Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0229/13
Data do Acordão:05/15/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:INTIMAÇÃO PARA COMPORTAMENTO
REEMBOLSO
Sumário:I - A intimação para um comportamento, prevista no artigo 147.º do CPPT, não visa substituir o procedimento administrativo instituído pelo legislador para certificar a existência e montante do direito ao reembolso de IVA, antes reagir contra omissões ilegais do dever de prestações jurídicas lesivas de direitos ou interesses legítimos em matéria tributária, o que pressupõe necessariamente, em face da inexistência de fase declarativa deste meio processual, a “evidência do direito” que se invoca como tendo sido lesado pela conduta omitida pela Administração tributária.
II - Sem a certeza do direito ao reembolso e do respectivo montante não pode a Administração tributária ser intimada a efectuá-lo, por nem sequer ocorrer omissão ilegal lesiva justificativa da intimação.
Nº Convencional:JSTA00068253
Nº do Documento:SA2201305150229
Data de Entrada:02/15/2013
Recorrente:A...
Recorrido 1:DIRGER DOS IMPOSTOS
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF BRAGA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - INTIMAÇÃO - COMPORTAMENTO
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART147
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO VOLII 6ED PAG585
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

- Relatório -
1 – A……., com os sinais dos autos, na qualidade de Administrador da Insolvência nomeado no processo n.º 18/09.8TYUNG do 3.º Juízo do Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia em que é insolvente B……., LDA, recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 15 de Outubro de 2012, que negou provimento à intimação para um comportamento que deduziu visando que a Direcção de Serviços de Reembolsos fosse intimada a remeter à Massa Insolvente a importância de 146.422,03€ a título de reembolso de IVA.
O recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
1 – Nunca foi posto em causa o princípio da Colaboração entre a Autoridade Administrativa e o Contribuinte, de acordo com o artigo 59.º da LGT em que se baseia a sentença em crise.
2 – No caso dos presentes autos, o âmbito de aplicação do referido princípio está subordinado ao n.º 1 do artigo 82.º do CIRE, que determina que o Administrador de Insolvência nomeado não substitui os órgãos sociais porque os mesmos mantêm-se em funcionamento após a declaração de insolvência sem serem remunerados.
3 – No número 4 do artigo 81.º do CIRE, poderá verificar-se que o Administrador de Insolvência assume a representação do devedor para todos os efeitos de carácter patrimonial que interessem à insolvência.
4 – A sociedade B……., Lda. encontra-se em liquidação, uma vez que não foi viável a sua recuperação, tendo sido nomeado como Administrador da sociedade devedora, C……., como consta da Publicação em Diário da República, da sentença de insolvência, Cfr. fls., a quem incumbe cumprir com todas as obrigações fiscais e tributárias, nomeadamente, proceder à entrega das declarações de IVA e cessação de actividade para esse efeito.
5 – A apreensão do valor do reembolso do crédito de IVA a favor da massa insolvente constitui um acto enquadrável no n.º 4 do artigo 81.º do CIRE, que foi realizado pelo aqui Recorrente, sendo que o preenchimento das declarações periódicas de IVA da sociedade insolvente, assim como da declaração de cessação de actividade para o mesmo efeito extravasam o âmbito das competências do AI, uma vez que, a fazerem parte – o que não é o caso – teriam de constar expressamente da sentença de declaração de insolvência.
6 – O Administrador de Insolvência, por todo o exposto, não se pode substituir ao administrador da sociedade devedora, nas suas atribuições, podendo apenas cooperar com este dentro dos limites legais.
7 – Da mesma forma, não pode a Administração Tributária exigir que o administrador de Insolvência ultrapasse o âmbito das suas competências que estão fixadas pelo seu Estatuto e pelo CIRE, para além das atribuições específicas da Assembleia de Credores.
8 – Assim, torna-se impossível ao ora recorrente obter o reembolso do IVA a favor da massa insolvente.
9 – Logrando a Administração Fiscal, com tal argumentação, adiar a entrega do valor referente ao reembolso do IVA, por falta de legitimidade do Administrador de Insolvência, o que, no limite, implicaria um adiamento “ad eternum”.
10 - Termos em que a sentença ora recorrida tem forçosamente de ser revogada e a Administração Fiscal ser intimada a proceder ao reembolso do IVA a favor da massa insolvente.
Termos em que, e nos melhores de direito e que V. Exas. certamente suprirão:
Deve ser admitido o presente recurso e, em consequência,
Ser revogada a douta sentença ora recorrida, nos seus precisos termos e fundamentos, condenando-se a Administração Fiscal no sentido de ser intimada a remeter à Massa Insolvente de B……., Lda., a quantia de €126.422, 03 a título de reembolso de IVA que lhe é devido.
