Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:021/18
Data do Acordão:01/31/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL
PRESCRIÇÃO
DIVIDA DECLARADA EM FALHAS
Sumário:I - Embora o julgamento em falhas no processo executivo fiscal consista num arquivamento provisório, trata-se, inequivocamente, de uma decisão que põe termo ao processo o qual só prosseguirá nas específicas situações previstas no referido artº 274º do CPPT as quais se prefiguram como hipotéticas e indeterminadas temporalmente.
II - Sendo consabido que o elemento temporal é essencial e vital no instituto da prescrição ditado por razões de certeza e segurança jurídica tendo como principal destinatário o devedor tributário para o qual é uma garantia, evitando que possa, a todo o tempo, ser interpelado para o seu cumprimento.
III - A nosso ver qualquer interpretação no sentido de que para efeitos de aplicação do artº 327º nº 1 do C. Civil só deve entender-se a extinção do processo executivo, (como defende a recorrente) afigura-se-nos não ter sustentação na letra da lei e colidiria com as razões que presidem ao instituto da prescrição.
Nº Convencional:JSTA00070516
Nº do Documento:SA220180131021
Data de Entrada:01/11/2018
Recorrente:AT- AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A.........
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF AVEIRO
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL.
Legislação Nacional:CPPT ART272 ART274.
CCIV66 ART327 N1.
LGT ART49.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0304/17 DE 2017/04/05.
Referência a Doutrina:JORGE LOPES DE SOUSA - SOBRE A PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA - NOTAS PRÁTICAS 2010.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo
1 - RELATÓRIO
A Autoridade Tributária e Aduaneira vem recorrer para este Supremo Tribunal da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou procedente a reclamação apresentada por A………, melhor identificada nos autos, contra a decisão de 8/2/2016, proferida no âmbito do processo de execução fiscal nº 0175200701005014 que lhe indeferiu o pedido de prescrição da divida exequenda de IRS do ano de 2003, no montante de € 29.193,52.

Inconformada com o assim decidido, apresentou as respectivas alegações de recurso a fls. 132 e seguintes com o seguinte quadro conclusivo:
«1ª - A Fazenda Pública interpõe recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que deu razão à executada e ali Reclamante, considerando procedente a Reclamação, decidindo que se verificou a prescrição da divida exequenda em 29/08/2016.
2ª - Salvo o devido respeito, não se conforma a Fazenda Pública com a decisão recorrida no que concerne à declaração de prescrição.
3ª - Considerou o tribunal a quo que à citação da executada, ocorrida em 17/07/2007, determinando esta a interrupção do prazo de prescrição da dívida exequenda, apenas é de conferir o efeito instantâneo e já não o duradouro porque, conforme resulta do raciocínio expendido, tendo sido declarado em falhas o processo de execução fiscal a que respeita a dívida tributaria posta em crise, cessa aquele efeito duradouro da interrupção da prescrição decorrente da citação efectuada.
4ª - Para tanto, e como base para sustento da sua decisão, considerou o tribunal a quo que a declaração em falhas é uma das formas de se extinguir um processo de execução fiscal, e assim, com aquela declaração em falhas reinicia-se de imediato o decurso do prazo de prescrição, o que, face à ausência de outras causas suspensivas daquele prazo, resultou na decisão de considerar a dívida exequenda prescrita.
5ª - Contudo, entende a Fazenda Pública que a sentença ora recorrida enferma de erro de julgamento, pois não considerou que o prazo de prescrição, quando interrompido em resultado de citação, como no caso, não começa a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo, aqui de execução fiscal, o que ainda não aconteceu.
Senão vejamos:
6ª - Foi efectivamente entendido pelo tribunal a quo que a citação da Reclamante em 17/07/2007 é causa de interrupção do prazo de prescrição.
7ª - Contudo, e em referência à apreciada prescrição, não tomou em consideração todos os efeitos decorrentes da referida citação.
8ª - A interrupção da prescrição tem sempre como efeito a inutilização para o respectivo regime de todo o tempo decorrido anteriormente, sendo esse efeito instantâneo o único próprio da interrupção, presente em todas as situações (cfr. artigo 326.° n°.1 do CC).
9ª - Porém, em certos casos designadamente quando a interrupção resultar de citação, notificação, ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (cfr. artigo 327.° n°.1 do CC).
10ª - Resultam, assim, destes artigos 326.º e 327.º do CC, dois conceitos de interrupção da prescrição: um que se traduz exclusivamente num efeito instantâneo sobre o prazo de prescrição (inutilização para a prescrição do tempo decorrido); outro que se consubstancia no mesmo efeito instantâneo acrescido de um efeito duradouro (é eliminado o período decorrido e a prescrição não corre enquanto o processo durar, efeito duradouro este que é próprio dos factos suspensivos da prescrição).
11ª - Ora, no caso em crise, uma vez que a causa de interrupção do prazo de prescrição foi, exactamente, a citação da Reclamante, é de concluir, além do referido efeito instantâneo, também pela verificação do efeito duradouro da interrupção da prescrição.
12ª - Posto isto, não podemos aceitar a decisão do tribunal a quo que, considerando que a declaração em falhas do processo de execução fiscal é uma das formas deste se extinguir, consequentemente decidiu pela cessação do efeito duradouro da interrupção da prescrição.
13ª - É certo que a regulamentação da declaração em falhas se encontra regulada no C.P.P.T. na secção “Da extinção da execução”.
