aceites como dedutíveis os juros suportados por uma empresa relativamente a empréstimos em que manifestamente se comprove que os fundos obtidos são “desviados da exploração e aplicados em fins estranhos à mesma”. Noutra fórmula que encontramos em RUI DUARTE MORAIS, Apontamentos ao IRC, Coimbra, 2007, p. 87, “se o encargo foi determinado por outras motivações (interesse pessoal dos sócios, administradores, credores, outras sociedades do mesmo grupo, parceiros comerciais, etc), então tal custo não deve ser havido por indispensável”.
67. Tendo em conta estas diretrizes, para proceder à aplicação ao caso em apreço do requisito da indispensabilidade dos custos, cabe verificar, na base de todos os factos e circunstâncias relevantes, a afetação efetiva e concreta do empréstimo de que os juros suportados são a remuneração, por outras palavras, importa ponderar o destino ou uso dos fundos obtidos em relação aos quais o sujeito passivo pretende deduzir fiscalmente, para efeitos do apuramento do seu lucro tributável, os juros e demais encargos associados que suportou.
Ora, procedendo ao apuramento e rastreamento do uso e destino do financiamento –nos termos de um bem conhecido “tracing approach” (sobre este método e sua aplicação cfr. o clássico trabalho de ARNOLD, General Report, in Cahiers de Droit Fiscal International, vol. 79a (1994), Deductibility of interest and other financing charges in computing income, pp. 498 a 500) –, retira-se, com evidência, da matéria de facto dada como provada que os fundos em apreço possuem como finalidade, destino e uso a aquisição das próprias participações sociais da Requerente pela sociedade D... SGPS, pelo que a afetação do empréstimo não se prende com a atividade nem com ativos detidos pela sociedade que dele é devedora, a aqui Requerente, mas sim com ativos detidos pela sua própria sócia.
Isto resulta, direta e imediatamente, do próprio contrato de empréstimo que foi celebrado, conforme se conclui dos factos dados como provados nos n.ºs VII e VIII. É que o empréstimo que se encontra em apreciação constitui um mútuo de escopo, modalidade de mútuo que se caracteriza por o mutuário, para além de se obrigar à restituição do capital e dos juros (arts. 1142.º e 1145.º do Cód. Civil), se comprometer ainda à aplicação das quantias mutuadas no âmbito de um fim específico, acordado com o mutuante (sobre o mútuo de escopo, vd., por todos, LUÍS MENEZES LEITÃO, Direito das Obrigações, vol. III, Contratos em especial, 7.ª ed., Coimbra, 2010, pp. 423-424). Na verdade, se se confrontar as estipulações do contrato de financiamento dado como integralmente reproduzido em VII verifica-se que compreendem um clausulado de destinação dirigido a fixar, em termos vinculativos para o mutuário, a afetação específica das quantias mutuadas, afetação essa que, por resultar da vontade das partes, permite configurar no caso um mútuo de escopo voluntário ou de fim convencionado. Assim, nos termos da cláusula 2.º, n.º 1, al. a) do contrato de financiamento, já acima citada em VII, o empréstimo concedido à B ... tem por “finalidade necessária e exclusiva habilitar a V... com fundos para esta adquirir e pagar aos Vendedores parte do preço, de montante igual, das ACÇÕES C ... que vai adquirir” (sublinhados nossos), prevendo-se também logo, conforme cláusula 17ª, n.º 1 já acima citada em VIII, que: “O BANCO declara o seu acordo de princípio à reestruturação empresarial do GRUPO B ..., consubstanciada na fusão por incorporação da B ... e da C ... na A ...”.
Deste modo, tendo em conta estas cláusulas e a fusão realizada, impõe-se concluir que a finalidade do financiamento em causa respeita estritamente à aquisição das participações sociais da Requerente, cuja propriedade pertence à D.... Observe-se que isto é inteiramente reconhecido pela Requerente no seu RI, dado que se alega que a operação de financiamento destinou-se a permitir à B ... adquirir a C ... e a Requerente (cfr. no RI os arts. 7: “operação de financiamento prévia à fusão que permitiu à primeira (B ..., SA) adquirir a C… SGPS, SA e a Requerente”, 63: “aquisição indireta da Requerente pelo Grupo B ..., através da aquisição do capital e suprimentos da C ... SGPS, SA pela B ... Indústria, SA e pela D... SGPS”, 162 e 163: “financiamento incorrido pela B ... (...) para aquisição da C ... SGPS SA e respetivos créditos”, “financiamento esse que (...) se demonstrou indispensável para que aquela pudesse adquirir (indiretamente) a ora Requerente”, 196: “os custos suportados pela B ... Indústria se revelaram indispensáveis à aquisição do controlo da ora Requerente – objetivo comercial pretendido – através da aquisição da sociedade que a detinha (C ... SGPS, SA), o que implicou (...) a aquisição de parte do capital e dos créditos sobre tal sociedade”).
As participações sociais em causa fazem, então, parte do património da D..., sócia da Requerente, e não da própria Requerente (caso em que constituiriam ações próprias), pelo que a titularidade e o aproveitamento de tal ativo, a cuja aquisição é imputável o financiamento ocorrido e os encargos financeiros com ele suportados pela Requerente, sem qualquer contrapartida, redunda exclusivamente em benefício da sócia D... e não da Requerente.
Consabidamente, o ativo financeiro consistente numa participação social representa, como regra, uma fonte suscetível de produzir rendimentos tributáveis (dividendos em face da distribuição de lucros pela empresa participada, mais-valias em face da alienação das participações, o que constitui proveitos do pertinente exercício). Precisamente, verifica-se no caso que a entidade que pode aproveitar, no seu interesse próprio, como fonte de rendimentos este ativo não é a entidade que suporta, em exclusivo, os custos relativos ao financiamento da aquisição do ativo (a Requerente), mas sim uma entidade distinta, no caso a sua única sócia (a D...).
Ativo este que, importa frisar, é constituído pelas próprias ações da Requerente, incorrendo esta, assim, em custos com empréstimo que serviu para a própria aquisição do seu capital por outra entidade. Não é possível, por isso, deixar de lembrar aqui o desfavor com que o próprio legislador olha para este tipo de situações nos termos que decorrem do art. 322.º do Código das Sociedades Comercial, que dispõe, no seu n.º 1, que: “Uma sociedade não pode conceder empréstimos ou por qualquer outra forma fornecer fundos ou prestar garantias para que um terceiro subscreva ou por outro meio adquira ações representativas do seu capital”.
Temos, pois, que os custos incorridos com o empréstimo em apreciação não são aplicados na exploração da própria Requerente, na sua atividade empresarial, nem servem à manutenção da fonte produtora de rendimentos. Tais custos, embora inscritos na contabilidade da Requerente, não beneficiam a sua atividade nem o respetivo interesse empresarial, mas antes aproveitam a um terceiro, no caso a sua sócia única D... SGPS.
