Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0858/14
Data do Acordão:01/15/2015
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CARLOS CARVALHO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P18461
Nº do Documento:SA1201501150858
Data de Entrada:07/09/2014
Recorrente:MUNICÍPIO DE LISBOA
Recorrido 1:CONSELHO DE MINISTROS E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
1. RELATÓRIO
1.1. “MUNICÍPIO DE LISBOA”, devidamente identificado nos autos e uma vez notificado do acórdão deste Supremo, datado de 06.11.2014, que indeferiu o incidente de declaração de ineficácia de atos de execução indevida e julgou totalmente improcedente a pretensão cautelar pelo mesmo deduzida contra o CONSELHO DE MINISTROS [«CM»] e os contrainteressados “A…………, SA” [«A…………»], “ÁGUAS DE PORTUGAL, SA”, “PARPÚBLICA - PARTICIPAÇÕES PÚBLICAS (SGPS), SA”, [«PARPÚBLICA»], “B…………, SA” [«B…………»], “MUNICÍPIO DE LOURES” [«MdL»], “MUNICÍPIO DE AMADORA” [«MA»], “MUNICÍPIO DE ODIVELAS”, [«MO»] “MUNICÍPIO DE VILA FRANCA DE XIRA” [«MVFX»], “ASSOCIAÇÃO ….....…” [«………»], “C…………, SA” [«C…………»], “D…………, SA” [«D…………»], “E…………” e AGRUPAMENTO EMPRESAS “F………” [«AGRUPAMENTO F……… »], veio, ao abrigo do art. 615.º, n.º 1, al. d) do CPC/2013, apresentar a presente arguição de nulidade daquele acórdão.

1.2. Devidamente notificados os requeridos, aqui ora reclamados, apenas vieram «CM», «A…………», «PARPÚBLICA», «B…………», em sede de contra-alegações, sustentar a improcedência da arguida nulidade [cfr., respetivamente, fls. 983 e segs. e fls. 1382 e segs.].

1.3. Sem vistos cumpre apreciar e decidir em Conferência.

2. ENQUADRAMENTO E APRECIAÇÃO DA QUESTÃO
Constitui objeto de apreciação nesta sede a arguição de nulidade da decisão judicial recorrida por alegada omissão de pronúncia no juízo de ponderação de interesses/prejuízos feito no quadro do art. 120.º, n.º 2 do CPTA quanto aquilo que haviam sido os danos alegados pela reclamante no articulado inicial e que tinham sido considerados na análise do requisito do periculum in mora.

I. Por força do disposto nos arts. 613.º, n.º 2, 615.º, 616.º, n.º 2, 617.º e 666.º do CPC/2013 “ex vi” art. 01.º e 140.º do CPTA os acórdãos são suscetíveis, para além de retificação de erros materiais e de reforma nos termos e com os limites definidos no mesmo quadro normativo, também do suprimento de nulidades.

II. Estipula-se no art. 615.º do CPC/2013, sob a epígrafe de “causas de nulidade da sentença” e na parte que ora releva, que é “nula a sentença quando: … d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento ...” [n.º 1], derivando ainda do mesmo preceito que as “... nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.° 1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades ...” [n.º 4].

III. As decisões judiciais proferidas pelos tribunais no exercício da sua função jurisdicional podem estar viciadas de duas causas que poderão obstar à eficácia ou validade da dicção do direito: - por um lado, podem ter errado no julgamento dos factos e do direito e, então, a consequência é a sua revogação; - por outro, como atos jurisdicionais, podem ter atentado contra as regras próprias da sua elaboração e estruturação ou contra o conteúdo e limites do poder à sombra do qual são decretados e, então, tornam-se passíveis de nulidade nos termos do art. 615.º do CPC/2013.

IV. Caracterizando em que se traduz a nulidade da decisão por infração ao disposto na al. d) do n.º 1 do art. 615.º do CPC/2013 temos que a mesma se consubstancia na infração ao dever que impende sobre o tribunal de resolver todas as questões que as partes hajam submetido à sua apreciação excetuadas aquelas cuja decisão esteja ou fique prejudicada pela solução dada a outras [cfr. art. 608.º, n.º 2 CPC].