14° - Contudo, tal não é suficiente, por si só, para que se possa considerar que se verifica a extinção do processo em consequência da declaração em falhas do mesmo, como concluiu o tribunal a quo, tomando como apoio para a sua decisão o douto acórdão de 05/04/2017 desse Supremo Tribunal proferido no recurso n°0304/17.
15ª - Pois de facto, não se extinguiu o processo até à presente data, razão pela qual não se poderá entender que a citação efectuada não tem a virtualidade de conferir o efeito duradouro à interrupção do prazo de prescrição.
16ª - É que a declaração em falhas nunca pode, por si, acarretar a extinção da execução, por evidente falta de suporte na letra da lei para tal resultado.
17ª - Isto porque a declaração em falhas representa e corresponde apenas e só, à impossibilidade temporária de continuação dos actos de execução tendentes à cobrança da dívida.
18ª - Aliás, nem seria congruente considerar-se que a declaração em falhas é uma das causas de extinção da execução fiscal previstas na lei, pois não faz qualquer sentido que, uma vez extinta, a execução fiscal possa prosseguir, tal como é preceituado no artigo 274.º do CPPT.
19ª - E nesse exacto sentido de que a declaração em falhas não corresponde à extinção da execução, podemos evocar doutrina e jurisprudência consolidada sobre a matéria.
20ª - Podemos por isso afirmar que, atento o teor do artigo 274.º do CPPT, se a execução pode prosseguir a todo o tempo, salvo prescrição, sem necessidade de nova citação, mais evidente se torna que a execução fiscal não se extingue com a declaração em falhas.
21ª - E considerar que, uma vez declarado em falhas um processo e porque, tal como refere a própria lei, pode ocorrer a prescrição da dívida depois daquela declaração em falhas mas antes da extinção definitiva, isso significa a cessação do efeito duradouro da interrupção da prescrição, também não se mostra acertado.
22ª - Pois o que resulta a lei é sim, e apenas, que pode ocorrer a prescrição depois da declaração em falhas, dai não se podendo concluir que, pelo facto de poder a dívida prescrever nessas condições, tal acarrete quer a extinção da execução, quer a cessação dos efeitos da citação anteriormente ocorrida, quaisquer que eles sejam.
23ª - Do mesmo modo, os efeitos da citação também não poderão sofrer quaisquer contingências, ou restrições, pelo facto de ter sido a execução declarada em falhas, por evidente ausência de suporte legal para o efeito.
24ª - Assim, como no caso, se o efeito duradouro da interrupção da prescrição se verificava quando foi a execução declarada em falhas, não se vê como poderá o mesmo cessar com aquela declaração, por evidente falta de suporte legal.
25ª - Mais ainda, quando o artigo 274.º determina que “a execução por dívida declarada em falhas prosseguirá, sem necessidade de nova citação (...)“, não nos parece que se possa entender que de alguma forma e por isso se condicionem os efeitos da citação anteriormente efectuada.
26ª - Assim, se a declaração em falhas não corresponde à extinção do processo, como resulta claramente da lei, estando por isso ainda activo o processo de execução fiscal e não tendo transitado em julgado qualquer decisão que pusesse termo ao processo, o novo prazo de prescrição de 8 anos que se interrompeu com a citação levada a cabo em 17/07/2007 ainda não começou sequer a correr, atento o facto de a interrupção ter origem na citação da executada.
27ª - Por isso, não se pode entender, como fez o tribunal a quo na decisão de que se recorre, que ocorreu já a prescrição da divida exequenda, porquanto, como se viu, em termos práticos o prazo de prescrição não está ainda sequer a correr desde a data da citação da Reclamante, recorde-se, em 17/07/2007.
28ª - E esta interpretação das normas é pacífica e está consolidada na doutrina e na nossa melhor Jurisprudência.
29ª - Contudo, e como se verifica do raciocínio explanado na sentença de que se recorre, assim como da sua conclusão, não foi esse o entendimento do tribunal a quo.
30ª - Por conseguinte, não obstante o devido respeito pela decisão do tribunal a quo, não a podemos aceitar, por se mostrar errada e desajustada a solução dada á questão, mostrando-se evidente que não ocorreu a prescrição da dívida exigida pela administração tributária no âmbito do processo de execução fiscal identificado, violando-se o disposto nos artigos 48.º e 49.º n.º 3 da LGT, e 326.º e 327.º, estes do CC.
31ª - Face ao supra exposto, defende a Fazenda Pública, salvo melhor entendimento, que a douta sentença sob recurso enferma de erro de julgamento, fazendo errónea interpretação e aplicação do disposto nas normas legais que regem a prescrição das dívidas tributárias plasmadas nos artigos 48.º e 49.º n.º 3 da LGT, e 326.º e 327.º, do CC, desvirtuando, assim, os verdadeiros sentidos e alcance das normas em apreço, mostrando-se evidente que não ocorreu a prescrição da divida exigida pela administração tributaria no âmbito do processo de execução fiscal identificado.
32ª - Face a estes condicionalismos estamos convictos de que do direito V. Ex. farão a adequada interpretação da motivação que subjaz ao presente recurso, pois que a douta sentença, ora recorrida, a manter-se na ordem jurídica, revela uma inadequada interpretação e aplicação do disposto no regime sub judice.
Nos termos vindos de expor e nos que V. Ex.as, sempre mui doutamente poderão suprir, deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, substituir a douta decisão recorrida por outra que declare improcedente a presente reclamação do acto do órgão de execução fiscal, quando declarou a prescrição da dívida exequenda, mais consentânea com o Direito e a Justiça.»

Foram apresentadas contra alegações com as seguintes conclusões:
«1 - Não assiste razão à Recorrente nas alegações apresentadas.