Inexiste, pois, aqui o “balanceamento ou matching” entre os custos suportados com os encargos financeiros e os respetivos proveitos, que se deve considerar como relevante em sede de exigência da indispensabilidade dos custos para efeitos fiscais conforme disposto pelo art. 23.º do CIRC (cfr. o acórdão do TCA Sul de 24.4.2012, processo n.º 05251/11).
Por tudo isto, não se pode deixar de considerar certeira a seguinte observação da Requerida AT (art. 25.º da sua Resposta): “A empresa que gera fluxos financeiros positivos, a A ..., suporta custos financeiros com um financiamento que não respeita à atividade formal que desenvolve, e por outro lado, ao longo dos tempos ficará descapitalizada dos valores que pagará ao banco pelo financiamento (amortização da dívida e pagamento de juros), cujo beneficiário é tão só e apenas a acionista D..., ficando esta, através deste esquema, titular de 90% do capital da A ..., sem no entanto despender meios financeiros relevantes.
Daí que se tenha de concluir que, na situação dos autos, não tem lugar “o juízo positivo de subsunção na atividade societária” pelo qual “os custos indispensáveis equivalerão aos custos contraídos no interesse da empresa” (para citar o acórdão do STA de 30.11.2011, proc. n.º 0107/11).
68. Deste modo, independentemente da assunção do empréstimo em causa pela Requerente ter resultado de fusão (não sendo necessário considerar aqui a eventual subsunção de uma operação de merger leveraged buy-out ou fusão alavancada à proibição constante do art. 322.º, n.º 1 do CSC – cfr. a este respeito INÊS PINTO LEITE, “Da proibição de assistência financeira. O caso particular dos Leveraged buy-outs” in Direito das Sociedades em Revista, ano 3, vol. 5 (2011), pp. 163 a 167), cabe declarar que os custos contabilizados pela Requerente no exercício em causa com os encargos financeiros respeitantes a tal empréstimo não satisfazem o requisito da indispensabilidade dos custos/gastos imposto para efeitos fiscais pelo art. 23.º do CIRC, dado faltar a necessária afetação dos custos em consideração ao interesse empresarial e à atividade produtiva próprios da Requerente.».
J. Resulta, assim, demonstrada a identidade da questão fundamental de direito no acórdão recorrido e no acórdão fundamento, já que em ambos, em concreto, foi decidida em igual situação de facto a mesma questão de direito, que se prende com a dedutibilidade fiscal, à luz do disposto no artigo 23.º, n.º s 1 e 2, alínea c), dos gastos de financiamento relativos a um empréstimo contraído em 2007 pela X... INDÚSTRIA - … S.A., para aquisição das ações da sociedade Y... SGPS SA (antiga participante em 90% do capital social do W...) aos seus anteriores acionistas, pessoas singulares, no âmbito de um processo de fusão inversa ocorrido em 2007, no qual a W... (sociedade participada) incorporou a X... INDÚSTRIA (sociedade participante em 78,95% do capital da Y... SGPS) e a Y... SGPS (sociedade participante em 90% do capital da W...), passando a assumir as obrigações emergentes do contrato de empréstimo celebrado pela sociedade incorporada X... INDÚSTRIA.
K. Em suma, entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento existe uma patente e inarredável contradição sobre a mesma questão fundamental de direito que importa dirimir mediante a admissão do presente recurso e consequente anulação do segmento decisório contestado, com substituição do mesmo por novo acórdão que definitivamente decida a questão controvertida, no sentido da legalidade da correção aos encargos financeiros fiscalmente desconsiderados pela Inspeção Tributária com fundamento na violação do disposto no artigo 23.º do Código do IRC, nos termos do entendimento propugnado pela AT em sede arbitral, bem como de acordo com a fundamentação invocada na decisão fundamento, a cujo teor se adere na totalidade.
L. A infração a que se refere o n.º 2 do artigo 152.º do CPTA, consiste num manifesto erro de julgamento expresso na decisão recorrida, na medida em que o acórdão arbitral viola o disposto no artigo 23.º, n.º s 1 e 2, alínea c), do CIRC.
M. Tal como exposto na Resposta ao pedido de pronúncia arbitral, que se dá por integralmente reproduzida, os SIT constataram que com a fusão ocorrida em dezembro de 2007, ocorreu uma “dupla fusão inversa”, através da qual a “empresa-filha” W... incorpora os patrimónios de duas empresas participantes: Y... SGPS (acionista da W... em 90%) e X... INDÚSTRIA (acionista da Y... SGPS em 78,95%).
N. De acordo com o disposto no projeto de fusão (cfr. pág. 24 e 25 do RIT), verificaram os SIT que o efeito prático, ao nível do controlo das participações financeiras, seria o mesmo caso a X... CAPITAL adquirisse os 100% do capital social da Y... SGPS, o que significaria que seria a X... CAPITAL a ter de contrair o empréstimo de 12.350.000,00 euros junto do Banco 1..., de forma a poder obter a detenção e controlo do ativo financeiro (ações), da W....
O. Logo, “apesar da obrigação legal de liquidação do financiamento ser da responsabilidade da W... (por via da assunção das obrigações contraídas pela X... INDÚSTRIA junto da banca), o ónus de suportar tais encargos (capital, juros e impostos) não lhe poderá ser imputável.”.
P. Conforme bem refere o RIT, resulta do projeto de fusão que “a acionista que se encontra no topo da cadeia de participações societárias, antes e após processo de fusão, sempre foi e é a X... CAPITAL A detenção do ativo e o controlo estratégico da W..., em última linha, foi sempre da X... CAPITAL: antes, de forma indireta, por via das suas participações na X... INDÚSTRIA e na Y... SGPS e, agora, por via direta, com a detenção de 100% do controlo da W....”.
Q. Concluindo o RIT que «uma vez que os encargos com juros, gastos de financiamento e imposto do selo registados nas contas SNC 69112, SNC 6984 e SNC 681236 estão associados ao empréstimo contraído, em 2007, pela X... INDÚSTRIA para aquisição das ações da Y... SGPS (antiga participante em 90% do capital social da W...), e, agora, o ativo financeiro sobrante (90% das ações da W...) se encontra na posse e controlo da X... CAPITAL, logo, não poderá ser a W... a assumir os gastos a nível contabilístico e, muito menos, em sede de apuramento do lucro tributável».
R. Perante a constatação de que “os fundos do empréstimo gerador dos encargos em análise tiveram como finalidade, destino e utilização a aquisição das próprias ações da W... pela X... CAPITAL, ainda que intercalada por outras operações”, concluíram os SIT “que a afetação dos capitais alheios não se relaciona com a exploração nem com os ativos detidos pela W..., mas sim com um ativo financeiro que integra o património da X... CAPITAL.” (cfr. pág. 28 do RIT).
S. O RIT demostra que “não existe nenhuma relação entre os encargos financeiros do mútuo e a exploração da W... ou qualquer dos seus ativos”, o que determinou que “nos termos dos artigos 17.º e 23.º do Código do IRC, não serão dedutíveis, ao lucro tributável do sujeito passivo, os encargos decorrentes de tais financiamentos bancários, pelo que importa que sejam acrescidos os montantes de 304.759,67 euros e 122.015,58 euros ao campo 752 do quadro 07 da declaração de rendimentos modelo 22 de IRC dos períodos de 2016 e 2017.”.
