Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0709/11
Data do Acordão:11/23/2011
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:VALENTE TORRÃO
Descritores:RECLAMAÇÃO DE DECISÃO DO ÓRGÃO DA EXECUÇÃO FISCAL
UTILIDADE
RECLAMAÇÃO
Sumário:I - Pretendendo-se com a reclamação evitar a penhora de bens com fundamento em que a execução se encontra extinta, a apreciação em diferido da reclamação faria perder o seu efeito útil que é o de evitar uma penhora ilegal.
II - Sendo assim, a reclamação deve subir imediatamente ao tribunal tributário para o conhecimento do respectivo mérito.
Nº Convencional:JSTA000P13521
Nº do Documento:SA2201111230709
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1. A……, com os demais sinais nos autos, veio recorrer da decisão do Mmº Juiz do TAF de Penafiel que julgou improcedente a reclamação contra a decisão do órgão da execução fiscal que, nos autos de execução fiscal nº 3565199401023446 e apensos, o notificou para a entrega do livrete e do título de registo de propriedade do veículo com matrícula ……, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui:
1ª) Tendo o recorrente reclamado de decisão do Serviço de Finanças que decide prosseguir com execução fiscal, penhorando bens, ignorando e desrespeitando sentença proferida pelo TAF de Penafiel, estamos perante facto que por si só não carece de invocação de prejuízo irreparável.
2ª) Estamos perante situação que forçosamente provoca prejuízo irreparável ao recorrente uma vez que, desde logo, frustra totalmente a legítima expectativa criada com a procedência da sua oposição deduzida.
3ª) O tribunal pode e deve conhecer da escandalosa violação do direito do recorrente, da clara ilegalidade cometida pelo Serviço de Finanças.
4ª) Ao admitir-se que não existe prejuízo irreparável e que não se está perante uma situação em que a apreciação da reclamação determina a sua perda de utilidade, está a negar-se a força de uma sentença transitada em julgado.
Termos em que, nos melhores de Direito que Vªs Ex.cias doutamente suprirão, deve o presente recurso merecer provimento e consequentemente revogada a sentença recorrida, com todas as consequências legais.
2. O Mº Pº não emitiu parecer.
3. Colhidos os vistos legais cabe agora decidir.
4. Com interesse para a decisão foram dados como provados em 1ª instância os seguintes factos:
1º) O ora reclamante foi notificado para proceder à entrega do livrete e título de registo de propriedade do veículo com a matrícula ……, no âmbito de processo de execução fiscal nº 35651999401023446 e apensos.
2º) O reclamante respondeu, demonstrando que a execução se encontra extinta desde 25 de Fevereiro de 2009, por força da sentença proferida nos autos de oposição com o nº 1895/06.9 à execução fiscal.
5. De acordo com as conclusões das alegações, a única questão a apreciar no presente recurso é a de saber se a reclamação da decisão do órgão da execução fiscal deveria ter subido imediatamente ou em diferido ao tribunal tributário.
5.1. É certo que, a final, o Mmº Juiz recorrido decidiu julgar improcedente a reclamação, nos seguintes termos:
“Atento o exposto e sem necessidade de mais considerações, julgo improcedente a presente reclamação de Actos do Órgão de Execução Fiscal, interposta por A……, mantendo-se o despacho reclamado”.
Poderia isto dar a entender ter conhecido do mérito da impugnação.
Porém, verifica-se que a sentença recorrida dedicou 3 folhas (v. fls. 533/536) a tentar justificar a subida da reclamação ao tribunal em diferido, concluindo que a mesma deve “ser devolvida ao Serviço de Finanças competente para prosseguimento dos ulteriores termos do processo de execução fiscal”.
Então, das duas uma: ou se considera a existência de nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão (artº 668º, nº 1, alínea b) do CPC), a qual não é de conhecimento oficioso; ou se entende ter existido um mero lapso na parte final da decisão já que no espírito do decisor estava a baixa dos autos ao órgão da execução fiscal.
Propendemos aqui para entender que o Mmº Juiz não se exprimiu correctamente na parte final da sentença, pois que estaria no seu espírito manter o despacho reclamado, uma vez que a subida dos autos apenas seria em diferido.
5.2. Posto isto, vejamos então se os autos de reclamação deveriam ter subido imediatamente - como subiram - ou se deverão subir em diferido.
O recorrente entende que os autos sobem imediatamente, uma vez que foi decidido prosseguir com execução fiscal, penhorando bens, ignorando e desrespeitando sentença proferida pelo TAF de Penafiel. Estamos, por isso, perante situação que forçosamente provoca prejuízo irreparável ao recorrente frustrando totalmente a legítima expectativa criada com a procedência da sua oposição deduzida. A não apreciação imediata da reclamação determina a sua perda de utilidade.
A decisão recorrida, por sua vez, entendeu que não se verificavam os requisitos legais para a subida imediata.
Vejamos então.
Como é sabido, a reclamação de decisão do órgão da execução fiscal sobe, em regra, depois de realizadas a penhora e a venda (artº 278º, nº 1 do CPPT).
A reclamação, todavia, subirá imediatamente quando a reclamação se fundamentar em prejuízo irreparável causado por qualquer das seguintes ilegalidades:
a) Inadmissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos ou da extensão com que foi realizada;
b) Imediata penhora dos bens que só subsidiariamente respondam pela dívida exequenda;
c) Incidência sobre bens que, não respondendo, nos termos do direito substantivo, pela dívida exequenda, não deviam ter sido abrangidos pela diligência;
d) Determinação da prestação de garantia indevida ou superior à devida.
e) Erro na verificação ou graduação de créditos. (artº 278º, nº 3 citado).
E, de acordo com a jurisprudência reiterada e uniforme deste Supremo Tribunal, a estas ilegalidades há que equiparar quaisquer outras de relevância semelhante em termos de garantia do direito à tutela judicial efectiva previsto na Constituição – artº 268º, nº 4”. (Acórdão do STA (2ª Secção), de 22.09.2004 – Recurso nº 897/04-30), considerando-se ainda que a reclamação deverá subir imediatamente sempre que a sua retenção a torne completamente inútil, isto é, quando o prejuízo eventualmente decorrente daquela decisão não possa ser reparado com a subida em diferido. (Acórdão do STA, 2ª Secção, de 23-05-2007- Processo nº 0374/07).
No caso dos autos, o recorrente veio alegar que foi efectuada penhora de bens seus em processo de execução fiscal extinto. Ora, a ser assim, e não cabendo agora aqui apreciar o mérito da reclamação, até porque nos parece existirem no processo factos relevantes para a decisão que não foram levados ao probatório, se os autos não subirem imediatamente, o recorrente verá bens seus penhorados ilegalmente, sendo certo que a sua pretensão de evitar a penhora ou de a execução prosseguir perderá o efeito útil.
Assim, os autos de reclamação deveriam subir imediatamente - como subiram - ao tribunal tributário para conhecimento do respectivo mérito.
6. Nestes termos e pelo exposto concede-se provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida e ordenando-se a baixa dos autos ao tribunal recorrido para, fixado o pertinente probatório, se conhecer do mérito da reclamação.
Sem custas.
Lisboa, 23 de Novembro de 2011. – Valente Torrão (relator) – Dulce Neto – Lino Ribeiro.