2 - A Douta Sentença recorrida, proferida pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal “a quo” está muito bem fundamentada, quando aos factos provados, quanto à motivação e, principalmente, quanto à aplicação do Direito.
3 - Explicita muito bem e que forma se deu a interrupção da prescrição, e, quando se esgotou o efeito duradouro da mesma.
4 - Á decisão de emitir a declaração em falhas, pelo Chefe do Serviço de Finanças de Sever do Vouga, entidade competente para tal, teve o efeito de por termo ao processo, pois de uma decisão se tratou, esgotando assim o efeito duradouro da prescrição ocorrido com a citação.
5 - Citação essa que foi a única causa de interrupção da prescrição e mais nenhuma, nos termos do artº 49º n.º 3 da LGT, com a redacção data pela Lei 56-A/2007, aplicável naquela data.
6- Não houve, em momento algum, lugar à suspensão do processo, por não existir despacho sobre esse pedido, e, muito menos de o notificar à Reclamante.
7 - A Reclamante rege-se por critérios legais e encontra-se obrigada a cumprir os mesmos, pelo que, conforme a Reclamante deixou expresso na sua Petição Inicial, ao não cumprir os termos do artº 36° do CPPT.
8 - Pelo que, pelo menos, desde 30/08/2016, o processo em causa já se encontra já prescrito, e assim deve ser determinado.
9 - Por todo o alegado, tendo em conta os factos dados como provados, assim como os documentos constantes do processo, só a decisão que tomou o Meritíssimo Juiz do Tribunal “a quo” estaria correcta, não se vislumbrando qualquer contradição ou erro na apreciação de qualquer norma legal.»

O Ministério Público emitiu parecer com o seguinte conteúdo:
«O MINISTÉRIO PÚBLICO, junto deste Tribunal, vem, ao abrigo do disposto no artigo 289.º, n.º 1, 1.º segmento, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (doravante, CPPT), pronunciar-se sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, emitindo, para tanto, o seguinte PARECER
1. INTRODUÇÃO
Inconformada, veio a Fazenda Pública interpor o presente recurso jurisdicional da sentença proferida em 20/11/2017, pelo M.m° Juiz de Direito do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que julgou procedente a presente Reclamação Judicial e, consequentemente, anulou o ato reclamado, com todas as consequências legais, ato esse que foi praticado em 08/02/2016, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 0175200701005014, e que indeferiu o pedido de declaração de prescrição da dívida exequenda, proveniente de IRS do ano de 2003, no montante de €29.193,52.
A ora Recorrente veio imputar, à decisão sob recurso, erros de julgamento na interpretação e aplicação do direito, com o que, alegadamente, se mostraria violado o disposto nos artigos 48.º e 49.º, n.º 3, ambos da LGT, e 326.º e 327.º, estes últimos do Código Civil.
Nesta conformidade, face à delimitação do thema decidendum efetuada em sede conclusiva, a única questão suscitada consiste em apurar se enferma de erro de julgamento o entendimento do julgador do TAF de Aveiro, segundo o qual a declaração em falhas, a que aludem os artigos 272.º a 275.º do CPPT, constitui uma das formas de extinção do processo de execução fiscal e, como decorrência, se, in casu, com o despacho de 29/08/2008, que declarou em falhas a execução, se reiniciou, de imediato, o decurso do novo prazo de prescrição de 8 anos, ou se, ao invés, conforme defende a Recorrente, inexistiu qualquer decisão que pusesse termo ao processo, razão por que o novo prazo de prescrição, que se interrompeu com a citação levada a cabo em 17/07/2007, ainda nem sequer teria começado a correr (vide as conclusões, nomeadamente, as enunciadas como 4ª 26ª 27ª 30.ª e 31ª da motivação em análise, ínsitas de fls. 132 a 134 do p. f.)
Vejamos, pois, se assiste razão à Recorrente Fazenda Pública, nas críticas que teceu à decisão judicial recorrida.
II. DOS ERROS DE JULGAMENTO DE DIREITO
Invoca, pois, a Recorrente que a sentença em crise efetuou uma errada interpretação e aplicação das disposições contidas nos artigos 48º e 49º, n.º 3, ambos da LGT, e 326.º e 327º, estes últimos do Código Civil.
Cumpre-nos, pois, apurar se ocorreu in casu a afronta aos mencionados preceitos, convocados pelo tribunal a quo para a solução do caso vertente.
Ora, examinada a motivação em análise, constata-se que o pomo da discórdia não reside, verdadeiramente, na interpretação desses preceitos legais, mas, tão-somente, na consideração - ou não - da declaração em falhas, a que alude o artigo 272.º do CPPT, como um meio extintivo do processo de execução fiscal.
Ora, o Ministério Público segue na esteira da posição doutrinal acolhida na sentença em crise, que, para assim decidir, fez apelo ao douto Acórdão deste Colendo STA, de 05/04/2017, tirado no Processo n.º 0304/17 (disponível in http://www.dgsi.pt).
Na verdade, o Ministério Público secunda esse sagaz entendimento, quer por ter suporte na letra e no espírito do artigo 272.º do CPPT, quer por se alicerçar em convincente argumentação jurídica, de ordem teleológica e sistemática, quer, ainda, por se mostrar ancorado nos ensinamentos do M.ºm Juiz Conselheiro Dr. Jorge Lopes de Sousa (in “Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas”, Áreas Editora, 2010, ponto 3.3.2.1 e nota 8).