T. Ora, o Tribunal a quo omitiu totalmente a análise da factualidade concreta apurada pelos SIT, limitando-se a fundamentar a sua decisão mediante a transcrição da fundamentação aduzida no acórdão proferido no processo n.º 537/2016-T, a qual, como demostram plenamente o RIT e a resposta, não tem aplicação in casu.
U. Com efeito, com a remissão para a decisão do processo n.º 537/2016-T, acolheu o Tribunal a quo a fundamentação que se baseia unicamente no facto de os encargos financeiros suportados pela X... INDÚSTRIA não terem sido questionados como dedutíveis nos períodos prévios à fusão, uma vez que se estava na “presença de juros de capitais alheios aplicados na exploração (art. 23.º, n.º 1, al. c) do CIRC)”.
V. Ora, provam o RIT e a resposta que os encargos com o financiamento foram dedutíveis na esfera da X... INDÚSTRIA enquanto esta deteve a titularidade e o controlo do ativo subjacente à contração do empréstimo, designadamente, as ações da Y... SGPS.
W. Deste modo, os capitais alheios obtidos pela X... INDÚSTRIA foram aplicados no seu interesse, tendo esta sociedade passado a deter, em contrapartida da divida, um ativo representado pela participação social no capital da Y... SGPS.
X. Assim, na realidade, não haveria razões para limitar o direito à dedução dos encargos na esfera da X... INDÚSTRIA, porque os capitais alheios foram aplicados na sua exploração.
Y. Contudo, esta situação só ocorre até ao período anterior ao processo de fusão.
Z. Provam o RIT e a resposta que os capitais alheios concedidos pela banca, em 2007, à X... INDÚSTRIA foram usados para pagar aos acionistas (pessoas singulares) da Y... SGPS, em troca das ações da Y... SGPS.
AA. Estas ações extinguiram-se com o processo de fusão e o único ativo financeiro (ações) da única participada sobrante (W...) passou a ser detido, em exclusivo, pela X... CAPITAL e afeto à atividade (exploração) desta sociedade gestora de participações sociais.
BB. Com a transformação ocorrida, em 2007, na estrutura societária do grupo, a detenção e controlo do ativo (ações) correlacionado com o mútuo passou a pertencer à X... CAPITAL (SGPS).
CC. Ou seja, os capitais alheios não passaram a estar aplicados na exploração da W..., mas sim na exploração da X... CAPITAL.
DD. Nestes termos, o erro de julgamento em que incorreu o Tribunal a quo advém da total desconsideração da factualidade concreta apurada nos autos, olvidando que é sempre necessário aferir casuisticamente, em cada período económico, da pertinência dos gastos relevados fiscalmente na esfera das sociedades beneficiárias, de modo a consentir apenas aqueles que cumpram os requisitos da dedutibilidade fiscal exigidos pelo disposto pelo art.º 23.º do CIRC;
EE. Bem como, olvidou o Tribunal a quo que, quando se trata de decidir matéria atinente à dedutibilidade de gastos, não basta a invocação de jurisprudência, porquanto os tribunais deparam-se com situações factuais específicas, devendo decidir o litígio de acordo com a concreta fundamentação subjacente aos atos de liquidação contestados;
FF. Como se afirma perentoriamente no acórdão fundamento: «para proceder à aplicação ao caso em apreço do requisito da indispensabilidade dos custos, cabe verificar, na base de todos os factos e circunstâncias relevantes, a afetação efetiva e concreta do empréstimo de que os juros suportados são a remuneração, por outras palavras, importa ponderar o destino ou uso dos fundos obtidos em relação aos quais o sujeito passivo pretende deduzir fiscalmente, para efeitos do apuramento do seu lucro tributável, os juros e demais encargos associados que suportou.».
GG. Ponderação que deveria constar do acórdão recorrido, permitindo concluir, como bem concluiu o acórdão fundamento que:
«As participações sociais em causa fazem, então, parte do património da X... Capital, sócia da Requerente, e não da própria Requerente (caso em que constituiriam ações próprias), pelo que a titularidade e o aproveitamento de tal ativo, a cuja aquisição é imputável o financiamento ocorrido e os encargos financeiros com ele suportados pela Requerente, sem qualquer contrapartida, redunda exclusivamente em benefício da sócia X... Capital e não da Requerente.
(…)
Temos, pois, que os custos incorridos com o empréstimo em apreciação não são aplicados na exploração da própria Requerente, na sua atividade empresarial, nem servem à manutenção da fonte produtora de rendimentos. Tais custos, embora inscritos na contabilidade da Requerente, não beneficiam a sua atividade nem o respetivo interesse empresarial, mas antes aproveitam a um terceiro, no caso a sua sócia única X... Capital SGPS.
68. Deste modo, independentemente da assunção do empréstimo em causa pela Requerente ter resultado de fusão (…), cabe declarar que os custos contabilizados pela Requerente no exercício em causa com os encargos financeiros respeitantes a tal empréstimo não satisfazem o requisito da indispensabilidade dos custos/gastos imposto para efeitos fiscais pelo art. 23.º do CIRC, dado faltar a necessária afetação dos custos em consideração ao interesse empresarial e à atividade produtiva próprios da Requerente.».
HH. Por tudo o exposto, resta concluir que o acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento por violação do disposto no artigo 23.º, n.º s 1 e 2, alínea c), do CIRC, bem como que se encontra em manifesta oposição quanto à mesma questão fundamental de direito com a jurisprudência firmada no acórdão fundamento, devendo ser substituído por novo acórdão que julgue improcedente o pedido arbitral no segmento decisório ora contestado.
II. O acórdão arbitral também se encontra em manifesta oposição com a jurisprudência firmada no acórdão fundamento, proferido no processo n.º 295/2018-T, quanto ao segmento decisório constante da alínea b) do dispositivo que determina a anulação total das liquidações de juros compensatórios n.º ...01, no valor de € 7.809,49, n.º ...34, no valor de € 9.141,31, n.º ...10, no valor de € 30.118,47 e n.º ...11, no valor de € 3.848,70.
JJ. O acórdão arbitral recorrido consignou como facto provado, na alínea hh) do probatório, que a Requerente arbitral «foi sujeita a um procedimento inspetivo externo, de âmbito parcial (IRC), relativo aos anos de 2017, 2015 e 2016, realizado pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Aveiro, que culminou com a elaboração do respetivo Relatório de Inspeção Tributária (doravante, designado RIT)», constando, ainda, da alínea hh) do probatório, a identificação atos tributários de liquidação adicional de IRC e de juros compensatórios na sequência da ação inspetiva.
KK. O Tribunal pronunciou-se sobre as correções à matéria coletável efetuadas no âmbito do procedimento inspetivo realizado pelos SIT da Direção de Finanças de Aveiro, a coberto das Ordens de Serviço n.º ...05, ...80 e ...81 e contestadas pela ora Recorrida, tendo determinado a anulação parcial dos atos de liquidação de IRC, na parte influenciada pelas correções ilegais, mas a anulação total das liquidações de juros compensatórios.
