Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:050/20.0BALSB
Data do Acordão:02/24/2021
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE
JURISPRUDENCIA CONSOLIDADA
SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO
Sumário:I - De harmonia com o disposto no n.º 2 do artigo 25.º do RJAT (DL nº 10/2011, de 20/1) a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é suscetível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com outra decisão arbitral ou com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo.
II - A este recurso é aplicável, com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no artigo 152º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, sendo requisito para a sua admissibilidade a existência de contradição sobre a mesma questão fundamental de direito entre a decisão recorrida e a decisão/acórdão fundamento e que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
III - A existência de uma jurisprudência consolidada deve transparecer ou do facto de a pronúncia respectiva constar de acórdão do Pleno assumido pela generalidade dos Conselheiros em exercício na Secção ou do facto de existir uma sequência ininterrupta de várias decisões no mesmo sentido, obtidas por unanimidade em todas as formações da Secção.
IV - Não se verifica este último requisito se a orientação perfilhada na decisão recorrida é plenamente conforme à assumida em acórdão do Pleno da Secção, em que intervieram todos os Juízes Conselheiros em exercício.
Nº Convencional:JSTA000P27265
Nº do Documento:SAP20210224050/20
Data de Entrada:05/28/2020
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A………………
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Processo n.º 50/20.0BALSB (Recurso para Uniformização de Jurisprudência)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. RELATÓRIO

A Directora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, devidamente identificada nos autos, inconformada com a decisão proferida nos autos de processo arbitral - Proc. nº 654/2019-T - que julgou procedente o pedido pronúncia arbitral deduzido por A……….. sobre o acto de liquidação de IRS, do ano de 2017, no valor de € 30.387,84 e sobre o indeferimento da Reclamação Graciosa com o n.º de Processo 3085201804010957, comunicada pelo Ofício n.º 7933 de 2 de Julho de 2019, veio interpor Recurso para Uniformização de Jurisprudência ao abrigo do disposto nos artigos 25.º e 26.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT) e no artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), aplicável ex vi do artigo 25.º, n.º 3 do RJAT, com base em oposição de acórdãos, apontando como acórdão fundamento, a decisão Arbitral proferida no Proc. nº 539/2018-T.

Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“ (…)

A – O Acórdão arbitral recorrido (654/2019-T) incorreu em erro de julgamento, porquanto decidiu o Tribunal Arbitral “(…) 7.1.1 Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, porquanto o acto de liquidação de IRS impugnado padece de ilegalidade, devendo ser anulado, com as consequências daí decorrentes; (…) Em consequência, julgar procedente o pedido anulação do despacho de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra o referido acto de liquidação; (…)”.

B – E sustenta o referido acórdão arbitral que “ 6.35. Ora, como vimos, o Requerente entende, neste âmbito que, a existência do regime exposto no ponto anterior não afasta a invalidade do regime discriminatório ainda em vigor (e que foi aplicado à liquidação de IRS do ano 2017 ora impugnada) porquanto, em matéria de tributação dos rendimentos resultantes das mais-valias provenientes da alienação de direitos reais sobre imóveis situados em Portugal, por não residentes neste território (mas residentes noutro Estado membro da UE ou do EEE), resulta que (de acordo com o disposto no nº 1 e nº 8 do artigo 72º do Código do IRS) coexistem para os sujeitos passivos não residentes em Portugal dois regimes fiscais, (i) um nos termos do qual aqueles rendimentos são sujeitos a uma taxa especial de 28% e (ii) um outro regime equiparado ao que vigora para os sujeitos passivos residentes em território português, segundo o qual, os mesmos rendimentos são sujeitos à taxa que, de acordo com a tabela prevista no nº 1 do artigo 68º, seria aplicável no caso de serem auferidos por residentes em território português, tomando-se em consideração, neste regime, todos os rendimentos, incluindo os auferidos fora de Portugal, mantendo-se em vigor a disposição constante do nº 2 do citado artigo 43º do Código do IRS.

6.36.Esta questão, quanto à aplicação do regime equiparado ao dos sujeitos passivos residentes em Portugal, já foi objecto de tratamento por este Tribunal Arbitral, no âmbito de diversas decisões arbitrais, nomeadamente, a proferida no âmbito do processo nº 45/2012-T, de 05-07-2012, nos termos da qual se refere que “para além de (…) a previsão deste regime facultativo fazer impender sobre os não residentes um ónus suplementar comparativamente aos residentes, a opção de equiparação não é, segundo entendemos, susceptível de excluir a discriminação em causa. Neste sentido, se pronunciou o TJUE, no Acórdão, de 18 de Março de 2010, proferido no processo C-440/08 (Acórdão Gielen) numa situação que apresenta manifesto paralelismo, somente com a diferença de que neste processo estava em causa a violação do artigo 49.º e não a do artigo 63.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia. Salienta aquele órgão jurisdicional que a opção de equiparação permite a um contribuinte não residente, (…) escolher entre um regime fiscal discriminatório e um outro regime supostamente não discriminatório, frisando que essa escolha não é passível de excluir os efeitos discriminatórios do primeiro desses dois regimes fiscais. (…). Conclui o TJUE que o Tratado se opõe a uma regulamentação nacional que discrimina os contribuintes não residentes na concessão de um benefício fiscal (…) apesar de esses contribuintes poderem optar, no que se refere a esse benefício, pelo regime aplicável aos contribuintes residentes”.