Assim sendo, a declaração em falhas põe, efetivamente, termo ao processo de execução fiscal, para efeitos de reinício da contagem do prazo prescricional, sem embargo da sua natureza provisória e condicional, resultante do artigo 274.º do CPPT, necessariamente dependente do posterior conhecimento de bens penhoráveis na titularidade ou posse do devedor executado, dos seus sucessores ou de outros responsáveis /ou da identificação do executado ou do prédio, quando a dívida respeitar a tributo que incida sobre a propriedade imobiliária.
Na verdade, importa atentar nos apertados pressupostos de que depende o prosseguimento da execução da dívida declarada em falhas, previstos no citado artigo 274º do CPPT.
Assim, nas palavras hábeis vertidas no mencionado douto aresto deste Colendo STA, “embora se trate de um arquivamento provisório, trata-se, inequivocamente, de uma decisão que põe termo ao processo o qual só prosseguirá nas específicas situações previstas no referido artº 274° do CPPT as quais se prefiguram como hipotéticas e indeterminadas temporalmente. Ora, é consabido que o elemento temporal é essencial e vital no instituto da prescrição ditado por razões de certeza e segurança jurídica tendo como principal destinatário o devedor tributário para o qual é uma garantia, evitando que possa, a todo o tempo, ser interpelado para o seu cumprimento.
A nosso ver qualquer interpretação no sentido de que para efeitos de aplicação do artº 327° n° 1 do C. Civil só deve entender-se a extinção do processo executivo, (como defende a recorrente) afigura-se-nos não ter sustentação na letra da lei e colidiria com as razões que presidem ao instituto da prescrição.
Como muito bem expressa o Sr. Procurador-Geral Adjunto neste STA referindo-se à possibilidade de prosseguimento da execução nos termos do artº 274° do CPPT, tal só será viável se a divida não se encontrar prescrita, prescrição que, em princípio, nunca estaria em causa se o efeito interruptivo duradouro decorrente da citação não cessasse com o termo, ainda que provisório, do processo de execução fiscal, por declaração em falhas”.
A ser assim, cumpre enfatizar que a Recorrente, embora imputando, à decisão judicial recorrida, a afronta aos citados normativos, todavia, não logrou rebater essa sapiente doutrina, em que o julgador da 1ª instância se estribou para concluir, como concluiu, pela procedência da presente reclamação judicial.
Destarte, em suma e em conclusão, face à falta de demonstração dos erros de julgamento de direito de que, alegadamente, padeceria a sentença recorrida e porque, de resto, o Ministério Público também os não vislumbra, salvo melhor opinião, o recurso jurisdicional sub judice deverá improceder na totalidade
III. CONCLUSÃO
Improcedendo, pois, na ótica do Ministério Público, todas as conclusões das alegações da Recorrente, deverá ser negado provimento ao Presente recurso jurisdicional e, consequentemente, ser inteiramente confirmada a sentença recorrida.»

2 - Fundamentação
O Tribunal a quo deu como provada a seguinte matéria de facto com interesse para a decisão:
1. Em 1/5/2007 a AT efetuou a liquidação n° 2007.5000053657, de IRS do ano 2003, no valor de €29.193,52, a pagar pela agora Reclamante até 11/6/2007 — fls. 34 do processo físico;
2. Em 4/7/2007, no Serviço de Finanças de Sever do Vouga foi autuado o processo de execução fiscal n° 0175200701005014, para cobrança coerciva da dívida acima referida — fls. 23 e 24 do processo físico;
3. Em 17/7/2007 a agora Reclamante assinou o aviso de receção que acompanhou a citação para a execução fiscal acima referida — fls. 2 do processo físico;
4. Em 16/8/2007, representada por mandatário judicial, a agora Reclamante apresentou no Serviço de Finanças de Sever do Vouga uma petição segundo a qual terá sido “notificadas para a execução acima identificada” e, informando ter intenção de “instaurar Impugnação Judicial” em momento próprio, até 11/9/2007, requereu “a suspensão do processo executivo, com dispensa de garantia por impossibilidade de prestação da mesma” — fls. 25 e 26 do processo físico;
5. Em 7/9/2007 a agora Reclamante apresentou no Serviço de Finanças de Sever do Vouga a petição inicial da impugnação judicial contra a liquidação a que alude o ponto 1 supra — fls. 29 a 33 e facto 12 da sentença de fls. 54vº;
6. Por despacho de 11/10/2007, com fundamento em informação de que “não são conhecidos bens penhoráveis à executada”, o Chefe do Serviço de Finanças de Sever do Vouga deferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia e ordenou a suspensão da execução nos termos do artigo 52° da LGT e mandou que fosse dado conhecimento ao representante da executada — fls. 28 do processo físico;
7. Em 29/8/2008 funcionários do Serviço de Finanças de Sever do Vouga elaboraram e subscreveram “auto de diligências” do qual consta que procuraram cumprir o mandado de penhora que antecede, para garantia das dívidas em cobrança no processo de execução fiscal n° 0175200701005014 e ap., com quantia exequenda no montante de € 37.651,75, mas verificaram “não o poder cumprir em virtude de não encontrarmos quaisquer bens penhoráveis” —fls. 39 a 42 do processo físico;
8. Em Despacho de 29/8/2008, o Chefe do Serviço de Finanças de Sever do Vouga declarou em falhas a divida exequenda e acrescido em cobrança coerciva no processo de execução fiscal n° 0175200701005014 e ap e notificou esse facto através de carta registada cujo aviso de receção foi assinado pela agora Reclamante em 24/9/2008. — fls. 43