LL. De igual forma, o acórdão fundamento consignou factualidade apurada numa ação inspetiva a um sujeito passivo de IRC, no âmbito da qual foram promovidas correções à matéria coletável declarada, que originaram a emissão de liquidações adicionais de imposto e de juros compensatórios, que foram parcialmente anuladas.
MM. O Tribunal Arbitral a quo entendeu o seguinte:
«48. Neste âmbito, a Requerente alega, essencialmente, o seguinte:
(…)
317. (…), é à AT, nos termos do n. º 1 do artigo 74. º da LGT, que cabe provar os elementos essenciais à liquidação de juros compensatórios, i.e., o nexo de causalidade e do juízo de censura sobre a conduta do contribuinte, uma vez que se trata de factos constitutivos de um direito seu.
318. Nesta medida, não tendo a AT fundamentado as liquidações de juros compensatórios nos termos descritos, não cumpriu esta o ónus de prova e fundamentação que a si cabia.
319. (…) as liquidações de juros compensatórios de que a Requerente foi alvo são absolutamente ilegais, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito da imputação da responsabilidade por juros compensatórios e falta de fundamentação da respetiva liquidação; assim sendo, semelhante liquidação enferma dos vícios de forma e violação da lei, pelo que deve ser anulada."
49. A Requerida, em sede de alegações, pronunciou-se relativamente a esta questão nos seguintes termos que aqui importa respigar:
''Sustenta a jurisprudência o entendimento no sentido de que se determinada conduta constitui um facto qualificado por lei como ilícito se deve fazer decorrer dessa conduta, por ilação lógica, a existência de culpa (não porque a culpa se presuma, mas por ser algo que, em regra, se liga ao carácter ilícito-típico do facto praticado), devendo partir-se do pressuposto de que existe culpa quando a atuação do contribuinte integra a hipótese de uma infração tributária (cfr. Ac. do STA, de 23-09-98, Proc. 022612 e Ac. STA, de 19-11-2008, Proc. 0325/08).
Ora, "in casu”, a responsabilidade da Requerente no atraso na liquidação e na entrega ao Estado do imposto devido, além do incumprimento das disposições legais vigentes para a sua concreta situação tributária e das consequentes inexatidões e omissões praticadas no preenchimento da declaração Modelo 22 de IRC, que constituem infrações previstas e punidas pelo RGIT, conforme refere expressamente o RIT nas pág. 104 e 105, donde resulta demonstrada a culpa, e, consequentemente, a legalidade da liquidação dos juros compensatórios. "
(…)
50. O artigo 35.º, n.º 1, da LGT estatui que os juros compensatórios são devidos "quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária''; decorre do n. º 8 do mesmo artigo que "os juros compensatórios integram-se na própria dívida de imposto, com a qual são conjuntamente liquidados".
A responsabilidade objetiva é excecional, só ocorrendo nos casos especificados na lei (cf. artigo 483.º, n.º 2, do Código Civil) e, por isso, deverá entender-se que, para efeitos de responsabilidade por juros compensatórios, só se está perante um “facto imputável ao sujeito passivo" quando puder formular-se um juízo de censura em relação à sua conduta.
Nesta linha, o Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender, uniformemente, que a imputabilidade exigida para responsabilização pelo pagamento de juros compensatórios depende da existência de culpa, por parte do contribuinte; sendo que a ''culpa consiste na omissão reprovável de um dever de diligência, que é de aferir em abstracto, pelo padrão de esmero do bonus pater familiae, hipoteticamente colocado na situação concreta" e, por isso, a "compreensível dúvida, dificuldade, ou divergência razoável de critério quanto à qualificação e enquadramento de determinada situação tributária não concorre para a integração do dito conceito de culpa - pelo que, por tal via, não se dá azo à cominação de juros" (acórdão do Supremo Tribunal Administrativo prolatado, em 11.03.2009, no processo n.º 0961/08).
51. Volvendo ao caso concreto, relativamente às partes das liquidações adicionais de IRC que têm como pressuposto correções que são ilegais, essa ilegalidade afeta as liquidações dos juros compensatórios correspondentes, pois estas têm aqueles atos de liquidação como pressuposto e, por isso, são fulminadas pelos mesmos vícios invalidantes.
Noutra ordem de considerações, compulsadas as liquidações de juros compensatórios que constam dos documentos n.ºs ..., ... e ... anexos ao PPA, constatamos que nelas são indicados os períodos a que se referem os juros, a taxa aplicável, a causa da liquidação (recebimento indevido e retardamento de liquidação) e referências genéricas aos artigos 102.º do CIRC e 35.º da LGT.
Assim, não sendo invocada a culpa da Requerente como pressuposto das aludidas liquidações de juros compensatórios, estas enfermam de vício de violação do citado artigo 35.º, n.º 1, da LGT e, por consequência, devem ser anuladas (cf. artigo 163.º, n.º 1, do CPA, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea d), do RJAT).».
NN. No acórdão fundamento (também) estava em causa uma liquidação adicional de IRC e a correspondente liquidação de juros compensatórios, resultantes de correções efetuadas em sede de ação de inspeção tributária, devidamente fundamentadas no RIT, que foram parcialmente anuladas na ação arbitral.
OO. O acórdão fundamento entendeu, com relevância para a apreciação do presente recurso, o seguinte:
«A Requerente sustenta, sem razão, que a liquidação de juros compensatórios não está fundamentada.
Com efeito, constata-se que, embora de forma sucinta como é permitido pelo artigo 77.º, n.º 2 da LGT, o RIT refere de forma expressa que serão liquidados os juros compensatórios devidos, nos termos do disposto no artigo 35.º da Lei Geral Tributária e do artigo 102.º do Código do IRC.
Adicionalmente, o documento de liquidação de juros compensatórios contém as menções essenciais exigidas pelo artigo 35.º, n.º 9 da LGT, pois evidencia com clareza (i) o valor da prestação sobre que incidem (valor base de IRC – € 64.859,54), (ii) o próprio montante de juros, e (iii) o correspondente apuramento que resulta da aplicação da taxa anual referida no documento, de 4%, pelo período decorrido (de 30.07.2015 a 16.01.2018).
A jurisprudência do STA tem consolidado o entendimento de que a mínima fundamentação exigível para os atos de liquidação de juros deve indicar a quantia sobre a qual incidem os juros, o período de tempo considerado para a liquidação e a taxa ou taxas aplicadas, com menção desses elementos no próprio ato de liquidação ou por remissão para documento anexo – vide por todos o Acórdão do STA, de 09.03.2016, no processo n.º 805/15. Considera este aresto que está “cumprido o dever legal de fundamentação se na liquidação de juros compensatórios estão explicitados o motivo da liquidação (ter havido retardamento da liquidação de parte ou da totalidade do imposto, por facto imputável ao sujeito passivo […]) e se constam a indicação do imposto em falta sobre o qual incidem os juros, o período a que se aplica a taxa de juro, a taxa de juro aplicável ao período (feita por remissão para a taxa dos juros legais fixada nos termos do art. 559º nº 1 do CCivil) e o valor dos juros.”