Tudo com as legais consequências.
2 – Contra-alegou a recorrida, concluindo nos termos seguintes:
A – A Circular nº 1/2010 da Administração Tributária contém as instruções procedimentais relativamente às empresas em processo de insolvência, designadamente sobre as personalidades jurídica e tributária, bem como sobre os direitos e obrigações impendentes sobre as mesmas. Adicionalmente.
B – Perante as regras do Código do IVA a empresa B…….., Lda está ainda em actividade pelo que a restituição do crédito existente em conta-corrente no quantitativo de 126 422,01 € obrigaria a que, previamente, fosse preenchida a declaração periódica prevista no art. 29º do CIVA, tal como determina o art. 14.º do Dec.-Lei nº 229/95, de 11/09.
C – Apesar de o ora Recorrente Jurisdicional ter enviado a declaração de cessação de actividade, a mesma foi-lhe devolvida porque carecida de rectificações, que o mesmo nunca efectuou.
D – A 1ª parte do n.º 5 do art. 8.º do Código do IRC dispõe que a cessação de actividade ocorre, relativamente às actividades com sede ou direcção efectiva em território português, na data do encerramento da liquidação. Assim e em consequência, temos que:
D.1 – A mera declaração de insolvência não consubstancia qualquer cessação de actividade dos insolventes, pois após a sua emissão, a actividade da entidade insolvente mantém-se, não apenas até à liquidação, mas até ao registo do encerramento da liquidação.
D.2 – O facto de, com a declaração de insolvência, o sujeito passivo ficar impedido de prosseguir o seu objecto social, não obsta a que a sua actividade prossiga para efeitos exclusivamente fiscais, até ao momento do registo do encerramento da liquidação.
D.3 – Assim, a cessação da actividade do insolvente verifica-se somente aquando do registo da liquidação, sendo este o momento em que nasce o dever de apresentar a declaração de cessação de actividade a que se referem o art. 118º nº 6, do Código do IRC, o art. 112º nº 3 do Código do IRS e o art. 33º do Código do IVA, consoante o caso.
E – Logo, a massa falida não constitui um património autónomo, eventualmente susceptível de subsumir-se ao conceito de sujeito passivo de IRC previsto no art. 2º nº 1 al.b), do Código do IRC; mesmo que assim fosse, o que não se concede, as operações realizadas por esse património autónomo continuariam a ser abrangidas pela incidência do IRC ou do IRC.
F – Mas, em qualquer das situações o administrador da insolvência é sempre o responsável pelo cumprimento das obrigações fiscais. Tanto assim que o ora Recorrente Jurisdicional já apresentou a declaração de cessação de actividade a sociedade insolvente, que foi devolvida a fim de o mesmo proceder a correcções, o que não fez, até à presente data !!!
G – Perante a matéria assente, a Sentença revela-se rigorosa, sensata e cumpridora dos preceitos legais directamente aplicáveis. Assim, só poderia terminar como terminou, negando procedência ao pedido, depois de concluir pela forma expressa e que se transcreve, com realce nosso: “Não pode o Tribunal intimar a AF a proceder a um reembolso de IVA, se o requerente, no âmbito das suas funções de Administrador de Insolvência da referida sociedade B…….., Lda., não logrou justificar perante a AF, no decurso de um procedimento próprio (que lhe foi dado saber) de que é, efectivamente, credora (a massa insolvente) de IVA, e pelo montante trazido aos autos.”.
H – Em resumo:
H.1 – A restituição do crédito existente em conta corrente no quantitativo de 126 422,01€ só pode ser conseguida se:
- previamente, for preenchida e entregue a declaração periódica prevista no art. 29.º do CIVA e em obediência ao disposto no art. 14.º do Dec. Lei n.º 229/95, de 11/09;
- Após a solicitação do respectivo reembolso e porque se desconhece se o mesmo tem existência real e/ou está correcto, é necessário que esse valor seja confirmado ou infirmado pelos serviços competentes da Inspecção Tributária, uma vez que qualquer crédito de IVA tem natureza meramente contabilística, dado resultar do preenchimento de declarações periódicas por parte dos sujeitos passivos.
H.2 – Ora, para se atingir esse objectivo, NUNCA poderá ser a Administração tributária a substituir-se ao impulso procedimental previsto na lei, quer se entenda que o mesmo incumbe ao Administrador da sociedade devedora, quer ao administrador de Insolvência !!!