9. Por ofício de 30/6/2016, a Caixa Geral de Depósitos, respondendo a pedido datado de 28/6/2016 de penhora de saldos de conta bancária em nome da Executada agora Reclamante, informou o Serviço de Finanças de Sever do Vouga de que as contas em causa não apresentam saldo, “pelo que não é possível satisfazer o solicitado” — fls. 61 do processo físico;
10. A Impugnação a que alude o ponto 5 supra deu origem ao processo n° 1270/07.9BEVIS, que correu termos neste Tribunal, decidido, no sentido da improcedência total do pedido, por sentença de 7/11/2016 com trânsito em julgado — fls. 53 a 59 do processo físico e consulta ao SITAF;
11. Por despacho de 3/3/2017, na sequência da decisão judicial a que alude o ponto anterior, o Chefe do Serviço de Finanças de Sever do Vouga determinou a extinção do efeito suspensivo da impugnação judicial e o consequente prosseguimento da execução — fls. 62 do processo físico;
12. Por ofícios de 3/3/2017 o Serviço de Finanças de Sever do Vouga solicitou à Caixa económica Montepio Geral (Montepio) a penhora de contas da executada, agora Reclamante, tendo a instituição de crédito informado que não é possível satisfazer o pedido formulado — fls. 64 e 65 do processo físico;
13. Em 17/3/2017 o Serviço de Finanças de Sever do Vouga notificou a agora Reclamante para se pronunciar sobre a proposta de inclusão na lista de devedores tributários a que alude o artigo 64° da LGT, para divulgação na internet, tendo a agora Reclamante que “O único processo em meu nome, a divida encontra-se prescrita nos termos do artº 48º, n° 1, da Lei Geral Tributária. Apresentarei pedido para reconhecimento da prescrição ao S.F. de Sever do Vouga — fls. 66 do processo físico;
14. Em resposta ao direito de audição a que alude o ponto anterior, em 20/3/2017, o Serviço de Finanças de Sever do Vouga considerou que, tendo a decisão proferida na impugnação judicial a que alude o ponto 10 supra transitado em julgado em 21/12/2016, a prescrição suspendeu-se no período entre 11/10/2007 e 21/12/2016, pelo que a dívida não prescreverá antes de 2024 — fls. 67 do processo físico;
15. Por ofício n°477, de 22/3/2017, remetido sob registo postal cujo aviso de receção foi assinado em 24/3/2017, a AT notificou a agora reclamante do teor da informação e da decisão a que alude o ponto anterior — fls. 68 do processo físico;
16. Em 8/6/2017 a agora reclamante apresentou no Serviço de Finanças de Sever do Vouga um pedido de reconhecimento da prescrição da dívida em cobrança no processo de execução fiscal n° 0175200701005014 e consequente extinção da execução — fls. 74 e 75 do processo físico;
17. Por ofício n° 1048, de 17/7/2017, remetido sob registo postal cujo aviso de receção foi assinado em 18/7/2017, o Serviço de Finanças de Sever do Vouga respondeu ao pedido a que alude o ponto anterior remetendo para a informação prestada em 20/3/2017 e notificada em 24/3/2017 (pontos 14 e 15 supra) - fls. 76 e 77 do processo físico;
18. Em 11/9/2017, via telefax, foi apresentada no Serviço de Finanças de Sever do Vouga a petição inicial da presente reclamação — fls. 4 e seguintes do processo físico;
3- DO DIREITO:
Fundamentação de direito da decisão sob recurso que se apresenta por extracto:
(…) Ou seja: no caso dos autos é pedido ao Tribunal que se pronuncie acerca da prescrição da quantia exequenda.
Da prescrição do IRS de 2003
A Reclamante considera que o despacho proferido (quer dizer, resposta ao pedido de declaração de prescrição notificada em 18/7/2017) “Não é de todo razoável além de que não reconhece a prescrição que já ocorreu” (artigo 4° da p.i.), percebendo-se que pretende imputar a essa decisão (que não consta formalmente de um despacho, mas diretamente de um oficio) o vício que erro quanto aos respetivos pressupostos, conforme também decorre dos artigos 5° e seguintes da pi.
A Reclamante considera que a fundamentação da decisão por remissão para o conteúdo da decisão, sobre a mesma questão, proferida e notificada pouco antes inquina o ato de uma nulidade resultante de “falta de pronúncia” (artigo 20° p.i.).
Note-se, a talhe de foice, que a fundamentação dos atos administrativos pode ser feita contextualmente ou por remissão para outro documento que seja do conhecimento do destinatário. Nesse sentido se tem pronunciado uniforme e reiteradamente a jurisprudência nacional, de que é bom exemplo o Ac. STA de 2/12/2010, proferido no recurso n° 0554/10, disponível em http /www.dgsi.pt /jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931//f28fc01181d5802577fb005044c9?OpenDocument&ExpandSection=1 Pelo que nesse aspeto não há qualquer vício formal na decisão reclamada.
Não há dúvida de que a Reclamação assenta essencialmente no entendimento de que sendo a dívida em causa constituída pelo IRS do ano 2003 e não tendo havido suspensão da contagem, a prescrição já se teria consolidado (artigos 5° a 6° da p.i.). Sem prejuízo, a Reclamante reconhece que ocorreu uma causa de interrupção em julho de 2007, por força da citação, pelo que o novo prazo recomeçou nessa data, em 17/7/2007 (artigo 7° p.i.), pelo que a prescrição se verificou em 17/7/2015 (artigo 15° p.i.). Isto porque a suspensão resultante da impugnação não se efetivou por falta de prestação de garantia e por ineficácia da declaração de dispensa de prestação de garantia solicitada ao abrigo do artigo 52° da LGT, na medida em que essa decisão não foi produzida ou não foi notificada ao destinatário (artigos 8° a 11°). Mas ainda que tivesse havido tal suspensão ela só seria válida por um ano, de 11/10/2007 até 11/10/2007, por força da caducidade da isenção de garantia prevista no artigo 52°, n° 5, da LGT (artigos 12° a 14° p.i.), pelo que a prescrição se teria verificado em outubro de 2016 (artigo 16° da p.i.)