Relativamente ao requisito da culpa, convém notar que a fundamentação e consequente imputação se consideram satisfeitas se, como sucede in casu, for estabelecida a relação entre a situação fáctica violadora da lei que justifica a liquidação dos juros ou os factos que levaram a AT a concluir que o atraso na liquidação se deveu a atuação culposa do contribuinte, conforme refere o Acórdão do STA (Pleno), de 22.01.2014, proferido no processo n.º 1490/13 e, bem assim, o Acórdão do TCA Sul, de 19.09.2017, no processo n.º 7964/14.
Preconiza o STA, no aresto citado, que a existência de culpa é de aferir em abstrato e que, quer a doutrina, quer a jurisprudência, sufragam a tese de que quando uma determinada conduta constitui um facto qualificado por lei como ilícito se deve fazer decorrer dessa conduta – por ilação lógica – a existência de culpa (não porque a culpa se presuma, mas por ser algo que, em regra, se liga ao carácter ilícito-típico do facto praticado) e que, por essa via, se deve partir do pressuposto de que existe culpa sempre que a atuação do contribuinte integra a hipótese de qualquer infração tributária, sem prejuízo de este juízo de censura poder ser afastado quando ocorram circunstâncias que o justifiquem.
Nestes termos, conclui-se que a liquidação de juros compensatórios não enferma de vício formal de falta de fundamentação, pois contém os elementos necessários à sua aferição, nem de vício relativo à falta de imputação dos factos à Requerente a título de culpa.».
PP. Tendo o Tribunal arbitral decidido no acórdão fundamento «(b) Julgar parcialmente procedente o pedido de anulação do ato de liquidação de juros compensatórios na parte em que estes incidem sobre o valor da prestação tributária anulada (de € 63.000,00)».
QQ. Resulta, assim, demonstrada a identidade da questão fundamental de direito no acórdão recorrido e no acórdão fundamento, já que em ambos, em concreto, foi decidida em idêntica situação de facto a mesma questão de direito, que se prende com a aferição dos requisitos de fundamentação de uma liquidação de juros compensatórios, consagrados no artigo 35.º da LGT, quando os factos que integram o comportamento ilícito e culposo se encontram descritos num relatório de inspeção tributária onde se demostra que a factualidade que suporta as correções conduziu ao retardamento da liquidação e que a culpa imputada ao contribuinte advém da prática de infração tributária prevista no Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT) e punível a título de dolo ou negligência.
RR. Em suma, entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento existe uma patente e inarredável contradição sobre a mesma questão fundamental de direito que importa dirimir mediante a admissão do presente recurso e consequente anulação do segmento decisório contestado, com substituição do mesmo por novo acórdão que considere cumpridas as exigências legais atinentes à fundamentação da liquidação de juros compensatórios, nos termos do artigo 35.º, n.º 1 e n.º 9, da LGT e do artigo 102.º, n.º 1, do CIRC e determine a anulação parcial das liquidações de juros compensatórios apenas na parte correspondente às correções julgadas ilegais.
SS. A infração a que se refere o n.º 2 do artigo 152.º do CPTA consiste num manifesto erro de julgamento expresso na decisão recorrida, na medida em que o acórdão arbitral viola o disposto artigo 35.º, n.º 1 e n.º 9, da LGT e o artigo 102.º, n.º 1, do CIRC.
TT. Nos termos dos preceitos legais referidos, os pressupostos legais exigidos para a liquidação de juros compensatórios prendem-se com a existência de atraso na concretização da liquidação e a imputabilidade desse atraso à atuação culposa do contribuinte.
UU. Ora, “in casu”, a responsabilidade imputada à ora Recorrida, com fundamento em culpa pelo atraso na liquidação e na entrega ao Estado do imposto devido, está perfeitamente demostrada no RIT, nas pág. 104 e 105, tal como o acórdão recorrido afirma, reportando-se às alegações efetuadas pela AT no âmbito da ação arbitral.
VV. O que consubstancia, indubitavelmente, a invocação e a demostração da imputação de culpa, já que o RIT demostra que a conduta da Requerente tem enquadramento legal como infração tributária punível a título de dolo ou negligência, referindo expressamente que as «infrações descritas constituem uma violação do disposto nos artigos especificados no ponto em que foram descritas e estão resumidas no ponto 1., importando referir que é o RGIT que prevê e pune tais procedimentos».
WW. O tribunal arbitral errou quando não acolheu o entendimento do acórdão fundamento, da jurisprudência firmada desse douto STA e da doutrina, no sentido de que se determinada conduta constitui um facto qualificado por lei como ilícito se deve fazer decorrer dessa conduta, por ilação lógica, a existência de culpa (não porque a culpa se presuma, mas por ser algo que, em regra, se liga ao carácter ilícito-típico do facto praticado), devendo partir-se do pressuposto de que existe culpa quando a atuação do contribuinte integra a hipótese de uma infração tributária.
XX. Desta forma, o Tribunal arbitral decidiu erroneamente e em contradição com o acórdão fundamento quando concluiu que as liquidações de juros compensatórios enfermavam de vício de violação do artigo 35.º, n.º 1, da LGT, considerando que a AT não invocou a culpa da ora Recorrida no atraso da liquidação.
YY. Acresce que, como, aliás, bem considerou o Tribunal a quo, sem daí retirar as devidas consequências legais, os documentos de demonstração das liquidações de juros compensatórios, emitidos na sequência das correções determinadas na ação inspetiva, referem: «Juros Compensatórios – Recebimento indevido (art.ºs 102.º do CIRC e 35.º da LGT)» e indicam o período de tributação, o n.º da liquidação de IRC, o imposto sobre o qual incidem os juros, o período de cálculo, a taxa de juro aplicável e o valor dos juros, cumprindo integralmente os requisitos de fundamentação constantes do artigo 35.º, n.º 9 da LGT.
ZZ. Constando dos documentos os elementos considerados pela jurisprudência desse douto STA, bem como pelo acórdão fundamento, como a «mínima fundamentação exigível em matéria de liquidação de juros compensatórios» (cfr. acórdão do STA de 1-7-2009, proc. n.º 871/08).
AAA. Assim, é de concluir que a liquidação de juros compensatórios cumpre integralmente os requisitos de fundamentação consagrados nos artigos 35.º, n.º 1, e n.º 9 da LGT e 102.º, n.º 1, do CIRC, incorrendo o Tribunal arbitral em erro de julgamento quando decidiu anular totalmente as liquidações, sustentando que «não sendo invocada a culpa da Requerente como pressuposto das aludidas liquidações de juros compensatórios, estas enfermam de vício de violação do citado artigo 35.º, n.º 1, da LGT», em total contradição com o acórdão fundamento e com a jurisprudência unânime desse douto STA.