6.37.Com efeito, e de acordo com o referido na Decisão Arbitral proferida no âmbito do processo nº 127/2012-T, de 14-05-2013, “a opção que é dada a um sujeito passivo residente na União Europeia ou espaço económico europeu entre um regime que continua a ser discriminatório, por violação do disposto art. 63.º da TFUE e um outro alegadamente não discriminatório equiparando-os com os residentes no território português, para além de terem a obrigação de optar e de declarar os rendimentos auferidos fora daquele território, não exclui nem neutraliza os efeitos discriminatórios do primeiro daqueles dois regimes”, concluindo que, “ao se reconhecer que os referidos efeitos não são eliminados, estar-se-á a admitir que a referida opção valida um regime fiscal que continua em si mesmo a violar o artigo 63.º do TFUE, pelos motivos acima enunciados, o que não se coaduna com o direito comunitário” (sublinhado nosso).

6.38. Na verdade, o entendimento referido no ponto anterior é, desde 2011, sufragado pelo STA, como se extrai da jurisprudência emanada do Acórdão de 22-03-2011 (proferida no processo nº 1031/10), nos termos do qual se anulou um acto de liquidação emitido pela Requerida que, “perante a declaração dos contribuintes, lhes liquidou o imposto que considerou devido (como aliás sempre sucede no IRS) à taxa prevista para os não residentes (…) e sobre o montante total da mais-valia realizada e não apenas sobre 50% deste valor (…), assim ignorando a jurisprudência comunitária e a deste Supremo Tribunal que a acolheu (cfr. o Acórdão de 16 de Janeiro de 2008, rec. n.º 439/06) quanto à incompatibilidade daquela disposição legal, assim aplicada, com o (então) artigo 56.º do TJCE (actual artigo 63.º do TFUE) sujeitando, deste modo, como veio a acontecer, a ver anulada nessa parte a liquidação impugnada, dado o primado do direito comunitário.

(…) 6.50. Assim, é seguro afirmar que o regime de tributação previsto no artigo 72º do Código do IRS (na redacção vigente à data da liquidação em crise, ou seja, em 2017), é incompatível com o disposto no artigo 63º do TFUE, pois torna a tributação das mais-valias imobiliárias menos atractiva para os sujeitos passivos não residentes (face à tributação aplicável aos sujeitos passivos residentes), constituindo uma restrição aos movimentos de capitais proibida pelo Tratado.

6.51. Ora, foi este regime negativamente discriminatório para os não residentes que foi aplicado na liquidação de IRS aqui impugnada e, não obstante este regime poder ser afastado pelos sujeitos passivos não residentes, através de opção, esta possibilidade não afasta a discriminação negativa, pois é imposta ao sujeito passivo (não residente) uma obrigação de opção que não é extensiva aos sujeitos passivos residentes.

6.52. Assim, sendo afirmativa a resposta a dar à questão decidenda enunciada no artigo 6.3., supra, decide este Tribunal Arbitral julgar procedente o pedido arbitral formulado pelo Requerente, quanto à ilegalidade parcial do acto tributário de liquidação de IRS, do ano de 2017, devendo a mesma ser anulada, com as consequências daí decorrentes, bem como anular o despacho de indeferimento da reclamação graciosa oportunamente apresentada.(…).”

C - Ao contrário do que decidiu a Decisão Arbitral fundamento (processo n.º 539/2018-T), na qual o Tribunal arbitral considerou que:

“14 - Apresenta-se, pois, neste processo, uma dupla situação que encerra incongruências, entre si, quanto ao que o Requerente pretende, porquanto: a) Por um lado, pretende a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 43.º do Código do IRS, que é aplicável às maisvalias obtidas em território português, que, de facto manda considerar a tributação de 50% saldo das mais-valias de imóveis, respeitantes às transmissões efetuadas por residentes, previstas na alínea a)2 do n.º 1 do artigo 10.º.

b) Por outro lado, exige que seja feita uma tributação do referido saldo, reduzido em 50%, com aplicação da taxa aplicável a não residentes de 25%, conforme opção de tributação pelo regime geral, conforme campo 07 do quadro 8B da sua Declaração mod. 3 de IRS, e não pela aplicação das taxas gerais do artigo 68.º e das demais regras aplicáveis aos residentes.

