Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:03075/16.7BELRS
Data do Acordão:05/10/2023
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANÍBAL FERRAZ
Descritores:REFORMA DE ACÓRDÃO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P30988
Nº do Documento:SA22023051003075/16
Data de Entrada:12/05/2022
Recorrente:BANCO 1..., SA
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa;

# I.

Banco 1..., S.A., …, notificado de acórdão proferido nos autos, veio requer a sua reforma, com as legais consequências.

Destacamos, do respetivo requerimento: «


(…).
II. Dos fundamentos da reforma
13. Conforme se enunciou supra, o ora Recorrente invocou na petição inicial de impugnação judicial e, bem assim, em sede do presente recurso, a ilegalidade e a inconstitucionalidade da aplicação da taxa agravada pela Portaria n.º 165-A/2016, de 14 de junho, à CSB autoliquidada no ano de 2016.
14. A este respeito, importa desde logo sublinhar que decorre da Sentença Recorrida e da jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo, nomeadamente do acórdão de 19 de junho de 2019 (processo n.º 02340/13.0BELRS), que “só no momento da aprovação das contas de cada exercício fica definida a base de incidência da CSB”.
15. E, nos presentes autos, foi demonstrado que a aprovação das contas ocorreu no dia 31 de março de 2016 (cf. ponto 313. e Doc. n.º ... junto às alegações de recurso apresentadas pelo Recorrente).
16. No entanto, a Portaria n.º 165-A/2016, de 14 de junho, foi aprovada após a data da aprovação de contas,
17. E, ainda assim, nos termos do disposto no artigo 3.º da identificada Portaria n.º 165-A/2016, de 14 de junho, “A presente portaria entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação, produzindo efeitos a partir de 1 de janeiro de 2016.
18. De onde resulta, portanto, que mesmo aplicada ao caso concreto a jurisprudência deste Supremo Tribunal, de acordo com a qual o momento relevante para aferir da aplicação retroativa das normas relativas à CSB é a aprovação de contas, e não o termo do exercício a que respeita o passivo que constitui base de incidência do tributo, sempre se concluiria que a Portaria n.º 165-A/2016, de 14 de junho, entrou em vigor em data posterior à aprovação de contas.
19. Neste contexto, entende o Recorrente que consta do processo meio de prova plena que, por si só, implica necessariamente decisão diversa da proferida e, portanto, justifica a reforma do Acórdão ora peticionada.
20. Recorde-se a este respeito que, nos termos do disposto no artigo 616.º, n.º 2, al. b), do CPC, aplicável por remissão do artigo 2.º, al. e), do CPPT:
Não cabendo recurso da decisão, é ainda lícito a qualquer das partes requerer a reforma da sentença quando, por manifesto lapso do juiz:(…)
b) Constem do processo documentos ou outro meio de prova plena que, só por si, impliquem necessariamente decisão diversa da proferida.
21. E, bem assim, que o artigo 666.º do CPC, aplicável por remissão do artigo 2.º, al. e), do CPPT, determina que “É aplicável à 2.ª instância o que se acha disposto nos artigos 613.º a 617.º”.
22. Ora, face ao enquadramento apresentado supra, verifica o Recorrente que consta dos presentes autos meio de prova plena que evidencia que as contas do Recorrente foram aprovadas em 31 de março de 2016,
23. O que, por si só, obsta à simples remissão para jurisprudência anterior que (i) não respeita à CSB do ano de 2016(2), e (ii) conclui que inexiste retroatividade porque o momento relevante é a aprovação de contas, quando no caso concreto as contas foram comprovadamente aprovadas em momento anterior à entrada em vigor da Portaria n.º 165-A/2016, de 14 de junho.
2 Sublinhando-se a este respeito que o acórdão do STA de 8 de junho de 2022, proferido no âmbito do processo n.º 792/18.0BELRS, respeita à CSB do ano de 2017, relativamente à qual não se colocava o pedido subsidiário relativo à aplicação retroativa do aumento de taxa operado pela Portaria 165-A/2016, de 14 de junho.
24. E é esta constatação que implica necessariamente decisão diversa da proferida no Acórdão.
25. Recorde-se: foi demonstrado nos presentes autos que a aprovação das contas ocorreu na Assembleia Geral de Acionistas de 31 de março de 2016, mais de dois meses antes da publicação da Portaria n.º 165-A/2016, de 14 de junho (cf. ponto 313. e Doc. n.º ... junto às alegações de recurso apresentadas pelo Recorrente).
26. Ou seja, encontra-se provado nos presentes autos que as contas do Recorrente já se encontravam aprovadas no momento em que a Portaria n.º 165-A/2016, de 14 de junho, entrou em vigor e determinou o aumento de 0,085% para 0,110% da taxa incidente sobre o passivo.
27. Assim, é por demais evidente que, no que concretamente diz respeito à CSB do ano de 2016, o agravamento da taxa introduzido pela referida Portaria no dia 14 de junho de 2016 age sobre um facto tributário passado.
28. Neste contexto, acolhendo a jurisprudência deste Sumo Tribunal segundo a qual a base de incidência da CSB fica definida no momento da aprovação das contas de cada exercício, necessariamente se conclui que autoliquidação da CSB de 2016 nos termos da taxa agravada pela Portaria n.º 165-A/2016, de 14 de junho, é ilegal e inconstitucional, por violação princípios da proibição da retroatividade da lei fiscal e da proteção da confiança, com acolhimento nos artigos 103.º, n.º 3, e 2.º da Constituição.
29. Com efeito, tendo a aprovação das contas ocorrido no dia 31 de março de 2016, foi nessa data que, de acordo com a jurisprudência deste Supremo Tribunal, se verificou o facto tributário subjacente à CSB, pelo que a aplicação ao mesmo de uma norma que apenas veio a ser publicada em 14 de junho de 2016 configura, obviamente, um flagrante problema de retroatividade autêntica de normas, proibido pela Constituição.
30. Assim, prevalecendo a tese defendida por este Sumo Tribunal na jurisprudência invocada no Acórdão de que o momento relevante para a determinação da taxa aplicável à CSB é o momento da aprovação de contas, sempre se haverá de concluir que foi junta prova aos presentes autos que demonstra cabalmente que o argumento subsidiário deve proceder,
31. O que vale por dizer que consta do processo meio de prova plena que, por si só, implica necessariamente decisão diversa da preferida e justifica a reforma do Acórdão ora peticionada.
32. Em suma: atenta a prova constante dos presentes autos e a jurisprudência deste Sumo Tribunal, deve ser reformado o Acórdão, nos termos do disposto nos artigos 666.º e 616.º, n.º 2, al. b), do CPC, aplicáveis por remissão do artigo 2.º, al. e), do CPPT, no sentido da procedência dos vícios de ilegalidade e inconstitucionalidade da aplicação da taxa agravada pela Portaria n.º 165-A/2016, de 14 de junho, à CSB autoliquidada no ano de 2016,
(…). »