Em face do exposto deverá: Rejeitar-se o presente Recurso Jurisdicional e manter-se integralmente a sentença recorrida, com as necessárias consequências legais.

3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer nos seguintes termos:
(…)
A nosso ver, o recurso não merece provimento.
A decisão recorrida, embora por outras palavras, acabou por decidir que a intimação para um comportamento não é o meio adequado para o recorrente obter o depósito da peticionada quantia a título de reembolso de IVA.
Vejamos, pois.
Em caso de omissão, por parte da administração tributária, do dever de qualquer prestação jurídica susceptível de lesar direito ou interesse legítimo em matéria tributária, poderá o interessado requerer a sua intimação para o cumprimento desse dever junto do tribunal tributário competente (artigo 147.º/1 do CPPT)
Este meio processual só é aplicável quando, vistos os restantes meios processuais contenciosos previstos no CPPT, ele for o mais adequado para assegurar a tutela plena, eficaz e efectiva dos direitos ou interesses em causa (artigo 147.º/2 do CPPT).
«A utilização deste procedimento, visando obter o cumprimento de um dever pela Administração tributária, supõe que esteja definida previamente a existência deste, uma vez que, ao contrário do que sucede com a acção administrativa especial para condenação à prática do acto devido, não se inclui no processo de intimação uma fase declarativa.
Tal definição da existência de um dever pode resultar directamente da lei, quando se esteja em face de direitos cuja existência não necessite de actos de aplicação ou decorra necessariamente de determinada situação fáctica.
… a primacial utilidade deste meio processual é a de permitir assegurar de forma muito mais rápida a efectivação de direitos cuja existência é evidente» (Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 6.ª edição 2011, II volume, página 585, Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa).
Ora, como muito bem refere o MP junto da 1.ª instância, a fls. 158 dos autos, o reembolso do IVA obedece aos formalismos previstos nos artigos 29.º e 41.º do CIVA e 14.º do DL 229/95, de 11 de Setembro, sendo certo que o recorrente não fundamenta a sua pretensão em qualquer norma específica do CIRE (ou qualquer outra) que disponha normativamente em contrário ou derrogue o regime de reembolsos de IVA.
Na verdade, como concisamente refere a entidade recorrida na alínea H) das suas conclusões “1 – A restituição do crédito existente em conta corrente no quantitativo de 126 422,01€ só pode ser conseguida se:
- Previamente, for preenchida e entregue a declaração periódica prevista no art. 29.º do CIVA e em obediência ao disposto no art. 14.º do Dec. Lei n.º 229/95, de 11/09;
- Após a solicitação do respectivo reembolso e porque se desconhece se o mesmo tem existência real e/ou está correcto, é necessário que esse valor seja confirmado ou infirmado pelos serviços competentes da Inspecção Tributária, uma vez que qualquer crédito de IVA tem natureza meramente contabilística, dado resultar do preenchimento de declarações periódicas por parte dos sujeitos passivos”.
Portanto afigura-se certo que a intimação para um comportamento não é o meio adequado para o recorrente obter o reembolso do IVA, tanto mais que não está, ainda demonstrado o dever da AF de reembolsar o montante peticionado.
Pelo que se referiu e atento o estatuído nos artigos 52.º e 98.º/4 do CPPT não há viabilidade ou suporte legal para convolar o presente processo judicial no procedimento tributário inerente ao pedido de reembolso de IVA (Idem, página 94).
Ocorre, assim, manifesto erro na forma de processo.
O erro na forma de processo sem possibilidade de convolação na forma adequada determina a nulidade de todo o processado, excepção dilatória que determina a absolvição da instância da Fazenda Pública (artigos 199.º, 288.º/1/d), 493.º/2 e 494.º/b) do CPC, ex vi do artigo 2.º/e) do CPPT).
´Termos em que deve negar-se provimento ao presente recurso jurisdicional e manter-se a decisão recorrida na ordem jurídica, nos termos e com os fundamentos referidos.
- Fundamentação -
4 – Questão a decidir
É a de saber se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento ao julgar improcedente a intimação para reembolso de IVA a favor da massa insolvente deduzido pelo Administrador de Insolvência.