A Fazenda Pública contesta tal entendimento por considerar que o efeito interruptivo provocado pela citação ocorrida depois de 1/1/2007 (como no caso dos autos) tem efeitos duradouros (até ao trânsito em julgado da decisão que puser termo ao processo em que foi declarada, nos termos do artigo 327°, n°1, do CC), conforme jurisprudência que cita.
No seu douto Parecer o DM Ministério Público junto deste Tribunal secunda a posição da Fazenda Pública.
De facto, estando em causa uma divida de IRS de 2003 aplica-se o disposto nos artigos 48° e 49° da Lei Geral Tributária (LGT).
Assim, por estar em causa um imposto periódico, o prazo de prescrição, que é de 8 anos, conta-se desde 31/12/2003 (artigo 48°, n°1, da LGT). Pelo que na falta de causas interruptivas ou suspensivas a prescrição verificar-se-ia em 31/12/2011.
Porém, nos termos do artigo 49°, n°1, da LGT, a citação interrompe a prescrição.
Como resulta do probatório a citação correu em 17/7/2007 (facto 3 de 3.1 supra), já depois da alteração legislativa produzida pelo artigo 90° da Lei n° 53-A/2006, de 29 de dezembro, que revogou o n°2 do artigo 49° da LGT.
Em consequência dessa alteração legislativa o efeito suspensivo duradouro (até então limitado a um ano contado a partir da paragem do processo durante superior a um ano consecutivo por facto não imputável ao contribuinte), quando existisse, deixou de ter esse limite.
Portanto, a partir de então sempre que a causa interruptiva seja a “citação”, como no caso dos autos, esta tem o efeito instantâneo de inutilizar para a prescrição todo o tempo já decorrido e, cumulativamente, o efeito duradouro de suspender o reinício do novo prazo enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo executivo no qual foi efetuada a citação. É assim por força do disposto no artigo 327°, n°1, do Código Civil.
Neste sentido se tem pronunciado a jurisprudência do STA, de que se cita, a título meramente exemplificativo, o acórdão de 7/1/2016, proferido no recurso n° 01564/15, disponível em http/www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/4acb231d8149c00480257f390050676c?OpenDocument&ExpandSection=1
Sendo assim, aquele efeito interruptivo mantem-se enquanto o processo de execução fiscal se encontrar ativo, mas cessa quando o processo for declarado extinto.
Ora, no caso dos autos, por despacho de 29/8/2008 a AT declarou em falhas a execução fiscal (facto 8 de 3.1 supra).
Dispõe o artigo 176°, n°1, do CPPT que o processo de execução fiscal extingue-se por pagamento, anulação ou qualquer outra forma prevista na lei.
Por seu lado, a Secção X do Título IV do CPPT, iniciada no artigo 259°, tem a epígrafe “Da extinção da execução” e prevê as seguintes causa de extinção: a) por pagamento coercivo (artigos 259° a 263°); b) - por pagamento voluntário (artigos 264° a 271°); c) -por declaração em falhas (artigos 272° a 275°).
Portanto, não há dúvida de que a declaração em falhas é uma das causas de extinção da execução fiscal previstas na lei. Trata-se porém de uma causa de extinção muito peculiar, já que a mesma execução poderá prosseguir sem necessidade de nova citação e “a todo o tempo, salvo prescrição”, logo que haja conhecimento de que o executado ou outros responsáveis possuem bens penhoráveis (por há quem fale numa “extinção provisória”, na medida em que depende da verificação de uma cláusula de “melhor fortuna”.
Assim, resulta claramente da letra da lei que a prescrição pode ocorrer durante o período posterior à declaração em falhas e antes da extinção definitiva.
Neste sentido se pronunciou, por exemplo o Acórdão do STA de 5/4/2017, proferido no recurso n° 0304/17, disponível em http/www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/0a085802 ea93 / 1b002e369a?OpenDocument&ExpandSection=1 que cita Jorge Lopes de Sousa, in “Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas”, Áreas Editora 2010, ponto 3.3.2.1 e nota 8, a propósito do regime do art.° 327°, n.º 1 do CC
(…)
Assim, o efeito duradouro resultante da citação expirou em 29/8/2008, por força da dita declaração em falhas do processo executivo onde essa citação fora efetuada.
Por isso, tem de se considerar que o novo prazo de prescrição se iniciou em 30/8/2008.
Entretanto, em 7/9/2007, a agora Reclamante tinha deduzido a impugnação judicial que originou o processo n° 1270/07.9BEVIS e tinha pedido dispensa de prestação de garantia, ao abrigo do artigo 52° da LGT, para suspensão da execução até ao trânsito em julgado da decisão final a proferir na impugnação. A AT reconheceu essa isenção de garantia por despacho de 11/10/2007 (factos 4 a 6 de 3.1 supra).
Porém, a AT não notificou tal decisão à agora Reclamante.
A Reclamante põe a hipótese de a dispensa de prestação de garantia requerida por si ter sido efetivamente deferida, mas contesta a eficácia dessa decisão.
A Reclamante considera que a própria AT não atribuiu qualquer eficácia à referida dispensa de garantia na medida em que continuou a praticar atos de penhora, “o que não se coaduna com um processo suspenso” — artigo 9° p.i.