BBB. Por tudo o exposto, resta concluir que o Acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento por violação das normas legais aplicáveis, bem como que se encontra em manifesta oposição quanto à mesma questão fundamental de direito com a jurisprudência firmada pelo STA no acórdão fundamento, devendo ser substituído por novo acórdão que julgue procedente o presente recurso, determinando a procedência parcial do pedido de anulação das liquidações de juros compensatórios na parte respeitante às correções anuladas e a improcedência quanto às restantes.
Termos em que deve o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência ser aceite e posteriormente julgado procedente, por provado, sendo, em consequência, nos termos e com os fundamentos acima indicados revogada a decisão arbitral recorrida e substituída por outro Acórdão consentâneo com o quadro jurídico vigente.

Foram produzidas contra-alegações com as seguintes conclusões:
A. O presente recurso não deve ser admitido na parte relativa à dedutibilidade dos encargos financeiros com juros do contrato de mútuo contraído em 2007 na medida em tal admissão contrairia o disposto no artigo 152.º, n.º 3 do CPTA.
B. No Acórdão arbitral recorrido o Tribunal arbitral julgou ilegais os atos de liquidação adicional de IRC de 2016 e de 2017 na parte em que negaram a dedutibilidade fiscal dos encargos financeiros suportados pela Recorrida na sequência de operação de fusão, por violação do disposto no artigo 23.º, n.ºs 1 e 2, alínea c) do Código do IRC, nos montantes de € 304.759,67 e de € 122.015,58, respetivamente.
C. Nos Acórdãos proferidos em 22 de março de 2018, 20 de janeiro de 2019 e 28 de outubro de 2020, proferidos nos processos n.º 208/17, n.º 02176/15.3BEPRT e n.º 02887/13.BEPRT, respetivamente, todos em situações de facto idênticas à dos autos, este Supremo Tribunal Administrativo negou provimento aos recursos da Fazenda Pública que procuraram reverter as sentenças proferidas pelos tribunais de primeira instância e que entenderam, pelas mesmas ordens de razões expendidas no acórdão arbitral recorrido, serem dedutíveis os encargos financeiros suportados pelas impugnantes/recorridas nesses processos e ilegais as liquidações adicionais de imposto que incorporavam correções fiscais em sentido contrário.
D. Existindo jurisprudência recente e consolidada no sentido perfilhado pelo Acórdão arbitral recorrido, deve ser negada a admissão do presente recurso para uniformização de jurisprudência, nos termos do disposto no artigo 152.º, n.º 3 do CPTA, mantendo-se o Acórdão arbitral recorrido.
E. Ainda que assim não se entenda, sempre se diga que a eventual apreciação do presente recurso deve ser decidida no sentido expendido no Acórdão arbitral recorrido, pelos motivos aí plasmados.
F. Nas alíneas e) a p) dos Factos provados do Acórdão arbitral recorrido deu como provados um conjunto de factos que, não tendo sido contraditados pela AT ao longo do presente processo não podem deixar de conduzir este Supremo Tribunal Administrativo às mesmas conclusões de Direito a que o Tribunal Arbitral chegou (neste, como em inúmeros outros casos similares).
G. Desde logo, resulta dos factos provados: i) a efetividade dos encargos suportados pela Recorrida, ii) a conexão com atividade empresarial da entidade contratante do financiamento no momento do contrato; iii) os efeitos económicos positivos da operação de fusão sobre o grupo económico de que a Recorrida faz parte; e até iv) o esforço ativo por parte da Recorrida, pós-fusão no sentido de minorar esses custos, por força da renegociação dos financiamentos com vista a baixar as taxas de juros associadas.
H. Como bem se entendeu no Acórdão arbitral recorrido, na esteira de numerosa e recente jurisprudência, os encargos financeiros em causa no presente processo preenchem, ao contrário do sustentado pela AT, os pressupostos da alínea c), do n.º 1, do artigo 23.º do Código do IRC, pelo facto de os gastos com juros em questão, corresponderem a capitais alheios que foram aplicados na exploração da entidade que os suporta.
I. Trata-se, como resulta dos Factos Provados, dos encargos com o financiamento decorrente da celebração em 2007 de um contrato de empréstimo que foi transmitido, por efeito da fusão da ‘X... Indústria, S.A’ na Recorrida, fusão essa que poderia ter ocorrido com a ‘X... Indústria, SA’ como incorporante – situação na qual os encargos com o financiamento continuariam a deduzir-se, sem oposição à respetiva dedutibilidade por parte da AT, naquela sociedade…
J. A operação de fusão em causa cumpriu com todos os requisitos comerciais e fiscais (inclusivamente os relativos ao regime especial da neutralidade fiscal), não teve qualquer intuito fiscal, nem a AT iniciou qualquer procedimento no sentido de aplicar uma norma antiabuso.
K. Como se deu como provado, da fusão resultou que ora Recorrida continuou com bons resultados operacionais, melhores até do que antes da fusão: no período imediatamente subsequente à fusão – 2007, e exercícios subsequentes – os resultados da Recorrida melhoraram significativamente, registando-se um valor de EBITDA anual superior a € 2.500.000, e mesmo um record histórico em 2008 de € 4.200.000, com um valor de EBITDA acumulado à entrada do ano 2009 de € 9.237.000 e, ao nível de cash-flow, um valor cumulado superior a € 4.000.000.
L. A conversão de um financiamento alheio num financiamento próprio em virtude dos efeitos translativos da fusão, apenas reforça a sua ligação ao escopo societário, ao contrário do que se infere das afirmações da AT, não tendo a operação de fusão a virtualidade de transmutar retroativamente um empréstimo que não o era em alheio ao escopo societário e às necessidades das atividades a realizar.
M. Foi compreendendo os efeitos da fusão por incorporação — incluindo a inversa — que, tal como o Acórdão arbitral recorrido, já o acórdão proferido no processo arbitral n.º 42/2015-T, havia entendido que «a fusão mantém na Requerente o financiamento pelo qual esta pagou juros, e teve como consequência patrimonial a junção, no mesmo balanço, dos ativos que tal dívida financiava e continuou a financiar. Não já ativos financeiros, mas a sua real tradução em ativos e passivos de cariz operacional».
N. Urge compreender que a Recorrida, tal como se apresenta depois da fusão ocorrida, não é já o mesmo “centro de interesses” que existia antes daquele processo, mas um outro diferente que se sintetizou com a sociedade incorporada e que, portanto, o contexto empresarial da Recorrida integra, também, a realidade económica antes corporizada autonomamente pela sociedade nela incorporada, pelo que estaremos aí a aferir os critérios normativos resultantes do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC no contexto empresarial próprio da Recorrida que não pode, pois, deixar de incluir o da sociedade que incorporou.