15 - Ora, esta forma de tributação mista, de escolha do melhor dos regimes de tributação, ou seja, ser considerado como residente para efeitos de aplicação do artigo 43.º, n.º 2 e não residente para efeitos de aplicação da taxa do artigo 72.º, n.º 1, ambos do CIRS, o que é incongruente e inaplicável, e nem sequer se pode argumentar que há violação dos Tratados da União Europeia, por não se estar perante uma qualquer discriminação.

16 - Isto porque o Requerente tinha ao seu dispor a possibilidade de ver tributadas as suas mais-valias de harmonia com todas as regras aplicáveis aos residentes, se, para tanto, tivesse feito essa opção, ao abrigo do n.º 9 do artigo 72.º do Código do IRS, como a lei lhe permite - o que não aconteceu.

17 - Assim, ao não ter optado pela tributação das suas mais-valias imobiliárias, pela aplicação das taxas do artigo 68.º do CIRS e das demais regras aplicáveis aos residentes, mas sim pelas taxas gerais, não assiste razão ao Requerente.

18 - Aliás, nem aos residentes as normas do CIRS permitem esta dualidade de tratamento, ou seja, redução a 50% das mais-valias imobiliárias e aplicação das taxas do artigo 72.º do CIRS, obrigando sempre, neste caso, ao englobamento deste saldo com os demais rendimentos para aplicação à totalidade dos rendimentos auferidos as taxas gerais do artigo 68.º do Código do IRS.

19. O regime escolhido pelo Requerente, embora invoque que é um residente na União Europeia, foi o da tributação pelas taxas do artigo 72.º aplicáveis a não residentes e não as aplicáveis a residentes, pelo que o regime escolhido deve ser aplicado "in toto", como procedeu, e bem, a Requerida, no entender do Tribunal.

19 - Assim sendo, não se poderá invocar a discriminação negativa como pretende o Requerente e isto porque as suas opções foram respeitadas.

20- Recorda-se que o Acórdão do TJCE de 2007OUT11 (Hollman) foi proferido antes das alterações introduzidas ao artigo 72.º do CIRS, já anteriormente citadas, precisamente para permitir uma tributação igualitária entre residentes em território português e não residentes, desde que os sujeitos passivos o requeiram - o que não foi o caso.”

D – Concluindo o Acórdão fundamento que:

“20 - Nesta conformidade, entende este Tribunal que a liquidação impugnada não sendo incompatível com o disposto no artigo 63.º do TFUE, dada a opção do Requerente, julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral, mantendo-se na ordem jurídica a liquidação n.º 2018.5005490173, relativa ao ano de 2017 e no valor de €47.034,56.

(…)

Termos em que se decide:

a) Julgar improcedente o pedido arbitral formulado e, em consequência, manter na ordem jurídica a liquidação de IRS impugnada.

b) Julgar igualmente improcedente o pedido de pagamento de juros indemnizatórios a favor do Requerente. (…)”

E - Verifica-se uma patente e inarredável contradição quanto à mesma questão fundamental de direito, que consiste em saber se o regime de exclusão de tributação de mais-valias previsto no artigo 43.º, n.º 2 do CIRS é aplicável aos não residentes.

F - Quanto ao estabelecido pelas regras que determinam os requisitos de admissibilidade deste tipo de recursos, resulta que, para que se tenha por verificada a oposição de acórdãos, é necessário (vd., entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 2015-06-03, processo 0793/14) que:

as situações de facto sejam substancialmente idênticas;

haja identidade na questão fundamental de direito;

se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta; e,

a oposição deverá decorrer de decisões expressas e não apenas implícitas.

G - As presentes alegações demonstram que, no caso vertente, se encontram reunidos os referidos requisitos para que se tenha por verificada a alegada oposição de acórdãos.

H - Para que se considere que há oposição de acórdãos, entende a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo que os acórdãos em confronto versem sobre situações fácticas substancialmente idênticas e que se pronunciem sobre a mesma questão fundamental de direito. Ou seja, importa que as soluções opostas tenham sido perfilhadas relativamente ao mesmo fundamento de direito, o se verificou.

I - Entre o Acórdão recorrido e o Acórdão fundamento há uma identidade de situações de facto, na medida que em ambos os casos, a factualidade consignada se reporta a tributação no âmbito de IRS, tendo em conta a aplicação do art. 43.º, n.º 2 do CIRS aos não residentes.

J - As decisões em confronto perfilharam, sobre a mesma questão fundamental de direito, soluções opostas de forma expressa, isto é, adotaram sobre a mesma questão de direito soluções juridicamente divergentes em idênticas situações de facto.