*

A parte contrária, notificada, omitiu pronúncia.

*

A Exma. Magistrada do Ministério Público, na sequência de vista nos autos, emitiu parecer “no sentido do indeferimento do pedido de reforma do acórdão”.

*

Cumpridas as formalidades legais, compete conhecer e decidir, com dispensa de vista aos Exmos. Conselheiros-adjuntos.

*******

# II.

O visado acórdão, além do mais, incorpora o seguinte segmento fundamentador: « (…).

Persiste, não versado, o aspeto subjacente às conclusões XXI. a XXIII. ( (Num parêntesis e para melhor perceção, reproduzimos, aqui, o seu conteúdo literal:

“XXI. Por fim, e a título subsidiário, importa concluir que a alteração da taxa da CSB, operada pela Portaria 165-A/2016, determinando um incremento de 0,085% para 0,110% da taxa incidente sobre o passivo apurado, é ilegal por violação do disposto nos artigos 12.º da LGT e 12.º do Código Civil;

XXII. Sendo ainda o artigo 1.º da Portaria 165-A/2016, de 14 de junho, na parte em que altera o artigo 5.º da Portaria CSB, bem como o artigo 3.º da mesma Portaria 165-A/2016, inconstitucionais por violação do princípio da proibição da retroatividade da lei fiscal, previsto no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição, e do princípio da proteção da confiança, com acolhimento no artigo 2.º da Constituição;

XXIII. Isto porque, em concreto quanto à CSB do ano de 2016, é forçoso concluir que o agravamento da taxa introduzido por tal Portaria no dia 14 de junho de 2016 intenta agir sobre um facto tributário passado – seja, de acordo com o entendimento do ora Recorrente, o termo do período de tributação de 2015, seja, na perspetiva da própria Sentença recorrida, a aprovação das contas que já havia ocorrido, mais concretamente no dia 31 de março de 2016 –, o que configura um flagrante problema de retroatividade autêntica de normas, proibido pela Constituição;”.)), em relação ao qual acolhemos o julgado e decidido na sentença recorrida (…), cujos termos, aqui, deixamos (re)transcritos: «

O artigo 6.º, n.º 2 da Portaria n.º 121/2011 apura a base de incidência do imposto tendo como referência "a média atual dos saldos finais de cada mês, que tenham correspondência nas contas aprovadas no próprio ano em que é devida a contribuição".

A Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março («Lei do Orçamento do Estado para 2016»)5 e a Portaria 165-A/2016, de 14 de junho de 2016 («Portaria 165-A/2016») que introduziram alterações à Portaria 121/2011.

Das normas indicadas não resulta qualquer retroatividade.

O imposto incidirá sobre os passivos contraídos anteriormente, isto é, sobre os valores com correspondência nas contas aprovadas no próprio ano em que é devida a contribuição (valores de um ano, cujas contas são aprovadas no a(n)o subsequente).

Incidindo a taxa sobre o passivo apurado no momento da aprovação das contas, e uma vez que as mesmas são “aprovadas no próprio ano em que é devida a contribuição”, não há retroatividade.

Os elementos da relação jurídica de imposto só se encontram estabilizados uma vez terminado o ano fiscal. O passivo sobre o qual incide o tributo é apurado no ano do seu pagamento. O ato tributário só se concretiza com esse apuramento do passivo. Não há destruição de efeitos produzidos por atos passados.

No caso dos autos o que se verifica é uma autoliquidação da contribuição sobre o setor bancário efetuada pelo Impugnante, com base no passivo relativo a período anterior, mas que apenas foram apurados posteriormente ao momento da entrada em vigor da lei.

Pelo que não há qualquer violação do princípio da irretroatividade da lei fiscal, previsto no artigo 103.º, n.º 3, da CRP. »

(…). »

Decorre daqui, objetivamente, que os Conselheiros intervenientes (tal como a sentença recorrida) não cometeram qualquer lapso e, muito menos, manifesto, pois, tiveram em conta, mesmo que, implicitamente, a circunstância de “as contas do Recorrente (terem sido) aprovadas em 31 de março de 2016”.

Portanto, o aresto sob crítica não carece de ser reformado.


*******

# III.

Face ao exposto, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, concordamos indeferir o versado pedido de reforma.


*

Custas pelo requerente, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC.

*****
[texto redigido em meio informático e revisto]

Lisboa, 10 de maio de 2023. - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz (relator) - Pedro Nuno Pinto Vergueiro - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes.