Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0249/14.9BESNT
Data do Acordão:09/16/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA
DISPENSA DO PAGAMENTO
REGULAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS
Sumário:Nos casos em que o valor da causa excede € 275.000,00, justifica-se a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida pelo recurso de revista (art. 6.º, n.º 7, do RCP) se a conduta processual das partes não obstar a essa dispensa e se o montante da taxa de justiça devida se afigura desproporcionado em face do concreto serviço prestado, pondo em causa a relação sinalagmática que a taxa pressupõe.
Nº Convencional:JSTA000P26311
Nº do Documento:SA2202009160249/14
Data de Entrada:09/18/2019
Recorrente:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A…………, SA E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Pedido de reforma de acórdão proferido em apreciação preliminar da admissibilidade do recurso excepcional de revista interposto no processo n.º 249/14.9BESNT

1. RELATÓRIO

1.1 O Representante da Fazenda Pública (adiante Requerente), notificado do acórdão proferido nestes autos pela formação a que alude o n.º 5 do art. 150.º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA), vem agora, invocando o disposto nos arts. 616.º, n.ºs 1 e 3 do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi da alínea e) do art. 2.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), requerer a reforma do dito acórdão, na parte referente às custas, pedindo a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida em sede de recurso, à luz do disposto no n.º 7 do art. 6.º do Regulamento das Custas Processuais (RCP).

1.2 Considerou a Requerente, em síntese, que se justifica a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, «uma vez que, estamos em sede de recurso de revista, não houve lugar à produção de prova testemunhal e o Tribunal analisou e decidiu sobre questão que não se afigura revestir grande complexidade tendo, aliás, acabado por não tomar conhecimento do recurso e assim não se ultrapassou a fase da admissibilidade do recurso de revista, não se justificando, pois, que a recorrente seja onerada com o pagamento de um remanescente tão elevado, cfr. art. 6.º n.º 7 do RC».

1.3 As Requeridas não se pronunciaram.

1.4 Cumpre apreciar e decidir.


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2. FUNDAMENTOS

2.1 DE FACTO

As circunstâncias processuais a atender resultam da consulta dos autos.


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2.2 DE DIREITO

2.2.1 DA DISPENSA DO PAGAMENTO DO REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA

Pediu a Requerente a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo da faculdade prevista na segunda parte do n.º 7 do art. 6.º do RCP, norma que dispõe: «[n]as causas de valor superior a (euro) 275.000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento».
Como este Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a afirmar, a dispensa do remanescente da taxa de justiça tem natureza excepcional, pressupõe uma menor complexidade da causa e uma simplificação da tramitação processual aferida pela especificidade da situação processual e pela conduta das partes.
No caso sub judice, o acórdão foi no sentido de não admitir o recurso de revista, por não estarem verificados os respectivos pressupostos, sendo que essa apreciação preliminar, se não revestiu dificuldade superior à média, também não se deve considerar como de menor complexidade, nos termos e para os efeitos do estatuído no n.º 7 do art. 6.º do RCP.
No entanto, o valor a pagar a título de remanescente afigura-se-nos elevado em face do serviço prestado, susceptível até de ofender os princípios constitucionais do direito de acesso aos tribunais e da proporcionalidade decorrentes do estatuído nos arts. 20.º, n.º 2.º e 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa. Não podemos perder de vista que a taxa de justiça, como todas as taxas, assume natureza bilateral ou correspectiva (cfr. arts. 3.º, n.º 2, e 4.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária), constituindo a contrapartida devida pela utilização do serviço público da justiça por parte do sujeito passivo.
Assim, concluímos que o acórdão que decidiu não admitir o recurso condenou, como não podia deixar de ser, a Recorrente nas custas, não decorrendo essa condenação de qualquer erro, lapso ou sequer descuido a justificar a reforma do acórdão, mas da estrita aplicação das normas legais que determinam a responsabilidade por custas (art. 527.º n.ºs 1 e 2 do CPC). No entanto, atento o que deixámos dito, entendemos como justificada a dispensa do remanescente da taxa de justiça formulado pela Requerente ao abrigo do disposto no n.º 7 do art. 6.º do RCP, sendo também que a conduta processual das partes no recurso não merece censura que obste a essa dispensa.


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2.2 CONCLUSÃO

Preparando a decisão, formulamos a seguinte conclusão:

Nos casos em que o valor da causa excede € 275.000,00, justifica-se a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida pelo recurso de revista se a conduta processual das partes não obstar a essa dispensa e se o montante da taxa de justiça devida se afigura desproporcionado em face do concreto serviço prestado, pondo em causa a relação sinalagmática que a taxa pressupõe.


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3. DECISÃO

Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em deferir o pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça formulado pela Requerente.

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Lisboa, 16 de Setembro de 2020. – Francisco Rothes (relator) – Isabel Marques da Silva – Aragão Seia.