O. A Recorrida não ignora a existência de jurisprudência, tal como a plasmada no Acórdão arbitral fundamento, em sentido contrário; porém esta encontra-se há muito ultrapassada e consolidada no sentido da dedução fiscal dos juros suportados pela incorporante pós fusão, relativos a financiamentos contraídos pela incorporada pré-fusão com vista à aquisição do capital social da futura incorporante, como evidenciam inúmeras decisões arbitrais, como sejam as emitidas nos processos n.ºs 101/2013-T, 42/2015-T (aqui numa fusão não invertida, mas as considerações são iguais como aliás vimos acima), 92/2015-T, 93/2015-T, 108/2015-T, 88/2016-T, 491/2016-T, 537/2016-T, 560/2016-T, 120/2017-T, 521/2017-T, 120/2018-T, e 607/2018-T e 102/2020-T que consideraram aqueles encargos financeiros indispensáveis para a obtenção dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora.
P. Por tudo o exposto, caso venha a ser admitido o presente recurso, deve ser o mesmo ser decidido no sentido perfilhado pelo Acórdão arbitral recorrido, pelos motivos aí plasmados e oportunamente citados nas presentes alegações, para os quais remetemos.
Q. Também quanto à ilegalidade dos juros compensatórios liquidados à Recorrida deverá ser mantido o Acórdão arbitral recorrido.
R. É consensualmente defendido quer pela jurisprudência, quer pela doutrina que, tendo em conta a redação do n.º 1 do artigo 35.º da LGT, e igualmente do n.º 1 do artigo 102.º que dispõe que «sempre que por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação […] ou obtido reembolso indevido, acrescem ao montante do imposto os juros compensatórios à taxa e nos termos previstos no artigo 35.º da lei geral tributária», não basta o mero atraso na entrega da liquidação devida ou a obtenção de reembolso indevido para efeitos da exigência de juros compensatórios.
S. Para que exista responsabilidade por juros compensatórios é necessário que se verifique: (i) nexo de causalidade adequada entre a atuação do contribuinte e o retardamento da liquidação; e, (ii) a conduta do contribuinte seja censurável, a título de dolo ou negligência.
T. É a todos os títulos inaceitável - e ilegal - que a uma liquidação adicional de imposto se siga a liquidação de juros compensatórios de forma automática, como sucedeu no caso presente, não sendo sequer feito qualquer juízo de censurabilidade (ou não) das condutas que possam fundamentar (ou não) essa liquidação, contrariamente à correta interpretação dos preceitos aplicáveis – como resulta, por exemplo, entre muitos outros, do acórdão do STA, de 3 de novembro de 2009, proferido no processo n.º 0961/08.
U. Ter procedido in casu à liquidação de juros compensatórios é, não só profundamente injusto, como viola cabalmente a letra e ratio da norma expressa no artigo 35.º da LGT e no artigo 80.º do Código do IRC, tal como decidido pelo Tribunal Arbitral no Acórdão arbitral recorrido.
V. A outro tempo, e como é sabido é à AT, nos termos do n.º 1 do artigo 74.º da LGT, que cabe provar os elementos essenciais à liquidação de juros compensatórios, i.e., o nexo de causalidade e do juízo de censura sobre a conduta do contribuinte, uma vez que se trata de factos constitutivo de um direito seu.
W. Não tendo a AT invocado a culpa da Recorrida nas liquidações de juros compensatórios que efetuou, não cumpriu esta o ónus de prova e fundamentação que a si cabia.
X. A este respeito, a AT entende que o Acórdão arbitral recorrido se encontra em oposição com o decidido no âmbito do processo arbitral n.º 295/2018-T, pois que desse acórdão arbitral se retira «que a fundamentação e consequente imputação se consideram satisfeitas se, como sucede in casu, for estabelecida a relação entre a situação fáctica violadora da lei que justifica a liquidação dos juros ou os factos que levaram a AT a concluir que o atraso na liquidação se deveu a atuação culposa do contribuinte».
Y. Como resulta do Acórdão arbitral recorrido, esse é justamente o problema das liquidações de juros compensatórios constantes dos presentes Autos: nelas não é estabelecida qualquer relação entre a situação fática violadora da lei que as justifica ou os factos que levaram a AT a concluir que o atraso na liquidação se deveu a atuação culposa do contribuinte, pois não existe, tal como refere o Acórdão arbitral recorrido, qualquer menção que seja, à culpa do contribuinte.
Z. Não se trata, assim, de aferir a culpa de forma mais concreta ou mais abstrata, com base em indícios mais fortes ou mais superficiais, mas de lhe fazer de todo menção nas liquidações de juros que se pretende que a Recorrida suporte!
AA. Desta forma, independentemente da forma como se considera que a AT satisfaz o ónus que lhe cabe por força do artigo 74.º da LGT, o que inegável é que ele existe e que não deixa de caber à AT satisfazê-lo.
BB. Assumir que a AT pode dispensar-se até de afirmar que esses elementos se encontram reunidos para efeitos da liquidação de juros compensatórios, equivale-se a dispensá-la do ónus probatório que lhe é imposto por lei, o que constitui um privilégio probatório ilegal e atentatório do princípio da igualdade processual das partes, tal como já decidiu este Supremo Tribunal Administrativo nos Acórdãos proferidos em 28 de março de 2012 e em 11 de março de 2009, no âmbito dos processos n.ºs 062/12 e 1032/08, respetivamente.
CC. Por tudo o exposto Tribunal Arbitral bem andou ao decidir da forma como decidiu, devendo o Acórdão arbitral recorrido ser integralmente mantido no que respeita às liquidações de juros compensatórios anuladas.
Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exas. por certo suprirão, o presente recurso não deve ser admitido, por força do disposto o artigo 152.º, n.º 3 do CPTA, e caso assim não se entenda, sempre deve a interpretação perfilhada no Acórdão arbitral recorrido prevalecer, devendo o mesmo ser integralmente mantido quanto a ambas as questões objeto do presente recurso, com todas as consequências legais.

O Ministério Público junto deste Supremo Tribunal acompanhou tal entendimento.

Cumpre decidir.

Dá-se aqui por reproduzida a matéria de facto que se verteu no probatório da decisão recorrida e da decisão fundamento.

Há agora que apreciar o recurso que nos vem dirigido.
É entendimento pacífico na jurisprudência do STA, a admissibilidade dos recursos com vista à uniformização de jurisprudência, tendo em conta o regime previsto nos artigos 25º, n.º 2 do RJAT e 152.º do CPTA, depende de existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito e que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
No que ao primeiro requisito respeita, como tem sido inúmeras vezes explicitado pelo Pleno desta Secção relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF de 1984 e da LPTA, para detectar a existência de uma contradição, quais sejam:
- identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica;
- que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica;
- que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta;
- a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta.

Vejamos então.
Quanto à primeira parte do recurso.
A Recorrente vem interpor recurso para Uniformização de Jurisprudência na sequência da notificação da decisão arbitral de 01/07/2022, proferida no processo nº 500/2021-T, que julgou procedente o pedido de pronúncia arbitral deduzido contra a liquidação de IRC referente aos anos de 2016 e 2017, por os encargos financeiros resultantes de aquisição de participações sociais dos quais resultou uma operação de fusão-inversa deverem ser considerados custos para efeitos do disposto no artigo 23º do CIRC, e logo ser possível a sua dedução pela recorrida.