5 – Matéria de facto
Na sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga objecto do presente recurso foram dados como provados os seguintes factos:
1 – A sociedade comercial B…….., Lda., foi declarada insolvente por douta sentença proferida no processo n.º 18/09.8TYVNG, em 27 de Maio de 2009, às 23,10 horas, pelo 3.º juízo do Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia – cfr. fls. 16 e 17 dos autos;
2 – O Requerente foi nomeado Administrador da Insolvência, tendo sido nomeado Administrador do devedor, C…….. – Cfr. fls. 16 dos autos;
3 – Do anúncio n.º 4644/2009, mandado publicitar no Diário da República, II série, n.º 115, de 17 de Junho de 2009, pelo 3.º Juízo do Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia, no âmbito do Processo n.º 18/09.8TYVNG, foi referido, entre o mais, o que segue:
“(…)
Ficam advertidos os devedores do insolvente de que as prestações a que estejam obrigados, deverão ser feitas ao administrador da insolvência e não ao próprio insolvente.
(…)”
4 – No dia 17 de Setembro de 2009, o Requerente, na qualidade de Administrador da Insolvência, elaborou um “auto de apreensão de bens”, pelo qual apreendeu a favor da massa insolvente, “o direito ao reembolso do crédito de IVA que a sociedade insolvente B……., Lda, detém sobre a administração Fiscal na importância de 126.422,03€ (…)” – cfr. fls. 18 dos autos;
5 – Por requerimento datado de 17 de Setembro de 2009, o Requerente remeteu requerimento ao Director de Serviço de Reembolsos do IVA, para que a Massa Insolvente seja reembolsada da quantia de 126.422,03 €, e creditada na conta pertencente à Massa Insolvente, para o que indicou o respectivo NIB – Cfr. fls. 21 dos autos;
6 – Entre o Requerente e a Administração Fiscal, foi entabulada diversa correspondência escrita visando o reembolso (à massa insolvente), do crédito de IVA – Cfr. fls. 21 a 48, e 67 a 133 dos autos;
7 – Em 27 de Novembro de 2009, o Chefe de Finanças Adjunto do Serviço de Finanças do Porto 2, procedeu à devolução ao ora Requerente, de declaração de cessação para efeitos de IVA respeitante a B….. ,., com especificações de iniciativas a empreender pelo administrador da Insolvência – Cfr. fls. 26 dos autos;
8 – Em 20 de Agosto de 2010, a Directora de Serviços de reembolsos remeteu ao aqui Requerente ofício – Cfr. fls. 125 dos autos -, pelo qual lhe dava a saber o que aqui se extrai como segue:
“(…) informo que (…) não tem qualquer pedido de reembolso em apreciação.
Por consulta ao sistema informático, nomeadamente a conta corrente do sujeito passivo, verifica-se existir um crédito de IVA, no valor de €126.422,01 reportado ao período de 09.04, última declaração periódica submetida.
Contudo, e porque o sujeito passivo ainda se encontra para efeitos de IVA com actividade, verifica-se que a empresa se encontra em falta declarativa (…).
(…)
Mais se informa que os créditos de IVA, resultam do preenchimento de declarações periódicas por parte do sujeito passivo, pelo que são créditos meramente contabilísticos, que, após serem solicitados sob a forma de reembolso e cumpridos todos os referidos requisitos, serão objecto de apreciação pelos competentes serviços de inspecção tributária relativamente à legitimidade do crédito de IVA.
(…)”
9 – Em 11 de Abril de 2011, a Directora de Serviços de reembolsos remeteu ao aqui Requerente ofício – Cfr. fls. 48 dos autos -, pelo qual lhe dava a saber o que aqui se extrai como segue:
“(…) que da consulta ao sistema de Registo de Contribuintes, verifica-se que o sujeito passivo B…….., Lda, para efeitos de IVA ainda mantém actividade.
Deste modo, os reembolsos de IVA têm que ser solicitados através do preenchimento da declaração periódica a submeter a estes serviços, dentro do prazo determinado no artigo 41 do (CIVA), conforme determina o artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 229/95, de 11 de Setembro.
Da consulta aos elementos remetidos conjuntamente com a presente exposição, verifica-se ter sido apresentada a declaração de cessação, contudo foi a mesma devolvida pelo Serviço de Finanças do porto 2, para efeitos de rectificação.
Por contacto telefónico com aquele serviço de finanças, foi-nos informado não ter ainda sido recepcionada nova declaração (de) cessação com as alterações solicitadas.
(…)”
10 – O requerimento inicial que motiva os presentes autos, foi entregue neste Tribunal no dia 18 de Maio de 2011 – Cfr. fls. 3 dos autos.

6 – Apreciando.