V. Com efeito, o tribunal deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes e analisar todos os pedidos/pretensões pelas mesmas formulados, ressalvadas apenas as matérias ou pedidos/pretensões que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se haja tornado inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões.

VI. Questões para este efeito são, assim, todas as pretensões processuais formuladas pelas partes que exigem decisão do julgador, bem como, ainda, os pressupostos processuais [gerais e específicos] debatidos nos autos, sendo que não podem confundir-se aquilo que são as questões que os litigantes submetem à apreciação e decisão do tribunal com o que são as razões de facto ou de direito, os argumentos, ou os pressupostos em que cada parte funda a sua posição nas questões objeto de litígio.

VII. Daí que as questões suscitadas pelas partes e que justificam a pronúncia do tribunal terão de ser determinadas pelo binómio causa de pedir-pedido, pelo que não incorrerá na nulidade em referência o julgador que, apreciando na decisão todos os problemas/questões fundamentais objeto do litígio, não se pronunciou, todavia, sobre a bondade de todas as considerações, razões ou argumentos apresentados pelas partes.

VIII. Só existe omissão de pronúncia e, consequente, nulidade [art. 615.º, n.º 1, al. d) 1.ª parte do CPC/2013] se o tribunal na decisão, contrariando o disposto no art. 608.º, n.º 2 do CPC/2013, não discriminar os factos que considera provados ou se proferir uma decisão desfavorável à parte sem apreciar todos os objetos e fundamentos por ela alegados, visto que a ação/pretensão ou a exceção só podem ser julgadas improcedentes se nenhum dos objetos ou dos fundamentos puder proceder.

IX. Presentes os considerandos caracterizadores da nulidade de decisão ora em análise temos que, no caso, não se descortina ocorrer qualquer omissão de pronúncia.

X. Na verdade, temos que, desde logo, na situação vertente o recorrente/reclamante não explicita devidamente os contornos da arguida nulidade limitando-se praticamente a invocá-la.

XI. Por outro lado e se bem entendemos neste segmento a alegação produzida pelo recorrente/reclamante temos que, além disso, não se vislumbra que no juízo de improcedência da pretensão cautelar deduzida tenha havido uma qualquer omissão de pronúncia já que o requisito negativo relativo à ponderação de interesses/prejuízos foi efetuado [cfr. acórdão no ponto 2.2.2) e seus n.ºs LVII) a LXIX)], nele tendo sido considerados e ponderados aquilo que, à luz do alegado e provado, se afigurou serem os danos/prejuízos para as partes decorrentes da negação ou decretação da pretensão cautelar.

XII. Nessa medida, não poderá imputar-se ao acórdão recorrido nesse âmbito qualquer omissão de pronúncia, na certeza de que aquilo que o recorrente/reclamante qualifica como sendo uma “questão” tal, na verdade, constitui mero argumento ou motivação jurídica na qual sustenta a sua tese e pretensão, inclusive recursiva.

XIII. Se os termos e fundamentos em que a decisão judicial impugnada se estriba no juízo de improcedência firmado são ou não os corretos, se o recorrente/reclamante discorda de tal juízo, tal envolverá eventual erro de julgamento, mas não nulidade de decisão.

XIV. De harmonia com o exposto, e não obstante a argumentação desenvolvida pelo recorrente/reclamante temos que no caso em apreço não ocorrerá a nulidade assacada à decisão judicial em crise, decisão esta que, assim, importa sustentar na íntegra.

3. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em sustentar a decisão judicial em crise, considerando que não ocorre a arguida nulidade.
Notifique-se e, oportunamente, remetam-se os autos de harmonia com o já determinado a fls. 970.
D.N..

Lisboa, 15 de janeiro de 2015. - Carlos Luís Medeiros de Carvalho (relator) – Maria Benedita Malaquias Pires Urbano – Jorge Artur Madeira dos Santos.