K - Resta concluir que o Acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento, bem como que se encontra em manifesta oposição quanto à mesma questão fundamental de direito com a jurisprudência firmada na Decisão fundamento, devendo ser substituído por novo Acórdão que julgue improcedente o pedido arbitral.

Termos em que deve o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência ser aceite e posteriormente julgado procedente, por provado, sendo, em consequência, nos termos e com os fundamentos acima indicados revogada a decisão arbitral recorrida e substituída por outro Acórdão consentâneo com o quadro jurídico vigente.


O recurso foi admitido por despacho de 25-06-2020.

Foi cumprido o disposto no artigo 25º nº 5 do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária.

O Recorrido A……………. apresentou contra-alegações, nas quais enuncia as seguintes conclusões:

“(…)

A. Não se verificam os pressupostos de admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência, dado que não existe, entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão fundamento a) identidade das situações de facto, b) identidade da matéria de direito e c) contradição entre ambos os acórdãos, pelo que deve ser o recurso ser julgado improcedente;

B. Subsidiariamente, não existiu qualquer erro de julgamento na decisão arbitral recorrida, pelo que deve o recurso ser julgado improcedente;

C. Subsidiariamente, e, sem conceder, ainda que venha a ser dado provimento ao recurso, deve ser analisada toda a matéria peticionada no pedido de pronúncia arbitral relativa ao vício de falta de fundamentação da liquidação, uma vez que, por inútil, não chegou a ser apreciada em sede de pronúncia arbitral, o que se requer.

Termos em que o recurso para uniformização de jurisprudência deve não ser aceite, nos termos e com os fundamentos acima indicados, mantendo-se a decisão arbitral recorrida com as demais consequências legais.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de não se tomar conhecimento do mérito do recurso.


Cumprido o estipulado no n.º 2 do artigo 92.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, cumpre decidir, em conferência, no Pleno da Secção.




2. FUNDAMENTOS

2.1. DE FACTO

Neste domínio, consta da decisão arbitral recorrida o seguinte:

“…

Dos factos provados

5.3. O Requerente é uma pessoa singular, de nacionalidade portuguesa que, até 08-11-2014, residiu para efeitos fiscais em Portugal.

5.4. O Requerente adquiriu, em 09-11-2004, por escritura pública, uma fracção autónoma do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito na ………….., nº .. a … e ….., da freguesia de S. José, em Lisboa, identificado matricialmente sob o nº 110666-U-1485-J, pelo valor de EUR 150.000,00.

5.5. Da escritura pública de aquisição do imóvel descrito no ponto anterior resulta que o mesmo se destinou à habitação própria e permanente do Requerente, tendo este utilizado para pagamento do valor de aquisição (i) EUR 2.304,96, retirados de conta poupança habitação aberta no ………. e (ii) EUR 147.695,04 proveniente de quantia mutuada pela referida entidade bancária.

5.6. Pela aquisição do referido imóvel, o Requerente suportou vários encargos, nomeadamente, o IMT (no valor de EUR 2.600,00), custos da escritura (no valor de EUR 1.695,00), custos de certificação energética (no valor de EUR 253,00) e, posteriormente, suportou custos associados com obras de conservação e de valorização do imóvel que totalizaram EUR 938,00.

5.7. O Requerente alterou, junto da Autoridade Tributária nacional, o seu domicílio fiscal para …………, 47600 Nerac, em França, passando à condição de não residente fiscal em Portugal, sem representante, com efeitos a partir de 08-11-2014.

5.8. O Requerente alienou, no dia 29-08-2017, o imóvel identificado no ponto 5.4., supra, pelo valor de EUR 298.000,00.

5.9. O Requerente apresentou, em 17-04-2018, a sua declaração anual de rendimentos modelo 3 de IRS, relativa ao ano de 2017.

5.10. O Requerente apresentou, em 24/07/2018, a sua declaração anual de rendimentos modelo 3 de IRS de substituição, relativa ao ano 2017 (Declaração nº 2017-3085-J5150-53), na qual declarou ser não residente fiscal em Portugal (por ser residente fiscal em França).

5.11. Nesta declaração anual de rendimentos modelo 3 de IRS de substituição, o Requerente optou pela aplicação das regras de tributação dos residentes fiscais em Portugal (assinalando para o efeito os campos 8 e 10 do Quadro 8 da referida declaração), tendo preenchido com valor 0,00 o campo 11 do referido Quadro 8, relativamente ao “Total de rendimentos obtidos no estrangeiro”.

5.12. O Requerente foi notificado da liquidação de IRS nº 2018 5005467911, de 26-07-2018, relativa ao ano de 2017, no montante de EUR 30.387,84, na qual foram aplicadas as regras de tributação das mais-valias aplicáveis aos não residentes fiscais em Portugal, ou seja, a mais-valia fiscal obtida com a alienação do imóvel descrito no ponto 5.4., supra, foi integralmente tributada à taxa de 28%.