O recurso é interposto nos termos do disposto nos artigos 25.º e 26.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), instituído pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20.10, e artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) por remissão do artigo 25.º n.º 3 do RJAT, com vista à anulação da decisão recorrida na parte especificamente impugnada.
Invoca que esta decisão arbitral se encontra em oposição com a decisão arbitral proferida no processo n.º 14/2011-T do CAAD, relativamente à mesma questão fundamental de direito.
Indica como questão de Direito em que entende existir oposição de julgamento o facto de ambas as decisões em confronto terem sido sobre a mesma questão da possibilidade de dedução dos encargos resultantes de financiamentos que deram origem a uma operação de fusão inversa e se a recorrida pode ou não deduzir tais encargos como custos ao abrigo do disposto no artigo 23º do CIRC.
Observa-se que ambas as decisões se pronunciaram, em sentido divergente, sobre a mesma operação de fusão, entre as mesmas empresas e que os encargos resultam dos mesmos financiamentos ou de financiamentos que resultaram da renegociação dos financiamentos originais.
Porém, apesar desta identidade da questão de facto e jurídica, não se pode com propriedade afirmar de forma absoluta que exista uma evidente e manifesta contradição entre ambas as decisões.
Como bem nota a recorrente, as diferentes decisões não se reconduzem a uma idêntica apreciação da matéria e de facto disponível e subsunção às normas pertinentes, antes resulta do facto de DD. Nestes termos, o erro de julgamento em que incorreu o Tribunal a quo advém da total desconsideração da factualidade concreta apurada nos autos, olvidando que é sempre necessário aferir casuisticamente, em cada período económico, da pertinência dos gastos relevados fiscalmente na esfera das sociedades beneficiárias, de modo a consentir apenas aqueles que cumpram os requisitos da dedutibilidade fiscal exigidos pelo disposto pelo art.º 23.º do CIRC;
EE. Bem como, olvidou o Tribunal a quo que, quando se trata de decidir matéria atinente à dedutibilidade de gastos, não basta a invocação de jurisprudência, porquanto os tribunais deparam-se com situações factuais específicas, devendo decidir o litígio de acordo com a concreta fundamentação subjacente aos atos de liquidação contestados;
FF. Como se afirma perentoriamente no acórdão fundamento: «para proceder à aplicação ao caso em apreço do requisito da indispensabilidade dos custos, cabe verificar, na base de todos os factos e circunstâncias relevantes, a afetação efetiva e concreta do empréstimo de que os juros suportados são a remuneração, por outras palavras, importa ponderar o destino ou uso dos fundos obtidos em relação aos quais o sujeito passivo pretende deduzir fiscalmente, para efeitos do apuramento do seu lucro tributável, os juros e demais encargos associados que suportou.».
GG. Ponderação que deveria constar do acórdão recorrido…, ou seja, a decisão arbitral recorrida decidiu a questão que lhe foi colocada, de forma objectiva, sem ter considerado os contornos factuais concretos que, eventualmente, lhe impunham uma decisão diferente, à semelhança da decisão fundamento.
Porém, daí não resulta uma oposição ou contradição entre ambas as decisões, tal como definida pelo artigo 152º do CPTA, antes estaremos perante um eventual erro de julgamento. De qualquer modo, na decisão recorrida relevou-se a matéria de facto que se entendeu suficiente para a decisão desta questão e, nessa medida, não incumbe a este Supremo Tribunal sindicar esse julgamento.
Na verdade, tal como configurada a questão no acórdão recorrido, a mesma encontra-se em consonância com a jurisprudência deste Supremo Tribunal bem como do próprio CAAD, pelo que, também por esta razão não se mostram reunidos os pressupostos legais para a apreciação da questão que nos vem colocada.

Quanto à segunda parte do recurso.
Da oposição entre a decisão arbitral recorrida e a que foi proferida no processo n.º 295/2018-T.
Tal como a recorrente bem salienta nas suas conclusões deste recurso, II) e seguintes, na decisão fundamento apreciou-se uma ilegalidade atempadamente invocada de falta de fundamentação da liquidação de juros compensatórios, tendo-se concluído pela sua não verificação, pela não verificação de vício formal de falta de fundamentação.
No caso dos autos não foi apreciada qualquer questão atinente a uma ilegalidade formal decorrente de falta de fundamentação, pelo contrário, decidiu-se mesmo que:
Volvendo ao caso concreto, relativamente às partes das liquidações adicionais de IRC que têm como pressuposto correções que são ilegais, essa ilegalidade afeta as liquidações dos juros compensatórios correspondentes, pois estas têm aqueles atos de liquidação como pressuposto e, por isso, são fulminadas pelos mesmos vícios invalidantes.
Noutra ordem de considerações, compulsadas as liquidações de juros compensatórios que constam dos documentos n.ºs ..., ... e ... anexos ao PPA, constatamos que nelas são indicados os períodos a que se referem os juros, a taxa aplicável, a causa da liquidação (recebimento indevido e retardamento de liquidação) e referências genéricas aos artigos 102.º do CIRC e 35.º da LGT.
Assim, não sendo invocada a culpa da Requerente como pressuposto das aludidas liquidações de juros compensatórios, estas enfermam de vício de violação do citado artigo 35.º, n.º 1, da LGT e, por consequência, devem ser anuladas (cf. artigo 163.º, n.º 1, do CPA, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea d), do RJAT).
Daqui não se retira uma contradição entre a decisão recorrida e a decisão fundamento, antes se retira uma incompreensibilidade do discurso da decisão recorrida uma vez que começa por alertar em primeira linha que a anulação das liquidações de impostos determina a anulação das liquidações dos juros compensatórios correspondentes e termina pela anulação total das liquidações de juros compensatórios.
A apreciação desta questão está fora do âmbito das competências deste Supremo Tribunal uma vez que se enquadra no processo de impugnação da decisão arbitral a ser dirigido ao TCA nos termos do disposto nos artigos 27º e 28º do regime jurídico da arbitragem em matéria tributária.

Efectivamente ao Supremo Tribunal incumbe conhecer do recurso para uniformização de jurisprudência nos termos do disposto no artigo 152º do CPTA, contudo os pressupostos aí previstos para a admissão do recurso têm que ser apreciados de forma muito restrita sob pena de se estar a transformar este tipo de recurso num recurso de revista ou mesmo numa apelação em que as partes pretendem “converter” erros de julgamento e contradições inerentes às próprias decisões em contradições entre decisões arbitrais distintas, quando as mesmas não se verificam, e apenas são decorrentes das próprias decisões recorridas.
Podemos, assim, concluir que não ocorre qualquer contradição entre a decisão recorrida e as decisões fundamento.

Pelo exposto, acordam os juízes que compõem o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em não tomar conhecimento do mérito do recurso.
Custas pela recorrente, com dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
Comunique ao CAAD.
D.n.
Lisboa, 24 de Maio de 2023. - Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia (relator) - Isabel Cristina Mota Marques da Silva - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes - José Gomes Correia - Joaquim Manuel Charneca Condesso - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz - Gustavo André Simões Lopes Courinha - Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro - Pedro Nuno Pinto Vergueiro.