6.1 Do indeferimento da intimação
A sentença recorrida, a fls. 164 a 174 dos autos, negou provimento à requerida intimação para um comportamento, oportunamente deduzida pelo ora recorrente, na qual este pedia ao Tribunal que se digne ordenar que aquela Direcção de Serviços de Reembolsos seja intimada por esse Tribunal a remeter à Massa Insolvente a importância de € 126.422,03 (…) a título de reembolso de IVA, no mais breve espaço de tempo possível e dentro dos prazos previstos no CPPT, a fim de evitar maiores prejuízos para a generalidade dos credores do processo, entre os quais alguns trabalhadores e para que se proceda ao encerramento do processo de insolvência, porquanto entendeu que não pode o Tribunal intimar a AF a proceder a um reembolso de IVA, se o requerente, no âmbito das suas funções de Administrador de Insolvência da referida sociedade B……., Lda, não logrou justificar perante a mesma AF, no decurso de um procedimento próprio (que lhe foi dado a saber) de que é, efectivamente, credora (a massa insolvente) de IVA, e pelo montante trazido aos autos, pois tal apenas poderia ser satisfeito pelo Tribunal, se o Requerente tivesse provado junto deste Tribunal ter prosseguido tudo quanto era devido prosseguir, procedimentalmente, e que a AF não lhe garantia o reembolso a que se achava com direito (cfr. sentença recorrida, a fls. 173/174 dos autos).
Discorda do decidido o recorrente, nos termos supra reproduzidos, alegando, em síntese, que o cumprimento dos deveres inerentes ao procedimento para obtenção do reembolso de IVA que lhe foi indicado pela Administração tributária extravasa o âmbito das suas funções de Administrador de Insolvência - pois que o preenchimento de declarações fiscais compete ao administrador da sociedade, e não a ele – pelo que, por essa via torna-se impossível ao ora recorrente obter o reembolso do IVA a favor da massa insolvente e logrando a Administração Fiscal, com tal argumentação, adiar a entrega do valor referente ao reembolso do IVA, por falta de legitimidade do Administrador de Insolvência, razão pela qual insiste em que a sentença ora recorrida tem forçosamente de ser revogada e a Administração Fiscal ser intimada a proceder ao reembolso do IVA a favor da massa insolvente.
Contra-alegou a recorrida defendendo a manutenção do julgado e também neste sentido se pronunciou o Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Supremo Tribunal no seu parecer, supra transcrito, entendendo, porém, que por ocorrência de erro na forma de processo insusceptível de convolação no procedimento próprio de pedido de reembolso.
Vejamos.
Pretende o recorrente ultrapassar os obstáculos burocráticos que o pedido de reembolso do crédito de IVA envolve através do meio processual de intimação para um comportamento, fundamentalmente em razão do facto de não caber no âmbito das suas funções de administrador de insolvência o cumprimento dos deveres fiscais que tal pedido de reembolso implica, mas caber-lhe assegurar a apreensão a favor da massa insolvente de tal crédito.
A sua pretensão está, porém, necessariamente votada ao insucesso, pois que a intimação para um comportamento, prevista no artigo 147.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), não visa substituir o procedimento administrativo instituído pelo legislador para certificar a existência e montante do direito ao reembolso de IVA, antes reagir contra omissões ilegais do dever de prestações jurídicas lesivas de direitos ou interesses legítimos em matéria tributária, o que pressupõe necessariamente, em face da inexistência de fase declarativa deste meio processual, a “evidência do direito” que se invoca como tendo sido lesado pela conduta omitida pela Administração tributária (cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, Volume II, 6.ª edição 2011, pp. 585/585 – nota 3 ao art. 147.º do CPPT).
No caso dos autos, não há ainda a “evidência” de um direito ao reembolso de IVA no valor de € 126.422,03, como pretende o recorrente, pois que a existência e montante deste ainda não foi objecto de “certificação” mediante o procedimento administrativo próprio. E não há igualmente omissão indevida de um dever de reembolso, pois que o procedimento tendente à sua obtenção nem sequer foi iniciado ainda.
O facto de o recorrente invocar a sua falta de legitimidade para o cumprimento dos deveres tributários que o procedimento de reembolso do IVA envolve, não obsta e em nada prejudica este entendimento, pois que sem certeza do direito ao reembolso não pode a Administração tributária ser intimada a efectuá-lo, nem ocorre omissão ilegal lesiva justificativa da intimação.
E assim sendo, bem decidiu a sentença recorrida ao julgar improcedente o pedido de intimação, pois que não se encontram reunidos os seus pressupostos legais, estando o recurso votado ao insucesso.

- Decisão -
7 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.

Custas pelo recorrente, sem prejuízo do apoio judiciário concedido.
Lisboa, 15 de Maio de 2013. - Isabel Marques da Silva (relatora) - Lino Ribeiro - Dulce Neto.