5.13. O Requerente entende que as regras de tributação aplicáveis ao rendimento das mais-valias obtidas com a alienação, em 2017, do imóvel acima identificado deveriam ser as aplicáveis aos residentes fiscais em Portugal, não concordando por isso com o diferencial de imposto, a mais, apurado pela Requerida, face ao total da liquidação.

5.14. O Requerente não pagou o montante de IRS liquidado dentro do prazo para pagamento voluntário.

5.15. O Requerente apresentou, em 31-07-2018, reclamação graciosa (processo nº 3085201804010957) junto do Serviço de Finanças de Lisboa 3 contra a liquidação de IRS identificada no ponto 5.12., supra, com fundamento no facto de (i) não ter lhe terem sido aplicadas as regras de tributação dos residentes fiscais (apesar de ter optado nesse sentido) e de (ii) não ter sido considerada a exclusão tributária por reinvestimento.

5.16. O Requerente foi notificado da execução fiscal nº 3085201801825674, de 10-09-2018, relativa à dívida de IRS do ano 2017 em cobrança coerciva, no montante de EUR 30.573,81.

5.17. O Requerente foi notificado do Ofício nº 5705, de 14-05-2019, relativo ao projecto de indeferimento da reclamação graciosa apresentada e para exercer, querendo, o direito de audição.

5.18. O projecto de indeferimento da reclamação graciosa identificada apenas se debruçou sobre a questão do enquadramento legal do reinvestimento do valor de realização do imóvel alienado, concluindo que “(…) a constituição do direito a benefícios fiscais (…) deve reportar-se à data da verificação dos respetivos pressupostos, pelo que é na data da alienação – 29-08-2017 – que se têm de verificar os pressupostos legais da exclusão da tributação, designadamente a afetação do imóvel (…) à habitação própria e permanente. (…)” pelo que sendo o então reclamante “(…) residente [em França], desde 08-11-2014 (…)”, “(…) à data de 29-08-2017, não se verificavam os pressupostos subjacentes à constituição do benefício fiscal da exclusão tributária”.

5.19. O Requerente não exerceu o direito de audição.

5.20. O Requerente foi notificado do Ofício nº 7933, de 02-07-2019 relativo ao despacho de indeferimento da reclamação graciosa identificada no ponto 5.15., supra, que convolou em definitivo o projecto de indeferimento da referida reclamação.

5.21. O Requerente apresentou, em 30-09-2019, pedido de pronúncia arbitral relativo à liquidação de IRS acima identificada com fundamento na alegada ilegalidade da referida liquidação por violação do artigo 63º do TFUE e por alegada falta de fundamentação da mesma.

Motivação quanto à matéria de facto

5.22. No tocante à matéria de facto provada, a convicção do Tribunal Arbitral fundou-se, para além da livre apreciação das posições assumidas pelas Partes (em sede de facto), no teor dos documentos juntos aos autos pelas Partes, incluindo o processo administrativo.