A EP contesta alegando que não houve qualquer penhora (2 - Contraditoriamente, no artigo 41° da contestação a FP afirma que foi decidida a suspensão da execução, nos termos do artigo 52° da LGT, na sequência da penhora de imóvel em 5/6/2006 e da apresentação de reclamação graciosa em 27/2/2006. Crê-se que tal afirmação resulta de manifesto lapso, na medida em que é impossível que a reclamação graciosa tenha ocorrido antes da liquidação (que é de 1/5/2007 — facto 1 de 3.1 supra). Do mesmo modo é impossível que a penhora efetuada para suspensão da execução seja anterior à autuação do processo executivo, que ocorreu em 4/7/2007 (facto 2 de 3.1) - (artigo 52° da contestação).
Na verdade, a AT fez diligências com vista a penhorar saldos bancários da Executada eventualmente existentes na Caixa Geral de Depósitos e na Caixa Económica Montepio Geral (factos 9 e 12 de 3.1 supra). Dessas diligências não resultou qualquer ato de penhora efetiva, por inexistência de bens ou direitos penhoráveis.
Como se sabe a impugnação, acompanhada de prestação de garantia idónea ou de decisão que dispense tal garantia, suspende a execução fiscal (artigo 169° do CPPT) e a suspensão da ação executiva é causa suspensiva da prescrição (artigo 49°, n° 4 da LGI).
A dispensa de garantia está prevista e regulada nos artigos 52° da LGT e 170° do CPPT.
A pedido do executado tem a AT a faculdade discricionária de, verificados os requisitos legais previstos no n° 4 do artigo 52° da LGT, dispensar a prestação garantia. Esse ato de dispensa de garantia constitui um ato administrativo em matéria tributária, uma verdadeira decisão com efeitos externos, sujeita a notificação como condição de eficácia (artigo 77°, n° 6, da LGT). No sentido da apontada qualificação jurídica do ato se pronunciou o Acórdão do STA de 14/12/2011, no Recurso n° 01072/11, disponível em www.dgsi.pt e Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária anotada e comentada, 4ª edição 2012, Encontro da Escrita, comentário n° 11 ao artigo 52°, pág. 428-429). Também nesse sentido aponta a interpretação conjugada dos artigos 170°, n° 4, do CPPT e 109° do CPA, segundo a qual o pedido de dispensa de garantia deve ser resolvido no prazo de 10 dias após a sua apresentação (artigo 170°, n°4 do CPPT) sob pena de, decorrido tal prazo sem que exista decisão, formar-se a presunção de indeferimento [artigo 109° do CPA, com a redação à data dos factos, ex vi artigo 2°, al. d) do CPPT) para efeitos de reclamação judicial prevista no artigo 276° e seguintes do CPPT (Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Vol. III, 6ª edição 2011, Áreas Editora, comentário n° 5 ao artigo 170°, pág. 235). Acresce que o artigo 52°, n° 5, da LGT, na sua redação atual, dispõe que a isenção de prestação de garantia à válida por um ano, devendo a administração tributária (AT) notificar o executado da data da sua caducidade, até 30 dias antes, O que reforça o entendimento de que a declaração de isenção da garantia também deveria ter sido notificada (à semelhança do que sucede com a sua iminente caducidade).
Assim, a decisão do pedido de dispensa de garantia apresentado em 16/8/2007 (admitindo que se quedou ineficaz até 7/9/2007, data da apresentação da impugnação) deveria ter sido proferida em 10 dias, até 17/9/2007, mas, ainda assim, terá sido proferida em 11/10/2007.
No entanto, dado que não chegou a haver notificação desse ato, ele quedou-se ineficaz e formou-se a presunção de indeferimento tácito para efeito de impugnação judicial.
De qualquer maneira, a dispensa de prestação garantia declarada após a alteração legislativa constituída pela Lei n° 64-B/2011, de 30 de dezembro (entrada em vigor em 1/1/2012) apenas será válida por um ano (artigo 52°, n°5, da LGT). Relativamente às isenções concedidas antes dessa alteração legislativa deve considerar-se que a “nova lei” é aplicável às situações pendentes, mas o prazo de um ano conta-se a partir da entrada em vigor da lei que estabelece esse prazo.
Ainda que assim não fosse no caso dos autos, a Reclamante considera que uma vez que a dispensa de garantia não poderia ter qualquer eficácia antes da cumulação do deferimento do pedido com a apresentação da impugnação, o que sucedeu em 7/9/2007, tem de se concluir que essa dispensa sempre teria expirado em 7/10/2008 (um ano após a sua declaração) - artigos 11º e 14° pi), pelo que a precisão ocorreu em 17/7/2015 (artigo 15°pi).
Porém, como se viu, em tal hipótese a declaração de isenção da prestação de garantia caducaria em 1/1/2013 (um ano após a entrada em vigor da Lei n° 64-B/2011), pelo que a prescrição não poderia ocorrer antes de 1/1/2021 [e, além disso, concluir que as diligências de penhora efetuadas em 2016 (facto 9) e em 2017 (facto 12) não contendem com a suspensão da execução, porque esta já não se verificava na altura desses factos].
Voltando ao argumento que se refere à interrupção causada pela citação, verifica-se que os efeitos duradouros dessa causa interruptiva cessaram com a declaração em falhas ocorrida em 29/8/2008.
Nessa altura reiniciou-se um novo prazo de prescrição de 8 anos. No entanto, não estando suspenso por força da Impugnação, a qual se quedou ineficaz por falta de notificação do deferimento do pedido de isenção de garantia, o prazo de prescrição expirou em 29/8/2016.