Dos factos não provados

5.23. Não se verificaram quaisquer outros factos como não provados com relevância para a decisão arbitral.


Por sua vez, o acórdão fundamento relevou a seguinte matéria de facto:
“(…)
1 - O Requerente era residente à data de 2017, em Madrid, Espanha, ou seja, era residente num Estado-Membro da União Europeia, como comprovou;
2 - O Requerente apresentou a sua Declaração Modelo 3 de IRS, de substituição, com o Anexo G, declarando para efeitos de mais-valias os valores de aquisição e de alienação onerosa de dois prédios urbanos, participações sociais, valor de despesas e encargos e rendimentos prediais (Doc. 6).
3 - Verifica-se pelo Rosto da Declaração Mod. 3 que no quadro 8 B foram assinalados pelo Requerente o campo 4 (não residente), o campo 6 (residência em país da União Europeia) e o campo 7 (pretende a tributação pelo regime geral aplicável aos não residentes).
4 - E verifica-se também que o Requerente não preencheu os campos 9 (opção pelas taxas do artigo 68.º do Código do IRS) e 11 (total dos rendimentos obtidos no estrangeiro).
5 - Os referidos bens alienados e rendimentos declarados foram todos auferidos todos em território português e eram os seguintes:
3.1 - Fração autónoma designada pela letra C, a que corresponde o ………., destinado à habitação, do prédio urbano sito na ………., n.º .... Letras ……., freguesia de Santa Isabel, concelho de Lisboa, inscrito na respectiva matriz da freguesia de Campo de Ourique sob o artigo 807 (Doc. 4), por escritura de 15/09/2017, pelo preço de €255,000,00 (Doc. 3).
A referida fração havia sido adquirida pelo preço de €90.000,00, por escritura pública de 20/04/2015 (Doc. 2).
3.2 - Fração autónoma designada pela letra F, a que corresponde o …………, destinado à habitação, do prédio urbano sito na Rua …………, n.º …., em Alcântara, concelho de Lisboa, inscrito na respetiva matriz sob o artigo 539 (Doc. 4), por escritura de venda de 21/03/2017, pelo preço de €155,000,00 (Doc. 5).
A referida fração havia sido adquirida pelo preço de €55.000,00, por escritura pública de 10/11/2015 (Doc. 4).
3.3 - Participações sociais vendidas 06/10/2017, pelo montante de €21.290,10, que havia adquirido em 26/08/2014, pelo preço de €19.805,40.
3.4 - Rendimentos prediais de €4.300,00 respeitantes às rendas relativas às duas frações autónomas alienadas, referidas nos pontos anteriores, sem menção de encargos ou retenções por conta.
6 - A sua declaração foi aceite e validada pela Autoridade Tributária, dando origem à liquidação n.º 2018.5005367017, com um montante de imposto a pagar de €46.551,36 (Doc. 7), posteriormente retificada por uma 2.ª liquidação com o n.º 2018.5005490173, com um valor de imposto a pagar de €47.034,56, originando um estorno do montante também a pagar, em relação à 1.ª liquidação, de €483,20 (Doc.8).
7 - O Requerente procedeu ao pagamento da quantia de €46.551,31 em 24-08-2018 e também de €483,20 na mesma data, num total de €47.034,56 (Doc.s 9 e 10).
8 - Pela demonstração da 2.ª liquidação de IRS, com o n.º 2018.5005367017, conforme certidão junta aos autos, constata-se o apuramento de um rendimento global e coletável de €167.980,58 e a coleta de €47.034,56 (à taxa de 28%).
9 - O Requerente procedeu ao pagamento da quantia de €46.551,31 e também de €483,20, num total de €47.034,56, em 24-08-2018 (Doc.s 9 e 10).
B) - Factos não provados
Não existem factos invocados que não se mostrem comprovados nos autos.
C) - Fundamentação dos factos provados
Todos os factos anteriormente descritos e invocados pelo Requerente (não há processo administrativo) têm por base prova documental junta aos autos, considerando-se, portanto, provados e não contestados e relevam para a decisão a proferir.

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2.2. DE DIREITO

2.2.1.- Dos requisitos de admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos

O presente recurso para uniformização de jurisprudência respeita à decisão arbitral proferida no processo n.º 654/2019-T, do CAAD, que julgou procedente o pedido pronúncia arbitral deduzido por A…………… sobre o acto de liquidação de IRS, do ano de 2017, no valor de € 30.387,84 e sobre o indeferimento da Reclamação Graciosa com o n.º de Processo 3085201804010957, comunicada pelo Ofício n.º 7933 de 2 de Julho de 2019, por alegada oposição com o decidido na decisão arbitral proferida no Proc. nº 539/2018-T (acórdão fundamento).

Nos termos do n.º 2 do referido art. 25.º do RJAT, na redacção aplicável, «[a] decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é […] susceptível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com outra decisão arbitral ou com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo»; dispõe o n.º 3 do mesmo artigo que a esse recurso «é aplicável, com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no art. 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, contando-se o prazo para o recurso a partir da notificação da decisão arbitral».

Como já foi enunciado, o presente recurso tem fundamento na oposição de julgados, impondo-se aferir previamente da verificação dos pressupostos substantivos de que depende o conhecimento do seu mérito. Que são, esquematicamente, os seguintes:

[1.º] que a decisão recorrida tenha apreciado o mérito da pretensão deduzida e tenha posto termo ao processo arbitral (artigo 25.º, n.º 2, primeira parte, do Regime Jurídico da Arbitragem em matéria Tributária – doravante identificado pela sigla “RJAT”);

[2.º] que exista oposição quanto à mesma questão fundamental de direito, com outra decisão arbitral ou com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo (artigo 25.º, n.º 2, segunda parte, do mesmo diploma);

[3.º] que a orientação perfilhada na decisão arbitral não esteja de acordo com a jurisprudência mais recente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo [artigo 152.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aplicável a coberto do n.º 3 do artigo 25.º daquele outro diploma].

[4.º] que o acórdão fundamento tenha transitado em julgado (artigo 688.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto no artigo 140.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos).

Avançando, diga-se ainda como se refere no Ac. deste Tribunal (Pleno) de 4 de Junho de 2014, Proc. nº 01763/13, www.dgsi.pt, para apurar da existência de contradição sobre a mesma questão fundamental de direito é exigível “que se trate do mesmo fundamento de direito, que não tenha havido alteração substancial da regulamentação jurídica e que se tenha perfilhado solução oposta nos dois arestos: o que, como parece óbvio, pressupõe a identidade de situações de facto, já que sem ela não tem sentido a discussão dos referidos pressupostos. Sendo que a oposição também deverá decorrer de decisões expressas, que não apenas implícitas. (Cfr., neste sentido, os acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário, de 25/3/2009, rec. nº 598/08 e do Pleno da Secção de Contencioso Administrativo, de 22/10/2009, rec. nº 557/08; bem como Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 3ª ed., Coimbra, Almedina, 2010, pp. 1004 e ss.; e Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Vol. IV, 6ª ed., Áreas Editora, 2011, anotação 44 ao art. 279º pp. 400/403.)”.

Tal significa que para apurar da existência de contradição sobre a mesma questão fundamental de direito entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão invocado como fundamento devem adoptar-se os critérios já firmados por este STA, quais sejam:

- Identidade da questão de direito sobre que recaíram as decisões em confronto, que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica;

- Que não tenha havido alteração substancial da regulamentação jurídica;

- Que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta;

- A oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta.

Analisando:

Desde logo, cabe notar que não se suscitam dúvidas quanto à verificação dos respectivos requisitos processuais, previsão legal do recurso, tempestividade e legitimidade do recorrente.

Por outro lado, com referência à verificação, in casu, do preenchimento dos pressupostos substanciais do recurso, procedendo ao exame da decisão arbitral recorrida, que se pronunciou sobre o mérito da pretensão e pôs termo ao processo, e a decisão arbitral fundamento, conclui-se, que existe identidade substancial das situações de facto tratadas em cada uma delas: ambas trataram da tributação de mais-valias resultantes de vendas de imóveis situados em Portugal, por residentes em Estados-Membros, à data dos factos, da União Europeia (França, no caso da decisão recorrida, Espanha, no caso da decisão fundamento), tendo sido aplicada a taxa de 28% ao rendimento coletável.

Com efeito, ainda que a leitura dos pontos 5.10 e 5.11 da matéria de facto descrita na decisão arbitral e dos números 3. e 4. da factualidade acolhida no acórdão fundamento possam inculcar que as realidades em análise terão contornos diferentes ab initio, tal não sucede a final, na medida em que, com referência à matéria evidenciada na decisão arbitral recorrida, o ali Requerente apresentou, em 24-07-2018, uma declaração de rendimentos modelo 3 de IRS que substituía a anteriormente apresentada, referente ao ano de 2017, tendo optado pelo regime aplicável aos residentes, mas no campo 11 do quadro 8 da referida declaração, o Requerente nada fez constar e, como nada assinalou nessa sede, a AT não conseguiu aferir qual a percentagem que o Requerente auferiu em Portugal do total dos rendimentos obtidos em 2017, motivo pelo qual foi o mesmo tributado pelo regime geral aplicável a não residentes.

Assim sendo, perante aquilo que foi suscitado, nos dois casos, perante o tribunal arbitral, temos que as decisões em confronto pronunciaram-se sobre a mesma questão fundamental de direito, a não aplicação do regime de exclusão de tributação das mais-valias imobiliárias em 50%, de acordo com o disposto no artigo 43.º, n.º 2 do Código do IRS, a residentes noutro Estado-Membro da União Europeia.

Ora, sobre esta mesma questão de direito, uma e outra perfilharam soluções opostas.
A decisão arbitral recorrida entendeu que a interpretação e aplicação do n.º 2 do artigo 43.º do Código do IRS, no sentido de excluir da limitação da incidência do imposto em 50% as mais-valias resultantes da alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis, realizadas por um residente noutro Estado, sendo aquela unicamente aplicável a residentes em território português, consubstancia uma violação do disposto no artigo 63.º do TFUE, por se traduzir num regime fiscal discriminatório para os não residentes, ponderando que “é seguro afirmar que o regime de tributação previsto no artigo 72º do Código do IRS (na redacção vigente à data da liquidação em crise, ou seja, em 2017), é incompatível com o disposto no artigo 63º do TFUE, pois torna a tributação das mais-valias imobiliárias menos atractiva para os sujeitos passivos não residentes (face à tributação aplicável aos sujeitos passivos residentes), constituindo uma restrição aos movimentos de capitais proibida pelo Tratado.”

Além disso, considerou também que as alterações legislativas ocorridas em 2007 não eliminaram aquele carácter discriminatório, apontando que “…foi este regime negativamente discriminatório para os não residentes que foi aplicado na liquidação de IRS aqui impugnada e, não obstante este regime poder ser afastado pelos sujeitos passivos não residentes, através de opção, esta possibilidade não afasta a discriminação negativa, pois é imposta ao sujeito passivo (não residente) uma obrigação de opção que não é extensiva aos sujeitos passivos residentes.”.

Perante o que ficou exposto, a decisão arbitral recorrida respondeu afirmativamente à questão de saber se o regime de tributação incidente sobre a totalidade das mais-valias imobiliárias, auferidas por não residentes em território português (mas residentes em território de outro Estado-membro da EU - no caso, em França), interpretando e aplicando assim o preceituado no nº 2 do artigo 43º do Código do IRS unicamente a sujeitos passivos residentes em Portugal, está ou não em desconformidade com o direito comunitário, em particular, com a liberdade de circulação de capitais prevista no artigo 63º do TFUE, constituindo uma situação de descriminação entre residentes em Portugal e residentes em outro Estado-membro da EU, o que conduziu à procedência do pedido arbitral formulado, quanto à ilegalidade parcial do acto tributário de liquidação de IRS, do ano de 2017 e sua anulação no domínio em análise.

A decisão arbitral fundamento, por seu turno, entendeu que a liquidação impugnada, resultante da não aplicação do disposto no artigo 43.º, n.º 2 do Código do IRS, não padecia de ilegalidade por violação do Direito da União Europeia, designadamente dos artigos 18.º, 63.º, 64.º e 65.º do TFUF, defendendo que a legislação nacional, pelo menos após as alterações introduzidas pela Lei do Orçamento de Estado para 2008 ao artigo 72.º do Código do IRS, pôs cobro à discriminação negativa dos não residentes, na medida em que veio a conceder-lhes a possibilidade de verem a mais-valias tributadas de harmonia com as regras aplicáveis aos residentes, desde que, para tanto, façam essa opção. E, assim, julgou improcedente o pedido e manteve na ordem jurídica a liquidação impugnada.

Neste enquadramento, é de concluir que há oposição na solução perfilhada nas duas decisões, recorrida e fundamento, sobre a mesma questão fundamental de direito.

Porém, para que o recurso seja admissível é necessário que se verifique, como referimos, um outro pressuposto, que a decisão recorrida não esteja de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo (artigo 152.º n.º 3 do CPTA, aplicável ex vi do disposto no n.º 3 do artigo 25.º do RJAT).

Pois, no que diz respeito a este elemento, tem de entender-se que o mesmo não está preenchido.

Na verdade, recentemente, o Pleno da Secção Tributária do Supremo Tribunal Administrativo, apreciou a questão fundamental de direito que importaria dirimir neste recurso, no acórdão de 09/12/2020, proferido no processo 075/20.6BALSB, tendo uniformizado jurisprudência no seguinte sentido:

«o n.º 2 do art. 43.º do CIRS, na redacção aplicável, ao prever uma limitação da tributação a 50% das mais-valias realizadas apenas para os residentes em Portugal, e não para os não residentes, constitui uma restrição aos movimentos de capitais, incompatível com o art. 63.º do TJUE, não tendo essa discriminação negativa dos não residentes sido ultrapassada pelo regime opcional introduzido no art. 72.º do CIRS pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro, previsto, aliás, apenas para os residentes noutro Estado-membro da UE ou na EEE e não para os residentes em Países terceiros.»

O que significa que a decisão recorrida está em conformidade com aquela que é a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, de acordo com os critérios que têm vindo a ser definidos – cf., por todos, o acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 12 de dezembro de 2012, proferido no processo n.º 0932/12, no qual ficou dito que «a jurisprudência consolidada deve transparecer ou do facto de a pronúncia respectiva constar de acórdão do Pleno assumido pela generalidade dos Conselheiros em exercício na Secção (consoante prevê o art. 17º, nº 2, do actual ETAF) ou do facto de existir uma sequência ininterrupta de várias decisões no mesmo sentido, obtidas por unanimidade em todas as formações da Secção».

Em conclusão, não se encontra preenchido o requisito de admissão do recurso previsto no n.º 3 do artigo 152.º do CPTA, o que determina que dele não se conheça (neste sentido, Acs. deste Tribunal (Pleno) de 20-01-2021, Procs. nºs 71/20.3BALSB e 108/20.6BALSB, ambos disponíveis em www.dgsi.pt).

Razão porque se decide não tomar conhecimento do recurso.




3. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em não tomar conhecimento do recurso.

Custas pela Recorrente.

Notifique-se. D.N..

Comunique ao CAAD.




Lisboa, 24 de Fevereiro de 2021

Pedro Vergueiro (Relator)

O Relator consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Srs. Conselheiros integrantes da Formação de Julgamento - os Senhores Conselheiros Isabel Marques da Silva - Francisco Rothes - Aragão Seia - José Gomes Correia - Joaquim Condesso - Nuno Bastos - Aníbal Ferraz - Paulo Antunes - Gustavo Lopes Courinha - Paula Cadilhe Ribeiro - Anabela Russo

Pedro Nuno Pinto Vergueiro