Acresce que ainda que a Impugnação tivesse efeito suspensivo, desde 11/10/2007, tal efeito teria caducado em 11/10/2008, pelo que a prescrição sempre teria ocorrido em 11/10/2016.
6. Decisão
Tudo visto e ponderado, o Tribunal julga procedente a presente Reclamação judicial, anulando o ato reclamado com todas as consequências legais(…)”.

DECIDINDO NESTE STA
Como muito bem sintetiza o Sr. Procurador Geral Adjunto neste STA no seu parecer supra destacado e tendo presente que é pelas conclusões de recurso que se delimita o seu objecto concordamos que a única questão suscitada consiste em apurar se enferma de erro de julgamento a sentença que considerou que a declaração em falhas, a que aludem os artigos 272.º a 275.º do CPPT, constitui uma das formas de extinção do processo de execução fiscal e, como decorrência, se, in casu, com o despacho de 29/08/2008, que declarou em falhas a execução, se reiniciou, de imediato, o decurso do novo prazo de prescrição de 8 anos, ou se, ao invés, conforme defende a Recorrente, inexistiu qualquer decisão que pusesse termo ao processo, razão por que o novo prazo de prescrição, que se interrompeu com a citação levada a cabo em 17/07/2007, ainda nem sequer teria começado a correr.
Adiantamos já que se mostra acertado o julgamento efectuado e que a nosso ver a sentença deverá ser confirmada.
Esta arrimou-se ao acórdão por nós relatado em 05/04/2017 tirado no rec.0304/17 no qual após se destacarem os ensinamentos de Jorge Lopes de Sousa in “ Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária - Notas práticas” Áreas Editora 2010 ponto 3.3.2.1 e nota 8 a propósito do regime do artº 327º nº 1 do CCivil (ensinamentos para os quais de novo agora remetemos) se expressou:
Concordamos que, embora se trate de um arquivamento provisório, trata-se, inequivocamente, de uma decisão que põe termo ao processo o qual só prosseguirá nas específicas situações previstas no referido artº 274º do CPPT as quais se prefiguram como hipotéticas e indeterminadas temporalmente. Ora, é consabido que o elemento temporal é essencial e vital no instituto da prescrição ditado por razões de certeza e segurança jurídica tendo como principal destinatário o devedor tributário para o qual é uma garantia, evitando que possa, a todo o tempo, ser interpelado para o seu cumprimento.
A nosso ver qualquer interpretação no sentido de que para efeitos de aplicação do artº 327º nº 1 do C. Civil só deve entender-se a extinção do processo executivo, (como defende a recorrente) afigura-se-nos não ter sustentação na letra da lei e colidiria com as razões que presidem ao instituto da prescrição.
Como muito bem expressa o Sr. Procurador Geral Adjunto neste STA referindo-se à possibilidade de prosseguimento da execução nos termos do artº 274º do CPPT, tal só será viável se a divida não se encontrar prescrita, prescrição que, em princípio, nunca estaria em causa se o efeito interruptivo duradouro decorrente da citação não cessasse com o termo, ainda que provisório, do processo de execução fiscal, por declaração em falhas.
Na consideração do que ficou dito, concordamos com o julgamento contido na sentença sob recurso de que a partir da data de declaração em falhas e dado que não constam dos autos quaisquer ocorrências com efeito interruptivo ou suspensivo do prazo de prescrição, (de resto não alegadas pela recorrente) o prazo correu ininterruptamente desde essa data (25/03/2011; vide ponto F, do probatório) até se completar, em 25-03-2016, sendo de aplicar aos juros de mora, o mesmo regime da obrigação principal”.

Esta jurisprudência mantém-se actual e aplica-se inteiramente ao caso dos autos. A recorrente não adianta argumentos novos e relevantes para sustentar que o prazo de prescrição, quando interrompido em resultado de citação, como no caso, não começa a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo, aqui de execução fiscal, o que ainda não aconteceu. A esta questão já foi dada resposta cabal. Por conseguinte a sentença agora sindicada que considerou tal jurisprudência e julgou prescrita a obrigação tributária não incorre em erro de julgamento tendo subsumido com correcção os factos ao direito. Assim sendo, falece razão à recorrente sendo de negar provimento ao recurso.
Preparando a decisão alinhamos as seguintes proposições:
I - Embora o julgamento em falhas no processo executivo fiscal se trate de um arquivamento provisório, trata-se, inequivocamente, de uma decisão que põe termo ao processo o qual só prosseguirá nas específicas situações previstas no referido artº 274º do CPPT as quais se prefiguram como hipotéticas e indeterminadas temporalmente.
II - Sendo consabido que o elemento temporal é essencial e vital no instituto da prescrição ditado por razões de certeza e segurança jurídica tendo como principal destinatário o devedor tributário para o qual é uma garantia, evitando que possa, a todo o tempo, ser interpelado para o seu cumprimento.
III - A nosso ver qualquer interpretação no sentido de que para efeitos de aplicação do artº 327º nº 1 do C. Civil só deve entender-se a extinção do processo executivo, (como defende a recorrente) afigura-se-nos não ter sustentação na letra da lei e colidiria com as razões que presidem ao instituto da prescrição.
4-DECISÃO:
Pelo exposto, acordam os Juízes deste STA em negar provimento ao recurso e, em confirmar a decisão recorrida.

Custas a cargo da recorrente
Lisboa, 31 de Janeiro de 2018. – Ascensão Lopes (relator) – Ana Paula Lobo – António Pimpão.